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O ESTADO DE S. PAULO TERÇA-FEIRA, 17 DE MARÇO DE 2020 Política A
Fernanda Boldrin
Paula Reverbel
A partir de um sorteio, a assis-
tente social Maria Aparecida
Arruda Fortes, de 54 anos, ga-
nhou a chance de influenciar
decisões da Prefeitura de For-
taleza em relação ao proble-
ma do lixo. Ela e outros 39 ci-
dadãos foram escolhidos alea-
toriamente para integrar um
conselho cidadão, parte de
um projeto patrocinado pe-
las Nações Unidas, incumbi-
do de propor sugestões para
a capital cearense.
Maria Aparecida lembra que
o ponto mais quente da discus-
são foi quando entrou em jogo
o tema de multas por atitudes
específicas no descarte de li-
xo. A cidade tem mais de 1.
pontos de descarte irregular
espalhados pelas ruas, cantei-
ros centrais e áreas de preser-
vação, segundo a prefeitura.
“O entrave maior foi porque
algumas pessoas eram bem ta-
xativas, dizendo que tínhamos
que criar multas. Já um outro
grupo achava que tinha de dis-
cutir e sensibilizar a popula-
ção”, relatou.
Segundo a assistente social, o
consenso formado foi de pri-
meiro focar em informar a popu-
lação sobre o assunto e, em um
segundo momento, colocar a
questão das multas em discus-
são. Dos debates, nasceram 19
propostas, protocoladas na Pre-
feitura de Fortaleza no último
dia 5 de março.
A elaboração das sugestões
foi financiada pelo Undef (Uni-
ted Nations Democracy
Found) – fundo de democracia
das Nações Unidas – e contou
com metodologia de como pra-
ticar democracia direta das ins-
tituições newDemocracy
Foundation, da Austrália, e De-
libera Brasil. O município de
Fortaleza foi parceiro da em-
preitada.
“Não é simples fazer as pes-
soas chegarem a um consenso”,
disse ao Estado o australiano
Iain Walker, diretor-executivo
da newDemocracy Founda-
tion. “Se você duvida, tente jun-
tar cinco amigos para encomen-
dar comida e veja quanto tem-
po leva até que todos concor-
dem”, argumentou.
Enquanto o Brasil vê o fortale-
cimento de grupos de formação
e renovação política voltados a
melhorar o funcionamento da
democracia representativa, as
entidades contratadas pela
ONU se especializam em colo-
car os cidadãos para debater e
participar de decisões sobre
problemas do poder público. A
experiência na capital do Ceará
é a primeira que o Undef finan-
ciou no mundo – foram selecio-
nadas também uma cidade na
Ásia e outra na África.
De acordo com Walker, entre
os sorteados havia pessoas de
várias idades e classes sociais.
Eles são orientados sobre o te-
ma e ouvem especialistas, de
modo que ganham entendimen-
to suficiente para tomar deci-
sões. Walker aponta que, quan-
do as pessoas entram em conta-
to com informação, a opinião
delas sobre possíveis soluções
muda muito.
Referendos. Em alguns luga-
res do mundo, a imersão de ci-
dadãos em um tema de interes-
se público é usada como fonte
de informação em plebiscitos.
Silvia Cervellini, coordenadora
do Delibera Brasil, cita o exem-
plo do “Citizens’ Initiative Re-
view” (iniciativa de revisão ci-
dadã, em inglês), do Oregon,
nos Estados Unidos. “Antes
dos referendos estaduais pe-
riódicos, um mini público che-
ga a um consenso sobre um te-
ma e a conclusão deles é apre-
sentada como informação ao
público sobre o ponto que está
sendo decidido”, disse.
Em Fortaleza, as sugestões
incluem a colocação de pontos
de entrega voluntária de lixo, a
inclusão de catadores no pro-
cesso de coleta seletiva e o de-
senho de incentivos para que
os resíduos coletados sejam re-
ciclados no próprio municí-
pio, promovendo a indústria
de reciclagem local.
Em entrevista ao Estado ,
Mario Fracalossi, superinten-
dente-adjunto do Instituto de
Planejamento da administra-
ção municipal, disse que al-
guns itens já estão sendo incluí-
dos no Plano de Saneamento
Fortaleza 2040 e que os editais
para colocar as propostas em
prática estão sendo prepara-
dos. A ideia é adiantar essa eta-
pa antes que a próxima gestão
assuma.
ENTREVISTA
‘Tem gente gastando pesado para
atacar a conduta das pessoas’
Pedro Prata
O governador de São Paulo,
João Doria (PSDB), e o senador
Major Olimpio (PSL-SP) se en-
volveram em uma discussão on-
tem, durante visita do tucano
ao Departamento de Opera-
ções Policiais Estratégicas (Do-
pe), na Barra Funda, zona oeste
da capital paulista. Os dois tro-
caram palavras ríspidas e Olim-
pio foi retirado do local por se-
guranças.
A agenda oficial do governa-
dor informa que ele esteve em
visita ao Dope com o diretor do
departamento, delegado Nico
Gonçalves, e com o secretário
da Segurança Pública, General
João Campos. O evento ocor-
reu das 10h às 11h da manhã.
Major Olimpio, por sua vez,
afirmou que foi chamado ao lo-
cal por policiais civis. “João Do-
ria escalou policiais do Dope pa-
ra estarem desde as 7h para fa-
zer imagens com ele”, disse.
