O Estado de São Paulo (2020-03-24)

(Antfer) #1

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A2 Espaçoaberto TERÇA-FEIRA, 24 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO






Passava pouco das 11h da ma-
nhã quando Jaime Maldona-
do, de 51 anos, entrou com seu
Nissan alugado em um estacio-
namento perto do Aeroporto
de São Francisco. Imaginou
que teria uma longa espera
diante de si até que o Lyft en-
viasse a ele uma notificação pa-
ra que buscasse um passagei-


ro. Enquanto os minutos pas-
savam, Maldonado se indaga-
va. “O que vou fazer para en-
cher o tanque e alimentar as
crianças amanhã?”
Número decorridas do mo-
torista de aplicativo caiu pela
metade com crise da covid-19.

http://www.estadao.com.br/e/informais

A


epidemia do coronaví-
rus – a pior dos últimos
cem anos – terá profun-
das consequências sobre um
mundo globalizado, sem lide-
ranças alinhadas e pouco soli-
dárias entre si. O impacto eco-
nômico e social vai ser profun-
do, com o custo recaindo nos
mais pobres, fracos e idosos e
em países menos preparados e
desenvolvidos.
Os efeitos sobre os países e
sobre a economia global estão
sendo sentidos e deverão agra-
var-se antes de melhorar.
Como a geopolítica global
poderá ficar afetada pela epide-
mia? O que poderá mudar no
cenário global?
Duas observações iniciais. A
crise atual mostrou que as
fronteiras nacionais desapare-
ceram com as facilidades do
transporte aéreo e o imediatis-
mo das comunicações. E que
as políticas econômicas do-
mésticas estão intimamente in-
fluenciadas pelo que acontece
no resto do mundo. Nenhum
país ou continente é uma ilha.
Por outro lado, a extensão e a
repercussão da crise, em larga
medida, deriva do peso da Chi-
na na economia global. No ini-
cio da década, quando se disse-
minou a Sars, o país represen-
tava 4% da economia global,
hoje representa 17%. A China é
a segunda economia mundial,
o maior importador e exporta-
dor do mundo e, para culmi-
nar, transformou-se num cen-
tro de suprimento de produ-
tos industriais para as cadeias
globais de valor.
Quais as consequências na
relação entre os EUA e a Chi-
na, as duas superpotências
atuais? Nos últimos anos cres-
ceu a competição entre os dois
países pela hegemonia global
no século 21. Os EUA, ao se iso-
larem e ampliarem ações con-
frontacionistas, protecionis-
tas, nacionalistas e xenófobas,
dificultam a interdependência
dos países, como ocorre com a
globalização. Enquanto os
EUA apontam a China como
adversária estratégica e criti-
cam o governo pela condução
da epidemia (vírus chinês),
Beijing, ao invés de fechar as

fronteiras, como fez Washing-
ton, favorece a abertura e a am-
pliação do comércio externo e
manda médicos e equipamen-
tos para a Itália, a Espanha e o
Brasil a fim de ajudar a comba-
ter o coronavírus. A guerra fria
econômica, a nova fase da con-
frontação, evidencia-se pela
iniciativa chinesa da Rota da
Seda, pela competição nas re-
des 5G e por conflitos sobre
propriedade intelectual e ino-
vações tecnológicas.
A pandemia poderá também
ter efeito relevante no cenário
interno dos dois países com
consequências geopolíticas. Xi
Jinping disse que caso a epide-
mia se prolongue haverá o ris-
co de instabilidade econômica
e social no país. A maneira co-
mo, de início, Donald Trump
conduziu a crise epidêmica em
seu país foi muito criticada e
sua popularidade caiu. As pré-

vias do Partido Democrata
vêm definindo Joe Biden co-
mo o candidato contra Trump,
com apoio do centro modera-
do. Caso essa tendência se fir-
me, pela primeira vez seria pos-
sível pensar numa derrota do
atual presidente. O resultado
da eleição, em novembro, po-
derá ter efeitos importantes
na geopolítica global caso haja
uma mudança da atitude do go-
verno de Washington em rela-
ção ao mundo.
Outra questão é como paí-
ses e empresas reagirão para
reduzir sua dependência do
mercado e da produção de par-
tes e componentes chineses
nas cadeias produtivas. A ten-
dência poderá ser uma gradual
redução dessa dependência e
alguns países mais preparados
e organizados, como o Vietnã
e alguns outros asiáticos, pode-
rão sair ganhando com investi-
mentos para substituir a Chi-
na. Em médio prazo, a proje-
ção externa das grandes econo-
mias vai depender de sua base
produtiva nacional e de sua

competitividade.
A estabilidade política e eco-
nômica global poderá ser signi-
ficativamente afetada pela vigi-
lância biométrica, que poderá
vir a ser implantada para evi-
tar epidemias futuras. A preo-
cupação com a saúde poderá
levar à invasão da privacidade,
com possíveis reflexos em po-
líticas totalitárias. Quanto à
dramática queda do crescimen-
to dos EUA e da China, as pro-
jeções apontam para uma redu-
ção norte-americana de 4% no
primeiro trimestre e 14% no se-
gundo. Para a China as estima-
tivas de crescimento não são
maiores que 3,5% para 2020.
Caso os EUA entrem em reces-
são e as projeções sobre a Chi-
na se confirmem, não se pode
afastar a possibilidade de re-
cessão e, no pior cenário, de
uma depressão, talvez mais
dramática que a de 1929, por
não ficar limitada ao setor fi-
nanceiro. Como os países
emergentes, produtores agrí-
colas, sairão de um cenário tão
dramático como esse?
A Europa está debilitada pe-
la saída do Reino Unido e viu a
situação humanitária, social e
econômica agravada pela crise
em alguns países, como Itália e
Espanha. Em cenário dramáti-
co como o atual, é possível pre-
ver que o continente sairá com
seu poder relativo diminuído.
O Brasil, uma das dez maio-
res economias do mundo, terá
de se ajustar rapidamente à no-
va geopolítica global, sob pena
de perder mais uma vez a opor-
tunidade de se projetar como
potência média em ascensão.
Em outros momentos da His-
tória, movimentos tectônicos
transformaram o equilíbrio de
poder entre as nações e os ru-
mos da economia. O mundo
pós-coronavirus deverá emer-
gir com novas prioridades e
com um novo cenário geopo-
lítico, com a Ásia – em especial
a China – em melhor posição
para ocupar um crescente espa-
ço político e econômico.

