Época - Edição 1079 (2019-03-11)

(Antfer) #1
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E


m2005,eu eraprofessordaUniversidade
de SãoPaulo(USP)emRibeirãoPreto.
Naépoca, trabalhava comdiferentes técnicas
de neuroimagemeasaplicava emquestões
de neurociência,desde epilepsiaatéAVC.Na
ocasião, eu tinhaumalunode doutorado
quefrequentava umadasigrejasdosanto-
daime. Nósconversávamosmuito sobreavi-
vência queele tinhacomaayahuasca; e, ape-
sar de já ter ouvidofalar,eununcatinhatido
experiênciacomela.Emnovembrodaquele
ano,apareceuaprimeiraoportunidade,a
convitedessealuno,deiraumadascerimô-
niasda igreja, emRibeirãoPreto.Embora
tenha sidoalgo muitoprofundoparamim,
nãomudouminhavida,comoalgumas pes-
soasrelatam.Masoque memarcoudesde
aquelaépoca foiapercepçãodeque,sobo
efeitodaayahuasca,épossível percebervá-
riosfenômenos queocorremquandosonha-
mos.Muitosdoselementosqueeu presenci-
avaali carregavamumimpactoemocional
muitoforte.Nocaso de umsonho, quando
acordamostemosaclaranoçãode queaqui-
lo foi só umsonho.Aoretornarda experiên-
cia comaayahuasca,oque maismechamou
aatençãofoi queela continuava tendostatus
de realidade.Nodiaseguinte, tambémtive
umasensaçãode muitatranquilidadeede
poucospensamentos.Senti umconforto
emocionalmuito grande.
Quandosaí dessaprimeiraexperiência,
ficouclaro paramim queela poderiaseres-
tudadaparaidentificarumpoucomelhor
quaiseramasbases neuraisportrásdaquele
processo.Então,começamosaplanejarum
primeiroexperimento científico usandoa
ayahuasca. Para isso,nos pareceu apropriado
realizaroestudocomvoluntáriosexperien-
tesno usoda ayahuasca, porquenãosabía-
mosqualseriaareação de umapessoa sobo
efeitoda substânciadentrode umhospital
universitário.Achamosporbemrecorrer a
membrosdaigreja,e,nesseprimeiro conta-

to,ficouevidente opapel terapêuticoda aya-
huasca. Pessoasseapresentavamvoluntaria-
mente, dizendoquehaviammelhoradode
quadrosde depressãoedeuso abusivode ál-
cool.Tambémrelatavamterdeixadoouso
abusivo de crackedecocaína.Porcausa dis-
so, achamosmelhorabrirumasegundalinha
de estudo,que teriaoutraperspectiva:avaliar
os efeitosantidepressivosda ayahuasca.
Comoera umestudoinicial, fizemoso
quechamamosdedesenhoaberto.Nós eos
pacientessabíamosqueoque estava sendo
ministradoeraasubstância.Nesseprimeiro
ensaio,recrutamos17 pacientes comdepres-
sãoresistente atratamento,istoé, pacientes
quejá haviamsidosubmetidosadoistrata-
mentosantidepressivoseque nãotinham
respondidoaeles.Para avaliaros sintomas,
pegamosumaescalaqueatribuiograude
severidadeda depressãoemumindivíduoe
aaplicamosantes da sessão,aolongoda ses-
sãoedeuma21 dias depoisdasessão. O
queobservamosfoiasignificativadiminui-
çãodoquadrodepressivonaquelespacien-
tesjá umdiaapós ouso da substância, o
queperdurounosdiasposteriores.
Em2012,fizemosumsegundoensaio,
com35 pacientes,dessavezcomapresença
deplacebo.Observamosbasicamente queo
efeitoantidepressivoda ayahuascaésuperior
ao do placeboeesseefeitocontinua apare-
cendona maioriadospacientes umdiade-
poisda sessão.Mas nemtodomundores-
pondeu,ou seja,aayahuascanãoéumaba-
la de prata. Poroutrolado,ninguémpiorou
comela.Nopiordoscenários,amelhora
nãofoisignificativa.Umamensagemim-
portante apassaréque umaúnicainter-
vençãocomaayahuascamelhoraaguda-
mente oquadrodepressivodessaspessoas.
Esseefeitoagudotemumarespostamuito
importante no quedizrespeitoàdepressão.
Cemporcento dosantidepressivoscomer-
cialmente disponíveisdemoramcercade 15

Professor do Instituto do
Cérebroda Universidade
Federal doRio Grandedo
Norte, DráulioBarros de
Araújo disse ter sentido
um conforto emocional
muitograndeao
experimentar aayahuasca


FOTO:ARQUIVOPESSOAL


NEUROCIENTISTAPESQUISA
OPOTENCIALANTIDEPRESSIVO
DAAYAHUASCA,CONHECIDA
TAMBÉMCOMOSANTO-DAIME
porDráulioBarrosdeAraújo
emdepoimentoaMatheusRocha

VIVIPARACONTAR
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