O Estado de São Paulo (2020-03-16)

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A14 Esportes SEGUNDA-FEIRA, 16 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


MAURO CEZAR


PEREIRA


I


ntervalo de jogo no Morumbi, o
Santos derrotava o São Paulo
por 1 a 0, gol assinalado na pri-
meira finalização do time santista,
que arrematara um par de vezes nos
primeiros 45 minutos contra 11 do
mandante. Os tricolores eram, mais
uma vez, castigados pela inoperân-
cia ofensiva, uma equipe que cria si-
tuações de perigo para o adversário,
mas desperdiça chances em quanti-
dades industriais.
Quando os times voltaram ao gra-
mado do Morumbi sem público, os
santistas tinham 10 homens – Job-
son foi expulso no finalzinho da pri-

meira etapa. Já os são-paulinos não
contavam mais com um dos zagueiros,
Bruno Alves, substituído por um ata-
cante, Pablo, que em 22 minutos fez os
dois gols da virada.
Fernando Diniz já havia feito algo se-
melhante na derrota para o Santo An-
dré, quando Anderson Martins deu lu-
gar a Éverton. O time atacou mais, con-
tudo, perdeu.
Em comum a coragem do treinador
para fazer algo inimaginável sob a batu-
ta de outros técnicos brasileiros. Diniz
acerta e erra, é evidente, como todos
está sujeito a equívocos, mas foge do
padrão por não ter medo de arriscar.

No ano passado, ainda no Fluminense,
tirou os dois zagueiros para buscar a
reação e o empate com o Cruzeiro,
mesmo atuando fora de casa.
No clássico do sábado, além de am-
pliar o volume de jogo, encher a área
santista de jogadores e criar ainda
mais oportunidades, o São Paulo prati-
camente não concedeu chances ao San-
tos na etapa complementar. A única
foi de Carlos Sánchez, mas o uruguaio
não conseguiu dominar a bola dentro
da área tricolor. Hoje, entre os quatro
times grandes de São Paulo, o de Diniz
é o que melhor joga.

A situação seria outra, não fossem os
incríveis gols perdidos, problema que
persiste desde o começo do ano passa-
do, e já existia com seus antecessores,
André Jardine, Vagner Mancini e Cu-

ca. Desde 2019 os tricolores têm um
dos piores ataques entre os times da
primeira divisão nacional. Na Série A
passada, apenas os sete últimos coloca-
dos apresentaram ataques inferiores.
Fernando Diniz faz seu melhor traba-
lho, tendo nas mãos o elenco mais qua-
lificado já dado a ele. Fosse um meda-
lhão da velha-guarda tirando um za-
gueiro para colocar um atacante e virar
o jogo, não faltariam amigos na mídia a
exaltar o arrojo do “professor”. A má
vontade de alguns com o atual técnico
do São Paulo é inversa à tolerância
com profissionais marcados pela obso-
lescência, que vivem do passado.
Falando nisso, o Footstats mostra
que o Palmeiras acertou apenas 49 dos
279 cruzamentos que tentou em 2020.
É o pior índice de acertos em tal funda-
mento (17,5%) entre todos os times
que disputarão a Série A do Brasilei-
rão. Momentos antes de rolar a pelota
para São Paulo 2 x 1 Santos, o elenco
mais caro do Estado empatava melan-
colicamente com a Internacional, em

Limeira: 0 a 0.
E a exemplo dos tricolores, os pal-
meirenses jogaram muito tempo
com 11 contra 10, já que o time do
interior teve Aírton expulso aos se-
te minutos do segundo tempo.
A insistência de Vanderlei Luxem-
burgo com o quarteto de atacantes
(Willian, Dudu, Luís Adriano e
Rony), sem que o time apresente jo-
go coletivo que sustente tal reunião,
sabota as possibilidades de desen-
volvimento.
O tempo passa, o São Paulo avan-
ça, mas corre riscos de eliminação
na Libertadores por estar em um
grupo difícil. Já o Palmeiras segue
estagnado, contudo, dificilmente
não avançará na competição inter-
nacional, pois sua chave é a mais
fácil entre as que têm times brasilei-
ros. Quem olhar a tabela de classifi-
cação sem prestar atenção com o
que se passa no campo deverá se sur-
preender quando o coronavírus per-
mitir a bola novamente em jogo.

Gonçalo Junior


O sonho do estudante Ronald
Nascimento é ser um jogador
profissional de League of Le-
gends, game que deixa aluci-
nados oito milhões de pes-
soas por dia e simboliza o
crescimento do mercado de
e-sports no mundo. Morador
da comunidade de Parada de
Lucas, ao lado de Vigário Ge-
ral, na zona norte do Rio, o
menino de 18 anos tem um
obstáculo para transformar
seu desempenho virtual em
trabalho com carteira assina-
da. O investimento inicial pa-
ra montar uma estação de jo-
go, formada por computador,
mesa, cadeira e periféricos,
oscila de R$ 7 mil a 18 mil.

