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O ESTADO DE S. PAULO QUARTA-FEIRA, 18 DE MARÇO DE 2020 Metrópole E5
Emilly Behnke / BRASÍLIA
O presidente Jair Bolsonaro
afirmou ontem que o gover-
no vai fechar a fronteira com
a Venezuela. A decisão, segun-
do o presidente, será publica-
da no Diário Oficial da União
de hoje e se restringirá ao
país comandado por Nicolás
Maduro pois é “mais sensí-
vel”. A medida é uma forma
de tentar conter a transmis-
são do novo coronavírus.
“Não é um fechamento total,
o tráfego de mercadorias vai
continuar acontecendo. Você
para Roraima se você fecha o trá-
fego com a Venezuela, a econo-
mia de Roraima desanca”, disse
Bolsonaro na entrada do Palá-
cio da Alvorada, residência ofi-
cial. O presidente afirmou que
não tem como “tomar medidas
radicais”, mas voltou a dizer
que é preciso evitar a histeria.
Como antecipou o Estado, o
fechamento da fronteira com a
Venezuela era avaliado havia
dias pelo governo, após pedido
do governador de Roraima, An-
tonio Denarium (sem partido),
aliado de Bolsonaro. O Estado
já sofre com o superlotação de
hospitais motivada pelo grande
número de venezuelanos que
migram em busca de tratamen-
tos de saúde.
Segundo Bolsonaro, porém,
o fechamento de fronteira não
deve impedir que imigrantes
continuem entrando no País.
“Alguns acham a palavra fe-
char a fronteira uma mágica.
Se tivéssemos o poder de fe-
char a fronteira, não teríamos
a entrada de drogas e armas no
Brasil. Temos 17 mil quilôme-
tros quadrados de fronteiras”,
afirmou o presidente. “Há uma
certa histeria com isso tudo,
como se fechar fronteira resol-
vesse o problema. Alguns que-
rem que a gente feche os aero-
portos.”
O presidente da Câmara, Ro-
drigo Maia (DEM-RJ), havia de-
fendido que o Brasil adote medi-
das mais rígidas em relação às
suas fronteiras em meio a pan-
demia de coronavírus. Maia dis-
se que, por ele, as fronteiras bra-
sileiras com os países da Améri-
ca do Sul já teriam sido fecha-
das. Além disso, ele também te-
ria restringido voos internacio-
nais que chegam no País.
“Acho que o governo já deve-
ria ter fechado as fronteiras.
Acho que já deveria ter restringi-
do os voos internacionais e já
deveria ter restringido a circula-
ção das pessoas, principalmen-
te nos Estados, onde a projeção
é de problemas maiores, como
Rio e São Paulo.”, disse na Câ-
mara dos Deputados.
O anúncio de Bolsonaro já re-
presenta uma mudança de pos-
tura em relação ao tema. On-
tem, em entrevista, ele havia
afirmado que não via a medida
como efetiva para conter a
doença. O presidente disse ain-
da que conversou com o presi-
dente do Paraguai, Mario Ab-
do, sobre a fronteira de Ponta
Porã e a cidade paraguaia de Pe-
dro Juan Caballero. Ele classifi-
cou as duas cidades como “gê-
meas”. “Não tem como você
evitar o tráfego de pessoas ali.”
Transporte. O presidente tam-
bém anunciou para amanhã
reuniões para discutir possí-
veis medidas relacionadas ao
transporte aéreo e terrestre.
Ao ser questionado se o gover-
no estuda alguma medida para
a ajudar empresas, que ficarão
sem passageiros por redução
na circulação de pessoas, ele
disse que a questão está sendo
analisada.
“O que a gente pensa aqui é
que fica muito mais caro se vo-
cê não colaborar (com o setor),
porque demissões virão”, afir-
mou Bolsonaro. Questionado
sobre a possibilidade de o
transporte público terrestre
parar, Bolsonaro voltou a criti-
car governadores, dizendo con-
siderar algumas medidas, co-
mo as do Rio, muito drásticas.
“Se o Brasil parar, vai ser um
caos. Vai morrer muito mais
gente da economia”, afirmou.
B
olsonaro age em resposta às críticas
que vem recebendo por não ter ado-
tado nenhuma medida de fechamen-
to de fronteiras, enquanto países vizinhos,
como a Colômbia e o Paraguai, já o fize-
ram. Oficialmente, a justificativa é de que
a decisão foi tomada para atender ques-
tões sanitárias, uma vez que o sistema de
saúde na fronteira está sobrecarregado.
Mas, na verdade, Bolsonaro decidiu baixar
armas e fazer um gesto político, atenden-
do a alguns dos apelos que vêm recebendo.
Por enquanto, esse fechamento parcial
de fronteira vale apenas para a Venezuela.
