O Estado de São Paulo (2020-03-19)

(Antfer) #1

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F2 Metrópole QUINTA-FEIRA, 19 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Isabela Palhares


“H


oje é dia de coro-


navírus?” Essa é a


pergunta que


Maya Ueki, de 3 anos, tem fei-


to à mãe todos os dias pela


manhã para saber se as aulas


em sua escola continuam sus-


pensas. Com a determinação


do governador João Doria


(PSDB), colégios públicos e


particulares de São Paulo ini-
ciaram nesta semana uma pa-

ralisação gradual por causa


da pandemia de coronavírus


e buscam alternativas para


continuar a ofertar ativida-


des que os alunos possam fa-


zer em casa.


Escolas particulares com


mensalidades mais altas con-


seguiram rapidamente se or-


ganizar para ofertar ativida-


des a distância em todas as eta-


pas, da educação infantil ao


ensino médio. Enquanto isso,


colégios com menos recursos


financeiros, especialmente os


da rede pública, ainda não sa-


bem como dar o suporte para


aulas virtuais. Ainda ontem,


as delegacias de ensino infor-


maram que o recesso de julho


será antecipado – com reto-


mada de aulas só no dia 3.


Já o Conselho Estadual de
Educação aprovou que as ati-

vidades escolares feitas em


casa contem para cálculo dos


200 dias letivos exigidos pela


legislação. A medida, que ain-


da precisa ser aprovada pelo se-


cretário de educação, Rossieli


Soares, vale para as redes públi-


ca e privada.


A publicitária Débora Urike,


de 37 anos, disse ter se organiza-
do para a suspensão das aulas

no Centro Educacional Pionei-


ro, na Vila Clementino, zona sul


da capital, onde Maya estuda. A


menina vai ficar com a avó e


uma babá durante o período em


que deveria estar na escola e a


família se esforça para manter a


rotina com a qual ela está acos-


tumada. “Mantivemos o horá-


rio de acordar, do banho, refei-
ções. A escola deu sugestões de

atividades, de livros, mas ela já


perguntou dos amiguinhos.”


O colégio Avenues, primeiro


a suspender as aulas depois da


confirmação de coronavírus


em um estudante, já está na se-


gunda semana com aulas a dis-


tância. As atividades e a forma


de comunicação entre alunos e


professores ainda passam por
ajustes, uma vez que se trata de

um modelo novo. Uma das mu-


danças foi abrir espaços vir-


tuais em que as crianças peque-


nas (da educação infantil e anos


iniciais do fundamental) pos-


sam conversar com os colegas.


“Preparamos atividades que


os adultos pudessem ajudá-los


a desenvolver, como vídeos dos


professores contando histórias
ou propondo atividades. Mas

percebemos que os pequenos


sentem falta dos amigos ainda


que não expressem isso. Então,


abrimos uma videoconferência


para que possam conversar


entre si e se ver”, contou Lia


Muschellack, diretora de tec-


nologia.


Adaptações. Ontem, no pri-


meiro dia de aulas a distância


no Santa Cruz, pela manhã


alguns alunos tiveram dificul-


dade para acessar as ativida-
des. Com muitas pessoas

acessando o portal ao mes-


mo tempo, houve lentidão.


“Rapidamente, os próprios


estudantes se organizaram.


Um deles conseguiu acessar,


baixar as atividades e o vídeo


e compartilhou com os cole-


gas. Tenho certeza de que


eles vão se adaptar muito me-


lhor e mais rápido do que ima-


ginamos”, contou Adriana


Tuono, mãe de três alunos.


Os filhos, de 16, 13 e 11 anos,


já usam recursos digitais pa-


ra estudar, por isso ela acredi-


ta que a adaptação será mais


fácil. O desafio, segundo ela,


é manter uma rotina saudá-


vel sem as aulas presenciais.


“Sentamos juntos e monta-


mos uma agenda. É entender


que não se trata de férias e


precisamos continuar com


uma rotina, com as responsa-
bilidades diárias.”

Foi a preocupação em mo-


nitorar a participação dos alu-


nos nas atividades que fez o


colégio Bandeirantes, na zo-


na sul, decidir por diversifi-


car os formatos de aulas. “Va-


mos ter vídeo, texto, lista de


exercícios, podcast. O que se


adaptar melhor à disciplina,


ao conteúdo, à forma de


aprendizado dos alunos”, dis-


se a diretora Mayra Lora.


Ela também defende que a


adaptação dos alunos vai ser


rápida por se tratar de um am-


biente conhecido por eles.