Os bicos que ele faz como ser-
vente de pedreiro com o avô ser-
vem apenas para ajudar a mãe, a
cozinheira Patrícia Luana, a sus-
tentar os cinco irmãos. Ele não
tem computador, e o celular foi
furtado. A saída que Ronald en-
controu para jogar Lol, o apeli-
do de League of Legends, foi se
inscrever no Afrogames, o pri-
meiro centro de treinamento
de jogos eletrônicos localizado
em uma favela no Brasil. Gratui-
to, o curso foi criado para tentar
democratizar e popularizar a
prática dos e-sports. Depois de


um ano de sucesso, o centro di-
minuiu muito o ritmo por falta
de recursos e agora busca patro-
cinadores para voltar a funcio-
nar plenamente. Isso atrapa-
lhou o sonho de Ronald.
O Afrogames é fruto de uma
parceria entre os empresários
José Junior, fundador do Afro-
Reggae, instituição que promo-
ve a inclusão por meio da arte,
da cultura afro-brasileira e da
educação, e Ricardo Chantilly,
empresário da área de entreteni-

mento responsável pelas carrei-
ras de bandas como Jota Quest
e O Rappa. No ano passado, o
projeto começou com força.
Cem adolescentes tinham à
disposição 20 computadores
para jogar o próprio Lol e tam-
bém estudar trilha sonora e pro-
gramação de computadores pa-
ra games. Todos tinham aulas
de inglês, ganhavam lanches e
vestiam uniformes. O projeto
contava com o apoio da Secreta-
ria de Cultura e Economia Cria-
tiva do Estado do Rio de Janeiro
e da empresa de telefonia Oi,
para infraestrutura de conexão
com internet. O programa exi-
gia que o jovem, de 12 a 18 anos,
estudasse na rede pública.
Por causa da crise econômi-
ca, os investidores não renova-
ram o patrocínio no início do
ano. As aulas, antes de segunda
a sexta-feira, hoje só aconte-
cem uma vez por semana.
Os meninos e os organizado-
res acreditam na retomada.
Chantilly afirma estar perto de
assinar um contrato com uma
empresa de bebidas. A ideia se-
ria formar um time do projeto
para disputar as fases qualifica-
tórias do Circuito Desafiante, a
segunda divisão de LoL no Bra-
sil. Os participantes vão contar
com a supervisão técnica da
INTZ, uma das mais importan-

tes equipes do País. Os jogado-
res teriam ajuda de custo de um
salário mínimo, uma espécie de
bolsa para treinar. “Um traba-
lho remunerado na área de e-
sports teria um grande impacto
na comunidade”, diz Chantilly.
O Índice de Desenvolvimen-
to Humano (IDH) de Vigário
Geral é de 0,763, o 107.º coloca-
do entre 126 regiões do Rio de

Janeiro. Um dos principais pro-
blemas é a segurança pública.
“Às vezes, a comunidade é tran-
quila. Às vezes não tem nin-
guém na rua. Qualquer coisa a
polícia já quer enquadrar. Fora
isso, é um lugar bom”, diz Da-
niel Felipe, que ganhou o apeli-
do de Messi, obviamente por
causa de sua habilidade no fute-
bol de verdade. “Melhor ficar

aqui (jogando games) do que fi-
car na rua vendo coisa errada. A
parada é complicada. Só quem
está aqui dentro dá para ver a
realidade que a gente vive”, diz
o menino de 18 anos.
Além de se tornar um jogador
mais habilidoso, Messi apren-
deu um pouco de inglês, a jogar
em equipe, deixando de lado a
individualidade, e também “vá-
rias paradas maneiras”.
Marcio Canosa, diretor de e-
sports da desenvolvedora de jo-
gos Ubisoft, diz que os brasilei-
ros são disputados por equipes
estrangeiras. No Rainbow Six
Siege, a alta qualidade dos atle-
tas profissionais do País e o ca-
lendário estruturado fizeram
com que grandes organizações
estrangeiras investissem na
contratação de equipes inteira-
mente formadas por jogadores
daqui. “É como se Barcelona e
Real Madrid decidissem contra-
tar um elenco formado apenas
por brasileiros para jogar o Bra-
sileirão e a Libertadores.”

No Brasil, a audiência dos e-
sports cresceu 20% no ano pas-
sado, com 21,2 milhões de espec-
tadores. O número abrange 9,


milhões de entusiastas, aqueles
que assistem a pelo menos uma
partida por mês, e 12 milhões de
espectadores ocasionais. O
País é a terceira maior audiên-
cia no mundo, atrás da China e
dos Estados Unidos. A receita é
de R$ 1,5 bilhão por ano.
No mundo, a receita deve su-
perar US$ 1 bilhão (R$ 4,8 bi-
lhões) em 2020, de acordo com
pesquisa recente da Newzoo.