Mas o tema está sendo reavaliado diaria-
mente, às vezes mais de uma vez no dia,
dependendo da evolução dos problemas.
Bolsonaro conversou por telefone, nesta
terça, com o presidente do Paraguai, Ma-
rio Abdo Benítez. Desde sábado o Para-
guai fechou a fronteira com o Brasil. Brasi-
leiros não entram em Ciudad del Leste. Os
paraguaios, porém, estão liberados para
passar para o lado do Brasil. Com isso,
criam problemas para a população de Foz
do Iguaçu, já que fazem estoques de com-
pras nos supermercados.
Na conversa entre os dois presidentes, o
tema principal teria sido a criação de “bar-
reiras sanitárias” na ponte da Amizade. O
presidente do Paraguai estaria defenden-
do o fechamento da fronteira pelo lado
brasileiro também. No entanto, até o mo-
mento, não há essa decisão pelo Brasil.
O Brasil tem 15 mil quilômetros de fron-
teira terrestre com dez países da América
do Sul. Os problemas nessas áreas são inú-
meros e o fechamento de fronteiras é um
assunto sempre delicado e considerado,
em muitos casos, quase impossível de ser
colocado em prática. Em várias cidades,
como em Tabatinga, no Amazonas, e Letí-
cia, na Colômbia, uma rua liga os dois paí-
ses. O fenômeno se repete entre Ponta Po-
rã, Mato Grosso do Sul, e Pedro Juan Ca-
ballero, no Paraguai, além de muitas ou-
tras áreas. Para os militares, por exemplo,
fechar fronteira é uma decisão pouco efi-
caz – como Bolsonaro chegou a dizer tam-
bém recentemente. Mas todos conside-
ram o assunto muito delicado.
Os ministros da Justiça e Segu-
rança Pública, Sérgio Moro, e
da Saúde, Luiz Henrique Man-
detta, publicaram portaria in-
terministerial ontem que esta-
belece a obrigatoriedade das
medidas de enfrentamento ao
coronavírus e a responsabilida-
de pelo seu descumprimento.
“O descumprimento das me-
didas acarretará a responsabili-
zação civil, administrativa e pe-
nal dos agentes infratores”, esti-
pula a portaria. Em caso de ser-
vidor público que concorrer pa-
ra o descumprimento das deter-
minações, caberá também puni-
ção administrativa disciplinar.
As medidas que se tornam
compulsórias devem ser solici-
tadas pelo Ministério da Saúde
ou por gestores locais da saúde
e devem ser notificadas à pes-
soa previamente.
São elas: isolamento; quaren-
tena; realização de exames; res-
trição excepcional e temporá-
ria de entrada e saída do País;
exumação de corpos; e requisi-
ção de bens e serviços de pes-
soas naturais e jurídicas, com
pagamento posterior de indeni-
zação. A portaria prevê, ainda,
detenção de 15 dias a 2 anos em
caso de descumprimento da
quarentena.
O documento cita dois arti-
gos do Código Penal para justifi-
car a prisão: o artigo 268, que
trata da “infração de determina-
ção do poder público, destina-
da a impedir introdução ou pro-
pagação de doença contagio-
sa”, e o artigo 330, que define a
“desobediência à ordem legal
de funcionário público”.
A norma prevê que os gesto-
res locais do Sistema Único de
Saúde (SUS), profissionais de
saúde, dirigentes de hospitais e
agentes da vigilância epidemio-
lógica poderão solicitar auxílio
da polícia no caso de recusa dos
pacientes.
Quem for preso poderá ser di-
recionado para casa, a fim de evi-
tar a propagação do novo coro-
navírus. Em caso de crimes
mais graves, o preso deverá ser
mantido em cela separada.
PEDRO PRATA, PAULO ROBERTO
NETTO e FAUSTO MACEDO
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
Gesto foi político, após
Colômbia e Paraguai
adotarem bloqueios
Medo do vírus
faz Sérgio Cabral
pedir liberdade
Portaria prevê prisão a quem descumprir quarentena
Gerson Monteiro
ESPECIAL PARA O ESTADO
As rebeliões que atingiram pre-
sídios paulistas estão controla-
das, de acordo com o governo
do Estado. Na manhã de ontem,
o motim que ainda tomava o
presídio de Tremembé foi con-
trolado. A juíza Sueli Zeraick,
da Vara de Execuções Crimi-
nais de Taubaté, acompanhou
as negociações. Parte da peni-
tenciária foi destruída. Ainda
não há um cálculo dos prejuízos
causados pelos detentos, e o go-
verno estuda como será feita a
segurança no local.
Segundo a Secretaria de Ad-
ministração Penitenciária,
1.375 presos fugiram e 586 fo-
ram recapturados na onda de re-
beliões.
