O Estado de São Paulo (2020-03-16)

(Antfer) #1

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A4 SEGUNDA-FEIRA, 16 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


COLUNA DO


ESTADÃO


Política


»Vixe! “Ninguém mais do
que Ronaldo Caiado enfren-
tou as esquerdas no Brasil”,
disse o próprio a manifes-
tantes, ressaltando que era
um dos poucos a apoiar Bol-
sonaro. Terminou vaiado
por uma minoria radical.

»Questão... Um bom ana-
lista político acha que Bol-
sonaro dividiu sua base po-
pular entre quem tem bom
senso e quem não tem ao
bancar as manifestações no
meio da crise de saúde.

»de bom senso. Segundo
ele, a classe média não gos-
ta de ser pintada de radical
e a fatura pode chegar em
breve ao presidente.

»Para lembrar. Não é a
primeira vez que a base bol-
sonarista se divide. A pri-
meira foi na indicação do
filho Eduardo para a embai-
xada do Brasil em Washing-
ton (EUA). Nesse episódio,
o presidente teve de recuar.

»Vai... Cresceu no final de
semana a indignação de par-
lamentares de vários parti-
dos com a decisão do minis-
tro Bruno Dantas, do TCU,
de suspender a ampliação
do Benefício de Prestação
Continuada (BPC) a idosos
e a pessoas com deficiência
de baixa renda.

»...complicar. Mesmo
quem votou pela manuten-
ção do veto (ou seja, contra
o espeto de R$ 20 bilhões
nas contas públicas), vê pro-
blemas: “Um membro de
um órgão auxiliar do Legis-
lativo suspender uma deci-
são do Congresso, por maio-
ria qualificada, é inaceitável
e exige reação”, diz Marce-
lo Ramos (PL-AM).

»E agora? A decisão no
TCU ocorreu justamente
quando líderes do Congres-
so tentavam esfriar os âni-
mos e desarmar novas bom-
bas a serem plantadas na
relação com o Executivo.

»O que temos.... Preocupa-
dos com o desgaste da rela-
ção entre as Executivo e
Legislativo, diplomatas es-
trangeiros intensificaram as
conversas com parlamenta-
res para entender o impac-
to que o covid-19 pode ter
na economia brasileira e no
andamento do Congresso.

»...para hoje. A busca por
informações com deputa-
dos e senadores tem por
trás a falta de acesso dos
diplomatas a representan-
tes ao governo: a boa inter-
locução com o Itamaraty,
como havia em outros mo-
mentos, já era, relatam os
parlamentares procurados.

»Superstar. O cineasta
Bruno Barreto fará docu-
mentário sobre o ex-presi-
dente Michel Temer
(MDB) e seu legado. Inicial-
mente, ele havia pensado
em uma longa entrevista,
mas achou que o formato
poderia soar arrastado.

»Mudança. Daniel José as-
sume hoje a liderança do
Novo na Assembleia-SP.
Economista, especialista
em educação e mestre em
relações internacionais em
Yale (EUA), é autor do pro-
jeto do ICMS educacional,
em tramitação na Casa, que
atrela maior repasse ao de-
sempenho escolar.

COM MARIANA HAUBERT E
MARIANNA HOLANDA.

A


reação de Ronaldo Caiado (DEM-GO) mostra, se-
gundo analistas, que até na base conservadora a ati-
tude de Jair Bolsonaro, de apoio explícito aos atos,
foi repudiada. Em redes privadas, líderes se indignaram
com a presença do presidente ao lado dos que deixaram
suas casas, desafiando recomendações da Saúde, para ata-
car instituições. Segundo participantes das conversas, pe-
la primeira vez surge um sentimento suprapartidário de
que o presidente precisa de freio por escolher a minoria
ultrarradical em detrimento da maioria dos brasileiros.

Bolsonaro escolhe o


lado dos ultrarradicais


ALBERTO BOMBIG
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KLEBER SALES/ESTADÃO

Eduardo Bolsonaro
estreita laços com a

extrema direita. Pág.A


Nos EUA


Bolsonaro ignora vírus e


vai a ato contra Congresso


Ruas. Presidente contraria médicos, deixa isolamento e tem contato direto com ao menos


272 pessoas; na visão de infectologistas, ele deu mau exemplo no combate à pandemia


