National Geographic - Portugal - Edição 228 (2020-03)

(Antfer) #1

ideiadelibertá-loemFrançaem 1952 parareduzir
o númerodecoelhosnoseuterreno.Oêxitofoi
imediato:em seissemanas morreram98%dos
animais.Poucodepois,porém,constatou-seque
ovírusseexpandira,matando45%doscoelhos
selvagensdeFrançae 35%dosdomesticados.
Ovírusdifundiu-sedesenfreadamentepelaEu-
ropaOcidentale ReinoUnido,reduzindoo núme-
rodecoelhosselvagensemmaisde90%.Foiuma
catástrofe para muitosanimais que dependem
destelagomorfoparasobrevivere quecontinuaa
serobjectodemedidascontínuasdereforçopopu-
lacional.Alémdisso,em1988,foidetectadooutro
agentepatogénico,a pneumoniahemorrágicavi-
ral,aparentementea mutaçãodeoutrovírusnão
patogénicojáexistenteemcoelhosquecontinuaa
fazer-sesentircomviolêncianaactualidade.
A situaçãofoi-se agravandocom a progres-
sivaperdae fragmentaçãodohabitatdolince-
-ibérico,osmatagaismediterrâneos.Éumdos
efeitos da substituição de práticas extensivas
porexploraçãointensiva.Porisso,natransição
parao séculoXXI,haviamenosdeumacentena
deindivíduos...noplaneta.Osespecialistasres-


ponsáveispeloprogramadeconservaçãoforam
confrontadoscomumasituaçãopoucoencora-
jadora.Naaltura,muitospensaramqueseriaum
casoperdido.Felizmente,estavamenganados.

AHISTÓRIADARECUPERAÇÃOdestaespécieé uma
históriadesucesso,aopontodea UniãoInternacio-
nalparaa ConservaçãodeNatureza(UICN)jáa ter
reclassificadode“Emperigocríticodeextinção”
para“Emperigodeextinção”.É umindíciodeque,
emborapersistamuitoporfazer,foidadoumpasso
nalutacontrao desaparecimentodeumdosfelinos
maisameaçadosdoplaneta.“Calcula-sequeexistam
agora 820 a 830exemplares”,dizRamónPérezde
Ayala,técnicodoprogramadeespéciesameaçadas
daWWF,umadasorganizaçõesmaisactivasnasal-
vaguardadolince-ibérico.“Metadeandaporterras
andaluzase osrestantes,frutodoprogramaderein-
troduçãoiniciadoem2011,estãodivididosentrea
Extremadura,Castilla-LaManchae Portugal.”

OS ATROPELAMENTOS,
O FURTIVISMO, A FRAGMENTAÇÃO DE HABITAT
E A PRAGA QUE AFECTOU O COELHO EMPURRARAM O LINCE
PARA O LIMIAR DA EXTINÇÃO.

Até à década de 1970, quando as leis de conser-
vação começaram a ser implementadas em Espa-
nha, graças ao progresso científico que permitiu
compreender a importância de manter uma bio-
diversidade rica e saudável, inclusivamente no
interesse da atividade cinegética, a caça do lince
persistiu de forma ilegal. Uma actividade crimi-
nosa que continua a ceifar demasiadas vidas – é
a segunda causa de morte dos linces, após os
atropelamentos – e que as autoridades penalizam
com multas que podem ascender a 120 mil euros.
No entanto, o modus vivendi do precioso feli-
no complicou-se realmente quando a sua presa
principal, o coelho, foi afectada por uma doença
da qual ainda não recuperara, a mixomatose viral,
detectada pela primeira vez em Espanha em 1953.
Convém ter em conta que este vírus foi introdu-
zido propositadamente em diversos países para
reduzir a população de coelhos. Um bacteriolo-
gista chamado Paul-Félix Armand-Delille teve a


O primeiro indício da recuperação foi observa-
do em 2005, ano no qual, no âmbito do programa
ex situ do lince-ibérico, nasceu a primeira ninha-
da, fruto da reprodução em cativeiro coordenada
no Centro de El Acebuche, em Doñana. Este e ou-
tros quatro centros (La Olivilla, em Jaén, La Gra-
nadilla, em Cáceres, e Silves, em Portugal, e, na
qualidade de centro colaborador, o Zoobotânico
de Jerez de la Frontera) empreenderam a tarefa
de proporcionar um número suficiente de ani-
mais saudáveis para ajudar a restaurar a espécie
na natureza e, em simultâneo, manter uma reser-
va de indivíduos como salvaguarda... para o caso
de algo correr mal. Actualmente, já têm mais de
530 linces e, de um modo geral, as reintroduções
tiveram sucesso. “Em 2015, nasceram as primei-
ras ninhadas de lince fora da Andaluzia, mais
concretamente em Matachel”, acrescenta Pérez
de Ayala. Em 2016, todas as novas populações
se reproduziram, gerando um total de 34 crias, e
em 2017 foram alcançados os objectivos finais do
projecto: mais de cinco fêmeas criaram ninhadas
em cada população e pelo menos 24 fêmeas re-
produziram-se, parindo 47 crias.
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