O Estado de São Paulo (2020-03-15)

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A14 Política DOMINGO, 15 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


J. R.


GUZZO


Era uma luxuosa, festiva e
despreocupada noite de sába-
do uma semana atrás em
Mar-a-Lago, resort do presi-
dente dos Estados Unidos,
Donald Trump, na Flórida,
no que, agora, parece ser o
fim de uma era e o começo de
outra. Nos dias que se segui-
ram, a propriedade presiden-
cial se tornou algo como uma
zona de risco para coronaví-
rus. Um número crescente de
convidados do último fim de
semana no resort disseram
que foram infectados ou se co-
locaram em quarentena.
Além de jantar com o presi-
dente Jair Bolsonaro e uma co-
mitiva brasileira, Trump partici-
pou da festa de aniversário da


sua nora, Kimberly Guilfoyle, e
foi a um brunch de arrecadação
de fundos para seu partido no
local no fim de semana passa-
do. Depois de resistir por dias,
ele fez o teste para coronavírus
na noite de anteontem. Ontem,
a Casa Branca informou que o
resultado deu negativo.
Há informações sobre pelo
menos seis pessoas que estive-
ram em Mar-a-Lago naquele
fim de semana e foram infecta-
das. Na lista estão quatro repre-
sentantes da comitiva brasilei-
ra: o secretário de Comunica-
ção, Fabio Wajngarten, o embai-
xador Nestor Forster, o sena-
dor Nelsinho Trad (PSD-MS) e
a advogada Karina Kufa. Bolso-
naro disse, anteontem, que seu

resultado para o vírus deu nega-
tivo, mas o presidente ainda de-
ve fazer novos exames, como
mostrou o Estado ontem.

Também relataram contágio
o prefeito de Miami, Francis
Suarez, que se encontrou com
Bolsonaro na segunda-feira, e

uma pessoa que ainda não foi
identificada e que teria partici-
pado do brunch com Trump.
Outra convidada do resort, a
presidente do Comitê Nacional
do Partido Republicano, Ronna
McDaniel, revelou que ficou
doente e que ainda espera a con-
firmação do contágio.
Pessoas têm pago até US$
200 mil por uma assinatura do
resort – e a chance de ficar próxi-
mo do presidente norte-ameri-
cano. Trump frequentemente
vai ao restaurante na hora do
jantar, apertando as mãos de as-
sinantes e acenando para quem
está na mesa. A regra não escri-
ta do clube é que aqueles que
amam Trump ou negociam co-
nexões com ele podem ter aces-

so ao presidente.
No fim de semana passado no
salão de festas do clube, Trump
deu uma amostra de quão preo-
cupado estava com o coronaví-
rus. Enquanto acompanhava
Bolsonaro antes do jantar, um
repórter perguntou se os casos
recém-relatados em Washing-
ton o preocupavam. “Não”, ele
disse. “Não estou preocupado.”
E então os dois entraram.
O jantar alegre tornou-se
uma metáfora para os perigos
de reuniões de pessoas em épo-
ca de coronavírus, demonstran-
do quão rápido e silencioso um
vírus pode se espalhar, mesmo
entre senadores, diplomatas e a
pessoa mais poderosa do plane-
ta. / COM THE NEW YORK TIMES

T


anto faz, de certa forma,
quanta gente vai ou não vai
para a rua, ou quantas vezes
está disposta a ir no futuro mais
próximo. Além e acima de tudo isso,
há um fato que não muda: o Congres-
so Nacional e todo mundo que está
lá dentro formam hoje um dos gru-
pos de seres humanos mais odiados
do Brasil. Se fizessem uma “pesqui-
sa de opinião” perguntando ao brasi-
leiro qual o ambiente que ele respei-
ta mais – a penitenciária da Papuda
ou a dupla Câmara-Senado – qual
você acha, sinceramente, que seria a
opinião da maioria?

