%HermesFileInfo:A-20:20200314:
A20 Metrópole SÁBADO, 14 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO
Diálogo com crianças
não deve ter pânico
Renata Cafardo
Isabela Palhares
Fabiana Cambricoli
As escolas públicas e particu-
lares de São Paulo vão fechar
por tempo indeterminado, a
partir do dia 23. O governa-
dor de São Paulo, João Doria
(PSDB), anunciou ontem um
“suspensão gradual” das au-
las, que começa na segunda-
feira. Esse tempo, até o dia
23, deve ser usado para as ins-
tituições e famílias se prepa-
rarem. Mas os alunos da rede
pública que não forem à esco-
la semana que vem não terão
faltas computadas.
Inicialmente, a interrupção
de aulas será tratada como um
adiantamento das férias, segun-
do o governo. “Não sei se vai
durar uma semana, duas sema-
nas, 30 dias ou mais. Vamos ava-
liar dia a dia, até que as autorida-
des de Saúde digam que pode
retomar as aulas”, disse ao Esta-
do o secretário estadual de Edu-
cação, Rossieli Soares.
As medidas graduais, que fo-
ram adiantadas pelo esta-
dao.com.br, se aplicam da cre-
che ao ensino médio. Para as fa-
culdades e universidades públi-
cas e privadas, o fechamento já
deve ocorrer na segunda-feira.
O reitor da Universidade de São
Paulo (USP), Vahan Agopyan,
disse ao Estado que a suspen-
são será a partir de terça-feira
porque os diretores das unida-
des receberão instruções sobre
como proceder apenas na se-
gunda-feira.
Transmissão. Conforme o Es-
tado apurou, o governo não pre-
tendia suspender as aulas ain-
da, mas a confirmação de trans-
missões comunitárias em São
Paulo levou à mudança de estra-
tégia. Isso quer dizer que não é
possível mais identificar ne-
nhum vínculo da contamina-
ção, como alguém que viajou pa-
ra outro país, por exemplo.
Ontem, o Ministério da Saú-
de recomendou justamente
que locais onde já exista esse ti-
po de infecção adiantem as fé-
rias escolares. A decisão de Do-
ria foi tomada após reunião
com o ministro da Saúde, Luiz
Henrique Mandetta, e os secre-
tários de Educação e Saúde.
A rede estadual de São Paulo
tem 3,5 milhões de alunos e a
rede municipal, 1 milhão. É o
maior sistema público do Bra-
sil. Nas escolas particulares pau-
listas, estão mais 2 milhões de
crianças e jovens. Não há casos
de coronavírus identificados na
rede pública, mas escolas priva-
das tiveram infecções. Alguns
colégios, como Avenues e Glo-
bal Me, já haviam fechado por
causa doença.
Segundo Rossieli, a medida se-
rá gradual por “preocupação
com a família”, que precisa ter
tempo para pensar com quem
vai deixar a criança. “Experiên-
cias (de mudança) do dia para
noite não têm sido positivas.”
O secretário disse se preocu-
par com pais que pretendem dei-
xar os filhos com avós, pois os
idosos são grupo de risco para a
doença. O governo deve divul-
gar na semana que vem um ca-
lendário com atividades a distân-
cia que poderão ser programa-
das para o período.
O secretário municipal de
Educação, Bruno Caetano, dis-
se ao Estado que não descarta
alternativas para mães que não
têm onde deixar seus filhos
com o fechamento das creches,
que atendem de zero a 4 anos.
Isso será discutido na semana
que vem.
Para Arthur Fonseca Filho,
presidente da Associação Brasi-
leira de Escolas Particulares (A-
bepar), as instituições privadas
não devem ter resistência à sus-
pensão das aulas, mas algumas
podem ter dificuldade em ado-
tar a medida já na próxima sema-
na. Segundo o secretário da Edu-
cação, as escolas particulares
são obrigadas a cumprir a reco-
mendação até o dia 23 porque
um decreto do governo federal
determina que esse tipo de deci-
são, durante a epidemia de coro-
navírus, é de responsabilidade
das autoridades de Saúde.
