Valor Econômico (2020-03-21, 22 e 23)

(Antfer) #1

JornalValor--- Página 10 da edição"23/03/2020 1a CAD B" ---- Impressapor ccassiano às 22/03/2020@20:03:46


B10|Sábado,domingoe segunda-feira, 21, 22 e 23 de marçode 2020


Agronegócios


IMPACTOSDO


CORONAVÍRUS


Proteçãocambial
Perfilde endividamentoda Minervae custo do hedge

Perfilde dívidafinanceirada Minerva*(R$bilhões)

Maisbarato
Evoluçãodo custo do hedge cambial,taxas linearespara 360dias corridos (fimde período), em %

Fontes:Minerva e B3. Elaboração: Valor Data.*Dados de 31 de dezembrode 2019. ** Em pontospercentuais

Dívidabrutatotal Curtoprazo

Dívida totalEm moeda
nacional

Em moeda
estrangeira

0

4

8

12
10,477

2,185

8,292

0

4

8

12

2,867

1,136

1,731

Longoprazo

0

4

8

12

7,610

1,049

6,561

Dívidatotal Em moeda
nacional

Em moeda
estrangeira

Dívidatotal Em moeda
nacional

Em moeda
estrangeira

0

5

10

15

20

2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 19/Mar/20

SwapDI x Pré SwapDI X Dólar Diferença**

00

4

8

12

(^1655)
2000
8,21 7,15
5,48
8,87 9,01
14,35
7,9
4,03
1,2 1,05
1,71
FrigoríficosEmpresamantém50%desuaexposição
delongoprazoprotegidapormeiodederivativos


Estratégia de proteção


da Minerva ao dólar vai


além do hedge natural


Luiz HenriqueMendes
De São Paulo

“O hedgenatural ébonito no li-
vro-texto, mas na prática há mui-
tas variáveis que você não contro-
la”.AfraseédeEdisonTicle,diretor
financeiro da Minerva Foods, uma
dasmaioresexportadorasdecarne
bovina da América do Sul. Em tese,
areceitaemdólaroriundadasven-
das externas compensaria, no mé-
dio prazo, o efeitonegativo do sal-
to da divisa americana sobre o en-
dividamento e as despesas com ju-
ros,masarealidadeémaisdifícil.
Desdemeadosde 2018,aMiner-
va mantémem tornode 50% da ex-
posiçãode longoprazoao dólar
protegidapor meiode instrumen-
tos derivativos—basicamente
NDFs,que equivalemà comprade
dólarfuturonomercadodebalcão.
Em 31 dezembro, últimodado
disponível, a Minervatinhauma
posição comprada em dólar,por
meiode NDFs,de poucomaisde
US$1bilhão.Dessetotal,US$850
milhõesse referiamaos instru-
mentos paraprotegeradívida
em dólarde longoprazo(que
venceem maisde um ano),eque

no fim do ano passadosomava
US$1,7bilhão,segundoTicle.
Comisso, acompanhia julga
estar a salvodas piores tormentas
provocadaspelovalorizaçãodo
dólar.Em2020,amoedaamerica-
na se apreciou 24,5%anteor eal,
passandode R$ 4,03 para R$ 5,02.
Grosso modo,avariação cambial
teriafeito a dívidadaMinervaem
moeda estrangeira que vence
no longo prazo aumentar de
R$6,5bilhõesparaR$8,5bilhões.
Sem o hedgecambial,inevita-
velmente oindicador de endivida-
mento(relação entredívida líqui-
daeEbitda)daMinervadispararia.
Em dezembro, esse indicador esta-
va em 2,8 vezes.Do pontode vista
de receita em dólar, que poderia
suavizar oaumento da dívida, é
preciso ter em conta que o resulta-
do —positivo —do dólarvaloriza-
donãoapareceráimediatamente.
Isso ocorre, entre outros moti-
vos, porque oprimeiro trimestre é,
sazonalmente, maisfraco paraas
exportações de carne bovina. Afo-
ra isso,adesaceleração econômica
global pode ter reflexos negativos
sobreofluxo das exportações nos
próximos meses, conjecturouo di-

