National Geographic - Portugal - Edição 227 (2020-02)

(Antfer) #1

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Em 2015, uma equipa da Universidade de Har-
vard liderada por Lakshminarayanan Mahadevan
mediu a circulação do ar no interior destas cate-
drais de barro. Através das suas paredes grossas e
porosas, concluiu que as termiteiras, funcionando
como pulmões, fazem algo parecido com respi-
rar: usando as temperaturas diurnas e nocturnas
e abrindo e fechando diferentes condutas, geram
uma corrente de convecção, que combina de for-
ma ideal a presença de ar quente e frio no interior,
regulando a temperatura e a acumulação de CO 2.
Outros engenheiros experientes são os castores,
roedores que constroem grandes diques nos rios
com os troncos das árvores que eles próprios aba-
tem com os seus incisivos. Tal como as térmitas,
as suas construções também podem ser formidá-
veis. Assim o constatou no Canadá o investigador
Jean Thie, que dirige a empresa de consultoria de
informação geográfica sobre o ambiente, EcoIn-
formatics International. Usando imagens de sa-
télite do Google Earth, ou seja, a partir do espaço,
localizou, há poucos anos, uma colossal represa
de castores com cerca de 850 metros de compri-
mento no Parque Nacional de Wood Buffalo, na
província de Alberta.
Segundo Thie, a represa foi construída por vá-
rias gerações de castores a partir de meados da
década de 1970. Os diques medem três a quatro
metros de altura e têm cerca de sete metros de lar-
gura. São constituídos por ramos e troncos enor-
mes, pois estes animais podem cortar uma árvore
inteira e fazê-la tombar onde mais lhes convém.
Os castores compactam-nas com barro, pedras e
vegetação e transportam cada material com as pa-
tas dianteiras. Com esta construção, conseguem
criar um espaço mais elevado de águas paradas,
um reservatório onde constroem a sua casa com-
posta por vários compartimentos, como o berçário,
o dormitório e o refeitório, cada qual com uma en-
trada subaquática independente, escavada com a
sua potente dentadura que nunca pára de crescer.
Os castores, hábeis nadadores revestidos com
uma pelagem cuja impermeabilidade sempre
despertou a cobiça dos comerciantes de peles,
alimentam-se de folhas e cascas e estão sempre
atentos para que a água não se infiltre por nenhu-
ma ranhura da represa. Para tal, desempenham
uma actividade frenética, reparando e fazendo
a manutenção constante da infra-estrutura que
os mantém a salvo. Por baixo desta, em recantos
sob a água, guardam ramos cheios de folhas fres-
cas e troncos suculentos e húmidos dos quais se
alimentarão durante o Inverno. A espécie existiu


CLAUDIO CONTRERAS/NLP/CORDON PRESS

nos rios portugueses no Calcolítico, mas estava
certamente extinta no início da era industrial. Na
gruta do Caldeirão, no Ribatejo, o paleontólogo
Miguel Telles Antunes encontrou fósseis deste
animal correspondentes ao Paleolítico Superior e
achados similares noutros contextos pré-históri-
cos, embora raros, comprovam que o castor ocu-
pou o território português há milhares de anos.

SOB A ÁGUA, no fundo de rios, vive outro arquitec-
to singular, o tricóptero, um insecto voador.
As suas larvas e pupas são aquáticas e, durante essa
etapa do seu crescimento, constroem curiosos
habitáculos para se protegerem. “As larvas destes
insectos costumam tapar-se com caixas que for-
ram com pedrinhas ou pedaços de ramos e até com
minúsculas conchas de molusco para se confundi-
rem com o fundo do rio e passarem despercebidas.
Procuram na medida do possível misturar-se com
o que as rodeia”, explica o entomólogo Albert
Masó. Presas comuns de peixes como a truta, que
pode comê-las com caixa e tudo, algumas larvas de
tricóptero sabem colocar os ramos de forma a difi-
cultarem a tarefa dos predadores. Todos os mate-
riais utilizados são colados com seda aderente,
sintetizada nas suas glândulas salivares, a mesma
seda com que se fabricará o casulo que lhes permi-
tirá metamorfosear-se para a vida adulta.
No entanto, este não é o único artista subaquá-
tico: os machos do peixe-balão do género Torqui-
gener são escultores experientes que criam com-
plexos círculos de areia, que chegam a atingir dois
metros de diâmetro para atraírem as fêmeas. Este
peixe com cerca de doze centímetros de compri-
mento dispõe a areia de forma radial, criando
saliências e sulcos requintados que funcionam
como barreiras para proteger das correntes o nú-
cleo central, constituído por partículas mais fi-
nas. Se tudo correr bem, será aqui que a sua futura
parceira fará a postura.
Uma vez terminada a obra, exausto após várias
semanas de actividade escultórica, esperará que
alguma fêmea valorize a sua arte e se coloque nas
imediações para ser fecundada. Cumprida a sua
função, o círculo começará a desintegrar-se, mos-
trando uma vez mais a fugacidade da vida. Fugaz,

sim, mas tantas vezes repetida. (^) j
Em Laredo no Texas (EUA), o orvalho da manhã
não impede uma aranha do género Eustala de
permanecer imóvel aguardando que uma presa
fique colada à pegajosa teia composta por
uma seda proteica e extremamente resistente
segregada por glândulas abdominais.

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