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B1 QUARTA-FEIRA, 18 DE MARÇO DE 2020 INCLUI CLASSIFICADOS O ESTADO DE S. PAULO
E&N
Governo pede calamidade contra vírus
para ampliar rombo fiscal para R$ 200 bi
ECONOMIA & NEGÓCIOS
Ampliação de déficit da meta fiscal daria folga de R$ 76 bilhões para expansão de gastos a fim de tentar evitar efeitos do coronavírus na
economia e administrar a queda de arrecadação com freada do PIB; medidas são estudadas para dar apoio a trabalhadores informais
Idiana Tomazelli
Amanda Pupo / BRASÍLIA
Após lançar medidas para socor-
rer pequenas e médias empre-
sas, trabalhadores com carteira
assinada e aposentados, a equipe
econômica estuda iniciativas de
auxílio a Estados e municípios,
que precisam de recursos para in-
vestir em saúde, e setores mais
atingidos, como o de aviação.
Em outra frente, o governo
começou a discutir a possibili-
dade de retomar obras paralisa-
das, com o objetivo de dar um
impulso à atividade econômica
em meio à crise deflagrada pelo
avanço do novo coronavírus.
Relator de um plano de socor-
ro a Estados já enviado ao Con-
gresso, o deputado Pedro Paulo
(DEM-RJ) disse que uma possi-
bilidade é a suspensão temporá-
ria da cobrança do serviço da
dívida dos governos regionais.
Ele esteve ontem com o minis-
tro da Economia, Paulo Gue-
des.
Apesar disso, Pedro Paulo re-
conheceu que Estados em crise,
como Rio de Janeiro, Rio Gran-
de do Sul e Minas Gerais, já es-
tão blindados dessas cobranças
graças a liminares no Supremo
Tribunal Federal (STF). Por is-
so, a medida seria pouco efetiva
no caso, por exemplo, do Rio,
que já está com alta demanda
em seu sistema de saúde.
“Eles são mais simpáticos ao
recurso direto, fundo a fundo”,
disse o deputado, referindo-se
à possibilidade de repasses via
Fundo de Participação dos Esta-
dos (FPE) e Municípios (FPM).
Aéreas. A equipe econômica
enfrenta um dilema para deci-
dir o conjunto de ações que ado-
tará para resgatar as compa-
nhias aéreas, que estão entre as
mais afetadas pela crise. Há
uma expectativa por parte das
empresas que a equipe de Gue-
des proporcione alívios por
meio do adiamento na cobran-
ça de PIS/Cofins e contribuição
sobre a folha de pagamento.
Até agora, porém, não houve
qualquer definição. De um lado,
a equipe econômica entende
que é complicado fazer aceno a
um setor específico, uma vez
que a crise deve atingir muitos
outros segmentos “de forma sé-
ria”. Por outro lado, o governo
tem dificuldades para conceder
o adiamento no pagamento de
tributos para todos os setores
porque a medida se tornaria “pe-
sada fiscalmente”.
Já a retomada das obras foi
discutida em uma reunião en-
tre o ministro do Desenvolvi-
mento Regional, Rogério Mari-
nho, e representantes do setor
da construção civil. O foco ini-
cial é a retomada de obras do
Minha Casa Minha Vida.
Economia avalia socorro a
Estados e setor de aviação
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
Adriana Fernandes
Jussara Soares / BRASÍLIA
O Palácio do Planalto infor-
mou na noite de ontem que
pedirá ao Congresso Nacio-
nal o reconhecimento do esta-
do de calamidade pública pa-
ra ampliar os gastos com o ob-
jetivo de enfrentar a pande-
mia do novo coronavírus. O
governo Jair Bolsonaro, em
nota, justificou que a medida
garantirá recursos para a
“proteção da saúde e empre-
gos dos brasileiros” diante da
perspectiva de queda de arre-
cadação. Se aprovada, a medi-
da terá efeito até 31 de dezem-
bro de 2020.
De acordo com um integran-
te da equipe econômica, o go-
verno deve divulgar na sexta-fei-
ra que fechará as contas com
rombo de R$ 155 bilhões, acima
da meta atual, que permite défi-
cit de até R$ 124 bilhões. No en-
tanto, essa previsão toma como
base crescimento da economia
de 2,1% em 2020. Como a proje-
ção está defasada, a equipe eco-
nômica vai ter liberdade para
atualizar a previsão de déficit
para o ano. O Estado apurou
que será preciso que as contas
fechem com rombo de até R$
200 bilhões para dar conta da
necessidade de ampliação de
gastos para enfrentar a crise.
O artigo 65 da Lei de Respon-
sabilidade Fiscal (LRF), marco
legal das contas públicas para
União, Estados e municípios,
permite a suspensão de metas
fiscais na ocorrência de calami-
dade pública, incluindo a neces-
sidade de bloqueios no Orça-
mento. No caso da União, a cala-
midade precisa ser reconhecida
pelo Congresso. As Assem-
bleias Legislativas e Câmaras
de vereadores devem fazer o
mesmo.
