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O ESTADO DE S. PAULO TERÇA-FEIRA, 17 DE MARÇO DE 2020 Metrópole D5
FARIA LIMA TEM
DIA ÚTIL COM
CARA DE FERIADO
Empresas optam por mandar funcionários
para trabalhar em casa em meio à pandemia
Gilberto Amendola
Passageiros de máscara, lojas e
cafés vazios, embarque e check-
in sem filas, aglomerações ape-
nas em áreas destinadas a recla-
mações ou remarcações de voo.
Esse era o clima nos Aeroportos
de Congonhas e Cumbica na tar-
de de ontem – após a nova série
de medidas impostas por causa
do novo coronavírus pelos go-
vernos estaduais e municipais.
A aviação tem sido um dos se-
tores mais afetados pela pande-
mia. Países têm fechado frontei-
ras, voos estão sendo cancelados
e companhias aéreas deixam de
voar para alguns destinos.
Em Congonhas, em São Pau-
lo, o tradicional trânsito de car-
ros de aplicativo e taxistas qua-
se não existe mais. Motoristas
de aplicativo dizem que não es-
tá valendo esperar por passagei-
ros. Os taxistas, que já vinham
enfrentando queda na deman-
da por corridas, afirmam que “o
que era ruim está ainda pior”.
Ao chegar ao saguão de Con-
gonhas, chama a atenção a quan-
tidade de pessoas usando más-
caras. Ao menos as ouvidas pela
reportagem garantiram não ter
sintomas, mas usam máscara
por “medida de segurança”.
A arquiteta Valesca Serafim,
de 29 anos, decidiu se precaver,
embora não tenha tido, até o
momento, nenhum sintoma.
“Participei de um congresso
com muita gente. Embora não
tenha sintomas, não posso ga-
rantir que não tenha sido infec-
tada por alguém naquele am-
biente. Então, acho melhor
usar a máscara para evitar preju-
dicar alguém”, contou.
O embarque e os check-ins
não tinham fila. Já os balcões
reservados para remarcações
eram focos de aglomeração. A
reportagem esteve em Congo-
nhas por volta das 16h30, quan-
do foram cancelados voos para
Rio, Porto Alegre e Londrina.
Na farmácia, nem sinal de ál-
cool em gel ou máscaras. Segun-
do o farmacêutico, os produtos,
repostos todos os dias, estão
acabando logo pela manhã.
Cumbica. Em Cumbica, o cená-
rio é o mesmo. O aeroporto está
sensivelmente mais vazio. O bai-
xo movimento se reflete na maio-
ria das lojas e dos cafés. O mes-
mo ocorre nos locais de embar-
que, desembarque e check-ins.
É possível ver famílias intei-
ras usando máscara. A reporta-
gem conversou com um empa-
cotador de malas que trabalha
no terminal 2. Ele estava de más-
cara. “Não é por mim. Mas a mi-
nha família tem medo. Acredi-
tam que, por eu trabalhar no ae-
roporto, estou mais exposto.
Hoje é o meu primeiro dia com
a máscara. Não sei se vou aguen-
tar”, disse Vítor Viana, fr 22
anos. No desembarque interna-
cional, dois tipos de cena. Famí-
lias que se abraçavam como se
não existisse o coronavírus e
pessoas que apenas se cumpri-
mentavam com os cotovelos –
não raro, todos com máscaras.
Isabela Palhares
O Ministério da Educação
(MEC) anunciou que vai pu-
blicar portaria autorizando
as escolas a substituir aulas
presenciais da educação bási-
ca pela modalidade a distân-
cia por 30 dias. A medida ain-
da pode ser prorrogada. A al-
teração foi elaborada pelo Co-
mitê Operativo de Emergên-
cia do ministério, criado para
pensar alternativas de con-
tenção ao avanço do coronaví-
rus. Ao menos 18 Estados já ti-
veram as aulas suspensas.