Em Tremembé, 218 fugiram e
108 foram recapturados pela Po-
lícia Militar. Mongaguá teve 563
fugitivos, sendo 197 recaptura-
dos. Em Porto Feliz, foram 594
e 281, respectivamente.
Em nota, a Polícia Militar no
Vale do Paraíba, onde está o pre-
sídio de Tremembé, informou
que intensificou o patrulhamen-
to na região do centro de deten-
ção com o objetivo de identifi-
car e recolher os foragidos, e
também pediu ajuda da popula-
ção, que pode informar a locali-
zação de foragidos através do te-
lefone de emergência 190 e pelo
Disque Denúncias (181).
Na segunda-feira á noite, qua-
tro rebeliões aconteceram em
presídios de Mongaguá, Tre-
membé, Mirandópolis e Porto
Feliz. O motivo foi a decisão da
Justiça paulista de suspender as
saídas temporárias de presos
na Páscoa, para conter a disse-
minação do novo coronavírus.
“Foi uma movimentação gra-
ve em termos do que eles causa-
ram à penitenciária”, comen-
tou o promotor Luiz Marcelo
Negrini, que acompanhou a ne-
gociação dentro do presídio em
Tremembé. Os setores de enfer-
maria, rouparia e educação fo-
ram totalmente destruídos, se-
gundo o promotor. Após apura-
ção, presos envolvidos na rebe-
lião serão transferidos.
O presídio tem capacidade pa-
ra 2.672 detentos, e a população
carcerária no local é de 3.006.
/ COLABOROU LUCAS MELO
lSem parada
Medida foi anunciada por Bolsonaro; Maia
defendeu fechamento de todas as entradas
União Europeia decide fechar fronteiras por 30 dias. Pág. E6 }
]
BASTIDORES: Tânia Monteiro
Preso preventivamente desde
novembro de 2018, o ex-gover-
nador do Rio de Janeiro Sérgio
Cabral apresentou pedido à Jus-
tiça para sair da cadeia em meio
à ameaça do novo coronavírus
no Brasil. Os pedidos foram pro-
tocolados perante ao Tribunal
de Justiça do Rio e a Vara de Exe-
cuções Penais da cidade.
O ex-governador diz que a cri-
se será ‘de grandes proporções’
e ‘generalizada’. “É notório o es-
tado caótico do sistema prisio-
nal brasileiro, em especial o do
Rio de Janeiro”, escreve a defe-
sa, que afirma a inexistência de
‘presídio compatível com a con-
dição pessoal’ de Cabral.
“Ante o exposto, requer, dian-
te da urgência que exige o caso,
somada a verdadeira crise sani-
tária que se aproxima, seja o ape-
nado colocado imediatamente
em prisão domiciliar”, solicita a
defesa.
Ainda no Rio, o juiz de Direito
André Tredinnick revogou pri-
são civil de devedor de alimen-
tos tendo em vista a atual pande-
mia do coronavírus. Tredinnick
diz que visitou há poucos meses
a Casa do Albergado Crispim
Ventino e verificou que não ape-
nas há excesso de presos e pre-
sas por metro quadrado, como
“não há como impedir a disse-
minação viral em ambiente car-
cerário”. O processo corre em
segredo de justiça.
Minas. O governador Romeu
Zema (Novo) decretou na se-
gunda que os presos em regi-
mes aberto e semiaberto pos-
sam cumprir a pena em casa co-
mo forma de controlar a disse-
minação do coronavírus. O jor-
nal O Tempo cita o conteúdo do
decreto: “Recomenda-se que to-
dos os presos condenados em
regime aberto e semiaberto de-
vem seguir para prisão domici-
liar, mediante condições a se-
rem definidas pelo Juiz da exe-
cução;Recomenda-se, igual-
mente, a prisão domiciliar aos
presos em virtude de não paga-
mento de pensão alimentícia”.
Medida estabelece a
obrigatoriedade de
isolamento, caso seja
solicitado pelo ministério
ou por gestores locais
DENNY CESARE/CÓDIGO19
Dos 1.375 detentos
que fugiram, apenas
586 haviam sido
recapturados pela
polícia até ontem
Após negociações,
governo controla
motins em presídios
Porto Feliz. Com 594 foragidos, houve 281 recapturados
ARIANA CUBILLOS/AP
Brasil fecha
a fronteira
com a
Venezuela
“Se o Brasil parar,
vai ser um caos. Vai
morrer muito mais
gente da economia que não
anda do que do próprio
coronavírus.”
Jair Bolsonaro
PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Ônibus em Caracas. Situação era avaliada havia dias pelo governo, após pedido do governador de RR, Antonio Denarium