O Estado de São Paulo (2020-03-15)

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O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 15 DE MARÇO DE 2020 Especial H11


Indústria vai


sofrer e a cultura


digital, florescer


tro de Estudos Monetários do Ibre/FGV, Jo-
sé Júlio Senna. No entanto, moedas de paí-
ses que são muito dependentes das exporta-
ções de commodities (matérias-primas bru-
tas) tendem a ser as mais afetadas. Isso por-
que a desaceleração da economia no mundo
deve levar a uma forte queda no preço des-
ses produtos. Grande compradora de com-
modities, a China está reduzindo o volume
de encomendas, o que tem derrubado as co-

tações. A contrapartida de uma queda dos
preços em dólar das matérias-primas é a de-
preciação da moeda dos países exportadores
desses produtos porque eles vendem menos
em dólar. Além do enfraquecimento nas ex-
portações de commodities, outro fator, apon-
tado por Senna, que aumenta a depreciação
da moeda local de um país neste momento é
o baixo crescimento da economia. “Investi-
dores internacionais têm influência muito

grande sobre a formação da taxa de câmbio e
não gostam de países que crescem pouco. E
o Brasil está nesse grupo”, diz.





O que eu faço com os meus investimen-
tos em Bolsa?
Especialistas indicam que em mo-
mentos de pânico no mercado o investidor evi-
te tomar decisões. “É um momento de desespe-
ro e, infelizmente, a recomendação é: não faça

nada. Qualquer atitude desesperada, como ten-
tar se livrar das ações, vai resultar em perda”,
diz o professor de finanças e colunista do Esta-
dão Fábio Gallo.





Quais setores da Bolsa podem se
beneficiar?
Especialistas afirmam que, duran-
te a crise e as quedas generalizadas, a aversão
a risco no mercado é geral. “Em momentos de

Pedro Doria

E


sta nova cepa de coronavírus está
amarrada de nascença com a indús-
tria da tecnologia. Surgiu em Wu-
han, na China, capital de sua indústria au-
tomotiva e a duas horas de trem de Shenz-
hen, o Vale do Silício asiático. De lá, espa-
lhou-se para a Coreia do Sul, para o norte
da Itália e entrou nos EUA pelo norte da
Califórnia e Estado de Washington. Milão
é um dos centros europeus da ótica, e len-
tes são indispensáveis na telefonia celular.
Da Coreia do Sul vem a Samsung, maior
fabricante de smartphones Android. No
norte da Califórnia estão Apple, Facebook,

Google e tantas outras — o Vale do Silício
original. E, em Washington, Microsoft e
Amazon. O digital é o marco zero da epide-
mia mundial. Este 2020 já é, para a indús-
tria, um ano essencialmente perdido.
A produção de tecnologia depende de via-
gens. Novos aparelhos nascem a partir do
encontro de quem os desenha, não raro na
Califórnia, com quem os fabrica. Encon-
tros físicos. Há novos materiais para testar
e linhas de montagem para organizar,
além de contratos complexos para deba-
ter. Não dá para resolver por Skype — a
ponte-aérea São Francisco-Shenzhen é a
alma de três quartos dos aparelhos que car-
regamos conosco.
O Vale do Silício congelou. Desde segun-
da-feira, dia 9, Stanford, a universidade
que ocupa seu centro intelectual, está fe-
chada. O belo câmpus arborizado que por
lá apelidaram de “a fazenda”, deserto. Au-
las, só via internet. Google e Facebook can-
celaram seus eventos do primeiro semes-
tre. A Apple já enfrenta atraso com o suces-
sor do iPhone barato, modelo SE.

Estes encontros que o Vale organiza no
primeiro semestre são fundamentais para
a indústria. Vem gente de todos os cantos,
em sua maioria técnicos, para conhecer os
lançamentos que virão no segundo semes-
tre. É com base nestas informações que
apps e apetrechos para os novos celulares,
tablets e computadores são desenvolvidos.
Ou seja: os aparelhos que chegarão em
2020, além de atrasos na fabricação, terão
menos acessórios.
Não há como medir o tamanho do atra-
so, mas esta é uma indústria que depende
de viagens para criar — em todas as fases
dos produtos. Se a epidemia se estender
até junho, até haverá produtos novos, mas
muito do que poderia ser desenvolvido pa-
ra as linhas de 2021 e 2022, que estão sen-
do encaradas agora, não vai acontecer.
O problema não é só com a indústria
americana. A China planejava encerrar
2020 com todas as cidades de mais de 1 mi-
lhão de habitantes com infraestrutura para
5G. Queria chegar na frente de todos. Não
conseguirá. Vai faltar mão de obra e, princi-

palmente, equipamento. A maioria das
fábricas opera bem abaixo da capacidade.
E, neste caso, se falta equipamento à Chi-
na, faltará também para o resto do mundo.
O 5G chegará com atraso para todos.
Mas nem tudo é perda ou atraso. Porque,
se do ponto de vista dos produtos os meses
perdidos terão impacto real, para a cultura
digital pode ser diferente. Não é só Stan-
ford que promove em quantidade massiva
aulas online. Muitas das grandes universi-
dades americanas estão fazendo o mesmo.
É uma experiência em escala que vai testar
servidores e software, educar alunos e pro-
fessores, e daí sairá um resultado rico.
O mesmo ocorre com as muitas empre-
sas que, por precaução inevitável, manda-
rão seus funcionários para casa. Se sempre
houve conservadorismo para lidar com a
ideia de trabalho remoto, esta é também
uma experiência de larga escala que, no
fim, deixará muito conhecimento. Vanta-
gens e desvantagens serão descobertas e
sistemas, adaptados. A indústria digital vai
sofrer. E a cultura digital, florescer.

ESPECIAL CORONAVÍRUS IMPACTO NA TECNOLOGIA


CLAUDIO FURLAN/AP

Sem turistas nem moradores. Homem usando traje completo de proteção desinfeta praça na frente da estação de trem
de Milão, na Itália, segundo país com mais casos da doença no mundo, atrás apenas da China
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