Segundo Fonseca Filho , as es-
colas de educação infantil de-
vem ter maior dificuldade para
o fechamento por atenderem
crianças pequenas. “Acredito
que as escolas vão se organizar
na segunda, pensar em um pla-
no de contingência, em como
manter as atividades a distân-
cia”, disse.
Universidades. O anúncio de
Doria causou desconforto nas
reitoria das universidades pau-
listas. Desde que foi confirma-
do o primeiro caso de coronaví-
rus na USP, os dirigentes têm
ficado incomodados com o fato
de o governador não levar em
consideração a autonomia das
universidades, garantida pela
Constituição, para a tomada de
decisões administrativas.
O governador criticou a Uni-
camp na quinta-feira por ter de-
cidido suspender as atividades
sem uma determinação esta-
dual. “Nós obviamente respeita-
mos a autonomia das universi-
dades, mas a questão da saúde
não é questão de autonomia.
Nós não temos Estados inde-
pendentes, não é o Vaticano
dentro do Brasil, nem Vaticano
dentro de São Paulo”, disse Do-
ria à GloboNews.
“Ao nosso ver, resguardado
as razões que motivaram a Uni-
camp a suspender as aulas, mas,
de maneira geral, não há neces-
sidade de medidas dessa nature-
za. Nós não queremos nem des-
qualificar nem desvalidar as
preocupações, mas de maneira
generalizada, não há esta neces-
sidade”, disse o governador,
um dia antes de suspender as
atividades em todas as institui-
ções de ensino públicas e priva-
das de São Paulo. Na manhã de
sexta, Marcelo Knobel, reitor
da Unicamp, defendeu a deci-
são e disse preferir “pecar pelo
excesso de zelo do que pela
omissão”. Não há casos de coro-
navírus na instituição. Ontem,
a USP confirmou a segunda con-
taminação de um estudante, da
Escola Politécnica (Poli).
A alteração das atividades peda-
gógicas em escolas particulares
de São Paulo, que já vinha ocor-
rendo mesmo antes da determi-
nação do governo do Estado,
não tem sido apenas para evitar
a transmissão de coronavírus,
mas também o contágio por ou-
tros vírus como o da influenza.
Comuns nesse período do ano,
os casos desse tipo de doença
entre os alunos fizeram com
que ao menos uma escola sus-
pendesse as aulas e outra regis-
trasse faltas por receio dos pais.
No colégio A. Einstein, em In-
terlagos, na zona sul da capital
paulista, as aulas de todas as tur-
mas foram suspensas ontem e
anteontem depois que casos de
H1N1 (influenza) foram confir-
mados em quase 30 alunos. Um
comunicado enviado aos pais in-
formou que a suspensão foi re-
comendada pela Vigilância Sani-
tária do Município.
“Diante dos novos casos con-
firmados de alunos com o vírus
influenza A e, seguindo a orien-
tação da Vigilância Sanitária e
Clínica Santa Isabella, cancela-
remos as aulas e atividades dos
dias 12 e 13 de março. Essa é uma
medida que tem o objetivo de
proteger a comunidade esco-
lar”, diz o comunicado. A Secre-
taria Municipal de Saúde e a
Coordenadoria de Vigilância
em Saúde (Covisa), no entanto,
disseram não haver orientação
para o fechamento de nenhuma
instituição de ensino para os ca-
sos de influenza.
Na zona sul, a Escola Pinhei-
ro também teve o registro de in-
fluenza entre os estudantes,
mas não decidiu pela suspen-
são das aulas. No entanto, mui-
tos pais optaram por não man-
dar os filhos para a unidade on-
tem. Uma funcionária, que pe-
diu para não ser identificada,
disse que quase um terço dos
alunos faltou. O Estado tentou
contato com a direção dos colé-
gios, mas ninguém foi localiza-
do para comentar a situação e
as medidas adotadas.