Melhor não fazer pesquisa nenhu-
ma, não é mesmo? A Papuda, na verda-
de, bem que poderia ser hoje a residên-
cia verdadeira de muitos dos nossos
parlamentares – levando-se em conta
que até setembro de 2019 cerca de 100
deputados, pelo menos, respondiam a
ações penais no STF.
É muito ruim para a democracia de
qualquer país que o Poder Legislativo
seja tão detestado como o brasileiro. É
muito pior, ainda, que os culpados dis-
so sejam os próprios deputados e sena-
dores, pelos atos que cometem e pela
conduta que exibem ao público. Não é
o “fascismo” que está sabotando o

Congresso, nem a direita – embora
existam, sim, grupos de extremistas
que querem acabar com a história toda
mandando para lá um cabo e dois solda-
dos. Mas essa turma jamais seria capaz
de derrubar um guarda noturno se ti-
vesse como alvo pessoas de bem.
É o caso? Não é – e não adianta fazer
de conta que é. A maioria da popula-
ção, hoje, iria aplaudir se a Câmara e o
Senado fossem fechados por um ato de
força, ou ficariam indiferentes. Uma
democracia assim está doente.

A verdade é que são eles mesmos
que construíram, tijolo por tijolo, a
sua imagem infame junto à maioria da
população. A mídia, os partidos, as en-
tidades que representam alguma coi-
sa, os sociólogos, etc. se levantam in-
dignados em defesa do Congresso.

Queriam o quê? Basta ver o que fazem,
no dia a dia da vida real, os deputados
e senadores. Não é só a questão crimi-
nal – estão sendo processados por pe-
culato, concussão, lavagem de dinhei-
ro, corrupção passiva e ativa, falsifica-
ção de documento. Conseguem, até
mesmo, ser acusados em ações penais
por trabalho escravo. Talvez pior que
isso seja a postura que, no entender
das pessoas, eles têm diante do inte-
resse público – sempre que veem algu-
ma chance, ficam contra. Escondem-
se atrás de crimes coletivos, no plená-
rio, para saquear o País.
Os congressistas brasileiros são,
eles mesmos, uma dificuldade quase
insuperável para quem, honestamen-
te, quer defender o Poder Legislativo.
Às vezes, até, nem merecem a imagem
que têm. Ainda no ano passado, por
exemplo, aprovaram a reforma da Pre-
vidência Social, uma obra que poucos
parlamentos do mundo fizeram até ho-
je. Mas isso já está esquecido – o que
interessa é o que o povo acha deles ago-

ra. E agora, além do passivo crimi-
nal, são vistos como inimigos de tu-
do o que o governo tenta fazer para
melhorar o País, e como bandidos
que agem o tempo todo contra as
mudanças que o Brasil precisa.
Nada pode ser considerado nor-
mal quando o presidente da Câmara
dos Deputados faz 250 viagens em
jatinhos da FAB durante o único ano
de 2019 – mesmo porque uma das
razões alegadas para isso é o fato de
que ele não pode andar em nenhum
meio de transporte público, para
não ser triturado por vaias. Temos,
aí, que o chefe da Casa do Povo não
pode chegar a um metro do povo.
É aceitável, uma coisa dessas?
Apesar de toda a sua mediocrida-
de, que sempre funciona como um
manto protetor para qualquer po-
lítico, os presidentes da Câmara e
do Senado estão hoje entre as pes-
soas mais abominadas do País.
Não dá para funcionar assim – com
ou sem gente na rua.

E-MAIL: [email protected]
J.R. GUZZO É JORNALISTA E ESCREVE
AOS DOMINGOS

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


Seis visitantes de Mar-a-Lago recebem resultado positivo para novo coronavírus; teste feito por presidente dos EUA ontem deu negativo


É muito ruim para a
democracia que o Poder
Legislativo seja tão detestado

Os mais odiados


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Como a matemática pode ajudar a entender (e combater) epidemias. Pág. A18}


ALAN SANTOS/PR–7/3/

Resort de Trump vira ponto de contágio


EUA. Trump, Bolsonaro, Wajngarten e Eduardo na Flórida
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