Duas frentes novas de medi-
das estão sendo desenhadas:
um benefício temporário de
renda para os trabalhadores in-
formais e a suspensão temporá-
ria dos contratos de trabalho pa-
ra empresas em dificuldade. O
trabalhador que tiver o contra-
to suspenso receberá seguro-
desemprego do governo. O fo-
co é o setor de serviços, o mais
afetado pela crise. Essa medida
já foi adotada na crise financei-
ra internacional de 2008 e deve
custar cerca de R$ 15 bilhões.
O presidente Jair Bolsonaro in-
formou que o ministro da Econo-
mia, Paulo Guedes, está preparan-
do um programa de auxílio aos
trabalhadores informais. “Algo
parecido com um voucher. Está
faltando definir o montante e co-
mo é que você vai organizar esse
pagamento”, afirmou. O Estado
apurou que, a depender do tem-
po que o benefício for mantido, o
custo do programa pode ficar em
torno de R$ 20 bilhões.
Receitas. O governo ainda terá
de administrar a perda de receita
com a queda do petróleo e com o
PIB mais fraco. Para cada 0,1 pon-
to porcentual de PIB menor, a re-
ceita diminui entre R$ 1,5 bilhão
e R$ 2 bilhões. Relatório da Insti-
tuição Fiscal Independente (I-
FI) do Senado apontou uma que-
da de R$ 17 bilhões de receitas da
União relacionadas a royalties
do petróleo.
Outros R$ 16 bilhões de recei-
ta com a privatização da Eletro-
brás terão de ser retirados da pre-
visão de arrecadação pela dificul-
dade de aprovação de projeto de
lei de privatização da estatal.
O governo também terá de ad-
ministrar a redução dos dividen-
dos dos bancos públicos e da Pe-
trobrás, que terão lucro menor.
Esse dinheiro iria reforçar o cai-
xa da União.
Também está em discussão pe-
la equipe do ministro do Desen-
volvimento Regional, Rogério
Marinho, uma injeção de R$ 10
bilhões de recursos orçamentá-
rios para tocar obras paradas.
Um integrante da equipe eco-
nômica disse ao Estado que a
mudança da meta dá mais liber-
dade para o governo administrar
a necessidade de caixa, sem preci-
sar mexer no teto de gastos (re-
gra que limita o crescimento das
despesas acima da inflação). /
COLABORARAM AMANDA PUPO E
EMILLY BEHNKE
PARA ENTENDER
O que é a meta fiscal?
A meta é calculada pela expec-
tativa de todas as receitas que
o governo arrecada menos a
projeção de gastos que vai ter
no ano. Essa é a chamada eco-
nomia que é feita para o paga-
mento dos juros da dívida.
Nos últimos anos, porém, o
resultado tem sido sempre
negativo (déficit), ou seja,
não é feita nenhuma econo-
mia, mas se estabelece um
valor máximo para esse saldo
negativo.
O que acontece quando há
déficit?
O déficit é reflexo de que o
País gasta mais do que arreca-
da. Para quitar o saldo negati-
vo, o governo precisa tomar
medidas como cortar despe-
sas, aumentar tributos e emitir
títulos públicos (que são com-
prados por investidores de
mercado, numa espécie de em-
préstimo, com juros). Esses
papéis compõem a dívida públi-
ca. Quando as despesas são
maiores do que as receitas, não
sobra dinheiro para fazer inves-
timentos e, até mesmo, a pres-
tação de serviços públicos fica
comprometida.
Quais os efeitos para o mer-
cado?
Manter as contas em ordem é
um indicador para os agentes
financeiros de que o governo
tem condições de quitar suas
dívidas. O elevado grau de endi-
vidamento público tirou do Bra-
sil o selo de bom pagador, co-
nhecido como “grau de investi-
mento”, concedido pelas agên-
cias de classificação de risco.
Como isso afeta a minha
vida?
Quanto pior estão as contas
do governo, menos espaço há
para pagar programas sociais
e, até mesmo, serviços bási-
cos, como patrulha de rodo-
vias e confecção de passapor-
tes. Se o governo não conse-
gue economizar o necessário
para cumprir seus compro-
missos, ele recorre a ferra-
mentas de política fiscal, co-
mo aumento de tributos,
além do corte de gastos que
não são obrigatórios, como
investimentos. Essas medi-
das agravam ainda mais a len-
ta recuperação do País, com
impacto sobre emprego, ren-
da e bem-estar.
No caso dos Estados,
uma das possibilidades
é suspender por tempo
determinado a cobrança
de juros da dívida
Cai juro do crédito consignado para aposentado. Pág. B4 }
NO VERMELHO DESDE 2014
FONTE: TESOURO NACIONAL INFOGRÁFICO/ESTADÃO
Resultado das contas do governo
EM BILHÕES DE REAIS
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-
0
50
100
NOVA
META
META
77,
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
-23,
Debate sobre
meta fiscal