O Estado de São Paulo (2020-03-04)

(Antfer) #1

Mariane Morisawa


ESPECIAL PARA O ESTADO


LOS ANGELES


Uma série com assinatura de


Dick Wolf normalmente signi-


fica duas coisas: sucesso e


franquia. Foi assim com Law


& Order, Chicago Fire e agora


FBI, que gerou FBI: Most Wan-


ted, estreia de hoje, às 23h, no


Universal TV. A série traz uma


força-tarefa liderada por Jess


LaCroix (Julian McMahon) e


formada ainda pelo ex-militar


Kenny Krosby (Kellan Lutz),


Hana Gibson (Keisha Castle-


Hughes), Sheryll Barnes


(Roxy Sternberg) e Clinton Sk-


ye (Nathaniel Arcand), encar-


regada de perseguir os crimi-


nosos na lista de mais procura-


dos do FBI.


Com tanta televisão sendo


produzida, o velho formato pro-


cedimental, com um caso por


episódio, continua sendo um


sucesso. “Eu acho que é porque


esses programas são uma válvu-


la de escape”, disse McMahon


em entrevista ao Estado, em


Los Angeles. “Sabemos o tema,


sabemos como vai ser apresen-
tado. Você pode assistir e se
sentir completamente confor-
tável e relaxado sabendo que,
no fim, os vilões vão ser pegos
e tudo vai terminar bem. Isso é
reconfortante depois de um
dia longo de trabalho.” Mas
Keisha Castle-Hughes acha
que FBI: Most Wanted tem suas

particularidades. “O formato
é procedimental, mas somos
dessa área especial, então algu-
mas coisas são diferentes. Por
exemplo, saímos mais a cam-
po do que outras séries proce-
dimentais, o que deixa tudo
mais empolgante”, disse
Keisha Castle-Hughes. “Mas
também focamos em como es-

sa força-tarefa atua em conjun-
to, sua dinâmica, e temos bas-
tante espaço para conhecer
suas vidas fora do FBI.”
Kenny Krosby, por exemplo,
que vem de um passado mili-
tar, ainda não se adaptou total-
mente à mentalidade do FBI e
pode estar sofrendo de desor-
dem de estresse pós-traumáti-

co. Jess LaCroix também tem
seu próprio drama. Ele perdeu
a mulher e agora cuida sozinho
da filha pequena. “O trabalho é
a única coisa que preenche um
vazio que ele tem dentro de si.
E ele se preocupa com seu time
e faz tudo para protegê-lo. É
um pouco como um médico,
ele tem muita responsabilida-
de, porque se ele for muito len-
to para prender os criminosos,
mais pessoas serão mortas.”
Segundo Julian McMahon,
há dois critérios para alguém ir
parar nessa lista de mais procu-
rados. “O primeiro é que a pes-
soa seja uma ameaça à socieda-
de. E o segundo é que colocar
essa pessoa na lista vai chamar a
atenção da imprensa, e isso vai
ajudar a capturar o criminoso.”
Muitos dos casos são basea-
dos em histórias reais. “Há mui-
to mal no mundo”, afirmou Kel-
lan Lutz. McMahon disse que é
difícil lidar com algumas coi-
sas. “A psicologia é complica-
da. Nós temos esses crimes hor-
ríveis, mas ao mesmo tempo
mostramos por que essas pes-
soas chegaram ao ponto de co-
metê-los. E tem alguém que
perdeu o pai, ou que voltou
traumatizado do Afeganistão,
ou que foi maltratado pelos
pais, ou teve um ferimento gra-
ve na cabeça do qual nunca se
recuperou”, lembrou ainda.
Kellan Lutz se viu particular-