Outras escolas da zona sul, co-
mo o colégio Santa Maria, tam-
bém registraram casos da doen-
ça. Na unidade, no fim da sema-
na passada, três crianças da edu-
cação infantil foram diagnosti-
cadas com influenza, mas as ati-
vidades foram mantidas. A úni-
ca recomendação dada pelo co-
légio é para que os alunos doen-
tes não frequentem as aulas.
Casos. A Secretaria Municipal
de Saúde informou que não há
orientação para o fechamento
de instituições para outras
doenças. A recomendação feita
no início da noite de ontem pa-
ra a suspensão das aulas ocorre
por causa da transmissão do co-
ronavírus. A pasta informou ain-
da que a campanha da vacina-
ção contra o surto de influenza
está prevista para começar em
23 de março, seguindo orienta-
ção do Ministério da Saúde.
O município registrou nesse
ano 146 casos de Síndrome Res-
piratória Aguda Grave (SRAG)
hospitalizados, sendo que dez
deles foram confirmados para o
vírus influenza A H1N1, 4 confir-
mados para influenza A não sub-
tipado e 9 casos foram confirma-
dos para influenza B. / I.P.
Além do coronavírus, influenza
também ameaça rotina escolar
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
Guilherme Bianchini
A lista de perguntas difíceis que
crianças fazem aos pais ganhou
mais um item com o avanço do
novo coronavírus. Os mais no-
vos também podem contrair o
vírus, mas a maioria dos casos é
leve ou assintomática, ou seja,
não apresenta manifestações
perceptíveis da doença. Apesar
disso, as crianças são capazes
de transmitir o vírus a outras
pessoas, o que aumenta a neces-
sidade de prevenção.
Segundo especialistas, a
orientação deve começar em ca-
sa, com os pais, que precisam
conduzir a situação com tran-
quilidade. Além de reforçar as
dicas repetidas à exaustão, co-
mo lavar as mãos, utilizar álcool
em gel e evitar contatos próxi-
mos, os ensinamentos devem
ser em tom de conscientização.
“A conversa tem de ser muito
calma e clara, tentando acalmar
os ânimos. Os pais não podem
transmitir pânico aos filhos,
principalmente os menores.
Quanto mais pessoas apavora-
das, pior. É bom utilizar mate-
riais lúdicos e pedagógicos, co-
mo ilustrações e infográficos. O
Ministério da Saúde oferece es-
se tipo de conteúdo”, sugere Ri-
cardo Monezi, pesquisador de
medicina comportamental da
Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp).
A atenção redobrada aos hábi-
tos de higiene pode contribuir
para a formação de uma gera-
ção capaz de se prevenir de vá-
rias doenças contagiosas. É o
que afirma Marco Aurélio Safa-
di, infectologista do Sabará
Hospital Infantil. “Um dos
bons legados de uma epidemia,
se é que podemos ter isso, é o
amadurecimento sobre a dis-
cussão de regras e etiquetas de
comportamento.”
Prática. E dar o exemplo é tão
importante quanto falar, segun-
do Monezi, que aconselha que
os pais lavem as mãos da manei-
ra adequada e com frequência,
em casa, para que os filhos repi-
tam o gesto de maneira natural.
Respeitar a inteligência das
crianças é outro ponto funda-
mental na hora de conversar so-
bre o novo coronavírus. Para Sa-
fadi, pessoas entre seis e nove
anos já são capazes de absorver
esse tipo de informação.
lCampanha de vacinação
Começa no dia 23 de março a
campanha de vacinação contra a
gripe. A iniciativa foi antecipada
para reduzir a sobrecarga do sis-
tema de saúde e facilitar o diag-
nóstico de coronavírus.
