Valor - Eu & Fim de Semana (2020-03-20)

(Antfer) #1
Sexta-feira,20demarçode2020|Valor| 17

“As medidas[para
evitara disseminação
docoronavírus]
deveriam valerpara
todomundo, inclusive
para o presidente”,
afirmaUip

ção? “O sequenciamento foi feito em apenas
48 horas. Éde arrepiar! Apossibilidadede
avançarna ciência éoladopositivo da pande-
mia.Queogovernoavaliequenãopodeinves-
tir em vacinasnestemomento, eu entendo,
mas que agente tem que participar, não te-
nho a menordúvida.” Pesquisadores do Labo-
ratório de Imunologia do Instituto do Cora-
ção (Incor) eda Faculdade de Medicina da
UniversidadedeSãoPauloestãodesenvolven-
do uma vacina contra ocoronavíruscom
apoioda Fundaçãode Amparo à Pesquisa do
EstadodeSãoPaulo(Fapesp).
Oinfectologista apontouos cozinheiros
com chapéu na cozinha do Rubaiyat. Foiali
que preparoujantares paraarrecadar verbas
para suas ações sociais, comoa Casa da Aids,
dirigida por ele durante oito anos. Contava
como auxíliodo ex-ministro de Educação
Paulo Renato(1945-2011) edo médico e de-
putado federal José Aristodemo Pinotti
(1934-2009). “O Paulo e o Pinotti eramexí-
mioscozinheiros, eu só enrolava, era uma far-
sa”,lembrouomédico,rindo.
Ogarçomapareceu com ocardápio,mas
Uip o dispensou.Escolheu o pratode sempre:
chouriço e arrozBiro-Biro. “Soutradicional.”
Pé de valsa, o médicocostumava sair para
dançarsemprenos mesmoslugares, comer
nosmesmosrestaurantesepediramesmaco-
mida.Mas,agora,porcausadoritmodetraba-
lho edas restrições a aglomeraçõespara con-
ter o novocoronavírus, muitas atividades têm
setornadocadavezmaisinviáveis.
Ogovernofederal,Estados emunicípios,
porexemplo,anunciaramdiversasmedidas
para tentarconter a transmissãoda doença
no Brasil.Isso afetaescolase universidades,
transportepúblico, serviçosde saúde,co-
mércio,órgãospúblicoseeventos.
Medidas drásticas impostas por outrospaí-
ses, comoisolamento equarentena obrigató-
ria para todaapopulação, têm se mostrado
eficazesparaconteraevoluçãodosurto.Frear
a disseminaçãoé uma maneira de evitar a so-
brecarga no sistemade saúde.No entanto,
Uip avaliou que essasações são pouco factí-
veis em paísespobres e que há uma sériede
questõesquedevemserlevadasemconta.
“Como isolarumafamília que moraem
um barracona favela com um únicocômo-
do? Comquemficarãoas criançasde uma
mãequeprecisatrabalhar,masaescolaestá
fechada? Comos avós, justamenteos mais
vulneráveis?Não pode.”Além disso,acres-
centou,o fato de oBrasil ser um país de di-
mensões continentais tambémtem que ser
levadoem consideração. Onovo coronaví-
rus, diz, provavelmentenão vai se espalhar
damesmaformaportodososEstados.
“Na hora que você para um montede coi-


sa, para a cadeiaprodutivaresponsável pe-
los insumos,inclusivedos que precisamser
usadosna saúde.Tudo isso precisaser pon-
derado,portantonãoéumadecisãosim-
ples”, disse.“Se você me perguntarse tenho
segurançatotalde umacoisa,não tenho.
Mas vou, acada momento,avaliartodosos
fatoresde custo/benefício. Vai funcionar ou
vamoscausarum problemaaindamaior?
Agora,isolamentode caso positivoe qua-
rentenapara as pessoasque tiveramconta-
to têm que fazer.” As medidasdevemser to-
madasdiaapósdiaecomcautela.
Convencer a população quanto ànecessi-
dadede prevençãonem sempreé tarefa fácil.
Casosdedoençassexualmentetransmissíveis,
comoo HIV/aids,sífilis, HPV e gonorreia, têm
crescido “que é umadesgraça”. Os medica-
mentosque ajudamaconteras doençasnão
podemser desculpa para as pessoasnão usa-
rempreservativos. “Nada tem garantia de
100%,temqueusaracamisinha.”
Oinfectologistanarraocasodeumcasalde
médicos, esclarecidos,que decidiu colocar
umterceironarelação.Ninguémusoucamisi-
nha. “Cada um faz o que quiser. Não vai aí ne-
nhumacrítica,oproblemaéafaltadepreven-
ção.”Nodia seguinte foram ao Emílio Ribas
para tomar remédioeevitar contrair adoen-
ça. Resultado? Um ficou negativo eooutro,
positivo. Uip disseque é comum ver casos de
pessoasque misturam álcool,drogae sexo e
chegam em seu consultório sem lembrar do
queaconteceunanoiteanterior.
“Coronavíruséuma situaçãoque cai no
seu colo e você tem que enfrentar. Oresto eu

me sintoincompetente.Falo de prevenção
há 40 anos,minhavida inteira,enão consi-
go convenceras pessoas.”Muitospais têm a
crençade que seus filhosadolescentessim-
plesmentenão fazemsexo,nem usamdro-
gas. “Isso só na cabeçadeles.”Amesmainge-
nuidade,disse,é acreditarque proporabsti-
nênciasexualpossaser uma políticade saú-
de públicaefetivapara evitargravidezinde-
sejadaou doençassexualmentetransmissí-
veis, comopropostopela ministraDamares
Alves(Mulher,FamíliaeDireitosHumanos).
Pausa paraa comida. “Hum,adoroarroz,
por mimcomeria tudocom arroz”, disse,an-
tes de trazer ocaso Tancredo Neves
(1910-1985)àmesa.Nasuaavaliação,ascom-
plicaçõesdesaúdedopresidenteantecedema
internação.Com75anos,jácorriaumaltoris-
co ao chegar ao Hospitalde Base de Brasília.
Uip era da equipe de médicos que cuidoude
Tancredoeasseguraqueelenuncatevecâncer
nem diverticulite, mas um tumor benigno no
intestinoquetratavacomautomedicação.“Eu
era muito joveme me envolvi em um caso de
repercussãoque acabou dandoerrado. Foi
umaloucura,opovocolocavaaculpanosmé-
dicos.” Um grupodeu murroseamassouseu
carro,suamulhersaiudecasaefoimorarcom
os pais, com medo das ameaças, e Uip passou
aandarcomescoltadaPolíciaMilitar.
Alémda sucessão de erros de procedimen-
tos e diagnóstico, os boletinsmédicosescon-
derama gravidadedocaso de Tancredo.Ou-
tros pacientespolíticos de Uip foram tratados
com transparência desdeo princípio. Éocaso
do governador Mário Covas (1930-2001), que

SILVIA COSTANTI/VALOR

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