“Quase três quartos dessa recei-
ta vêm de patrocinadores e di-
reitos de transmissão, o que
mostra a relevância dos espor-
tes eletrônicos para o público,
veículos de mídia, tradicionais
ou de streaming, e grandes mar-
cas, que enxergam o potencial
do negócio”, avalia Marcio Ca-
nosa, diretor de e-sports da de-
senvolvedora de jogos Ubisoft.
A pandemia de coronavírus

também vai trazer impactos ne-
gativos para o segmento na opi-
nião de Bruno Maia, CEO da
Agência de Conteúdo 14 e espe-
cialista em negócios e novas tec-
nologias no esporte.
“O coronavírus deve ter um
impacto inevitável nos eventos,
que são muito importantes pa-
ra a disseminação da cultura e
consagração deste produto no
calendário brasileiro. Por um la-
do, as quarentenas podem in-
centivar a venda de jogos e con-
soles, mas esse tipo de situação
também atrapalha para o pro-
cesso de solidificação dos e-

sports”, avalia Maia.
O mercado brasileiro ainda
possui outro entrave: a falta de
regulamentação. O projeto de
lei nº 383/2017, específico para
o setor, foi discutido com sena-
dores e representantes do es-
porte eletrônico por meio de au-
diências públicas. Está em tra-

mitação no Congresso à espera
da audiência da Comissão de As-
suntos Econômicos (CAE) do
Senado. No final do ano passa-
do, o governador de São Paulo,
João Doria, vetou um projeto
de lei estadual sobre o tema. Ho-
je, a lei que regulamenta os es-
portes eletrônicos no País é a
Lei Pelé, válida para todos os es-
portes.
André Feher, advogado espe-
cialista no tema e integrante do
CSMV Advogados, afirma que o
projeto tem falhas. “Os proje-
tos de lei se omitem na aborda-
gem de pontos realmente caren-
tes de um posicionamento legal
no cenário dos e-sports no Bra-
sil, caso de celebração de contra-
tos com atletas menores de ida-
de, o registro de atletas junto às
organizações”, afirma Feher.
“Além disso, outras questões
como a contagem de jornada de
trabalho e horas extras do fato
de os atletas morarem, trabalha-
rem e treinarem em um imóvel
comunitário, as gaming houses,
também precisariam ter sido
abordadas. Pautas como o do-
ping, implantação de Tribunais
de Justiça Desportiva e câmaras
de resolução de conflitos, aos
moldes, mas não idênticos,
àqueles que existem em outras
modalidades, também são ou-
tras notórias ausências no tex-
to”, afirma o especialista. / G.Jr.

lO jogo League of Legends, ensi-
nado e praticado no centro de
treinamento Afrogames, é um
dos mais populares entre vários
títulos criados por empresas pri-
vadas (publishers) no mundo to-
do. Ele foi criado pela Riot Ga-
mes e a empresa tem estimados
100 milhões de jogadores ativos
espalhados pelo planeta. Outros
games relevantes são Free Fire
(Garena), Counter Strike Global
Offensive (Valve), Rainbow Six
(Ubisoft), Overwatch (Blizzard) e
o Fifa (EA Sports).

E-MAIL: [email protected]
INSTAGRAM: @maurocezar
TWITTER: @maurocezar

Da coragem ao obsoleto


Centro de e-sports


procura apoio


para se manter


LOL é um dos games
mais populares

Diniz acerta e erra, é evidente,
mas foge do padrão por
não ter medo de arriscar

CONSELHO
SANTOS DELIBERATIVO
FUTEBOL CLUBE
CNPJ: 58.196.684/0001-

COMUNICADO
Em virtude de medidas já adotadas em âmbito nacional e internacional devido ao novo
Coronavírus (Covid-19), com recomendações expressas para cancelar ou adiar eventos
para reduzir possíveis contaminações em espaços de aglomeração de pessoas e da
disseminação da doença em nosso País, diante de muitos pedidos de conselheiras e
conselheiros, está suspensa a reunião extraordinária do Egrégio Conselho Deliberativo
do Santos Futebol Clube programada para o dia 16 de março de 2020, de forma a
prevenir a evolução do vírus em nossa Região.
Mesa do Conselho Deliberativo Santos Futebol Clube

INTERESSE

Oportunidade. Projeto em Vigário Geral dá chance de ascensão a jovens de baixa renda

Inclusão. Projeto na favela de Vigário Geral, no Rio, começou


no ano passado, mas agora sofre com a crise e busca patrocínio


Receita com os jogos no País é de R$ 1,5 bi


Audiência apresentou


crescimento de 20% nos


e-sports no ano passado


no Brasil, que só fica


atrás da China e dos EUA


Sonho. Jovens querem virar jogadores profissionais de Lol

21,2 milhões
de espectadores foi a audiência
dos e-sports no Brasil em 2019;
9,2 milhões deles assistiram a
pelo menos um jogo por mês

FOTOS: WILTON JUNIOR/ESTADÃO – 05/03/
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