retor da Minerva, ao defendersua
posiçãocontrao“hedgenatural”.
NaentrevistaaoValor,oexecuti-
vo da Minervanão fez comentários
sobreas exportaçõesdo grupones-
te trimestre,mas éfato que as pers-
pectivasparaoanosãopiores,mes-
mo com atenuantescomoa escas-
sezdeproteínanaChina—queain-
dasofrecomosefeitosdaepidemia
depestesuínaafricanaedeveconti-
nuarabsorvendocarneimportada.
Na semana passada,opresiden-
te da Associação Brasileira das In-
dústrias Exportadoras de Carnes
(Abiec), Antonio Camardelli, disse
que as exportações àEuropa sofre-
ram grande abalo em razão do co-
ronavírus. Alémdisso, arecupera-
ção da demandachinesa enfrenta
problemas logísticos, comoafalta
de contêineres. Dados prelimina-
resdaSecretariadeComércioExte-
rior(Secex)mostramque,nasduas
primeiras semanas de março, ovo-
lumemédio diário de exportações
decarnebovinadoBrasilcaiu4,4%
anteomesmomêsdoúltimoano.
Nesse ambiente, aMinerva anun-
ciounaterça-feirafériascoletivasem
quatro de seus novefrigoríficos no
Brasil. Em nota,acompanhia disse

que éuma formade ajudarno com-
bateàpropagação do coronavírus e
tambémum reflexo da “piorados
cenários doméstico eglobal, que in-
clui queda na demandano segmen-
to de food service e limitações logís-
ticasemdiversaspartesdomundo”.
Para aMinerva, as vendasestão
concentradasno exterior —mais
de 65% do faturamento de R$ 18,1
bilhões de 2019. No Brasil, acom-
panhiasempre dedicouos esfor-
ços para o pequeno emédio varejo
e parao food service, que costu-
mam ter maior rentabilidade.
Agora,comoisolamentodapopu-
laçãonas residências, este último
segmento está bastante desafiado.
Hárelatosdefrigoríficosqueredu-
ziram as vendas para foodservice
em 40% na semanapassada. Na
bolsa,acrisedocoronavírusrepre-
sentouquedade 39,2%no valor

das açõesda Minerva, atualmente
avaliadaemR$3,75bilhõesnaB3.
Nessa conjuntura,aproteção
financeira da Minerva poderá
render um alívio. Masissosóé
possível porque o custo para
montar posições de hedgecaiu
sensivelmente. Quando ataxa de
juros no Brasil era alta, aestraté-
gia de hedge da Minerva era mais
ativa, montando e desfazendo
posiçõesao sabor do risco econô-
mico epolítico. No auge da reces-
sãobrasileira,em2016,aMinerva
chegou apagar 14% por ano.Mas
a expressiva redução do diferen-
cial entreos jurosbrasileiros eos
americanos fez o custo do hedge
cair para menos de 4%. Com essas
mudanças, a Minerva pode man-
teraproteçãocambialporlongos
períodos sem que a despesa fi-
nanceiratenhapesoexcessivo.

Embora há temposadvoguea
necessidade de protegerobalanço
dascompanhiascontraossolavan-
cos cambiais, Ticle admite que, no
passadorecente, o custo parapro-
tegeraexposição em dólar era im-
peditivo, o que tornava operações
do tipo episódicas e, não raro, mal
recebidas pelos analistasdeban-
cos—estimarasdespesasfinancei-
raseracomoapostarnaloteria.
Agora, afirmouTicle, ocusto de
proteger obalanço contra a valori-
zaçãodo dólar,somado ao custo
de dívida do grupo,éinferior ao
Retorno sobre oCapital Investido
(ROIC). Essa não era a realidade no
passadodejurosaltosnoBrasil.Do
pontode vista econômico, asoma
entre o custo de hedge e o de dívi-
da já chegou aser superior ao
ROIC,oque poderiafazerdacom-
panhiauma“rendafixanegativa”.

Adiamento de feiras golpeia indústria de máquinas


Conjuntura


Rafael Walendorff
De Brasília

O adiamento de eventos impor-
tantes do agronegócio por precau-
ção ante a proliferaçãodo coronaví-
rusdeveráafetardrasticamenteain-
dústria de máquinas eimplementos
agrícolas do país esteano. Feiras co-
mo TecnoshowComigo,Agrishow,
Agrobrasília e Expozebu foramsus-
pensas. Juntas, elasmovimentaram
mais de R$ 7,5 bilhõesem negócios

em 2019 e aexpectativa era que esse
marcafossesersuperadaem2020.
“O impacto vai ser grande”, afir-
mouPedro Estevão Bastos, presi-
dentedaCâmara Setorial eMáqui-
nas e ImplementosAgrícolas da
Associação Brasileira da Indústria
de Máquinas e Equipamentos
(Abimaq). Segundoele, a previsão
de crescimento de 7% em 2020 das
410associadasdaentidadenoseg-
mento—quefaturaramR$16,7bi-
lhõesem 2019 —, será frustrada.
“As fábricas vão parar com a que-
bradacadeiadefornecimento”.
NoRioGrandedoSul,queproduz
62% das máquinas do país, aespe-
rançaéarealizaçãodaExpointer, no
segundosemestre. A Bahia Farm
Show, prevista para maioem Luis

