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O RESPEITINHO NÃO É BONITO


O fantasma de António de Oliveira Salazar


A


ntónio de Oliveira Salazar é
o fantasma mais rentável de
Portugal. O seu nome está
na capa de centenas de
livros que vendem dezenas
de milhares de exemplares.
A sua vida privada é alvo de
especulações picantes e de séries
de televisão. O seu legado anima
concursos polémicos sobre os
grandes portugueses. Salazar
preenche a vida de salazaristas e de
anti-salazaristas, e embora os
segundos sejam muito mais
numerosos do que os primeiros,
Ængem não ser, para se acharem
importantes. Salazar paga as
contas a uma vasta legião de
historiadores ocupados a patrulhar
o seu legado, e aquilo que sobre ele
podemos dizer e pensar. Salazar
anima a vida de inúmeros activistas
que o transformaram no seu
monstrinho favorito. Salazar bate
recordes num dos mais
reconfortantes passatempos
nacionais: a assinatura de petições
públicas para impedir pessoas de

João Miguel Tavares


fazerem coisas. Salazar está morto
e enterrado há 50 anos. Mas o seu
cadáver continua a provocar
tremendas paixões.
A paixão deste Verão foi o
chamado “Museu Salazar”, que
aÆnal se irá chamar “Centro
Interpretativo do Estado Novo”. O
dito museu começou por ser
acusado de fazer a apologia do
salazarismo, com a intenção
malévola de levar charters de
fascistas a Santa Comba Dão, e
acabou com os seus promotores a
garantirem que iria “incomodar”
imensos salazaristas, porque as
ditaduras são regimes
desagradáveis. É verdade que são.
E é também verdade que a
velocidade com que se passa de
salazarista a anti-salazarista em
Portugal é tão grande, que o
fenómeno vem comprovar a minha
tese: uns e outros são duas faces da
mesma moeda. Ambos são
inquilinos das mesmas ruínas onde
habita o fantasma de Salazar. E
ambos têm um cheiro a mofo que
já não se atura em 2019.
Abram os olhos, meus senhores.
Onde é que António de Oliveira
Salazar é uma ameaça nos dias que
correm? Quem é hoje realmente
salazarista? Quem é que sonha com
uma sociedade fechada ao exterior,
com um ditador paternalista, com

uma polícia política, com a tortura
e a censura, com o partido único,
com a repressão das liberdades
individuais, com o velho pai de
família, com a proibição de livros e
o corte de Ælmes, com Uma Casa
Portuguesa elevada a canção
nacional, com a ÆlosoÆa do
pobrete mas alegrete? Deixem-me
dar-vos uma notícia chocante:
Salazar morreu há meio século, e
com ele morreu um triste regime
que durou outro meio. Importa
conhecê-lo e não há qualquer razão
para temê-lo.
Portanto, façam o museu, o

antimuseu, o pós-museu, o que der
na gana a quem tiver entusiasmo
para isso, porque Santa Comba Dão
não é o Vale dos Caídos, nem
nunca será. A única coisa que
Salazar é em 2019 — não custa
muito percebê-lo, se se meter o
esqueleto no armário — é uma boa
história, uma personagem que
atrai pela singularidade, um
homem que praticamente mandou
sozinho no país durante quatro
décadas, sem que ninguém tenha
sido capaz de correr com ele.
Nunca se casou, nunca saiu do país
(excepto umas breves viagens à
fronteira espanhola), tinha cabeça
de técnico oÆcial de contas, criava
galinhas em São Bento, montou
uma ditadura de baixa intensidade
que se revelou
extraordinariamente sólida. Os
livros vendem-se e os museus
abrem-se porque a sua história é
única e bizarra, e isso nada tem a
ver com o desejo de ressuscitar o
salazarismo ou regressar a um
passado que só foi bom para quem
não o viveu. Ser anti-salazarista em
2019 é uma patetice. Mais: é uma
afronta aos que efectivamente
resistiram a Salazar, e não ao seu
fantasma.

ADRIANO MIRANDA

Abram os olhos, meus
senhores. Onde é que
António de Oliveira
Salazar é uma ameaça
nos dias que correm?
Quem é hoje realmente
salazarista?

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