“Os policiais me acionaram, eu
fui para a frente do Dope.”
Em um dos vídeos divulgados
pelo senador, é possível ver o
momento em que Olimpio se
encontra com Doria, já dentro
do Dope. “Vai trabalhar!”, diz
Doria, ao que Olimpio respon-
de: “Você não tem respeito!”
Por meio de nota, o Sindicato
dos Delegados de Polícia do Es-
tado de São Paulo (Sindpesp)
afirmou que o senador “foi agre-
dido por ecoar os anseios de to-
dos os policiais civis do Estado
de São Paulo.”
Também por meio de nota,
Doria afirmou que “é um desres-
peito ao povo de São Paulo um
senador da República que vira
as costas para o grave tema da
saúde pública. E quer fazer cam-
panha política, ideológica e sin-
dical na hora errada.”
Projeto leva
cidadão a
planejar
soluções
l Consenso
“Não é simples chegar a um
consenso. Tente juntar
cinco amigos para
encomendar comida e veja
quanto tempo leva.”
Iain Walker
DIRETOR DA NEWDEMOCRACY FOUNDATION
Felipe Frazão / BRASÍLIA
Presidente da Comissão Parla-
mentar Mista de Inquérito das
Fake News, o senador Angelo
Coronel (PSD-BA) quer apon-
tar quem financia a propagação
de mensagens ofensivas e infor-
mações distorcidas contra po-
líticos nas redes sociais. “Tem
gente gastando pesado”, disse
ele ao Estado.
lO ‘Estado’ mostrou que o in-
quérito do Supremo Tribunal Fe-
deral identificou empresários
financiando ataques à Corte. O
Supremo não compartilhou nada
com a CPI?
Nada. Estão investigando os
ataques que eles e suas famí-
lias sofreram. A CPI é mais am-
pla, pode investigar qualquer
pessoa. Vamos tentar colocar
algo no relatório final para pro-
pormos indiciamento e enca-
minhar ao Ministério Público
Federal.
lA CPI vai atrás de quem finan-
cia disseminação de fake news?
Esse, para mim, é o ponto prin-
cipal. Quem são os financiado-
res nas redes sociais para difa-
mar alvos, para atacar a condu-
ta das pessoas? Tem gente gas-
tando pesado.
lHaverá depoimento de empre-
sários?
Está aprovada a convocação
do (Luciano) Hang (dono da
Havan) , e a do (Otávio)
Fakoury (site Crítica Nacional)
será na semana que vem.
lO vereador Carlos Bolsonaro
será convocado?
Tem de aprovar no plenário.
Não passou ainda.
lA quase um mês do fim, a CPI
será prorrogada?
Quero que vá até outubro para
servir como proteção às elei-
ções brasileiras. A gente vai fi-
car como um canal de denún-
cias de fake news usadas em
benefício de algum candidato.
Para intimidar.
lQue rumo a CPI vai tomar?
Estamos quebrando sigilos
que detectam quem conversou
com quem, mas eu quero esse
conteúdo.
lO senhor quer apreender os
aparelhos?
Não, eu quero saber o que foi
conversado. Estamos em cima
das redes sociais, Facebook,
Instagram, para nos fornece-
rem esses dados. E eles estão
batendo na tecla de que só po-
dem liberar com autorização
da Corte americana. Não con-
cordo com isso. Se eles estão
sediados no Brasil, têm de es-
tar subordinados às leis brasi-
leiras, não às americanas. O ca-
ra não pode vir dos EUA para
morar aqui e achar que vai se-
guir leis americanas. Nossa bri-
ga é com as plataformas.
lAvalia acionar a Justiça?
A Advocacia do Senado proto-
colou um ofício para eles (Face-
book). E eles enviaram dizendo
que não poderiam fornecer os
textos das mensagens. Nós va-
mos pedir novamente, porque
a figura do presidente (da CPI
Mista) é de magistrado. Sou o
juiz. Espero que eles cumpram
essa decisão para não cometer
crime de desobediência. Estão
obstruindo (a investigação). Is-
so é onde está o pulo do gato.
lQual o papel da Polícia Legisla-
tiva no Senado?
Nós sabemos que tem duas
máquinas (usadas para divul-
gar fake news) aqui no Senado,
e a Polícia Legislativa vai saber
onde estão localizadas. Estão
no encalço. Acredito que essa
semana a gente saiba.
lDo contrário, a CPI vai identificar
o IP, mas não vai dar em nada?
Não vai dar em nada. O crime
está no conteúdo que a gente
não tem acesso ainda.
Ceará. Iain Walker, diretor da New Democracy Foundation, durante palestra em Fortaleza
JARBAS OLIVEIRA/ESTADAO-5/3/
Doria e Major Olimpio discutem e falam em ‘desrespeito’
Em programa da ONU, 40 moradores de
Fortaleza dão ideias para problema do lixo
WALDEMIR BARRETO/AGÊNCIA SENADO-9/3/
Apuração. Angelo Coronel diz que sigilos foram quebrados
Senador afirma que vai
chamar empresários que
pagariam para espalhar
conteúdo difamatório
contra políticos
Angelo Coronel (PSD-BA), senador e presidente da CPI Mista das Fake News