Eduardo Magalhães,tambémainda
nãoanuncioumudançadedata.
“Vendaéemoção, eas feiras são
um instrumento de vendasmuito
fortedo nosso segmento. Os adia-
mentosvãoprejudicarmuitoasven-
das”, afirmou Cláudio Bier, presi-
dentedoSindicatodasIndústriasde
Máquinas e ImplementosAgrícolas
no Rio Grande do Sul (Simers). Na
indústria de Bier,70% dos funcioná-
riosjáreceberam férias coletivas eo
mesmo deve ocorrer com o restodo
pessoal em 15 dias. O dirigentelem-
brouque as grandes montadoras
têm “fôlego maior”, eque as peque-
nasterãomaisdificuldades.
AAbimaqenviou ofício àminis-
tra da Agricultura, Tereza Cristina,
pedindo aantecipação do Plano Sa-

fra 2020/21 de julho para abril.Mas
a medida foi descartadapelo dire-
tor de Financiamento e Informação
do Pasta, Wilson Vaz Araújo. “Nos
resta aguardar.Cada um terá que
arcarcom um poucodo prejuízo”,
disseFranciscoMatturro, presiden-
te da Agrishow—maior feira agro-
pecuária do país,realizada todosos
anos em Ribeirão Preto (SP).
O adiamento das feirastambém
pesana programaçãodedesem-
bolsos do crédito rural,e ocenário
econômicoimpedemelhorias nas
linhasdebancosprivados.“A gente
vinha trazendoprodutoscom re-
cursospróprioseconseguiaofertar
nas mesmascondiçõesdas linhas
do BNDES. Na última semana,ain-
certeza praticamenteinviabilizou

essetipodeoperação”, afirmouRo-
bertoFrança, diretor de Agronegó-
cios do Bradesco. Aatual carteira
decréditoruraldobancosuperaR$
30 bilhões,dos quais R$ 7 bilhões
são direcionadospara acomprade
máquinaseimplementos.
França já identificaoutrospro-
blemas. “Alguns decretos munici-
pais estão fechandocartórios. Isso
é um problemasério. Semeles,
operações de financiamentos não
podemserformalizadas”, alertou.
O Bancodo Brasil,líder em crédi-
to rural no país, reforçou as linhas
para oagronegócio com mais R$ 20
bilhões, com foco em comercializa-
ção e estocagemda produção. O vi-
ce-presidente de Agronegócios e
Governo do BB, João Rabelo Júnior,

disseque ainstituição vai facilitar
operações com concessionárias, in-
dústrias erevendas cadastradas em
uma espécie de “feira virtual”, para
osclientesquequiseremconcretizar
as compras de máquinas,equipa-
mentos de irrigação,pequenases-
truturas de armazenagem eprodu-
çãodeenergiafotovoltaica.
Mas os estímulospodemnão ser
suficientes. Comohouve forte inves-
timentos em máquinasna última
década, os agricultorespodemdeci-
dir esperar para fazernovas aquisi-
ções. “A maioria vaise retrair. Logo
haveráfaltade liquidezna econo-
mia e aí a retraçãoserá maior. Para a
indústria, será um ano destrutivo”,
disseEnio Fernandes, professor da
FundaçãoGetulioVargas(FGV).

.


Usinassucroalcooleiraspedemsocorro ao governo


DANIELWAINSTEIN/ VALOR

Luiz Gustavo Junqueira, diretor da UsinaAltaMogiana:quedade preços


CamilaSouzaRamos
De São Paulo

Os produtores de etanol estão or-
ganizandouma lista de pedidos de
socorroao governo federalem meio
àdupla crise que golpeounestemês
o segmento: o colapsoda demanda
por causado coronavírus e o tombo
do petróleo derivadode divergên-
ciasentreArábiaSauditaeRússia.
OValorapurou que, de imediato,
as empresas queremque o governo
autorizeonãorecolhimentodePISe
Cofins por 120 dias, que seriampa-
gosposteriormente,aindanesteano
fiscal. Comisso, aexpectativa é que
as usinastenhamreforço em seu ca-
pital de giro para iniciar a safra que
começaráem abril(2020/21), ga-
rantindoopagamentodasdespesas.
Os grupos do segmentopagam
R$0,1309porlitrodePISeCofins.
Asegundareivindicaçãoéacria-
çãodeumalinhadefinanciamento
doBNDESatreladaaoprogramafe-
deralRenovaBioparagarantirao
menos a manutenção dos investi-
mentosemprodutividade,quenão
podemdeixarde ser feitossob pe-
na de deterioração dos canaviais e

