National Geographic - Portugal - Edição 227 (2020-02)

(Antfer) #1

manidade. É assustador ver quão importante a
beleza se tornou. O alcance da beleza prolonga-se
até à própria alma da pessoa. A beleza tornou-se
tão importante que negar que alguém a possua é
equivalente a negar-lhe oxigénio.


ANTIGAMENTE, HAVIA GRADAÇÕES para descrever
o ideal feminino: caseira, jolie laide, atraente,
bonita e, por fim, bela. A mulher caseira fazia
aquilo que podia com aquilo que tinha. Adaptava-
-se à evidência de a aparência não ser o seu ponto
forte. Era aquela mulher com uma personalidade
espectacular. As mulheres arrebatadoras tinham
algumas características que as fazia sobressair
entre a multidão: lábios grossos, nariz aristocrá-
tico, uma poitrine gloriosa. Muitas mulheres pode-


riam ser descritas como atraentes. Estavam a meio
da curva de Bell. Ser bonita já é diferente.
Hollywood está cheia de gente bonita.
Ah, mas a beleza! Beleza era uma descrição
reservada a casos especiais, às vencedoras da lo-
taria genética. A beleza até poderia ser um fardo
porque assustava os outros. Intimidava-os. A be-
leza era excepcional.
No seu conjunto, os avanços da cirurgia plásti-
ca, o desenvolvimento de uma nutrição mais per-
sonalizada e eficaz, o florescimento da indústria
do fitness e a ascensão dos filtros das selfies nos
smartphones, juntamente com o botox, preen-
chimentos e a invenção do Spanx, ajudaram-nos
a ter melhor aspecto, aproximando-nos um pou-
co mais da excepcionalidade. Terapeutas, blog-
gers, influenciadores, estilistas e amigos cheios
de boas intenções fizeram-se ouvir, num coro de
mantras positivos sobre o corpo: Força, miúda!
A sua função não é dizerem-nos verdades du-
ras, nem contribuírem para que tenhamos uma
visão realista de quem somos ou para que seja-
mosmelhoresversõesdenóspróprias.Oseupa-


pel é animarem-nos constantemente, dizendo-
-nos que somos perfeitas tal como somos.
E a globalização de tudo significa que, algures,
existe alguém que irá apreciar-nos em toda a nos-
sa magnificência... seja lá o que for.
Somos todas belas.

EM NOVA IORQUE, Londres, Milão e Paris (as capi-
tais tradicionais da moda mundial), os códigos de
beleza mudaram de forma mais dramática nos
últimos dez anos do que nos cem anteriores. His-
toricamente, as mudanças ocorriam devagar. As
alterações na estética não eram lineares e, apesar
da reputação rebelde da moda, a mudança proces-
sava-se lentamente. As revoluções mediam-se em
escassos centímetros.

Ao longo dos anos, valorizou-se primeiro uma
forma angulosa, seguida da fase da forma mais
curvilínea. O tamanho de roupa médio de uma
modelo, representativo do ideal dos estilistas, en-
colheu do 38 para o 32. As louras pálidas da Euro-
pa de Leste dominaram as passerelles até as louras
beijadas pelo sol do Brasil as destituírem. O corpo
da alta-costura (magro, sem ancas e praticamente
sem peito) pode ser observado em imagens clás-
sicas captadas por Irving Penn, Richard Avedon e
Gordon Parks, bem como nas passerelles de esti-
listas como John Galliano e Alexander McQueen.
Um dia, Miuccia Prada, pioneira na promoção
de uma passerelle quase homogénea de modelos
magras, brancas e pálidas, adoptou subitamen-
te a figura de ampulheta. De seguida, a modelo
de tamanhos grandes Ashley Graham apareceu
na capa da edição de fatos de banho da “Sports
Illustrated” em 2016. Em 2019, Halima Aden foi
a primeira modelo a usar um hijab nessa mesma
revista. De repente, o mundo da moda debateu o
pudor e a beleza de corpos mais voluptuosos....
Osprogressossãovertiginosos.

Ver e


ser visto
As revistas de moda e beleza são
um paradigma de ambição, definindo
frequentemente padrões de beleza
para mulheres de todas as culturas.
As revistas também funcionam
como anúncios gigantes para
as indústrias que dependem da
venda destes ideais aos consumidores.

1997 “Elle”
Alek Wek


2016 “Sports Illustrated”
Ashley Graham

2018 “Vogue” britânica
Vittoria Ceretti, Halima
Aden, Adut Akech, Faretta
Radic, Paloma Elsesser

CAPAS, A PARTIR DA ESQUERDA: PUBLICADO NA REVISTA “ELLE”, 1997, REIMPRESSO COM AUTORIZAÇÃO DE HEARST MAGAZINES, INC., FOTOGRAFIA DE GILLES BENSIMON;
FOTOGRAFIA DE JAMES MACARI, “SPORTS ILLUSTRATED”, CONTORNO DE GETTY IMAGES; FOTOGRAFIA DE CRAIG MCDEAN, “VOGUE” © THE CONDÉ NAST PUBLICATIONS LTD.


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