O Estado de São Paulo (2020-03-15)

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H2 Especial DOMINGO, 15 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Como reduzir o


custo psicológico


do isolamento


baixíssima de mortos, inferior à do novo corona-
vírus. Nos Estados Unidos, apenas 0,05% dos
casos anuais é fatal, segundo análise dos Cen-
tros de Controle e Prevenção de Doenças
(CDC). A gripe H1N1, pandêmica entre 2009 e
2010, também é menos letal, com taxa de 0,6%.






Por que, apesar de ser menos letal
que outras doenças, o novo coronaví-
rus é tão temido?
Para Raquel Muarrek, infectologista do Hospi-
tal e Maternidade São Luiz, o temor é grande
por ainda não haver vacina nem tratamento
específico para a infecção por covid-19. Os vá-
rios níveis de adaptação do vírus também são
responsáveis pela tensão global. Por fim, há
ainda o temor de sobrecarga dos sistemas de
saúde com a alta procura por atendimento.






Qual é a diferença na taxa de letalida-
de entre jovens e idosos?
Dos 10 aos 49 anos, a taxa varia en-
tre 0,2% e 0,4%, com salto para 1,3% nos pa-
cientes entre 50 e 59 anos. Na faixa etária en-
tre 60 e 69 anos, o índice é de 3,6%. O número
sobe para 8% em infectados de 70 a 79 anos e
chega a 15% entre os que têm mais de 80 anos.
Os dados são do Centro de Controle e Preven-
ção de Doenças da China.






E entre pessoas com doenças crôni-
cas e saudáveis?
A taxa de mortalidade é até nove
vezes maior entre pessoas com alguma doença
crônica quando comparada à de pacientes sem
patologia preexistente. Segundo dados do go-
verno chinês, no grupo de infectados que não
tinham nenhuma comorbidade, apenas 1,4%
morreu. Já entre os pacientes com alguma
doença cardiovascular, por exemplo, o índice
chegou a 13,2%.






Quais são os riscos para uma pessoa
com asma?
A infecção por coronavírus pode,
sim, desencadear um ataque de asma, segundo
fundação de estudos sobre a doença no Reino
Unido. A entidade recomenda uso de inalador
preventivo diário, como recomendado pelo
médico particular, para evitar riscos.


PREVENÇÃO






Como devo me proteger contra o coro-
navírus?
Medidas básicas de higiene devem
ser adotadas, como lavar as mãos com água e
sabão por 20 segundos com frequência, não
compartilhar objetos de uso pessoal, evitar to-
car em olhos, no nariz e na boca sem que as
mãos estejam higienizadas. É importante prote-
ger a boca e o nariz com o braço ou um lenço
descartável ao espirrar ou tossir. O Ministério
da Saúde também recomenda evitar viagens
sem necessidade.






Qual é a forma correta de lavar as
mãos?
O processo deve durar 20 segundos.
A recomendação é usar sabonete líquido e ini-
ciar esfregando as palmas das mãos. Depois, en-
trelace os dedos e lave as costas de uma mão
com a palma da outra. Esfregue o punho esquer-
do com a palma da mão direita em movimentos
circulares e vice-versa. Esfregue os dedos com as
mãos entrelaçadas. Esfregue a parte de trás dos
dedos na palma da outra mão. Gire uma mão
fechada sobre o polegar. Repetir na outra mão.
Esfregue os dedos de uma mão fechada sobre a
palma da outra mão. Enxágue as mãos. Seque
bem as mãos usando uma toalha de papel.






Qual é a forma correta de usar álcool
gel?
Se não houver água e sabão disponí-
veis, a saída, de acordo com a agência federal
de saúde dos EUA, é usar gel desinfetante que
contenha, pelo menos, 70% de álcool.






Lugares públicos deveriam oferecer
álcool em gel?
O risco de transmissão é majorita-
riamente respiratório. O uso do álcool em gel
é um complementar à lavagem das mãos para
uma higienização apropriada, feita para dimi-
nuir o risco de infecção. Porém, não há previ-


são em lei ou recomendação do governo brasi-
leiro nesse sentido.





Quem deve usar máscaras de prote-
ção?
Segundo a OMS, o uso de máscara
não é necessário em casos de pessoas que não
apresentam sintomas da doença, pois não há
evidências de que elas oferecem proteção. Ape-
nas pessoas com o sintoma da doença devem
utilizar a máscara, que só deve ser usada uma
vez.





É recomendável evitar aglomerações
e eventos fechados aqui no Brasil?
O Ministério da Saúde recomen-
dou na sexta-feira, dia 13, medidas mais restriti-
vas para evitar o avanço do novo coronavírus,
entre elas o cancelamento de eventos com

aglomerações e o isolamento por sete dias de
todas as pessoas que chegam de viagens inter-
nacionais, mesmo sem sintomas.





Eventos ao ar livre são menos perigo-
sos ou não faz diferença?
Embora os estudos indiquem que
a doença não é transmitida pelo ar, é possível
contrair o novo coronavírus em locais com
aglomeração de pessoas, tendo em vista a pos-
sibilidade de contato com as gotículas de sali-
va de uma pessoa infectada, mas o risco é
maior em locais fechados.





