JornalValor--- Página 5 da edição"16/03/20201a CADC" ---- Impressa por RCalheirosàs 15/03/2020@20:22:5 0
Sábado,domingoesegunda-feira, 14,15e16demarçode 2020|Valor| C5
Finanças
Entra em vigorhoje
liberação de R$ 49
bi em compulsório
Estevão Taiar
De Brasília
AliberaçãodeR$49bilhõesde
depósitos compulsórios pelo
BancoCentral(BC) entraem vi-
gor hoje,em meioàs fortestur-
bulências nos mercados mun-
diaiscausadas pela pandemiado
coronavírus.O anúncio foi feito
aindaem fevereiro, semanas an-
tes do agravamento da crise, co-
mo partede um processoestru-
tural de reduçãodos compulsó-
rios. A medida,segundo econo-
mistas,pode garantir maiorsoli-
dez ao sistemafinanceiro em um
períodode fortestensões,mas
devedar poucoimpulsoàativi-
dadenestemomento.
“Não havia sentido umarestri-
ção monetária dessaordemcom a
economia nestasituação. Mesmo
que o valornão seja direcionado
para o crédito, isso tem que ser de-
cisão dos bancos”, diz Sergio Vale,
economista-chefe da MB Associa-
dos.“A reduçãoépositiva,masnão
sei quantopode ajudar na recupe-
raçãodecurtoprazo.”
Antesda liberação,oscompul-
sórios estavam na casa dos
R$450bilhões.Essesrecursossão
usadospara dar solidezaos ban-
cos em momentos de crise.Foio
que aconteceu,por exemplo,na
crisefinanceirade2008.
Opresidentedaautoridademo-
netária,RobertoCamposNeto,eos
diretores destacam com frequên-
ciaquea estratégiaparaos depósi-
tos faz parteda política macropru-
dencial do BC e não tem o objetivo
de estimular aatividade por meio
damaiorofertadecrédito.
O corte anterior no volume de
recolhimentos compulsórios ha-
via sido realizado no fim de junho
do ano passado, quando o BC re-
duziua alíquota dos depósitos a
prazode33%para31%.Entretanto,
cerca de R$ 15 bilhõesdos aproxi-
madamente R$ 20 bilhões libera-
dos ficaram parados nos bancos,
conforme números divulgados
porCamposNetoemoutubro.
“Em tese, aliberaçãode depó-
sitosauxiliano estímulo ao cré-
dito.Mas agrandeverdadeéque
isso não ocorreu”, diz o econo-
mistaGilbertoBorça.
Para Vale, da MB Associados,a
diminuição dos compulsórios
gera“um aumentoda ofertade
crédito, mas não necessariamen-
te umademanda por ele”. “Isso
acaba retornando ao sistema,
por meiode operaçõescom títu-
los públicos”, afirma.
Na avaliaçãodo economista
RobertoLuis Troster, atendência
é que a medida,alémde reforçar
ocaixa dos bancos,tenhaimpac-
tos positivos sobre ocrédito.
“Menosspreadsignificamenos
custose consequentementemais
crédito”, afirma.Alémdisso, “a
demandapodeser menor[por
causada crise],mas ela sempre
existe”.“Foialgo que veio aca-
lhar”, diz,sobreadecisãodoBC.
O corteque entra em vigorhoje
soma-se a uma diminuição, anun-
ciadanomesmodia,dasobreposi-
ção entre compulsórios e exigên-
cias do indicador de liquidez de
curtoprazo do sistema financeiro
(LCR, na sigla em inglês). Na práti-
ca, isso liberou até R$ 86 bilhões
para os bancos. Combinadas, am-
bas as medidastêm um impacto
potencialdeR$135bilhões.
Na ocasiãoem que anunciou
as duasdecisões,o próprioBC
evitoudar estimativasde quanto
do montante efetivamente se
transformariaem crédito.“Di-
nheironão tem carimbo”, disse o
diretorde políticamonetáriado
BC,BrunoSerraFernandes.
Na sexta-feira,o ministroda
Economia, Paulo Guedes,afir-
mouque o BC anunciará mais
medidasparareforçarasolidez
do sistemafinanceiro, sem dar
maisdetalhes.
Fonte:BancoCentral
Colchãodeliquidez
Totalde recolhimentoscompulsórios(emR$ bilhões)
100
200
300
400
500
1/2008 12/2011 1/2020
475
448
190
RessegurosBalançodo4
o
trimestretrouxereclassificaçãoenovosdados
IRB mudou números
analisados pela Squadra
AnaPaula Ragazzi
De São Paulo
A leitura das demonstrações fi-
nanceirasdoIRBdoquartotrimes-
tre de 2019mostraque o ressegu-
rador alterou algunsnúmeros que
foramrelevantesnaanálisedages-
tora Squadra sobre o tratamento
dadopelaempresaaprovisões.