mente tocado por um episódio
sobre um veterano de guerra.
“Tenho dois irmãos que são mi-
litares, e o mais velho luta con-
tra a desordem de estresse pós-
traumático depois de ir para o
Iraque, o Afeganistão e Koso-
vo. Então fiquei com lágrimas
nos olhos depois de ler o episó-
dio. A verdade é que muitas ve-
zes temos conexão com os per-
sonagens, por piores que sejam
seus crimes, porque temos em-
patia, como atores e como se-
res humanos.” Keisha Castle-
Hughes confessou que deixou
de ver séries e ouvir podcasts
sobre crimes reais. “Agora não
preciso mais”, contou, rindo.
Os três atores sabem que es-
tar numa série produzida por
Dick Wolf é quase garantia de
sucesso. “Há como uma rede
de proteção”, explicou Kellan
Lutz. “Queremos que a série du-
re tanto tempo quanto Law &
Order: SVU”, completou o ator,
referindo-se ao programa estre-
lado pela atriz Mariska Hargi-
tay (como a policial Olivia Ben-
son), que está na 21.ª tempora-
da. Sua família certamente vai
curtir. “Claro que todo o mun-
do assiste às séries do Dick
Wolf, mas minha família é gran-
de e mora na América do meio.
Eles estão tão empolgados que
estou fazendo uma série do
Dick Wolf! Então isso é baca-
na”, acrescentou Lutz.

‘FBI: Most Wanted’ busca os maiores criminosos


Andrea Riseborough
ATRIZ

Pedro Venceslau


Paula Reverbel


Com liturgias, regras e códigos


morais próprios, o mercado glo-


bal de cocaína movimenta bi-


lhões de dólares todo ano e está


estruturado como uma sofisti-


cada rede empresarial na qual


players com perfis completa-


mente diferentes jogam afina-


dos como um relógio suíço.


Os grandes “empresários” do


ramo são em sua maioria pais


de família respeitados por suas


comunidades no México, nos


Estados Unidos e na Europa e


mantêm negócios de fachada
enquanto operam o tráfico de
forma violenta. Esse universo
peculiar se tornou fetiche do pú-
blico e inspirou dezenas de do-
cumentários, filmes e séries.
Na esteira da bem-sucedida
franquia Narcos, da concorren-
te Netflix, a Amazon Prime Ví-
deo coloca em seu catálogo na
sexta-feira, 6, a série ZeroZero-
Zero, uma superprodução que
acompanha o caminho do pó
do chão de fábrica no México,
onde é embalada em latas de
chili, até o nariz do consumi-
dor final na Europa.

O título é uma gíria usada pe-
los europeus para a cocaína de
altíssima qualidade produzida
pela elite do narcotráfico mun-
dial. Trata-se de uma ficção,
que fique claro, mas que foi ba-
seada no livro homônimo do
cultuado jornalista e escritor
italiano Roberto Saviano.
É a assinatura e o caderno de
fontes dele nos serviços de inte-
ligência que conferem à série
um grau de verossimilhança
maior que todas as outras
obras do gênero, a maioria ins-
pirada em biografias de “ca-
pos”, como Pablo Escobar, Cha-
po ou Felix Gallardo.
Ameaçado de morte em 2006
depois de seu livro-reportagem
sobre a máfia napolitana, Ca-
morra (que foi adaptado para o
cinema), Saviano vive há mais
de uma década em endereço
desconhecido e sob vigilância
cerrada 24 horas por dia.
Em 2015, ele cancelou sua par-
ticipação na Festa Literária In-
ternacional de Paraty (Flip), on-
de seria o principal convidado
da 13.ª edição do evento.
Na ocasião, a organização da
Flip divulgou um comunicado
dizendo que o escritor “não foi
autorizado” pelos responsáveis
por sua segurança a deixar o
continente europeu.

Escala. A narrativa conta a his-
tória na perspectiva de todos en-
volvidos – vendedores, interme-
diários e compradores de pó. Já
no primeiro episódio, um paga-

