Psique - Edição 156 (2019-02)

(Antfer) #1
6 psique ciência&vida http://www.portalespacodosaber.com.br

relações em pauta por Elaine Cristina Siervo


IMAGENS: SHUTTERSTOCK E ARQUIVO PESSOAL

APAIXONAR-SE
LIBERA DOPAMINA,
E, COMO UMA
DROGA, O OBJETO
DA PAIXÃO
PODE CAUSAR
ABSTINÊNCIA,
COMPULSIVIDADE,
ALTERAR A CRÍTICA
E O EQUILÍBRIO
EMOCIONAL

As RAÍZES da paixão


TODOS QUEREM SE APAIXONAR. APESAR DISSO,


TEMOS POUCO OU NENHUM CONTROLE


SOBRE ESSE ESTADO DE ENCANTAMENTO QUE


PROVOCA ALTERAÇÕES BIOQUÍMICAS E


COMPORTAMENTAIS QUE PODEM COLOCAR O


INDIVÍDUO EM UMA POSIÇÃO DE FRAGILIDADE


objeto de amor. Winnicott, psicanalis-
ta inglês, fala sobre a “mãe suficien-
temente boa”. Postula que se houve
qualidade nas primeiras relações com
a mãe, o pai ou figuras substitutas, isso
possibilitará a constituição mais sau-
dável, ou menos saudável, da psique.
Esses fatores podem influenciar dire-
tamente a capacidade do indivíduo
de ter mais ou menos condições de
estabelecer e manter futuras relações
afetivas na vida adulta.
Apaixonar-se libera neurotrans-
missores como a dopamina, que esti-
mulam a pessoa a buscar a manuten-
ção desse estado. Como uma droga,
oobjeto da paixão pode causar absti-
nência, compulsividade, alterar a crí-
tica e o equilíbrio emocional.
Essa recompensa bioquímica, entre
outros fatores, pode levar os indivíduos
a viverem essas experiências sem se
importar com as consequências para
sua vida e para a de outras pessoas.
Uma boa ilustração do aspecto des-
trutivo da paixão está no filme Perdas
e Danos. Nesse longa-metragem de
1992, o personagem de Jeremy Irons
é um ministro de Estado que se apai-
xona pela noiva de seu filho. Apesar
de saberem que havia grande possibi-
lidade desse romance destruir as suas
famílias, eles o mantêm.

de autoconhecimento é por meio das
relações nas quais aparecem nossas
sombras e projeções.
Pessoas apaixonadas ficam à mer-
cê de alguém, do seu carinho, afeto e
atenção como uma coisa vital. Exata-
mente como quando nascemos e de-
pendemos de alguém para sobreviver.
Uma das melhores sensações humanas
é o amor correspondido. Isso nos leva
ao início de tudo: o aconchego do colo
materno, onde o mundo se resume ao
bebê e sua mãe com toda atenção vol-
tada para ele. Por toda a nossa vida,
procuramos recriar esse momento em
que não havia nada entre nós e nosso

“O


que se faz por amor está
muito além do bem e
do mal.” Nietzsche
A paixão está por
trás das maiores alegrias e dores hu-
manas. Todos conhecem histórias
marcantes sobre esse sentimento na
vida real, nos livros e filmes. Ela tem
suas raízes culturais que datam do
surgimento do Romantismo – movi-
mento artístico que surgiu na Europa
no final do século XVIII e consoli-
dou-se no século XIX – em contra-
partida ao Iluminismo, que era pau-
tado por ideias centradas na razão.
Com o surgimento do Romantismo, o
subjetivismo, o homem e a satisfação
dos desejos ficam em evidência.
A paixão é tema das tragédias nas
histórias da mitologia greco-romana,
em que as relações acontecem en-
tre deuses, semideuses e mortais.
Podemos dizer que esse afeto só se
configura por meio da idealização do
parceiro. Considera-se o outro como
um deus ou semideus, a pessoa mais
especial e encantadora já encontra-
da. O conhecido mito em que o deus
Eros toma por sua esposa Psique,
uma mortal, ilustra as etapas do pro-
cesso de individuação que se dá atra-
vés do relacionamento com o outro.
Sem dúvida, a maior oportunidade

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