Sexta-feira,20demarçode2020|Valor| 19SOCIEDADE
Emtemposxenófobos,exposição valorizarefugiados
ConsuladoGeral doBrasil
emGenebra abriga
mostra sobre
contribuiçãodosexilados
daSegundaGuerra
Mundial.PorAssis
Moreira, deGenebra
DIVULGAÇÃOA exposiçãodestacao judeualemãoHansStern,queabriulojadepedraspreciosasA
exposição“Legadodo Exí-
lio: A Contribuição dos Re-
fugiadosdaSegundaGuerra
para o Brasil”será abertana
quarta-feira(25),no ConsuladoGeral
do Brasilem Genebra,numcontexto
de criseecrescentexenofobia,fecha-
mentode fronteirase cenasde refu-
giadosàderivaemtornodomundo.
A mostra é resultado de colaboração
entreoconsulado e a Casa Stefan Zweig
(CSZ), inaugurada em Petrópolis em ju-
lho de 2012.Aintençãodo idealizador
daCSZ,AlbertoDines(1932-2018),des-
de sempre foi homenagear milharesde
refugiados que, assim como o escritor
austríaco Stefan Zweig (1881-1942),
deixaram para trás suas pátrias eforam
obrigadosarecomeçardozero.
Gravemente deprimido, Zweignão
suportouasolidão intelectual em Pe-
trópolis (RJ) e suicidou-se,com sua se-
gundamulher, Lotte.Centenas de ou-
tros exilados refizeram suasvidas e
deixaram um importante legado.
O Memorialdo Exíliona CSZ começou
com um toteminterativoem que visitan-
tes podemconsultarmais de uma cente-
na de minibiografiasem áudioe vídeo,
comoexplicaKristinaMichahelles,dire-
tora-executivadaCSZecuradoradaexpo-
sição.Foi para as telas da TV sob aforma
de uma série em dez episódioschamada
“Cantodos Exilados”,produzidaedirigi-
da por LeonardoDouradoe exibidapelo
canalArte 1 em 2016,tendosido reprisa-
danaquelecanalenoEurochannel.
Nomomento,umaequipedenovepes-
quisadoressob coordenaçãode IsraelBe-
loch trabalhana elaboraçãodo “Dicioná-
rio do Exílio”, com 285 verbetesde exila-
dos, queserápublicadoem2021.Aexpo-
siçãodeGenebraéumapequenaamostra
dessetrabalhodepesquisa.
“É importante lembrar ocontingente
de pessoasperseguidas que encontra-
ram novapátria no Brasil, fugindo da
violêncianaEuropaanteseduranteaSe-
gundaGuerra [1939-1945] eque deixa-
ram sua marcano NovoMundoem vá-
rios campos do conhecimento, das artes
e ciência”, diz a cônsul-geralem Gene-
bra,aembaixadoraSusanKleebank.
Kristinaacrescenta: “Quando se aco-
lheoexilado, dando-lhecondiçõesade-
quadas, elevai retribuir.Éis so o que
queremos mostrar às novasgeraçõesa
partirdas fascinantes trajetóriasdesses
homensedessasmulheres”.
Nessecontexto, a Casa StefanZweigre-
ceberárecursosnesteano da Fundação
Konrad Adenauer,do partidoda chance-
ler alemãAngelaMerkel,para desenvol-
ver visitasde estudantes“parateremaula
viva de históriano museuem que se fala
de SegundaGuerra,exílio, tolerância,pa-
cifismo,humanismo,ou seja, oideáriode
StefanZweig”,dizRenatoBronfman,dire-
tor da CSZ. Omuseuatraianualmente
maisde2milvisitantes,dosquaisumter-
çoéformadoporturistaseuropeus.
Durante a SegundaGuerraMundial,
milharesde pessoas foram forçadas a
deixar aEuropa para fugirdos nazistas.
Na América Latina,oBrasil foi o segun-do país que maisacolheu refugiados
depoisdaArgentina, com um número
estimadoentre13mile16mil.
