o Alto Comando do Exército deveria ser consultado sobre a sucessão, esposara-o há muito tempo.
Estávamos num regime revolucionário, sustentado pelas Forças Armadas; por que então impedi-las
de manifestar-se, através de seus altos órgãos, sobre tão importante matéria?
A vocação ditatorial do general Geisel - eleito infelizmente com o beneplácito das Forças
Armadas - deveria ser contida.
O general Portella é inimigo figadal do general Ernesto Geisel. As raízes desta rancorosa
inimizade encontram-se em incidente ocorrido entre os dois, nos primeiros dias da Revolução de
1964.
Costa e Silva assumira, como o general mais antigo, o comando do Exército Nacional. Neste
caráter, tomara como acertada e improrrogável medida a substituição dos grandes comandos e
comandos de unidades de tropa da guarnição da Guanabara. O general Oromar Osório foi substituído
no comando da 1á Divisão de Exército pelo general Orlando Geisel que, contrariamente à
determinação de Costa e Silva, procurou conservar alguns comandos antigos, ditos de sua confiança
pessoal, mas que não o eram da Revolução.
Talvez tenha sido esta a primeira dificuldade séria no caminhar já trôpego do Movimento
Revolucionário de 1964. Dois altos chefes militares desentendiam-se e um deles, por vaidade
pessoal, obstinava-se em não cumprir as ordens do outro. Reconhecendo a gravidade do momento,
Costa e Silva dispensa o general Orlando Geisel daquele grande comando e designa para ocupá-lo o
general José Ulhoa Cintra.
No mesmo dia, ou no dia seguinte pela manhã, voltando o então coronel Jayme Portella da
Agência do SNI da Guanabara, ao entrar no Salão D. João VI - antecâmara do gabinete do Ministro
do Exército - deparou-se com um grupo de oficiais, no centro dos quais estava o general Ernesto
Geisel, gesticulando e verberando com palavras ácidas o procedimento de Costa e Silva.
Aproximou-se Portella e repeliu de modo áspero as acusações do general Ernesto Geisel,
defendendo com ardor Costa e Silva. Homens que 48 horas antes estavam dispostos a metralhar-nos
não podiam, para segurança do incipiente movimento, permanecer nos comandos de tropa; foi este
um dos argumentos lançados à face do general Ernesto Geisel.
O atrito agravou-se, porém a feliz interferência de colegas presentes evitou conseqüências
desagradáveis.
Estes fatos foram-me contados pelo próprio Jayme Portella e confirmados, em linhas gerais, por
vários oficiais que os assistiram.
As ofensas morais são como queimaduras, deixam marcas indeléveis, estas na pele e aquelas na
memória.