Público - 25.08.2019

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Público • Domingo, 25 de Agosto de 2019 • 17

Quigley, que já esteve envolvido
numa manifestação semelhante na
Cova do Vapor, em Almada, contra
a exploração de petróleo na costa
portuguesa. O californiano que
visita regularmente Portugal
explica que o exercício passa por
compor uma “árvore da vida
humana”, com uma “mensagem
gigante para o Governo”.
Quigley vai orientando a Æla de
pessoas, posicionando-as para
preencher a sua árvore desenhada
no chão, enquanto soa um suave
instrumento de percussão que
convida à meditação. A batida
compassada é apenas perturbada
pelo zumbido dos drone s que
captam o momento através de
fotograÆa e vídeo. “Water is Life” e


são mais os estrangeiros” a
manifestá-la, repara.
O protesto de ontem foi disso
exemplo, sendo fácil encontrar
quem não seja dali, mas por ali se
tenha Æxado. É o caso de Carmen
Guesalaga, natural do País Basco,
que, com companheiro, Dieter
Seitz, alemão, tem uma quinta em
Travancinha. “Vivemos a um
quilómetro e meio de um dos
pontos de prospecção”, aÆrma
Carmen e teme que a extracção do
metal da rocha cause poeiras que
se espalhem pela zona. Dieter
receia que não seja sequer
compensado, caso seja lesado pela
extracção mineira. “Tenho 63 anos
e começa a Æcar tarde para
começar de novo noutro lugar”,

sublinha.
“Os interesses de duas ou três
empresas, com a criação de
algumas centenas de postos de
trabalho, não podem pôr em
causa a qualidade de vida das
populações”, sublinha Samuel
Infante. A mineração de lítio,
podendo ser a céu aberto ou em
galeria, implica a instalação de
uma “indústria pesada que tem
impacto na qualidade de vida das
populações, impactos
signiÆcativos no território,
paisagem e biodiversidade”,
aÆrma o ambientalista. Há ainda a
questão da utilização de produtos
químicos para separar o minério,
explica Infante. Isso signiÆca a
utilização de uma “quantidade de

água brutal”. “Além disso,
Portugal não é um país muito rico
em água, pelo que esta deve ser
uma preocupação nacional”,
acrescenta Lynn Mylou.
Samuel Infante fala do potencial
impacto numa região como a do
Fundão, zona de produção de
cereja. Mas as consequências
podem chegar mais longe, no caso
de haver exploração de minério
nas proximidades do rio Zêzere,
onde, mais a jusante, está
instalada a barragem de Castelo de
Bode, utilizada para
abastecimento de água da região
de Lisboa.

Avaliação contínua
Para dar resposta às preocupações
ambientais, em Abril, o secretário
de Estado da Energia, João
Galamba, adiantava ao PÚBLICO
que as empresas de prospecção,
extracção e mineração do lítio
seriam obrigadas a apresentar
anualmente um plano de
intervenção às autoridades, em
que mencionam as acções a levar a
cabo nas zonas da sua concessão.
Como garantia de que a
monitorização do Estado é
frequente, a obrigação será
incluída nos cadernos de encargos.
Esta medida visa dar resposta à
preocupação sobre os trabalhos de
redução de futuros impactos
ambientais.
O caso das minas de urânio é um
dos argumentos que Lynn Mylou
utiliza para não se avançar com as
explorações de lítio. “Houve
promessas feitas, mas, no Ænal, as
pessoas morreram de cancro,
nada aconteceu e ainda há minas
abertas”, argumenta.
Nesses casos, quando as minas
fechavam, os terrenos eram
abandonados. Tem sido a
Empresa de Desenvolvimento
Mineiro a fazer esse trabalho, que
ainda não está concluído, com
recurso a dinheiros públicos. No
entanto, Galamba mencionava ao
PÚBLICO que hoje seria
“impossível isso acontecer,
porque a legislação ambiental o
impede”, sublinhando a
necessidade de os cadernos de
encargos preverem “que as obras
de eliminação do passivo sejam
feitas em permanência”.

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“Não às Minas”, lê-se lá de cima.
“Temos de nos lembrar do
essencial”, aponta.
“É a nossa qualidade de vida que
está em causa”, começa por
explicar António Veiga, de t-shirt e
olhos azuis, quando lhe
perguntam porque quis estar
presente no protesto. “Já há pouca
gente. Os jovens foram-se embora”
e os incêndios Æzeram a sua parte
a tornar o território menos
atractivo, diz o antigo professor
que veio de Seia. Se a extracção
mineira for avante, receia o seu
impacto. Por isso, considera
“importante mostrar que há força”
para protestar. “Já se começa a ver
uma preocupação entre as
pessoas”, regista. “Infelizmente

Na serra mais alta de Portugal
continental, 400 pessoas
reuniram-se ontem para
protestar contra a extracção de
lítio. Sob a orientação de John
Quigley, os activistas
deitaram-se no chão para fazer
um desenho de uma “árvore da
vida humana”, a ser filmada do
ar com um drone
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