Sexta-feira,6demarçode2020|Valor| 35CRIS BIERRENBACH
“Contra a Interpretação”Susan
Sontag.Tradução:DeniseBottmann.
CompanhiadasLetras,R$ 79 ,90“Contraa
Interpretaçãoe
Outros”, publicado
pela primeiravez
em 1966e eleitoum
dos cem melhores
livrosde não ficção
de todosos tempos
pelo “The Guardian”, é uma
coletâneadefinitivados trabalhos
maisimportantesde SusanSontag
(1933-2004).Não por acaso, é a obra
que consagroua ensaísta,críticade
arte e ativistados direitoshumanos,
comouma das grandespensadoras
da nossaépoca.
Nestanovatradução,aedição
incluidiscussõessobretemas
marcantesdosanosde1960–entre
elesostextos“NotasSobreoCamp”e
“ContraaInterpretação”, eodebate
daintelectualarespeitodenomes
comoSartre,Camus,Weil,Godard,
BecketteLévi-Strauss.LANÇAMENTOS
“OsSegredosqueGuardamos”
Lara Prescott.Tradutor,Alessandra
Esteche.Intrínseca,R$ 59 ,90“DoutorJivago”, de
BorisPasternak
(1890-1960),
tornou-seumlivro
clássico.Depoisvirou
umfilmeclássicode
DavidLean,com
OmarSharifvivendo
ahistóriadomédicoqueapoiaa
RevoluçãoRussa,massedesiludecom
osistema.Navidapessoal,estádividido
entreamulhereoutroamor.Olivro,
consideradopelogovernorussocomo
antissoviético,foiproibido.Sua
publicaçãodeu-seapósamortedo
escritor,umganhadordoNobel
forçadoarecusaroprêmio.Asagruras
dePasternakeoscaminhostrilhados
foradaRússiaafavordaobrasãoos
ingredientesdestelançamento,que
contaessepercursoerevelaaaçãode
trêsmulheresenvolvidasemuma
missãodaCIA,alémdemostraro
talentodamulhernaespionagemeo
poderdemudançadaliteratura.“OSocialemTe mposde
Incerteza”GeorgesBalandier. Tradutor,
AndréTe lles.EdiçõesSesc,R$75,00Oantropólogoe
sociólogofrancês,
GeorgesBalandier
(1920-2016),
criadordotermo
TerceiroMundo,é
autordeum
trabalhoque
destronou,naépoca,acaracterística
funcionaldaantropologia:
“SociologiaAtualdaÁfricaNegra”
(1954),frutodesuapesquisano
Congo-Brazaville.Oantropólogo,
comumabibliografiaquesoma 27
obras,recebeucom“OSocialEm
TemposdeIncerteza”, lançadona
Françaem2013,oreconhecimentoà
grandezadeseutrabalho.Olivrofaz
umbalançodasideias,utopias,
desacordosedesafiosdeBalandier.A
obratemduaspartes:umatemo
nomedolivro,com11ensaios,a
outrareúneartigoseresenhas
publicadosnojornal“LeMonde”.“BerçodeJudas”
JéfersonAssumção
Editora Taverna.R$54, 90Vozoriginalna
literaturabrasileira,
JéfersonAssumção
(“CabeçadeMulher
OlhandoaNeve”)
conta,numtexto
preciso,ahistóriado
escritorIuri,emcrise
comsuaproduçãointelectual
medíocreequedecidetransformar-se
emoutrapessoa.Otipoaltoemagroirá
setransformarquandoeleelegea
academiacomooseunovomundo.
Ganhamassamuscular,aprendeluta
livreemostra-secomoummonstro
fascinadopelaviolênciadaslutas
clandestinas.Aoenterraropassado
literário,começaafrequentaro
submundodosbordéisdePortoAlegre
eseapaixonaporumamulherqueo
desafiaamilitarpelaliberdade,
inclusiveasexual.Primeirovolumedo
tríptico“OInfernodosSentidos”,que
inclui“OsBeatlesNegros”e“O
Homem-Rã”,aseremlançados.■pobres:aimportânciadepermanecer
navizinhançaondesefoicriado, por
exemplo,oqueseligaanoçõesde
orgulhoepertencimento,semcontar
ohistóricodeperseguiçãoem
comunidadesétnicasquelutaram
muitoparaestarondeestãoagora,
nãoéalgocompensável—comoseria
naclassemédiabrancabeminstruída
—pelacriaçãodeoportunidadesem
outroslugares.
“Euachavaquesabiaoqueera
melhorparaaspessoassemperguntar
aelas”,disseArnadeementrevistaao
podcastdoPitchforkEconomics.Mas
ospersonagensde“Dignity”nãosão
apenasinstrumento,istoé,material
parauma(auto)críticadaelite
intelectualquenãopercebeuas
razõesprofundasdefenômenoscomo
DonaldTrump.Hápouca
generalizaçãonolivro,oquesempreé
umavantagem.Ospobressãovítimas
dodesprezosocialeagentesdo
ressentimento.Areligiãoéfontede
amparoedeintolerância.O
sentimentoantissistemase
manifestaemaçãocomunitáriaeem
apatia,violência.
Emseusmelhoresmomentos,o
autornãomudaotomdesses
registros.Sejanaigrejadeum
pregadormoralista,sejanocarrode
umtraficante,ashistóriasmerecema
mesmaatençãoformalehumana.É
umagenerosidadenarrativa,que
deixaalinguagemdospersonagens
sintetizar—àsvezesnumafrase,
numapalavra—todoumcontexto
sociocultural:“Eunãoqueriater
tantosfilhos,masàsvezeseufico
grávida”;“Elenãotinhaproblemaem
botaramãonasmulheres”;“Éuma
gentefodida,maséaminhagente
fodida”;“Nãoseiporqueeuganhei
umcorpodemenino,masDeusdeve
terummotivo.”
As fotosque ilustram o livro
tambémajudamnessaproposta
ética,digamos,em que a dignidade
do títulofala por si, sem precisarde
nossojulgamento:ela podeestarna
expressãode uma viciadacom a
pele cheiade hematomas,na
senhoraque joga bingoao lado de
um copode refrigerante.O conjunto
só perdequandoa pegada
jornalísticase diluiem comentários
impressionistas algo comuns—que
não conseguemdizernadamuito
melhordo que “precisamosouvir
maisuns aos outros.”
Paravoosumpoucomais
ambiciosos,olivroteriadedarmais
ênfaseacontradiçõesdesuaprópria
premissa.OmesmoMcDonald’sque
hojeacolhedesgarrados,por
exemplo,representaomodelo
corporativoqueajudouaarrasarcom
avidacomunitárianãoapenasnos
EstadosUnidos:opequenocomércio
local,amultiplicidadedehábitos
culturaisadaptadaàsrealidades
diversasque“Dignity”defende.
Demaneirasemelhante,aeliteque
ditouaspolíticasportrásdetamanho
fracassosocialéquemacumulao
conhecimentotécnicoparaenfrentar
oproblemaemlargaescala.Oque
fazerapartirdisso?Ouseja,paraque
açõescontraapobrezadeixemdese
basearapenasemestatísticase“coisas
quepodemosmedir?”Aresposta
podeedevepassarpelashistórias
colhidasporArnade,masnãotem
comoselimitaraelas.■Canal Unico! O Jornaleiro