A legislação não permite au-
las a distância na educação in-
fantil e no ensino fundamental
(do 1.º ao 9.º ano). A modalida-
de é permitida para até 30% da
carga horária do ensino médio
em cursos noturnos e 20% nos
diurnos. Também é liberada em
40% da carga de cursos presen-
ciais de ensino superior.
Segundo nota do ministério,
a liberação da modalidade para
todas as etapas da educação
básica tem caráter excepcional
e valerá apenas enquanto durar
a situação de emergência de saú-
de pública. A adesão das escolas
será voluntária.
O Estado apurou que a medi-
da atende mais a uma demanda
das escolas e faculdades priva-
das do que serve como solução
para a rede pública de ensino.
Diretores da rede particular vi-
nham cobrando o MEC por um
dispositivo que deixasse as uni-
dades mais seguras para poder
contar os dias com atividade
nos 200 dias letivos exigidos
por lei. Na sexta-feira, o Conse-
lho Nacional de Educação (C-
NE) já havia emitido ofício, in-
formando entender que juridi-
camente a reposição dos dias
perdidos pode ser feita no próxi-
mo ano, mas que os 200 dias e
as 800 horas anuais precisam
ser cumpridas – o entendimen-
to seria o mesmo usado em
2009, quando aulas foram sus-
pensas na epidemia de H1N1.
Para Luiz Miguel Garcia, pre-
sidente da Undime (entidade
que reúne os secretários muni-
cipais de educação), a liberação
do ensino a distância para a edu-
cação básica não garante a quali-
dade e nem que todos os estu-
dantes serão atendidos. “Não
conhecemos metodologia, ain-
da mais em caráter emergen-
cial, que garanta um ensino de
qualidade para crianças nessa
faixa etária que permita a substi-
tuição. Estamos falando de
uma fase em que os alunos es-
tão sendo alfabetizados.”
Além da qualidade, ele tam-
bém destaca que a maioria das
escolas da rede pública não tem
recursos para oferecer ensino a
distância e, ainda que tivessem,
nenhuma teria como garantir
que todos os alunos pudessem
assistir às aulas nessa modalida-
de de casa. “Como garantir que
toda criança tem um celular,
um computador com internet
para fazer as atividades? Vamos
deixar muitos alunos de fora
porque a realidade do Brasil es-
tá muito distante de permitir is-
so. O princípio básico da equida-
de não será garantido”, disse.
Segundo o Consed (que reú-
ne secretários estaduais de edu-
cação), 18 redes públicas já deci-
diram pela suspensão das aulas.
São Paulo, que tem o maior nú-
mero de casos e a maior rede de
ensino do País, vai fazer parali-
sação gradativa até 23 de março
- a medida tem sido criticada
pelos sindicatos que pedem a
suspensão imediata.
Também foram suspensas as
aulas no Amapá, Bahia, Ceará,
Espírito Santo, Goiás, Mara-
nhão, Minas, Mato Grosso, Per-
nambuco, Piauí, Rio, Rio Gran-
de do Sul, Roraima, Santa Cata-
rina, Sergipe e Tocantins.
Álcool em gel. O ministério in-
formou que vai antecipar R$
450 milhões do Programa Di-
nheiro Direto na Escola (PD-
DE) para que os colégios da re-
de pública possam comprar ál-
cool em gel e outros produtos
de higiene. O recurso estava pre-
visto para ser liberado em abril
e setembro, mas as parcelas fo-
ram adiantadas diante do avan-
ço do coronavírus. Secretários
de educação destacam que não
se trata de recurso extra.
Priscila Mengue
“H
oje até atravessei
a Faria Lima com
o semáforo aber-
to ( para carros )”, contou a ad-
vogada Débora Fernandes,
de 33 anos. Um dos principais
centros financeiros do País, a
avenida teve um dia com cara
de feriado, sem o engarrafamen-
to e as calçadas cheias, comuns
nos outros dias úteis.