mento é extraviado, o que que-
bra toda a cadeia produtiva e
causa consequências em três
continentes.
“Foi um privilégio trabalhar
em uma série criada por alguém
que escreveu um livro muito
técnico sobre o funcionamento
do ramo. O livro do Roberto Sa-
viano, que eu li, obviamente, dá
uma boa ideia de como esse
mundo funciona, embora seja
ficcional. A série é uma exten-
são desse livro”, disse ao Esta-
do, por telefone, a atriz An-
drea Riseborough (A Morte de
Stalin, A Guerra dos Sexos).
Na série da Amazon ela in-
terpreta a personagem Emma
Lynwood, que cuida do dia a
dia das operações da transpor-
tadora de seu pai, interpreta-
do por Gabriel Byrne (In Treat-
ment, Os Suspeitos).
Com a morte do patriarca,
ela é obrigada a tomar deci-
sões drásticas para manter o
negócio funcionando.
A empresa de transportes
marítimos, cuja sede fica em
New Orleans, tem mais cem
anos na praça, mas mergulha
no tráfico para sobreviver.
Assim como Saviano, o cria-
dor da série ZeroZeroZero (e
diretor dos dois primeiros epi-
sódios) também conhece co-
mo poucos o riscado do tráfi-
co. O diretor e roteirista italia-
no Stefano Sollima assina
dois clássicos do gênero: Sicá-
rio e Gomorra.
A série também abre um deba-

te clichê em produções do gêne-
ro. Uma força de elite da polícia
mexicana nos moldes do Bope
do Capitão Nascimento corre
por fora da polícia local corrup-
ta e usa e abusa da tortura como
método de trabalho.
Vale tudo na luta contra as
drogas? Algumas cenas são es-
pecialmente fortes, como a
morte de uma garotinha por ba-
la perdida durante um tiroteio
em um mercado logo no primei-
ro episódio.

Laboratório. Após apostar suas
fichas em Hunters, série na qual
Al Pacino é um caçador de nazis-
tas, a Amazon Prime Vídeo fez de
ZeroZeroZero seu novo grande in-
vestimento de 2020. A platafor-
ma não revela o investimento,
mas o elenco custou caro.
Um dos protagonistas é o
ator Dane DeHaan, que fez O
Espetacular Homem-Aranha 2.
Ele interpreta Chris Lynwood,
cuja vida é virada de cabeça pa-
ra baixo quando sua ajuda é so-
licitada no negócio da família
enquanto ele luta contra uma
doença degenerativa.
“Meu personagem tem algo
chamado doença de Hunting-
ton, que é uma doença degene-
rativa genética. Mas uma coisa
que gosto da série é que ela não
é sobre um personagem com a
doença – isso é só um dos obs-
táculos no caminho do perso-
nagem que tem que superar
muitas outras coisas”, acres-
centou o ator.

MARK SCHAFER/CBS

Televisão. Estreia hoje a


série criada por Dick Wolf,


que traz força-tarefa em


perseguições e em sua


vida fora do FB1


Equipe. ‘Há muito mal no mundo’, diz o ator Kellan Lutz (1º à esq.), que vive Kenny Krosby






Como você se preparou
para fazer essa série?
Li sobre o ramo de negó-
cios da minha personagem,
que vem de uma família pro-
prietária de empresa de trans-
portes marítimos com sede
em New Orleans. E li o livro
do Roberto Saviano.





Saviano segue um proto-
colo de segurança rígido.
Conheceu-o?
Sim, fizemos uma entrevista
juntos no Festival de Cinema
de Veneza. Ele divulgou mui-
tos fatos sobre tráfico. Foi um
privilégio estar lá, ele é uma
pessoa corajosa, em detrimen-
to da própria segurança.





Vê semelhanças com ou-
tras séries de drogas?
São muito diferentes.
O que eu gostei em ZeroZero-
Zero é que o envolvimento
com o tráfico não foi glamouri-
zado. Há séries e livros em
que você quer fazer parte do
que está acontecendo. Nesta,
a cocaína é resultado de pes-
soas almejando poder. Quan-
to mais poder a minha perso-
nagem consegue, mais ela gos-
ta, de modo muito humano.

3 PERGUNTAS PARA...


AMAZON STUDIOS

Amazon


entra no


nicho das


narcosséries


Streaming. ‘ZeroZeroZero’, que estreia na


sexta, retrata mercado global de cocaína


Realidade e ficção. Série é baseada
no romance homônimo do jornalista
e escritor italiano Roberto Saviano

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O ESTADO DE S. PAULO QUARTA-FEIRA, 4 DE MARÇO DE 2020 Caderno 2 C3

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