Um primeiro ponto trata da
análise de dados referentes a “sal-
vados e ressarcidos” do IRB. Quan-
doumaseguradorapagaumsinis-
tro,ela poderecuperarpartedesse
valor. No caso de um carro que so-
freu uma batida eteve perda total,
apóspagarosinistro,aseguradora
podevender o que sobrou do veí-
culo para um ferro-velho eaíterá
um valor“salvado”.Ela também
podeacionar a pessoaque provo-
cou oacidente eresponsabilizá-lo
pela perda —osrecursos que vier a
recebersão“re ssarcimento”.
Ano passado, a reguladoraSu-
sep passoua orientar as empresas
para, na divulgação de salvadose
ressarcidos, separar os valores que
são uma expectativa de recebi-
mentodaquelesque já são um di-
reito líquido e certo, mesmo que o
pagamento não tenha ocorrido.A
expectativaécontabilizadano la-
dopassivodobalanço,comoredu-
tor do saldo da provisão de sinis-
tros aliquidar (PSL). Já odireito de
recebimentoentranoativo.
Quando a Squadraolhou os nú-
merosdivulgadospelo IRB na Su-
sep, referentes ao terceiro trimes-
tre de 2019,primeiro notouque
eles só estavam no site da regula-
dora—não haviam sido divulga-
dos pela empresanos resultados.E
identificou que o IRB apontava
R$ 605 milhões comoexpectativa
parasalvados eressarcidos, valor
que representava 30% da PSL.Em
seuestudoapartirdosdadosdosi-
te da Susep, aSquadrasó encon-
trou,entretodasasresseguradoras
locais, uma empresa, aAustralRe,
que também constituiu essa ex-
pectativa, mas numtotalequiva-
lentea2% de sua PSL, muito infe-
rioraos30%doIRB.
AgestoradiznacartaqueaPSLé
aprovisão para pagamento de si-
nistros de montante maisrelevan-
te nas resseguradoras. Nas contas
dela, essa expectativa de R$ 605
milhões respondeu por 44% do lu-
cro do antesde imposto de renda
emnovemesesde2019doIRB.
Nos números do quarto trimes-
trede2019,póscarta,oIRBincluiu
pela primeira vez em seu balanço,
nanotaexplicativa10,umvalorde
R$ 614 milhões referentenão aex-
pectativas, mas a direitoslíquidos
e certos de salvados e ressarcidos,
que ela esperareceber numprazo
entre 3 e4anos. O totalé muito
próximo aosR$ 605milhões en-
contrados na Suseppela Squadra,
mas paraaexpectativadesalvados
eressarcidos. Além de constituir
na nota 10 esse valor de recupera-
ção, o IRB, na nota 9, apontou o va-
lor de R$ 305 milhões para expec-
tativas de salvadoseressarcimen-
tos, metade do encontradopela
SquadranaSusep.
O IRB perdeu o prazo de 2 de
marçodado pelareguladora para
a divulgação das informações con-
tábeisde 2019.Mas informaque
enviou os dadosna quinta-feira—
devem estar acessíveisnesta se-
gunda-feiranositedaSusep.
OIRB também afirma que,
diantedosmaisde80anosdevida
da empresa, ainda estavatraba-
lhando no melhor tratamentoe
transparência das informações
quandosurgiuoquestionamento
da Squadra. Durante oano, já ha-
via preceitos contábeis para con-
tabilizar essas linhas, mas oIRB
ainda estava identificandosede-
veriam entrar noativo ou passivo
do balanço.Por ter sido ogrande
ressegurador do monopólio, tem
umlegadomuitograndedereser-
vas e contratos em que assumiu
100%do risco e, portanto, tem di-
reitode 100%em eventuais recu-
perações eque isso ofaz diferente
de outras resseguradoras locais
quandoseolhaessesdados.
Outro ponto abordado pela
Squadra foi objeto de uma reclas-
sificação na demonstração finan-
ceira do IRB no quarto trimestre.A
carta da gestora destacouum ele-
vadoníveldereversãodeprovisões
de anos anteriores a 2014, quando
aempresaera estatal. Essas rever-
sões teriam servido para “compen-
sar oaltovolume de despesas epa-
gamentos de sinistros em 2019”.
Do fechamentodo ano de 2018,
até oterceiro trimestre de 2019, o
IRB computava que osaldo dessas
provisõesanteriores a 2014se re-
duziuemR$1,5bilhão.
ASquadraobservou,emsuacar-
ta, que, em resseguradoras, reava-
liações de reservas impactamdire-
tamenteolucroantesdeimpostos,
alterando os resultadoscorrentes.