O principal motivo é o au-
mento de casos confirmados
do novo coronavírus, inclusive
entre pessoas que trabalham
em empresas na avenida, o que
levou parte das empresas a ado-
tar o home office por tempo
indeterminado.
Com isso, o impacto na cir-
culação de veículos era visível.
Segundo dados da Companhia
de Engenharia de Tráfego
(CET), o trânsito esteve abai-
xo da média na cidade durante
todo o dia.
Débora afirmou, por exem-
plo, ter levado 20 minutos pa-
ra fazer um trajeto que geral-
mente leva pouco mais de uma
hora ontem. “Nossa empresa
forneceu álcool em gel e um
médico fez exame em todo
mundo”, relatou.
No horário de almoço, um
dos momentos que a avenida
costuma ficar mais cheia, era
mais evidente a mudança na ro-
tina da via.
“Meio-dia, o pessoal começa
a sair dos prédios. Fica quase to-
do mundo tropeçando um no
outro. Na sexta-feira, a gente já
sentiu a diferença”, afirmou a
recepcionista Maria Lima, de 42
anos, que trabalha em um res-
taurante da região.
A procura por álcool em gel
também é frequente. “Virou o
produto mais cobiçado do mo-
mento”, disse Maria Nilvanda
Souza, de 44 anos, dona de uma
loja de cosméticos em uma das
travessas da Faria Lima. “Liga-
ram até pedindo caixa fechada
de máscaras, mas eu nunca tive
para vender”, disse.
A empresária recebeu 16 no-
vas unidades de álcool em gel
na quinta-feira, que se esgota-
ram em duas compras no mes-
mo dia. Mesmo sem estoque,
trabalhadores do entorno conti-
nuam perguntando sobre o
reabastecimento.
“Prometeram ( fornecer
mais do produto ) até segun-
da ( ontem ), agora falaram
que pode chegar na quarta”,
afirmou.
Como em outros dias, a
contadora Priscila Lemos, de
46 anos, saiu com o celular e a
carteira em mãos.
Desta vez, porém, carrega-
va mais um item: uma peque-
na embalagem de álcool em
gel. Além disso, ela e a tam-
bém contadora Maria Cecí-
lia Rodrigues, de 39 anos, fo-
ram almoçar meia hora mais
cedo “para evitar aglomera-
ções”. “O restaurante está
bem mais vazio que o nor-
mal”, disse.
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
Aeroportos sofrem com queda sensível de movimento
l Alunos em casa
l Rotina
Europa estuda fechamento de fronteiras; EUA pedem isolamento social. Pág. D6 }
Tanto em Congonhas
como em Cumbica, lojas
e cafés estão vazios e
muitos passageiros usam
máscara por precaução
Congonhas. Nova cena: saguão vazio e pessoas de máscara
MEC libera ensino a distância por 30 dias
2 semanas
Foi a suspensão de aulas deter-
minada em todo o Estado de São
Paulo na sexta-feira. Nesta pri-
meira semana, tanto em escolas
públicas quanto particulares, as
faltas serão justificadas. Na se-
mana que vem, não haverá aula
nas instituições.
Regra atual veta a prática, mas escolas particulares cobravam medida para garantir os 200 dias letivos mesmo com a crise de saúde
WERTHER SANTANA/ESTADÃO
3,8%
do total das vias monitoradas
pela Companhia de Engenharia
de Tráfego (CET) em São Paulo
estavam congestionadas ontem
às 18h30, taxa inferior à média
para o horário, de 8,3%. Às 22
horas, havia apenas dois quilôme-
tros de lentidão em toda a capital
paulista.
Deserto. Pedestre atravessa a Avenida Faria Lima (zona oeste) quase sem carros em uma segunda-feira: CET registrou trânsito abaixo da média durante todo o dia de ontem
Home office
NILTON FUKUDA/ESTADÃO