O Estado de São Paulo (2020-03-14)

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A18 SÁBADO, 14 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Metrópole


Mateus Vargas
Camila Turtelli / BRASÍLIA


O Ministério da Saúde reco-
mendou ontem medidas
mais restritivas para evitar o
avanço do novo coronavírus,
entre elas o isolamento por
sete dias de todas as pessoas
que chegam de viagens inter-
nacionais, mesmo sem sinto-
mas, e cancelamento de even-
tos com aglomerações. O go-
verno passa a considerar tam-
bém a hipótese de realizar
quarentena em locais onde a
ocupação de leitos de UTI pa-
ra a nova doença ultrapasse
80%. E sugere a suspensão de
aulas – adotada ontem em
São Paulo (mais informações
na página A22).
As recomendações foram da-
das com detalhamento para
áreas com transmissão susten-
tada (que não envolve países
com casos anteriormente regis-
trados), que são Rio, São Paulo
e Bahia. O governo estima que o
número de casos possa dobrar a
cada dois ou três dias, se não
forem tomadas medidas. Ofi-
cialmente há 98 casos confirma-
dos, 56 em São Paulo, com 12
internações.
A ideia é que gestores locais
(governo federal, Estados e mu-
nicípios) discutam como adap-
tar as recomendações a suas rea-
lidades. A recomendação geral,
no entanto, já é de cancelamen-
to de “grandes eventos”, sejam
eles governamentais, esporti-
vos, políticos, comerciais e reli-
giosos, além do isolamento de
assintomáticos que estiveram
fora do país.
O governo federal também
orienta o adiamento de cruzei-
ros turísticos. “Não dá para acei-
tarmos ou permitirmos concen-
tração de pessoas”, disse o se-
cretário de Vigilância em Saú-
de, Wanderson Oliveira. Segun-
do ele, há mais de 20 cruzeiros
programados no País e o minis-
tério deve entrar em contato
com os operadores. “Muitos
idosos se concentram nesses lo-
cais, onde historicamente a
transmissão respiratória é facili-
tada”, afirmou. Ontem, subiu
para dois o número de passagei-
ros do navio Silver Shadow, an-
corado no Recife, retirados da
embarcação com suspeita de co-
ronavírus.


Contato social. O principal re-
cado para a população é reduzir
o contato social. Até aglomera-
ções em velórios de mortos pe-
lo coronavírus devem ser evita-
dos. Bufês de comida no estilo
self-service devem ser elimina-
dos e se sugere reuniões somen-
te em locais abertos.
Em relação à circulação de
pessoas em shoppings e comér-


cios locais, o governo quer que
esses estabelecimentos ofer-
tem lugares para lavar as mãos e
álcool em gel. O secretário dis-
se que é preciso estimular trans-
missões virtuais de eventos,
cancelar viagens, realizar traba-
lho remoto e reuniões via web.
O ministério orienta ainda
que idosos e doentes crônicos
evitem viagens, cinema, shop-
ping, shows e locais de aglome-
ração. A pasta reforçou que este
grupo deve vacinar-se contra in-
fluenza (gripe).
Também há o recado do go-
verno de que, mesmo em cida-
des sem casos, já é preciso se
planejar para a chegada da doen-

ça, pois o período do ano de
maior transmissão de síndro-
mes respiratórias se aproxima
(outono e inverno).

Nova fase. As medidas que o
ministério sugere indicam a en-
trada pelo menos de São Paulo e
Rio na etapa de “mitigação” da
doença, quando a ideia é salvar
vidas. Nessa fase, o ideal é que
leitos de hospitais estejam li-
vres e pessoas fora de grupos de
risco (idosos e doentes crôni-
cos) evitem ir a serviços de saú-
de. A recomendação é que pes-
soas que não apresentem febre
e mais um sintoma da doença
só liguem para o 136.