Não viajei nem me encontrei com via-
jantes, mas tenho sintomas da doen-
ça. Quando me preocupar?
De acordo com o Ministério da Saúde, são con-
siderados casos suspeitos os de viajantes que

apresentaram ao menos um sintoma respirató-
rio – como febre, tosse, coriza e dificuldade
para respirar – e de pessoas que tiveram conta-
to com casos suspeitos. O contato domiciliar
com uma pessoa infectada é caracterizado co-
mo caso provável da doença. O caso é confir-
mado por exames laboratoriais ou por critério
clínico-epidemiológico.





Há um caso suspeito no meu trabalho,
o que fazer?
Caso um profissional apresente
sintomas após participar de reuniões ou even-
tos no trabalho, a orientação da OMS é identifi-
car uma sala ou outro local em que essa pes-
soa possa ficar isolada e estabelecer uma for-
ma segura de transportá-la para um serviço de
saúde. A empresa deve guardar os nomes dos
participantes dos eventos por, ao menos, um

Fernando Reinach

O


aumento dos casos da covid-19 tem
forçado os países a implementar me-
didas que aumentam a distância físi-
ca e diminuem o contato entre pessoas. Na
China, as pessoas deixaram de ir ao traba-
lho, as escolas fecharam, os eventos que en-
volvem aglomerações foram cancelados e a
liberdade de ir e vir foi restrita. O mesmo
está ocorrendo na Itália. Outros países es-
tão tomando medidas semelhantes. Sepa-
rando as pessoas, fica mais difícil de o vírus
se espalhar e o número de casos por dia di-
minui, o que retarda a pandemia. E, mais
importante, diminui a sobrecarga no siste-

ma de saúde. O surto dura mais tempo,
mas é menos intenso e as pessoas têm mais
chances de serem tratadas adequadamente.
Temos de nos preparar para a possibilidade
de termos nossa liberdade de ir e vir restri-
ta nas próximas semanas ou meses.
O problema é que somos animais so-
ciais. Estamos acostumados a viver em gru-
pos, a interagir com familiares e amigos.
Por esse motivo, ficar trancado em casa
durante semanas deixa qualquer um louco.
Na verdade, pouquíssimas pessoas ficam
realmente loucas no sentido médico do ter-
mo. E, graças à ciência, existem muitos es-
tudos sobre o custo psicológico de uma
quarentena. O respeitado jornal The Lan-
cet publicou uma revisão da literatura cien-
tífica sobre o estado emocional das pes-
soas durante e após o isolamento (The Psy-
cological Impact of Quarentine and How to
Deduce It: Rapid Review of the Evidence).
A base de dados do jornal apontou inicial-
mente 3.166 artigos sobre o assunto. Exclu-
indo-se as duplicatas, havia um total de
2.900 trabalhos – 2.848 foram considerados

irrelevantes. Cinquenta e dois estudos pas-
saram por avaliação cuidadosa e o que se-
gue são os resultados reportados nos 24 tra-
balhos incluídos na revisão. As populações
estudadas incluem médicos infectados, po-
pulações do Canadá, de Taiwan, do Sene-
gal, de Hong Kong, da China e de outros
países que sofreram com a epidemia de
Sars, ebola, Mers e outras doenças.
Vários impactos foram detectados durante
o isolamento: depressão, estresse, mau hu-
mor, irritabilidade, insônia, estresse pós-trau-
mático, raiva e exaustão emocional. Esses
são os sintomas com maior prevalência. No
caso de pessoas isoladas por Sars e Mers,
20% ficaram com medo, 10% com sentimen-
to de culpa e 18% com tristeza. Também hou-
ve pessoas com sentimentos positivos, 4% se
sentiram aliviados e 5%, felizes.
Após a quarentena, os sintomas persisti-
ram em muitas pessoas por meses. Em al-
guns médicos e enfermeiras, o medo de
doenças não desapareceu. Os estudos de-
monstraram que pessoas jovens (16 a 24
anos), de baixa educação e mulheres têm

maior suscetibilidade. Ter filhos parece
diminuir as chances de sofrimento.
Foram também identificadas as razões
para esses distúrbios: medo de ser infecta-
do, frustração e tédio, falta de suprimen-
tos e de informação. Depois da quarente-
na, as preocupações financeiras e o estig-
ma de ter sido isolado são as razões mais
frequentes para os sintomas. Os estudos
recomendam o que pode ser feito para ali-
viar os efeitos: manter a quarentena tão cur-
ta quanto possível, garantir informação e
suprimento de comida, reduzir o tédio com
ajuda de meios digitais e comunicação.
A conclusão é que a quarentena tem efeitos
psicológicos muito diversos e de longa duração.
Como muito provavelmente a maioria de
nós vai passar por um período de isolamen-
to total ou parcial, é bom saber que os sen-
timentos fazem parte da resposta normal
dos seres humanos. Esse conhecimento
talvez nos ajude a enfrentar com mais cora-
gem esse transtorno. Cabe ao governo le-
var em conta esses achados ao organizar o
distanciamento social ou as quarentenas.

ESPECIAL CORONAVÍRUS IMPACTO NA SAÚDE


Sem gente. Pessoa caminha por rua totalmente vazia em Xangai, na China, no começo de
fevereiro. Casos no país, que é o epicentro da epidemia, baixaram para menos de 50 novos por dia
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