E os resultados recentes do IRB
“parecemter sido beneficiados pe-
lo grande volume de reversão de
provisões”oriundosde contratos
anteriores ao início da gestão que
levouaempresa àbolsa, alémde
uma avaliação otimista de contra-
tosrecém-subscritos.
No resultado do quartotrimes-
tre,oIRBtransferiuR$500milhões
em provisões que estavam lança-
das para o períodoanterior a2014
parao períodosubsequente. As-
sim,oR$1,5bilhãoreportadoatéo
terceiro trimestreeanalisado pela
SquadracaiuparaR$1bilhão.
O IRB informa que reversões são
semprefeitas por motivos técni-
cos, acompanhadospelas audito-
rias enovamente reforçou sua tra-
jetória de 80 anos comomonopo-
lista e estatal. A empresa disse ain-
daqueareclassificaçãofoifeitapa-
ra aprimorar adivulgação de seus
números e que, além do triângulo
de sinistros, passoua divulgaro
triângulo de prêmios, prática que
não é adotada por outras compa-
nhias pelo mundo. Só assimacre-
dita que conseguirá dar uma
maiorvisão ao investidorsobre a
sinistralidadede sua safra. Infor-
mou,ainda,teridentificadoqueos
númerosnãoestavamcomatrans-
parênciaadequada.
ASquadranão deuentrevista. O
Valorconversou com analistas, in-
vestidores e empresas do setor.
Eles observaram que, na questão
de salvados e ressarcidos,o IRB po-
deria, de imediato,ter ditoque
ainda trabalhava na classsificação
dos dados. Sobre as reversões de
provisões, afirmam de formasim-
plificada que, aparentemente, a
empresa, até oterceiro trimestre
de 2019, tinha“muita provisão”
paraoperíodoemqueeraestatale
poucapara anos maisrecentes —
comodiz aSquadrana carta, isso
implicava uma sinistralidademui-
to baixaem 2019, de 30%, menos
dametadedamédiahistórica.
As fontes ressaltam quenão há
nadadeirregularemfazerreclassi-
ficações, embora oIRB,ao fazeris-
so,tenhamudado opassado,alte-
rando números divulgados em
- O ponto que fica é que o res-
segurador tem computado em seu
lucrocontábilitensdeseupassado
de décadas de estatal, em volumes
muito significativos.EaSquadra
aponta que esses itenssão extraor-
dináriosevãoseesgotar.Masaem-
presa vinha sendoavaliadapelo
mercadocomose eles fossemre-
correntesparaseuresultado.
Intervençãodo BC no câmbiosomaUS$15 bi no mês
MarceloOsakabe
De São Paulo
OBanco Centralinjetou o
equivalente aUS$ 15 bilhões
apenas nas duasprimeiras se-
manas de marçoparacontera
valorizaçãoexcessivadodólar. A
forteatuaçãocontrastacomo
comportamentode outrosban-
cos centrais cujasmoedastam-
bémestãosob pressão,mas que
atuaram de formamaistímida
ou apenasreforçaramoaparato
de intervençãono período.
Desde oinício de março,oBC
vendeuUS$7,24bilhõesnomerca-
do àvista eoequivalente a US$ 6
bilhões por meiode contratos de
swapcambial. Na sexta, comple-
mentou aação liberando outros
US$2bilhõespormeiodaschama-
das operações de linha, comosão
conhecidas as operações de venda
comcompromissoderecompra.
Nesse período,odólaracumulou
alta de 8,1% contra o real, bastante
abaixodo registradopor divisas co-
mo opeso colombiano(14,1%),o
pesomexicano(12%)eorublorusso
(9,4%).Paísmaisafetadonoperíodo,
a Colômbia anunciou na quinta a
criação de um mecanismo para pro-
ver liquidez em moedaestrangeira
novalordeUS$1bilhão.
No México, aautoridademonetá-
ria injetou na quinta US$ 2 bilhões
em operações de swapcambial. De
olhonavolatilidade do moeda,o
Banxico já havia anunciado,no iní-
cio da semanapassada, um reforço
do programade intervenção, que
passouacontarcomUS$40bilhões.
No Chile, oBC estendeu na
quinta a duração de seu programa
de swapcambial ede “repo” até
- Segundo oBC, o programa
se destina aprover liquidezem
meioà deterioração das condições
globais e domésticas. Nesse perío-
do, aalta do dólarcontra o peso
chilenofoimaismodesta,de2,6%.
Reformulado, Banco Fibra volta a
crescer e faz aposta em serviços
Talita Moreira
De São Paulo
De voltaàs origens, mas com
um modelo de negócios repagi-
nado, oBancoFibra teve,em
2019, seu melhordesempenho
emumadécada.Controladapelo
grupoVicunha, a instituição fi-
nanceiracomeçouacolheros re-
sultadosde umareestruturação
queseestendeuporseteanos.