O secretário de Vigilância
lembrou que, apesar do foco na
nova enfermidade, o serviço
continua pressionado por situa-
ções corriqueiras. “Com den-
gue, cirurgias, acidentes. Não
estamos cuidando só de novo
coronavírus”, disse. Ele afir-
mou ainda ser fundamental que
cada hospital tenha seu plano
de contingência, para ampliar
com segurança o número de lei-
tos para receber a doença. O Mi-
nistério da Saúde recomenda
ainda a centros médicos ter em
mãos medicamentos para redu-
ção da febre, como ibuprofeno.
Na fase de mitigação, o SUS
passa a priorizar testes para no-
vo coronavírus em pessoas com
maior risco de desenvolver qua-
dros graves. O governo reconhe-
ce que, neste modelo, pessoas
assintomáticas ou quadros le-
ves podem não ser somados às
estatísticas, mas considera a
medida racional, pois já não é
essencial apontar quem passou
a doença para quem, mas sim
evitar mortes e pressão no siste-
ma de saúde.
A estratégia é mais restrita do
que a prevista no plano nacio-
nal de contingência, que deter-
mina reduzir a busca por casos
leves no País quando 100 pa-
cientes forem confirmados.
“Foi um dado empírico que
OMS colocou no início da epide-
mia. Precisamos olhar esses nú-
meros”, disse Oliveira.

Farmácias


poderão aplicar


vacina da gripe


Fabiana Cambicoli

Para evitar aglomerações de ido-
sos nas Unidades Básicas de
Saúde (UBSs) durante a campa-
nha de vacinação contra a gripe,
prevista para começar no próxi-
mo dia 23, o governo do Estado
de São Paulo vai tentar fazer
uma parceria com a rede priva-
da de farmácias – para que elas
também apliquem vacinas do
calendário do Sistema Único de
Saúde (SUS).
Segundo o coordenador do
Centro de Contingência contra
o Coronavírus do governo do
Estado de São Paulo, David Uip,
a rede privada “será convidada”
a oferecer as vacinas contra a
gripe e o sarampo. Os pacientes
seriam imunizados gratuita-
mente, como nos postos. “Seria
uma opção a mais de local para
tomar a vacina, mas a vacinação
nos postos de saúde continuará
normalmente”, explicou.
O ministro da Saúde, Luiz
Henrique Mandetta, disse que,
na próxima segunda-feira, o mi-
nistério deverá liberar para dis-
tribuição aos Estados as primei-
ras 10 milhões de doses que se-
rão usadas na campanha de vaci-
nação contra a gripe. No total,
serão cerca de 75 milhões de do-
ses colocadas à disposição para
a população-alvo.
O governo federal decidiu an-
tecipar a campanha neste ano,
que começaria só em abril, por
causa da ameaça do coronaví-
rus. Embora a vacina contra a
gripe não proteja contra a nova
doença, ele poderá evitar de for-
ma mais precoce casos de com-
plicação da gripe, o que sobre-
carregaria o sistema de saúde
em um momento de crise.
Na campanha deste ano, o pri-
meiro grupo a ser vacinado, a
partir de 23 de março, serão os
idosos e trabalhadores da área
da saúde. A segunda etapa da
campanha de imunização, pre-
vista para ocorrer a partir de 16
de abril, contemplará professo-
res e profissionais das forças de
segurança e salvamento.
Na terceira fase, a partir de 9
de maio, entrarão os demais gru-
pos (crianças de 6 meses a me-
nores de 6 anos, doentes crôni-
cos, pessoas com mais de 55
anos, grávidas, mães no pós-par-
to e população indígena).
A mobilização nacional para
o “Dia D” da vacinação contra a
gripe está marcada para o dia 9
de maio.

Jean Gorinchteyn, médico do Instituto de Infectologia de São Paulo


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS São Paulo suspende aulas do fundamental ao ensino superior. Pág. A20 }


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RECOMENDAÇÃO

Ministério da Saúde quer isolar viajante


sem sintomas e evitar grandes eventos


Com detalhamento para áreas com transmissão sustentada, que são Rio, São Paulo e Bahia, as medidas visam a conter o ritmo de


avanço da doença; outras recomendações incluem de veto a cruzeiros turísticos a restringir até bufê self-service; País tem 98 registros


lComo medida para evitar a pro-
pagação do coronavírus, estão
suspensos eventos promovidos
pelo poder público com aglome-
ração de pessoas na cidade de
São Paulo por tempo indetermi-
nado, já a partir desta sexta-fei-
ra. “Para eventos privados, há
uma recomendação para que
eles sejam evitados neste mo-
mento”, informou a gestão muni-
cipal – e o mesmo vale para a

estadual. O cancelamento foi
uma decisão do prefeito em exer-
cício, Eduardo Tuma (PSDB), a
pedido do prefeito Bruno Covas
(PSDB). Covas está licenciado
por dois dias e está no interior do
Estado com o filho.
Em uma primeira nota, corrigi-
da, a Prefeitura informava que a
medida atingia “todos os eventos
de massa governamentais, espor-
tivos, artísticos, culturais, políti-
cos, científicos, comerciais e reli-
giosos com concentração próxi-
ma de pessoas na cidade de São
Paulo”. Mas a determinação atin-
ge apenas o poder público. /
BRUNO RIBEIRO