Ontem, pouco mais de uma


hora depois de uma professo-


ra de Português ter publica-


do vídeo de uma aula, 400


dos 500 alunos de 1.º ano já


tinham assistido o conteúdo.


“Talvez a adaptação seja
mais difícil para nós, educa-

dores, e os pais. Mas, com


uma situação tão atípica, va-


mos fazer um esforço para


nos adaptar”.


Paula Felix


Adiar assembleias e intensificar


a limpeza das áreas de entrada e


saída dos moradores estão en-


tre as orientações passadas por


entidades ligadas aos condomí-


nios, que estão adotando estra-


tégias para evitar a dissemina-


ção do novo coronavírus.


O Sindicato da Habitação (Se-


covi-SP) e a Associação das Ad-


ministradoras de Bens Imóveis


e Condomínios de São Paulo


(AABIC) recomendam a ado-


ção de medidas para evitar aglo-


merações em áreas comuns e


agir com transparência se ocor-


rer o registro de casos suspeitos


ou confirmados da doença.


“A primeira orientação é evi-


tar aglomerações no condomí-


nio. Há uma recomendação pa-


ra que os idosos e pessoas de


grupos de risco fiquem isolados


e alguns condôminos estão se


colocando à disposição para aju-


dar em alguma coisa. Os síndi-


cos podem orientar porteiros e


zeladores”, sugere José Rober-


to Graiche Junior, presidente


da AABIC.


Graiche Júnior diz que a higie-


nização dos ambientes é funda-


mental. “É preciso manter os lo-


cais arejados, fazer limpezas


constantes e os moradores zela-


rem pela limpeza, cuidando de


equipamentos que manuseiam,


como na academia, passando


sempre álcool em gel.”


Sobre a divulgação dos casos,


ele diz que os moradores preci-


sam receber a informação. “Se a


pessoa estiver com a doença,


que comunique o síndico, que


deverá alertar sem identificar o


doente. O sigilo é para que não


haja discriminação.”


Síndico do Condomínio Ala-


meda Morumbi, na Vila Andra-
de, zona sul da capital, o aero-

nauta Paulo Werneck Coelho,


de 42 anos, diz que medidas es-


tão sendo adotadas para evitar


infecções entre os cerca de 1,6


mil moradores. “Suspendemos


um bazar, reforçamos a limpeza


e o uso de álcool em gel. Tam-


bém antecipamos a campanha


de vacinação que era para o fim


de abril.”


No condomínio Mais Reser-


va Jaguaré, localizado na zona


oeste da capital, salão de festas


e de jogos, academia, espaço


mulher, playground, piscinas e


churrasqueira não podem ser


usados desde sábado.


“Comunicamos a todos os


moradores de forma muito inci-


siva que estamos em uma situa-


ção problemática. Neste mo-


mento de respeito à comunida-


de, a gente bloqueou tudo para


que não haja movimentação


nesses locais. Alguns reclamam


um pouco, mas o morador preci-


sa entender”, diz Iuri Britto, de


37 anos, gerente regional de ven-


das e síndico do condomínio,


que tem cinco torres e 285 apar-


tamentos.
A maior preocupação dele é

com as crianças. “As pessoas


acham que elas são imunes,


mas transportam o vírus. Te-


mos muitos idosos que acabam


vindo aqui porque as crianças


estão fora da escola. Eles não


deveriam, porque são mais vul-


neráveis e ficam expostos, mas


está acontecendo.”


Na semana passada, o gover-


no do Estado anunciou a inter-


rupção gradativa nas aulas nas


redes pública e privada. Na oca-


sião, foi ressaltado que os avós


não devem cuidar das crianças,


tendo em vista que formam par-


te do grupo de maior risco.


Gabriel Caldeira


André Borges / BRASÍLIA


O pastor e líder da igreja pente-


costal Assembleia de Deus Vitó-


ria em Cristo, Silas Malafaia,


afirmou, em vídeo publicado


em seu canal no YouTube, que


não vai diminuir o número de


cultos nem fechar igrejas por


causa da pandemia do coronaví-


rus, contrariando recomenda-


ções de autoridades de saúde pa-


ra que não haja aglomerações.
Para Malafaia, a igreja é “tão

importante quanto as medi-


das” contra a doença. O pastor


afirmou que só suspenderia os


cultos caso a covid-19 force as


prefeituras e Estados a inter-


romper o funcionamento dos


transportes coletivos. Mas o


pastor ressaltou que deixará


igrejas abertas para atender pes-


soalmente os fiéis. Malafaia pro-


pôs como alternativa que “for-


ças-tarefa” sejam deslocadas


para estações de trem, metrô e


terminais de ônibus para “fazer


uma limpeza para amenizar” a
disseminação da doença.