BRASÍLIA
SÃO PAULO

Ao participar por mais de
duas horas de um ato a favor
do seu governo e com críticas
ao Congresso e ao Supremo
Tribunal Federal (STF) on-
tem à tarde, o presidente Jair
Bolsonaro ignorou a orienta-
ção de sua equipe médica e as
diretrizes do Ministério da
Saúde para o combate ao co-
ronavírus. Bolsonaro deixou
o isolamento que deveria fa-
zer por ter se encontrado, se-
mana passada, com ao menos
11 brasileiros que já tem a
doença (mais informações na
pág. A7) e cumprimentou cen-
tenas de apoiadores em fren-
te ao Palácio do Planalto. A
atitude foi criticada por po-
líticos e médicos, que classifi-
caram a atitude como um
mau exemplo à população.
Análise feita pelo Estado a
partir da filmagem da participa-
ção do presidente no ato mos-
tra que ele teve contato físico
com 272 pessoas em cerca de 58
minutos de interação na frente
do palácio. Bolsonaro manu-
seou ao menos 128 celulares,
trocou ao menos quatro obje-
tos com a plateia, entre eles um
boné, que vestiu, e cumprimen-
tou 140 pessoas, segundo levan-
tamento do Estado. Ele chegou
a colar o rosto ao de outras pes-
soas para fazer fotos.
Infectologistas e até aliados
próximos de Bolsonaro reprova-
ram a atitude. Segundo especia-
listas em doenças infecciosas, o
presidente errou ao ignorar a re-
comendação de isolamento e
expor os manifestantes ao risco
de contaminação pela covid-

(caso esteja com o vírus incuba-
do); ao não proteger a si próprio
e ter contato com uma aglome-
ração que pode incluir pessoas
infectadas; e ao não dar o exem-
plo à população de que deve ser
levada a sério a orientação feita
pelo Ministério da Saúde para
que se evite aglomerações.
“As pessoas públicas, autori-
dades, profissionais de saúde
têm que dar o exemplo para a
população. Temos que manter
a coerência. Com esse tipo de
atitude (do presidente) , fica mais
difícil a população aderir e acre-
ditar que é algo que deve ser le-
vado a sério”, afirmou Nancy
Bellei, professora de infectolo-
gia da Universidade Federal de
São Paulo (Unifesp) (mais infor-
mação na pág. A6).
Segundo especialistas, não é
só o contato direto que transmi-
te o coronavírus. Gotículas de
saliva de uma pessoa infectada
também podem passar o vírus.
Para o epidemiologista Eliseu
Waldman, da Faculdade de Saú-
de Pública da Universidade de
São Paulo, a conduta de Bolso-
naro entrou em conflito com as
recomendações das autorida-
des sanitárias. “O Ministério da
Saúde fala uma coisa e o presi-
dente, não com palavras, mas
com atos, fala outra", disse ele.
No fim da tarde, o Ministério
da Saúde voltou a orientar que
sejam evitadas aglomerações e
contatos próximos. “A reco-
mendação vale para manifesta-
ções, shows, cultos e encon-
tros, entre outras atividades”,
informou a pasta. O ministro
Luiz Henrique Mandetta disse
ao canal CNN Brasil que partici-
par de aglomerações “é comple-
tamente equivocado”.

De acordo com o infectologis-
ta Celso Granato, professor da
Unifesp e diretor médico do
Grupo Fleury, o correto seria
Bolsonaro manter o isolamen-
to por 14 dias desde o último
contato que teve com um caso
confirmado. “Pegar celular e ou-
tros objetos pode deixar uma
‘impressão digital com o vírus’.
É um risco em potencial.”

Políticos. Além das críticas

por desrespeito às diretrizes de
combate a uma doença que se
espalhou mundialmente, Bolso-
naro também foi atacado por
ter participado de manifesta-
ções que atacam o Parlamento.
Enquanto o presidente cumpri-
mentava simpatizantes em fren-
te ao Palácio do Planalto, mani-
festantes gritavam “Fora
Maia”. Um deles chegou a pedir
que o Bolsonaro fechasse o Con-
gresso. Era possível ouvir tam-
bém ouvir gritos contra o presi-
dente do STF, Dias Toffoli.
O presidente do Congresso,
senador Davi Alcolumbre
(DEM-AP) classificou o com-
portamento do presidente co-
mo “inconsequente”, um “con-
fronto” à democracia.
O presidente da Câmara, Ro-
drigo Maia (DEM-RJ), afirmou
que Bolsonaro deveria estar
“coordenando um gabinete de
crise para dar respostas e solu-
ções para o País”, em vez de ir
ao protesto (mais informações
na pág. A6).
No fim do dia, o presidente
comentou o assunto em uma en-
trevista à CNN Brasil. Ele cha-
mou de “extremismo” e “histe-
ria” medidas adotadas diante
da pandemia do coronavírus,
que no Brasil já havia infectado
200 pessoas até o início da noi-
te. “Porque não vai, no meu en-
tender, conter a expansão desta
forma muito rígida. Devemos
tomar providências porque po-
de, sim, transformar em uma
questão bastante grave a ques-
tão do vírus no Brasil, mas sem
histeria”, opinou o presidente. /
BRUNO NOMURA, CAMILA TURTELLI,
DANIEL WETERMAN, FABIANA
CAMBRICOLI, GUSTAVO PORTO,
JUSSARA SOARES e MATEUS VARGAS