ENTREVISTA


Gilberto Amendola


Em entrevista ao Estado, o
infectologista Jean Gorinch-
teyn, médico do Instituto de
Infectologia de São Paulo, elo-
giou as medidas do governo.
“Se a gente fechar os olhos ou
deixar o vírus circular na co-


munidade, corremos o risco
de sofrer o mesmo impacto
no sistema de saúde pública
da Itália e mesmo da China.”

lO Ministério da Saúde acerta ao
fazer recomendações tão duras?
O Brasil tem cumprido uma
trajetória de antecipações em

relação ao coronavírus. Nós
também estamos nos utilizan-
do dos exemplos dos outros
países – principalmente na for-
ma como temos lidado com a
doença e nas estratégias para
sua contenção.

lEssas medidas podem ser efi-
cazes neste momento?
O coronavírus teve uma explo-
são de mortalidade no fim de
dezembro – mas ele já circula-
va desde outubro. Na ocasião,
achavam que era algo relacio-
nado ao clima frio na China e

não existia muito perigo fora
daquele contexto específico.
Foi a mesma coisa que aconte-
ceu na Lombardia, na Itália.
Agora, com a possibilidade de
transmissão comunitária, justi-
fica-se a criação de medidas
como as que foram recomen-
dadas pelo governo.

lQual o risco de não seguirmos
essas recomendações à risca?
Nas maioria dos casos, vamos
encontrar versões absoluta-
mente brandas do coronaví-
rus. Mas a nossa preocupação

precisa ser com os mais ve-
lhos e com quem tem proble-
mas de saúde preexistente.
Essas pessoas podem ser afeta-
das de forma grave e anteci-
par-se a isso é uma forma de
lutar. Neste momento, não
existe tratamento ou vacina.
Portanto, essas medidas de
prevenção são adotadas para
que uma disseminação maior
seja evitada entre a população.

lMas o impacto na vida das pes-
soas não será brutal?
Uma ação como essa vai afe-

tar economicamente a vida
das pessoas. Nós estamos cer-
ceados no direito de ir e vir.
Nós nunca vivenciamos isso
na história, nunca vivencia-
mos esse cerceamento.

lO senhor acredita que medidas
mais duras podem estar por vir?
Eu acredito ainda que medi-
das de reforço aconteçam se
mais de mil casos de coronaví-
rus forem confirmados no
País. Por enquanto, o governo
está sendo estratégico e agin-
do de forma correta.

l Geral
Isolamento de 7 dias para quem
esteve em viagem internacional,
mesmo sem sintomas
Cancelar, adiar ou realizar sem
público grandes eventos
Fazer eventos em locais abertos
e sem bufê self-service
Adiar cruzeiros turísticos
Em caso de morte por novo coro-
navírus, evitar velório e emitir
rapidamente o atestado de óbito

l Medidas para áreas com
transmissão comunitária
Para as instituições de ensino,
planejar antecipação de férias e
ensino a distância
Cancelar atividades em locais
fechados com aglomeração de
mais de 100 pessoas
Reduzir o caminho ao trabalho:
incentivando home office e cance-
lando viagens não essenciais
Reduzir fluxo urbano: estimulan-
do horários alternativos
Declaração de quarentena: pode-
rá ser utilizada ao atingir 80% da
ocupação de leitos de UTI

l Idosos/doentes crônicos
Restrição de viagens, cinema,
shoppings, shows e locais com
aglomeração em cidades com
transmissão local ou comunitária
e vacinação contra gripe

ERBS JR./FRAMEPHOTO

Aeroporto Tom Jobim, no Rio. O principal recado para a população é reduzir o contato social, para limitar a disseminação

Prefeitura e Estado


suspendem todas as


reuniões públicas


‘Governo está sendo estratégico


e agindo de forma correta’

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