O banco obteve lucro líquido de
R$136,68milhõesnoanopassado,
dez vezes superior ao obtido em
- Amaior parte dessacifra
veio do aumento na alíquota da
CSLL(ao levar à ativação de crédi-
tos tributários), que engordouo
resultado em R$ 111 milhões. Mas,
mesmoexcluído esse efeito,oFi-
bra lucrou R$ 25,4 milhões —qua-
se o dobro do ano anterior e ainda
omaiorresultadoemdezanos.
“Estamosvivendoum ciclo po-
sitivo, com os resultadosmelho-
randoano aano”, afirmou aoVa-
loropresidentedo Fibra,Arno
Schwarz,numararaentrevista.
Nofimde2018,obancovoltou
a atender empresas de médio
porte, com receita anual apartir
de R$ 30 milhões. Osegmento re-
monta às origens do Fibra,mas a
instituiçãohaviasaído do negó-
cio enquanto tentava estancar as
perdas de umamalsucedida in-
cursão no varejo,que resultou
numa sucessão de prejuízose le-
vou os acionistas afazer aportes
de quase R$ 1bilhãonos anos se-
guintes.Enquantosereestrutura-
va, ainstituição ficou concentra-
da apenas no “corporate” (clien-
tesquefaturamapartirdeR$300
milhões)enoagronegócio.
Comfocoredefinidonasmédias
e grandesempresas enas cadeias
de produtores rurais, o Fibra reen-
controu sua vocação, segundo
Schwarz. O bancoencerrou o ano
passadocomR$4,3bilhõesemsua
carteira de crédito. O volume cres-
ceu 15,1%e voltou ao patamar de
- A expectativa é chegar a de-
zembrocomR$5bilhões.
Agora,o bancoestá dandoum
passoadiante.OFibra lançanes-
ta semanauma novamarca,mais
moderna, eum “novotomde
voz” —comodefiniuSchwarz—
parase aproximardos clientes.
“Muitosnãosabemaextensãode
nossascapacidades”,afirmou.
Apartirdeinvestimentosemdi-
gitalização, o bancoampliou a
prestaçãode serviços,que inclui
umamesa para gestão de risco
(com operações como câmbioe
derivativos), seguros e estrutura-
ção de transações no mercado de
capitais. Está em desenvolvimento
uma área de gestão de caixa para
oferecer serviçoscomocobrança e
pagamentos. Comas mudanças, a
receita de prestação de serviços e
tarifasalcançou R$ 48 milhões no
ano passado, alta de 31,6%. “A tec-
nologianospermiteiralémdocré-
dito”,destacouSchwarz.
A áreade tecnologiaganhou
vida própriano fim de 2018.Até
então,era um pedaçoda direto-
ria de operações do banco. Al-
gunsmesesantesdessamudan-
ça, oFibra colocoutodosos seus
sistemasna “nu vem” —foi um
dos primeirosbancosbrasileiros
adar esse passo.Para Rodrigo
Bueno, responsável pelodepar-
tamento comercial, amedida
ampliouacapacidadede pro-
cessamentode dadosda institui-
ção etem sido importante para
entender melhor o perfildos
clientes,oque ajudaaaprimo-
rar a ofertade serviços.
Outrainiciativa foi a criação de
uma área de clientes, cujo atendi-
mentoestava atéentãovinculado
à diretoria comercial. “O banco
nãotinhaumolharparaocontrole
de qualidade e até mesmopara o
marketing”, disse o presidente do
Fibra. “Queremos que nos vejam
cadavez mais como um banco de
pessoasdetecnologia.”
De acordocom Schwarz, o ban-
co está com aestruturaprontapa-
ravoltaraganharescalaeabasede
capital é adequada para isso. Não
há, neste momento, necessidade
de novos aportes na instituição,
afirmou. O Fibra encerrouo ano
com 12,67% de índice de Basileia,
umamedidadecapitalbancário.
Adúvida,agora, équal oimpac-
toqueacriseprovocadapelocoro-
navírusterá sobre a economia e os
negócios. Aindahá pouca clareza,
navisãodeSchwarz,eobancoestá
acompanhando os desdobramen-
toscom“cautela” e“casoacaso”.
Para o executivo,osbancos
brasileirosestãobemprepara-
dos paraenfrentarcenáriosad-
versosdepoisdas liçõestrazidas
pelosanosde crise.Até mesmo
as perdascausadaspelaaposta
no varejodeixaramseu legado.
“Aprendemos comaexperiên-
Arno Schwarz, presidentedo Fibra: “A tecnologianos permiteir alémdo crédito” cia”, disseSchwarz.
ANAPAULAPAIVA/VALOR
.