%HermesFileInfo:B-5:20200312:
O ESTADO DE S. PAULO QUINTA-FEIRA, 12 DE MARÇO DE 2020 Economia B5
O pânico voltou a dominar o
mercado financeiro ontem,
depois que a Organização
Mundial da Saúde (OMS) re-
conheceu o coronavírus co-
mo uma pandemia. A declara-
ção, embora aguardada, le-
vou a B3 a interromper suas
operações pela segunda vez
em três dias.
Depois do anúncio, a Bolsa
brasileira chegou a cair 12%,
mas no fim do dia conseguiu
reduzir as perdas e terminou
com desvalorização de 7,64%,
em 85.171 pontos. No ano, a B3
acumula perdas de 26,35%, o
que significa R$ 1,03 trilhão, se-
gundo a Economática. Só a Pe-
trobrás perdeu quase R$ 200
bilhões. No mercado de câm-
bio, o dólar subiu 1,62% e termi-
nou o dia cotado a R$ 4,72. A
valorização da moeda america-
na ante o real em 2020 está em
17,72%.
As Bolsas de Nova York tam-
bém intensificaram as perdas
na tarde de ontem e o Dow Jo-
nes entrou no chamado bear
market (mercado de urso),
quando os índices caem mais de
20% da máxima histórica, expli-
cou o estrategista-chefe da Da-
vos Financial Partnership, Mau-
ro Morelli. O Dow Jones caiu
5,86%; o Standard & Poor’s 500,
4,89%; e o Nasdaq, 4,70%. “Esse
limite indica que os investido-
res terão de adaptar seu portfó-
lio”, explica Morelli.
Em meio ao clima de estres-
se, as taxas do Credit Default
Swap (CDS) de cinco anos do
Brasil, um termômetro do risco
país, disparou 40 pontos hoje,
batendo em 221 pontos, voltan-
do aos níveis mais altos desde
novembro de 2018.
Nem mesmo o anúncio do Fe-
deral Reserve (Fed, o banco
central americano) de que ele-
vará os limites para as opera-
ções de recompra, com objeti-
vo de aumentar a liquidez do
sistema financeiro, foi capaz
de acalmar os mercados. O índi-
ce de volatilidade VIX, conside-
rado um “medidor do medo”
em Wall Street, saltou quase
14% e voltou a ultrapassar os 50
pontos.
Segundo economistas, os in-
vestidores sentem falta de um
anúncio de medidas concretas
para reduzir os efeitos do coro-
navírus na economia mundial.
Nos Estados Unidos, o secretá-
rio do Tesouro, Steven Mnu-
chin, prometeu um pacote de
ajuda, mas não disse quando
nem como será feito.
Impacto. Para o banco holan-
dês ING, os Estados Unidos, as-
sim como outros países, senti-
rão o impacto da demanda glo-
bal mais fraca, cadeias de supri-
mentos interrompidas e caute-
la nos negócios. “Também há o
impacto da queda da confiança
no mercado acionário, o que po-
de se traduzir em fraqueza mais
ampla nos gastos”, disse a insti-
tuição.
Por aqui, a falta de uma ação
coordenada entre Executivo e
Legislativo também tem ajuda-
do para derrubar o ânimo dos
investidores. “Mas essa é uma
crise importada e vamos ser afe-
tados pelas notícias que vêm de
fora”, afirma Morelli. Segundo
ele, o mercado aguarda a próxi-
ma reunião do Comitê de Políti-
ca Monetária (Copom), na se-
mana que vem, para uma nova
queda da taxa Selic, hoje em
4,25% ao ano. As apostas do mer-
cado vão de corte de 0,25 ponto
porcentual a 0,5 ponto.
Petróleo. Somado a esse am-
biente de incerteza, o petróleo
registrou novas quedas ontem,
após a estatal petrolífera Saudi
Aramco informar que recebeu
ordem para elevar a capacidade
de produção de 12 milhões para
13 milhões de barris por dia. Na
New York Mercantile Exchange,
o petróleo WTI para abril fechou
em queda de 4,02%, a US$ 32,98
o barril. / RENÉE PEREIRA, IANDER
PORCELLA e LUÍS EDUARDO LEAL
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
BCE deve
anunciar pacote
de estímulo
A
decisão de mudar o critério para aces-
so ao Benefício de Prestação Conti-
nuada (BPC), via derrubada de um
veto presidencial, implicará gastos adicio-
nais de pelo menos R$ 21,5 bilhões em ter-
mos anualizados. A ausência de espaço no
Orçamento, o quadro de déficit e dívida ele-
vados e o contexto de forte turbulência no
cenário global recomendam prudência.
O novo critério de acesso ao benefício pas-
sará a ser a renda familiar per capita de
meio salário mínimo, não mais de 1/4. Não
se discute a necessidade de aprimorar e até
de aumentar as transferências sociais. O
problema é que decisões com impactos tão
expressivos estão sendo tomadas sem a indi-
cação de compensações: corte de outros gas-
tos ou aumento de receitas. Aumenta-se o
gasto obrigatório, espremendo a despesa
discricionária (em que há margem para cor-
te), onde estão os parcos investimentos.