Na cena musical,vários músicos e
compositorespartiramparaoBrasilcom
novavisão estética eajudaram amontar
orquestras nacionais. Casode Eugen
Szenkar(1891-1977),queantesdepartir
paraoBrasil,em1939,faziabelacarreira
na Europa. No Brasil, foi oprimeiro re-
genteda Orquestra Sinfônica Brasileira
(OSB), no Rio. Foi amigo de composito-
res comoBéla Bartók (1881-1945), Ser-
gei Prokofiev(1891-1953)eAram Kha-
chaturian (1903-1978) etransformoua
cenamusicalnoRio.
Outromaestrofoi ojudeualemão
ErnstMehlich(1888-1977).Em 1933era
chefedo departamentode músicada ci-
dadee diretormusicalem Baden-Baden.
Partiu para evitarser preso.EmSão Paulo,
tornou-seoprimeirodiretormusicalda
OrquestraSinfônicaMunicipal.
FelicjaBlumental (1908-1991) foi
umapianistaecompositorapolonesa
que acabou se naturalizandobrasileira.
Ela encantou Heitor Villa-Lobos
(1887-1959), que em 1954 dedicou-lhe
o“ConcertoparaPianoNo5”.
Entre os empreendedores, a exibição
mostraHansStern(1922-2007),quefu-
giuda Alemanhaaos 17 anos de idade.No Brasil,começou atrabalhar como
datilógrafonumacompanhiaquepolia
pedras preciosas.Logo ele começou a
viajar pelo país para comprar evender
essas peças.Em 1945inaugurousua lo-
ja, aprimeira no Brasilcom certificado
internacional. Em 1964,foi chamado
pelarevista“Time” dereidosdiamantes
edasgemascoloridas.
Regine Feigl, que nascera no Império
Austro-Húngaro, chegou ao Brasil com
o marido, Fritz, conhecido químico da
Universidadede Viena,eofilho,Hans.
Baseado nummétodode extração de
cafeínadesenvolvidoporFritz,elamon-
tou uma fábrica que vendia sua produ-
çãoparaaCoca-Cola.
O húngaroOscar Aranyfugiu dos
nazistas em 1938 e, comocelista, foi
um dos membros fundadoresda Or-
questra Sinfônica Brasileira. Dianteda
dificuldade paraencontrar partituras
de música clássica, ele passoua impor-
tar e acabouabrindouma loja no Rio,
que se tornoulocalde referênciapara
músicos clássicos e da bossanova.
Tambémfotógrafosexcepcionaische-
garamao Brasilpós-deflagraçãoda guer-
ra na Europa.Caso de HansGunterFlieg,
de 97 anos,que captouimagensaparen-
tementebanaisdeSãoPauloemplenain-
dustrialização.OfrancêsJean Manzon
(1915-1990)inovounojornalismo.
Muitos refugiados tiveram em co-
mumumavastaculturae grandeamor
peloslivros.Para ganharalgumdinhei-
ro, Eva Herz(1911-2001)começouem-
prestandolivrose depoisfundouaLivra-
ria Cultura.ErichEicherchegouao Brasil
com 18 anos,fez parceriacom outroaus-
tríaco, NorbertGeyerhahn,efundarama
LivraraKosmosem 1936no centrodo
Rio, que se tornouentãolocalde encon-
tro de intelectuaisepolíticos.A alemã
SusanneBachfundouo primeiro“bo-
okshop” internacionalno Rio de Janeiro.
A mostraemGenebrafoiparcialmente
afetadapelo coronavírus.AUniversidade
de Genebrateve que adiarpara setembro
aapresentaçãodos vídeos,diantedas res-
triçõessanitáriasimpostasatualmentea
agrupamentodepessoas.Emtodocaso,o
interesseé grandena Europae a exposi-
ção deve depoisocorrerem Berlim,Viena
eZurique,porexemplo.■Canal Unico PDF - Acesse: t.me/jornaiserevistas