Público - 25.08.2019

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6 • Público • Domingo, 25 de Agosto de 2019

ESPAÇO PÚBLICO


As cartas destinadas a esta secção
devem indicar o nome e a morada
do autor, bem como um número
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CARTAS AO DIRECTOR


Museu de Salazar
ou da grande desgraça?

Falam num museu de Salazar que
está a ser criado, mas preÆro dizer
que o ditador foi a primeira grande
desgraça do nosso país. A segunda,
Cavaco Silva, sem dúvida. Por
outras palavras, o pai e o Ælho,
ambos de má memória. Salazar
deixou os portugueses pobres e
analfabetos. Diz-se que havia
muitas reservas de ouro, mas no
bolso dos portugueses, que é o que
verdadeiramente conta, não havia
nada, rigorosamente nada. No
tempo dele, chegou a haver 80%
de analfabetos! Não havia Serviço
Nacional de Saúde nem Segurança
Social, apenas as chamadas “casas
do povo”. E crianças com 12, 13
anos tomavam conta, descalças, de
rebanhos nas montanhas! Só os
ricos é que estudavam. Os pobres,
a grande maioria, iam para os
campos ou emigravam. A guerra,

infelizmente, fazia parte do nosso
destino, muito mais do que o fado,
e a PIDE era verdadeiro atentado à
dignidade e liberdade da pessoa
humana. (...) Não creio,
sinceramente, que um ditador
como Salazar mereça um museu,
mesmo em Santa Comba Dão que
seja. Nem o facto de haver
Bolsonaros, Trumps, Salvinis, Le
Pens e quejandos o justiÆca.
Portugal, velha e grande nação,
não é obrigado a seguir, de forma
alguma, o lado mais negativo, diria
mesmo horrendo, do dealbar
deste século. Como diz o nosso
povo, só os bons exemplos é que
se seguem.
A liberdade que o 25 de Abril nos
deu seria, seguramente, mais
credora de um museu. E o seu
nome, sem dúvida, mais bonito,
abrangente e grandioso — Museu
da Liberdade. Cabíamos todos e
não só o ditador! Portugal, no seu
todo, vale um milhão de vezes mais

do que Salazar. São mesmo
incomparáveis. Ainda bem!
Simões Ilharco, Lisboa

Um Serviço Nacional de
Saúde para cães e gatos?

Com todo o respeito por quem tem
cães e gatos, e nada tendo contra
estes animais, até por em tempos
já ter tido um cão, que sempre foi
muito bem tratado, “parece” no
mínimo assustadora esta proposta.
Quando temos as Ordens ligadas
aos proÆssionais de saúde sempre
e sempre a protestar que o Serviço
Nacional de Saúde, para pessoas,
está mal. Quando temos velhos que
não têm acompanhamento
humano — não só na saúde, mas
também na saúde — e temos
crianças que têm imensos
problemas e ninguém os
acompanha como o deveria fazer.
Ao lermos que se deseja propor/
criar um SNS para cães e gatos,

permitimo-nos pensar que algo
está “virado ao contrário”, aqui no
“jardim à beira mar plantado”!
Sugerir-se criar um SNS para cães e
gatos talvez seja querer colocar as
pessoas num patamar muitíssimo
inferior ao que têm e onde
merecem, estar.
Augusto Küttner de Magalhães,
Porto

PÚBLICO ERROU


Por lapso, no artigo “EDP muda de
ideias e reentra na vaga de
investimento solar”, publicado a 24
de Agosto, foi referido que a EDP
requereu a adjudicação da potência
de um lote do recente leilão de
solar que não recebeu
candidaturas. De facto, o lote teve
uma candidatura, precisamente a
da EDP, acabando por não ser
leiloado. Pela incorrecção pedimos
desculpas aos leitores e aos visados.

O plano de jogo de Sérgio Conceição
resultou na perfeição e a forma como
conseguiu condicionar a construção do
Benfica valeu-lhe o triunfo no clássico. Impediu
sempre o rival de jogar pelo corredor central e
arrastou-o para um futebol de bolas longas, em que
o FC Porto é claramente mais forte. Se dúvidas
houvesse de que a época ainda tem muita incerteza
para semear entre os adeptos, eis mais uma prova.
Os dois candidatos estão agora a par (Pág. 28). N.S.

Apesar de a nova presidente da Comissão
Europeia, Ursula von der Leyen, ter pedido
que cada país indicasse um homem e uma
mulher para os futuros cargos de comissários, as
hipóteses de Pedro Marques não se complicaram
muito. Com mestria, António Costa pediu uma pasta
“impossível” para Elisa Ferreira, não beliscando as
probabilidades de Marques. Segunda-feira vai ser
um dia decisivo para o equilíbrio de poderes na nova
Sérgio Conceição Pedro Marques Comissão (ver Pág. 12). H.P.

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O CDS é um partido transgénero


O


CDS é um partido com um
largo historial de
ambiguidades programáticas.
Freitas do Amaral e Adelino
Amaro da Costa criaram-no à
direita, para travar o comunismo,
mas disseram-no do centro social,
para evitarem o anátema de falarem
em nome dos “fachos”. O CDS
invocou a democracia-cristã
italiana e o conservadorismo
alemão. Foi europeísta com Lucas
Pires e antieuropeísta e popular
com Manuel Monteiro e Paulo

Portas. Foi elitista, monárquico,
defensor da lavoura, das pensões e
dos ex-combatentes. O partido que
já coube num táxi encheu um
autocarro nas autárquicas de Lisboa
e Assunção Cristas achou que o
podia conduzir com o PSD a
reboque. A questão é simples: a
principal prioridade do PSD foi o PS
e a principal prioridade do CDS —
repetir os excelentes resultados das
autárquicas — não passou de uma
miragem.
Transformar o despacho do
Ministério da Educação sobre o uso
de casas de banho e balneários
escolares, de modo a proteger
cerca de 200 jovens em processo
de alteração de identidade de
género num capricho, numa
libertinagem ou no apocalipse da
sociedade é tudo menos cristão e

democrata; é desonesto e
desproporcional. Alguns dirigentes
do CDS não se inibiram de truncar
partes do despacho para
conscientemente tentar confundir
a opinião pública, como se
passassem a existir casas de banho
mistas nas escolas. O sofrimento de
quem não encaixa na gaveta
normativa e binária do credo do
CDS é desrespeitado e encarado
com bizarria, como se não
estivéssemos em 2019. Crianças
“trans” e intersexo sempre
existiram e vão continuar a existir
e é de bom senso que o Estado as
proteja dos maus tratos, bulliyng ,
ignorância, preconceito e
transfobia em ambiente escolar.
O que, sucessivamente, têm
aÆrmado vários dirigentes
partidários atropela direitos em

nome de um obscurantismo risível,
contemporiza com a discriminação
sexual e diz muito acerca de um
partido transgénero. Na corda
bamba, esvaziado de metas e
políticas, enxotado pelo PSD após
um casamento traumático, o CDS
tomba, cada vez mais, para um
populismo oportunista. Um partido
europeu e democrata que não faça
do combate às desigualdades mais
básicas e pelo reconhecimento dos
direitos mais universais uma
prioridade é tudo menos um
partido preocupado com o
essencial numa sociedade humana.
Deus criou o homem e a mulher,
como se diz numa petição a
circular, mas não consta que tenha
criado a transfobia.

Amílcar Correia
Editorial
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