É a segunda vez na semana


que um pastor evangélico vem a


público minimizar os riscos do


coronavírus, apesar de todos os


alertas que vêm sendo feitos pe-


las autoridades de saúde. No


fim de semana, em uma trans-


missão ao vivo em sua página


no Facebook, o bispo Edir Mace-


do, da Igreja Universal do Reino


de Deus, disse aos fiéis que não


se preocupem com a propaga-


ção do coronavírus. Ele atri-


buiu a tensão que o mundo vive


com a doença a uma “tática de


Satanás” e ao trabalho da mídia.


A Igreja Universal não cance-


lou os cultos. Em seu site ofi-


cial, informa que “obedece a


quantidade estipulada pelas au-


toridades e controla a entrada
de público”. Se necessário, diz,

é ampliado o número de reu-


niões para atender a todos. Ain-


da orientou que se evite ora-


ções com “imposição de mãos”


e se oferte álcool em gel e água e


sabão para os fiéis.


O presidente da Frente Parla-


mentar Evangélica do Congres-


so Nacional, deputado Silas Câ-


mara (Republicanos-AM), di-


vulgou nota para pedir a reaber-


tura de templos. Os parlamenta-


res argumentam que precisam


de orações para enfrentar a


“pandemia maligna”.


“Sabemos que a igreja é lugar


de refúgio para muitos que se


acham amedrontados e deses-


perados. A fé ajuda a superar an-


gústias e é fator de equilíbrio


psicoemocional. Por isso, neste


momento de tanta aflição, é fun-


damental que os templos, guar-


dadas as devidas medidas de


prevenção, estejam de portas


abertas para receber os abati-


dos e acolher os desesperados”,


diz a bancada.


A bancada evangélica disse


dar “apoio irrestrito à decreta-


ção do estado de calamidade pú-


blica” pelo governo federal. A


decisão permite o rompimento


da lei de teto de gastos.


Católicos. Já a Conferência Na-


cional dos Bispos do Brasil reco-


mendou que templos católicos


sigam os protocolos das autori-


dades. A reunião anual dos bis-


pos que aconteceria na próxi-


ma semana foi cancelada. Diver-


sas arquidioceses e dioceses pe-


lo Brasil suspenderam missas


públicas. /COLABOROU JOÃO PRATA


PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


Prédios reforçam higiene e vetam até piscina


Adaptação. Os filhos de Adriana Tuono, de 11, 13 e 16 anos, estudam com recursos digitais


Educação


lAlerta


lReação


Malafaia contraria recomendação


e diz que não vai reduzir cultos


Metade dos alunos


em todo o mundo


está sem aulas


SP tem 3 novas mortes pela doença; óbitos no País vão a 4. Pág. F3 }


NILTON FUKUDA/ESTADÃO

Precaução. Sindicato e associação recomendam que condôminos evitem aglomerações


Além de evitar as


aglomerações, a


recomendação é de


isolamento para idosos e


grupos de maior risco


ADRIANA TUONO

COLÉGIOS


INVESTEM


EM AULAS


VIRTUAIS


Desafio é ofertar atividades a distância; conselho


aceita usar EAD na contagem de dias letivos


“As pessoas acham que as


crianças são imunes, mas


elas transportam o vírus.”


Iuri Britto


SÍNDICO DE CONDOMÍNIO

“Coronavírus! Querem


fechar as igrejas de que sou


pastor? Recorram à


Justiça.”


Silas Malafaia


PASTOR E LÍDER DA ASSEMBLEIA DE

DEUS VITÓRIA EM CRISTO

Frente Evangélica do


Congresso quer reabrir


templos contra doença


‘maligna’; outras igrejas


vetaram encontros


l A Organização das Nações


Unidas para a Educação, a Ciên-


cia e a Cultura (Unesco) informou


ontem que metade dos alunos de


todo o mundo está sem aulas por
causa da pandemia. De acordo

com o órgão, 102 países tiveram


o funcionamento de escolas e


universidades totalmente suspen-


so, enquanto outros 11 suspende-


ram parcialmente atividades. Ao


todo, isso significa ao menos 850


milhões sem aulas.


Em um comunicado oficial, a


diretora-geral da Unesco, Audrey


Azoulay, afirma que a crise


“impõe aos países desafios imen-


sos para poder proporcionar um


aprendizado ininterrupto a todas


as crianças e jovens de maneira


equitativa”. / COM AGÊNCIAS

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