22 | Valor| Sexta-feira,6demarçode2020
ARTIGO
China e
Brasil em
contexto
Em 1995 a renda per
capitabrasileiraera
aproximadamente quatro
vezes maiordo que a
renda per capitachinesa.
Esta é, hoje,maiselevada
do que a renda per capita
brasileira. PorTiago
Cavalcanti, para o Valor,
de São Paulo
N
oensaiointitulado“Oqueo
BrasilquerdaChina?”,
publicadopeloValornodia
14defevereiro,PhilipYang
noslegouumareflexãoparaalémdas
relaçõesentreChinaeBrasil.Mostrou
deformaclaraeprofundaocontraste
dastransformaçõesocorridasnos
doispaísesnasúltimasdécadas.
Talcontrastededesenvolvimento
entreBrasileChinaservepararevelar
nossofracassorelativocomonação.O
gráficonesteartigomostraoproduto
percapitabrasileiroechinêsentre
1995 e2018emdólaresde2011,
corrigidospelopoderaquisitivode
cadapaís.Em1995arendapercapita
doBrasileraaproximadamente
quatrovezesmaiordoquearenda
percapitachinesa.Hoje,arendaper
capitachinesaémaiselevadadoque
arendapercapitabrasileira.
Essessãonúmeroscomrelevantes
implicaçõesaobem-estardas
pessoas,masoutrasmudançasreais
aindamaisimportantesaconteceram
nosdoispaíses.Porexemplo,o
progressochinêslevouauma
reduçãoemmassadesuapobreza.
DeacordocomoBancoMundial,
aproximadamente40%dapopulação
chinesaestavanapobreza
(percentualdepessoasquevivem
commenosdeUS$1,90apreçode
2011 corrigidospelopoder
aquisitivo)em1995.Atualmente,
menosde1%dapopulaçãochinesa
vivenapobreza.Nessemesmo
períodooBrasilreduziusuapobreza
de13%para5%.Ouseja,oBrasiltem
hojeumpercentualdepobresqueé
relativamentecincovezesmaiordo
queoobservadonaChina.
Oautordoensaiotemvisãoprópria
ecolocaofocoprincipalmentenas
transformaçõesdascidadesenopapel
doEstadonosdoispaíses.Desseponto
devista,oartigodoPhilipYangé
criativoetrazumareflexãodiferentea
respeitododesenvolvimento
comparativodaChinacomodoBrasil.
Opontodepartidado
desenvolvimentochinêsrecenteéde
elevadaigualdade.Apesardoaumento
dadesigualdadenasúltimasdécadase
daperdadeespaçosurbanosde
convíviosocial,aChinatemaeducação
públicacomoprioridadeetambém
promoveaconectividadedesuascidadescomforteinvestimentono
transporteurbano.
Poroutrolado,oBrasiladotouum
modelodeapartaçãosocialao
segregarosbairrosdeforma
irreconciliável.Issogerouoambiente
propícioparaosurgimentodocrime
organizado,dasmilíciaseaausência
doEstadoemcertosespaçosurbanos.
Comomarcouomeuconterrâneo
ChicoScienceem1994:“A cidadenão
para/acidadesócresce/odecima
sobe/eodebaixodesce”.Apesardo
Brasilterdiminuídoosníveisde
pobrezaedesigualdadenasúltimas
décadas,osnossoscontrastessociais
aindasãochocantes.Andarpelas
grandescidadesdoBrasil,comoSão
Paulo—queétalvezoaglomerado
urbanodemaiorsucessonaAmérica
Latina—,ésedefrontarcoma
pobrezaecomariquezaextremas.
Portanto,preocupaoaumento
recentedanossadesigualdade.
E nessetemao ensaiode Philip
Yang mereceatençãoespecial,pois
poucostêm pensadoas cidadesna
profundidade críticaque ele alcança.
Ao tempoem que as cidadesrevelam
um dramasocial,sobretudocom a
segregaçãoespacial,também
representamo incalculável
potencialde espaçohumanopara
criar “pontese overdrives”no
sentidode promoversoluções
criativaspara diversosde nossos
problemassociaise econômicos.
Ou seja, conectarcadacidadecom
seus próprios pedaçosem
isolamentorepresentauma riqueza
coletivade inimaginável potência.
ComoPhilipYang buscoufazercom
o projetopioneiroCasa Paulista,
uma parceriapúblico-privada(PPP)
na qual se demonstraa
racionalidadeeconômica e humana
de integrardiferentesfaixasde renda
em espaçosurbanosconectados.
Melhorandoa qualidadede vida das
pessoasde baixarenda,diminuindo
o tempode deslocamento das
pessoas,já que se procurouocupar
espaçosociososno entornodas
estaçõesde treme de metrô.
OcasodoBrasilémuitasvezesmais
complexodoqueochinês.Como
indicadoemseuensaio,aextrema
homogeneidadeetnoculturaldaChina
équaseoopostodaheterogeneidadedoBrasil.Ocorrequeaquivaleuma
qualificação:oBrasilédecertaforma
homogêneoquandosefocanos
estratoseconômicos.
Emgeral,quandoseolhaparaas
camadasmaispobresdasociedade
brasileira,sobretudonasgrandes
cidadesdolitoral,mastambém
Brasília,BeloHorizonteeGoiânia,as
comunidadesperiféricastendemaser
de“cor”, enquantoqueas“elites”são
massivamenteembranquecidas.
Apesardadiscriminação“racial”ser
crimedealtíssimagravidade,éinegável
queoBrasilcarregaacentuadoviés
ocultodosmais“claros”emrelaçãoaos
mais“escuros”.
Ver,porexemplo,osexperimentos
controladosporMarcosLimaeJorge
Vala,publicadonoperiódicocientífico
“Psicologia:TeoriaePesquisa”.Nos
experimentos,indivíduosbrancos
deveriamavaliarumgrupodepessoas
negraseumgrupodepessoasbrancas
(representadosporfotografias)que
obtinhamsucessosocialouqueeram
malsucedidossocialmente.
Osautoresmostramqueosnegros
queobtêmsucessosocialsão
percebidoscomomaisbrancosdo
queosnegrosquefracassam.Além
disso,quantomaisosnegroscom
sucessosãopercebidoscomobrancos,Canal Unico! O Jornaleiro