reduçãodos ganhosnas safrasse-
guintes. A ideia que está em gesta-
çãoéqueapenasasusinascertifica-
das para participarem do Renova-
Biotenhamacessoaesserecurso.
Circula também entre alguns
membrosdosetor uma propostade
elevação da alíquota da Cide sobrea
gasolina— hoje em R$ 0,10 por litro.
Segundoumafonte,amedidapode-
ria melhorar acompetitividadedo
etanolhidratadoanteocombustível
fóssilmesmoantevendasanêmicas.
Asdiscussõesestãoemcursoen-
tre as associações representantes
das usinas, comoaUnião das In-
dústriasde Cana-de-Açúcar (Uni-
ca) eaUniãoNacional do Etanol
deMilho(Unem),eentidadesesta-
duais.TambémparticipamoMi-
nistério de Minas e Energia (MME)
eoBNDES, conforme uma fonte. O
conjuntodepedidosserá“aprimo-
rado” antes de ser apresentado
aocomitêdecrisedogoverno.
Não se trata de umaarticulação
isolada no setorprivado. Quaseto-
dasascadeiasprodutivasestãoseor-
ganizandopara pediralívio fiscal e
socorrofinanceiro ao governo, já
que a pandemiada covid-19exige

medidas de controle de circulação
das pessoas que levam inevitavel-
menteaumchoquenademanda.
A chegadado coronavírusno
Brasilviroude ponta-cabeçao ce-
nárioalvissareiroquesearmavapa-
ra a próximasafrade cana no país.
Apósdois anos de preçosde açúcar
em patamaresmuitasvezesabaixo
do custode muitosprodutores,o
déficitglobalde ofertavinhaofere-
cendosuporteaospreços.Alémdis-
so,odólarvinhasemostrandocada
vez maisfavorável às exportações.
Paralelamente,asperspectivaspara
oetanoleramde preçosaindasus-
tentadospor causado consumoin-
ternodecombustíveisaquecido.
Em 15 dias, tudo mudou.Na pri-
meiraquinzenademarço,asaltera-
ções no comportamentodo consu-
midorforammaissignificativasem
São Paulo,mas sem um padrão, se-
gundoSergioMassilon,presidente
da Associaçãodas Distribuidoras
de Combustíveis(Brasilcom).“Mas
asprevisõesparaasegundaquinze-
nanosparecemsombrias,compro-
vávelquedasignificativadedeman-
dadecombustíveis”.Embreve,afir-
mou,as distribuidoras erevende-

dorasverão“umaumentonosesto-
ques,em funçãodas obrigações
contratuaiscomos fornecedores,
mormentecomaPetrobras”.
Para piorar,aguerrado petró-
leo entre Arábia Saudita e Rússia,
que não querem perderparticipa-
ção de mercado numcenário de
reduçãode consumo, nemcome-
çou a se refletir nos preços da ga-
solina nos postos brasileiros.
Desde que os sauditas decidiram
inundar omundo de petróleo, em 8
de março, a Petrobrasjá cortou o
preçodagasolinaA(semetanolani-
dro)nas refinarias em 20%.Nas
bombas,aquedafoide1%,nasema-
naatéodia21,segundoaANP.Nesse
período,oetanol hidratadojánão
estava mais competitivo que agaso-
lina nos principais polos de consu-
mo,comoSãoPauloeMinas.
Para algunsanalistas, opreço do
etanolteráque recuar muitopara
retomar competitividade. “A aco-
modação da menor demanda se
dará por um ajuste na paridadeen-
tre gasolina eetanol. Ou seja, oeta-
nol será escoado eamenordeman-
da recairá sobrea gasolina”, avalia
Luis Gustavo Correa, sócioda FG/A.

“Oriscoétermosmargemnegati-
va no etanol se não mudarocená-
rio”, disseLuiz Gustavo Junqueira,
diretor comercialda UsinaAlta Mo-
giana, de São Joaquim da Barra (SP).
Eleestimaque,seagasolinaCabsor-
vertodaapressãodopetróleo,oeta-
nolserávendidonaportadasusinas

a R$ 1,80 —preço que, para muitos,
jánãocobretodososcustos.
Atábuade salvação ainda pode
ser oaçúcar, já que muitas usinas
conseguiram travar antecipada-
mente preço de exportação paraa
nova safra, além de receitas adicio-
naiscomcogeraçãodeenergia.

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