Com o anúncio de suspensão
das aulas em diversas escolas e
faculdades de todo o País, o
Conselho Nacional de Educa-
ção (CNE) orientou que, se ne-
cessário, as instituições podem
repor as aulas no próximo ano
para cumprir os 200 dias letivos
anuais exigidos pela legislação.
Ou seja, não é preciso cumprir o
ano civil.
A orientação geral foi feita on-
tem depois de o conselho ser
procurado pela Abmes, associa-
ção de faculdades privadas, so-
bre a aplicabilidade das medi-
das sugeridas pelo Ministério
da Saúde para conter a propaga-
ção do coronavírus.
O presidente do CNE, Luiz
Curi, diz no ofício entender que
“do ponto de vista jurídico” con-
tinua valendo o entendimento
de 2009, quando situação seme-
lhante ocorreu pelo surto de
H1N1. “É importante que as es-
colas tenham isso em mente pa-
ra que possam se organizar. Res-
gatar o parecer daquela época
foi para dar tranquilidade a to-
das as instituições para tomar
as medidas necessárias neste
momento”, disse.
Em 2009, as aulas foram sus-
pensas em alguns locais por até
duas semanas durante o mês de
agosto. Depois de passado o pi-
co da doença e, com o retorno
das atividades, muitos sindica-
tos e escolas passaram a ques-
tionar judicialmente a necessi-
dade de cumprir naquele ano os
200 dias letivos. O entendimen-
to na época era de que o cumpri-
mento era necessário para ga-
rantir a qualidade do ensino
dos estudantes, mas que as au-
las poderiam ser repostas no
próximo ano, ou seja, prorro-
gando o ano letivo.
Aulas a distância. O ofício do
CNE também ressalta que, no
caso das instituições de ensino
superior, uma portaria publica-
da pelo Ministério da Educação
(MEC) no ano passado passou
a permitir que até 40% da carga
horária de cursos presenciais
pode ser ministrada pela moda-
lidade a distância, o que pode
ser uma alternativa para o mo-
mento atual.
No caso das escolas de educa-
ção básica, muitas unidades parti-
culares também têm adotado au-
las a distância ainda que a legisla-
ção atual não preveja que a carga
horária dessa etapa de ensino pos-
sa ser dada de forma virtual. /I.P.
lO governo do Estado de São
Paulo anunciou ontem que foi
registrado o primeiro caso de
cura de um paciente brasileiro
infectado pelo coronavírus. Se-
gundo o infectologista David Uip,
coordenador do Centro de Contin-
gência do Coronavírus do Estado,
o paciente ficou internado duran-
te quatro dias no Hospital Israeli-
ta Albert Einstein, na capital pau-
lista. Foi o hospital privado que
confirmou às autoridades a cura
e alta do paciente. N
ão foram divulgados detalhes
sobre o perfil do curado. De acor-
do com o Ministério da Saúde,
dos 98 casos confirmados de in-
fecção pelo coronavírus no País,
12 estão hospitalizados e os de-
mais são acompanhados em ca-
sa. / F.C.
Portaria de Moro deve impor internação. Pág. A 22 }
Especialistas dizem que
pais devem apresentar
situação aos pequenos
e dar exemplos de bom
comportamento
WERTHER SANTANA/ESTADÃO –2/3/
SP vai suspender
aulas em escolas
públicas e privadas
Unidades serão fechadas por tempo indeterminado a partir do dia
23; já na segunda-feira terá início suspensão gradual de atividades
Fechado. Avenues já havia suspendido aulas anteriormente, após ter um aluno com covid
RAUL FARIA/FUTURA PRESS–12/3/
Colégio suspendeu
aulas depois de
confirmar quase 30
casos; outras unidades
registraram faltas
A. Einstein. Colégio em Interlagos não teve aulas ontem
Reposição poderá ser feita no ano que vem, diz conselho
Estado anuncia
1º caso de cura