Em 2020, as discricionárias do Executivo
poderão ficar abaixo de R$ 100 bilhões, em
um Orçamento de R$ 1,5 trilhão. No recente
acordo entre Congresso e Executivo, que
envolve três projetos de lei (os famigerados
PLNs), a limitação para cortar as emendas
parlamentares vai aumentar. O relator pas-
saria a ter mais poder e dinheiro e o corte
seria proporcional à redução feita no bolo
do Executivo.
A IFI calcula que o nível mínimo de discri-
cionárias para a máquina pública não parar
é de R$ 77,2 bilhões. Se as projeções para as
receitas da Lei Orçamentária Anual forem
reduzidas, o cumprimento da meta legal de
déficit demandará um corte expressivo de
gastos discricionários. Essa piora na expec-
tativa para as receitas explica-se pela econo-
mia mais fraca. No Relatório de Acompanha-
mento Fiscal de fevereiro, a IFI considerou
que o contingenciamento necessário seria
de R$ 27 bilhões a R$ 37 bilhões. Com o BPC,
o limite superior pode ser mais provável. A
impossibilidade de cortar requereria nova
mudança na LDO, desta vez na meta de défi-
cit de R$ 124,1 bilhões. Isso sem mencionar o
aumento do risco para o teto de gastos. A
IFI calcula uma folga de cerca de R$ 26 bi-
lhões no teto em 2020. Isto é, a mudança do
BPC poderia representar 80% dessa mar-
gem. Definitivamente, não há espaço para
gastos novos. A decisão só reforça o quadro
de descoordenação da política fiscal e orça-
mentária.
]
DIRETOR EXECUTIVO DA INSTITUIÇÃO FISCAL INDE-
PENDENTE (IFI) DO SENADO FEDERAL.
Bancos públicos têm R$ 207,8 bi para enfrentar turbulência. Pág. B6}
Saiba mais sobre as medidas
anunciadas por Trump
Eduardo Gayer
Apesar de já ter demonstrado
preocupação com os efeitos co-
laterais de uma política monetá-
ria altamente acomodatícia, o
Banco Central Europeu (BCE)
deve apresentar, hoje, um am-
plo pacote de estímulos, como
corte de juros, atualmente em
-0,50% ao ano, e ampliação do
programa de relaxamento quan-
titativo (QE, na sigla em in-
glês). A medida seria uma res-
posta aos impactos econômi-
cos do novo coronavírus e à imi-
nência de uma recessão no blo-
co comum, de acordo com cin-
co instituições consultadas pe-
lo Estadão /Broadcast.
A presidente do BCE, Christi-
ne Lagarde, já disse que a Euro-
pa está sujeita a sofrer uma cri-
se semelhante à de 2008 por
causa do coronavírus, hoje de-
clarado como uma pandemia
pela Organização Mundial da
Saúde (OMS). Um corte de ju-
ros de olho nos efeitos da doen-
ça sobre a economia por parte
do BCE deve vir a reboque de
seus pares inglês e americano,
que cortaram suas taxas básicas
de forma extraordinária em 0,5
ponto porcentual nos últimos
dias 3 e 11, respectivamente.
O Morgan Stanley aposta no
que chama de “pacote comple-
to”: corte de 0,1 ponto porcen-
tual nos juros e salto nas com-
pras de bônus de ¤ 20 bilhões
para ¤ 40 bilhões por mês. “Em-
bora continuemos céticos de
que o corte proporcionará um
estímulo econômico significati-
vo, vemos a medida como sinal
de forte compromisso do BCE
com seu mandato.”
Nos EUA, o presidente Do-
nald Trump anunciou na noite
de ontem a suspensão por 30
dias de voos da Europa para o
país e disse estar “confiante”
de que seu governo “reduzirá
significativamente” a ameaça
do surto para os cidadãos ame-
ricanos.
]
ANÁLISE: Felipe Salto
Mudança do BPC não
cabe no Orçamento
VARIAÇÃO NO DIA
-4,14%
-0,38%
Bolsa
Dólar
Dólar
EM REAIS
FÔLEGO CURTO
Ibovespa
EM PONTOS
FONTE: BROADCAST INFOGRÁFICO/ESTADÃO
2
JAN
2020
3
FEV
70.000
90.000
110.000
130.000
4,000
4,300
4,600
4,900
2
MAR
11
4,722
85.171
VARIAÇÃO
NO DIA
-7,64%
1,62%
NO MÊS
-18,24%
5,45%
Bolsa
Dólar
118.573
4,0242
Bolsas no mundo
VARIAÇÃO DO DIA, EM PORCENTAGEM
IBEX 35
(MADRI)
DAX
(FRANK-
FURT)
NASDAQ
(NOVA
YORK)
S&P 500
(NOVA
YORK)
FTSE
100
(LONDRES)
PSI 20
(LISBOA)
CAC 40
(PARIS)
DOW
JONES
(N. YORK)
0
-5,86
-4,89
-4,70
-0,47
-1,40
-0,57 -0,35
-0,34
Bolsa tem novo dia de pânico e cai 7,64%
Operações da B3 foram interrompidas ontem pela 2ª vez em três dias quando queda bateu em 12% e após OMS reconhecer pandemia
Pág. A18
i