Janaina Paschoal

H


á tempos o Brasil não assiste, à luz do sol, a uma ir-
responsabilidade como a do presidente da Repúbli-
ca, que jogou para o alto as recomendações de saú-
de e se encontrou com manifestantes em frente ao Planal-
to. Em nova versão da “fantasia”, Jair Bolsonaro passou
para a população a mensagem de danem-se o Ministério
da Saúde, os especialistas, os médicos!
Entre o correto e o conveniente politicamente, Bolsonaro op-
tou pela conveniência política, o que se torna ainda mais irres-
ponsável quando a epidemia está só começando no País e, ao la-
do dele, estava o diretor substituto da própria Anvisa. Chocante.
Paulo Guedes defende reformas, mas Bolsonaro senta
em cima das propostas e publica fotos justamente com fai-
xas de “Fora Maia” nas manifestações. E o ministro Luiz

Henrique Mandetta tenta evitar mortes e contaminação e
adverte que em pessoas acima de 60 anos a covid-19 é mais
letal e todos que tiveram contato com contaminados de-
vem se preservar – e preservar os outros –, mas o que faz
Bolsonaro? Vai à rua, toca pessoas e seus celulares.
É contra a ciência, os deveres do cargo, os direitos dos cida-
dãos. E danem-se as pessoas que, ingenuamente, foram colo-
cadas em risco por quem ainda é sujeito a um segundo teste e
tem recomendação de isolamento, depois de dias ao lado de
contaminados. Mas Bolsonaro não foi o único irresponsável.
Nas manifestações do “Fora Maia”, “Fora STF” e “SOS
Forças Armadas”, tudo foi grave: o ataque às instituições,
o uso do nome das FFAA em vão e o risco em que aquelas
pessoas se colocavam e colocarão as outras, todas as ou-
tras. Não viram China, Itália, EUA? Acreditam na versão
de Bolsonaro de que tudo era fantasia? Não é fantasia. É
um pesadelo, questão de vida ou morte.

»SINAIS
PARTICULARES.
Michel Temer,
ex-presidente da
República

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


BOMBOU NAS REDES!

Diretor da Anvisa


vai com presidente


à manifestação


Brincadeira de vida ou morte


Parlamentares e médicos criticam atitude de presidente. Pág. A6 }

“Em momentos de crise, vemos a diferença que faz
a cultura. Não estou falando de educação. Estou fa-
lando de cultura. Que triste constatar nosso atraso.”

Deputada estudal (PSL-SP)

lO diretor-presidente substituto
da Agência Nacional de Vigilân-
cia Sanitária (Anvisa), Antonio
Barra Torres, acompanhou o pre-
sidente Jair Bolsonaro no ato de
ontem em Brasília. Em alguns
momentos da transmissão da
participação de Bolsonaro na ma-
nifestação, Torres, que é médico
e contra-almirante, aparece fil-
mando os cumprimentos entre o
presidente e os apoiadores.
A presença do diretor da Anvi-
sa no protesto causou perplexida-
de em técnicos da área da Saúde
do governo, segundo apurou o
Estado. Para eles, o episódio tira
crédito da campanha de preven-
ção ao coronavírus que vem sen-
do feita e confunde a população.
A Anvisa não se manifestou
sobre a ida de Bolsonaro ao ato.
O órgão disse apenas que Torres
aceitou um convite para conver-
sa informal no Palácio do Planal-
to com o presidente. / J.S. e M.V.

»CLICK. Numericamen-
te, as manifestações des-
de domingo em todo País
foram pífias. Quem foi,
mostrou ser radical no
ataque às instituições e
na defesa do presidente.

WILTON JUNIOR / ESTADÃO

DIDA SAMPAIO/ESTADAO

Risco. Presidente dá a mão a apoiador em frente ao Palácio do Planalto em protesto contra o Legislativo e o Judiciário

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ANÁLISE: Eliane Cantanhêde
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