Q
uerido(a) leitor(a), mais um ano se passou e,
pasmem, já é dezembro outra vez! E o que
combina mais com dezembro do que o Natal?
Se você acompanha esta coluna há algum tempo,
além da minha gratidão pessoal, sabe que gosto de
trazer sempre uma história de Natal, uma maneira
de fechar o ano de forma serena. Essas histórias nos
mostram que, mesmo em meio ao caos e sofrimen-
to das guerras, é possível que os seres humanos
(inclusive os inimigos em batalha) encontrem um
momento de paz. E se você é novo por aqui, seja
muito bem-vindo, e se acomode confortavelmente
que lá vem história!
Na coluna de exato um ano
atrás, falamos sobre a Batalha
do Bulge, também conhecida
como Batalha das Ardenas, e
da famosa frase “Nuts” (“Lou-
cos”), proferida pelo coman-
dante norte-americano em
resposta a seu homólogo ale-
mão. Nossa história de hoje se
passa na mesma batalha, mas, em vez de tratar dos
generais, falamos de pessoas comuns, soldados
estadunidenses e alemães e, sobretudo, de civis.
Imagine uma paisagem branca, as copas das
árvores cobertas com a neve que acaba de cair, um
chalé no meio da mata, fumaça saindo da lareira...
Um cenário bem bucólico, não é mesmo? Seria a
imagem perfeita de um Natal aconchegante, não
fosse o fato de este chalé se localizar exatamente
na fronteira, na linha de frente da Batalha das
Ardenas. Nesta habitação moravam dois civis ale-
mães, Fritz Vincken e sua mãe, Frau Elisabeth
Vincken. O pai, Herr Hubert Vincken, um padei-
ro de profissão, havia levado a família para a f lo-
resta enquanto servia nas tropas de apoio do Exér-
cito Alemão. Herr Vincken acreditava que no meioda mata a família estaria segura, mas em um país
em guerra, “seguro” é um termo relativo.
Na noite de 24 de dezembro de 1944, Fritz e sua
mãe estavam se preparando para comer sua ceia
natalina – apesar de a “refeição” ser uma sopa de
frango, feita com um galo magro e batatas ralas,
Frau Vincken se esmerara para fazer com que o
Natal de seu filho de apenas 12 anos fosse “o mais
normal possível” –, quando foram interrompidos
por batidas fortes na porta. Apagaram as luzes e,
cuidadosamente, olharam pela janela para ver
quem estava ali no meio da noite. O “visitante” era
não um, mas três soldados do Exército dos Estados
Unidos. Cansados, com frio e
sem roupas adequadas, além
de um deles estar gravemente
ferido, bateram na primeira
habitação que viram – sem sa-
ber o que os aguardava.
Os Vincken colocaram os
militares para dentro, mesmo
sabendo o risco que corriam,
pois, na Alemanha de Hitler, um civil acolher o
inimigo, ainda que ferido, era crime punível com a
morte – nem as crianças estavam livres da pena
capital. Como Elisabeth falava francês, ela foi capaz
de se comunicar com um dos soldados, que sabia
um pouco do idioma, lhe explicando que eram
bem-vindos. Os rapazes se sentiram em casa, todos
eram bem jovens, apenas poucos anos mais velhos
que Fritz. Se sentiram como se estivessem sendo
cuidados por suas mães. Quando estavam todos se
sentando para a ceia, uma nova batida na porta.
Mais uma surpresa, uma patrulha alemã!
Fritz abriu a porta e na sequência veio Elisabeth.
Os alemães disseram que haviam se perdido de sua
unidade e pediram hospedagem por uma noite.
Frau Vincken disse que eram todos bem-vindos,COLUNA RICARDO LOBATO
UMA NOITETRANQUILAFOTO GETTY IMAGES“Hoje é Natal. Não
haverá tiroteio por aqui”,
disse Frau Vincken, ao
receber soldados alemães
e americanos em seu lar