]
PRESIDENTE DO INSTITUTO
DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS
E COMÉRCIO EXTERIOR (IRICE)

Mundo está agora tão endivi-
dado ou mais do que estava
na última grande crise.

http://www.estadao.com.br/e/crise

INFORMALIDADE


A fragilidade da ‘economia dos bicos’


Aos 40 anos, Adam Castille-
jo transpira boa saúde, mas
a sua jornada foi árdua e en-
volveu quase dez anos de
tratamentos horríveis.

http://www.estadao.com.br/e/hiv

l“Decisão acertada. Vamos deixar para depois que passar a crise do
coronavírus na saúde e também na economia.”
GREGÓRIO DANTAS

l“Somente se cortarem fraudes, roubos e desvios do Bolsa Família é
que vão sobrar recursos para quem precisa.”
PASCOAL LELLIS

l“Ótima ideia. Poderiam também fazer uso do fundo eleitoral e cor-
tar 50% dos salários de parlamentares com benefícios em demasia.”
ROSELI ANDRADE

l“Fácil o STF controlar o Orçamento na base da canetada, né? Isso
é anticonstitucional!”
VITOR DE VITA

COMENTÁRIOS

CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
PRESIDENTE: ROBERTO CRISSIUMA MESQUITA
MEMBROS
FERNANDO C. MESQUITA
FERNÃO LARA MESQUITA
FRANCISCO MESQUITA NETO
GETULIO LUIZ DE ALENCAR
JÚLIO CÉSAR MESQUITA

Leões e leopardos do Par-
que Nacional Gir em geral
não conseguem conviver,
mas uma leoa surpreendeu
os cientistas.

http://www.estadao.com.br/e/leoa

Espaço Aberto


O


problema é de ajuste fi-
no. Definir o que é ou
não essencial. Fechar
tudo, sem mais, vai caindo a fi-
cha do mundo inteiro, é mais
ou menos como nos suicidar-
mos antes que o vírus nos pe-
gue. As economias não podem
ser desligadas e ligadas impu-
nemente. Elas morrem e têm
de nascer de novo, que são pro-
cessos muito mais demorados
e dolorosos.
Dinheiro x vidas? Falso dile-
ma. Economias são pessoas.
Sonhos feitos e desfeitos. Se-
meaduras de saúde ou de doen-
ças futuras. Plantações de paz
ou de violência. Partindo do
nada, o tsunami econômico po-
liticamente fabricado em no-
me da contenção da pandemia
do coronavírus está provocan-
do uma devastação que, consi-
derado apenas o ponto a que
já chegou, muito abaixo da cri-
se de 2008, para a qual havia
todos os fundamentos econô-
micos e financeiros concretos,
será um marco divisor na His-
tória da humanidade.
Nem os Estados Unidos,
com todo o seu poder e sua
glória, poderão mantê-las vi-
vas artificialmente distribuin-
do um trilhão de dólares por
quinzena para cima e chequi-
nhos de campanha eleitoral pa-
ra baixo, à la Lula. No Brasil os
15 dias de pânico já quebraram
mais de R$ 1,5 trilhão no valor
de tudo que está nas bolsas,
mais de 20% do PIB...
Investir em precisão e come-
dimento é a resposta correta,
como mostra o argumento in-
discutível do resultado que se
pode aferir comparando a des-
troçada Europa Latina, de que
somos filhos, toda ela em “ri-
gorosa quarentena” e com índi-
ces de mortalidade que come-
çam por mais que o dobro dos
nossos 1,6% e vão até aos qua-
se 9% da Lombardia italiana,
com Alemanha, Taiwan, Cinga-
pura, Coreia do Sul e outros
que têm colhido índices de le-
talidade inferiores a 0,4%.
Não há ventos favoráveis pa-
ra o navegante que não sabe pa-
ra onde vai. Testagem rápida
em massa e parar, na maior me-
dida possível, só os doentes e


os transportadores de doença
já identificados. Pesquisa inten-
siva de tratamentos eficazes.
Precisão na informação, rigor
nas medidas preventivas indivi-
duais, eis os ingredientes que
detêm a pandemia e enfraque-
cem o coronavírus.
O primeiro e maior desafio
é, portanto, da imprensa. A per-
gunta essencial é quanto da
reação dos políticos responde
aos fatos e quanto à cobertura
que ela tem feito, pois é no in-
terstício entre essas duas bali-
zas que prospera o vírus que
vai devastando a economia do
planeta inteiro, este, sim, de
uma letalidade nunca antes vis-
ta em tempos de paz ou em
tempos de guerra, no mundo
antigo ou no mundo moderno.
O desafio está em impedir
que o foco da cobertura se des-
vie da mecânica da progressão
da doença para as reações do

povo às determinações dos po-
líticos e as dos próprios políti-
cos às decisões de outros po-
líticos, o que nem sempre é
fácil de separar. Em outras pa-
lavras, no rigor do cuidado das
redações em não se deixarem
transformar em correias de
transmissão de um pânico que
se alimenta de si mesmo.
Garantir três horas de palan-
que por dia para políticos isen-
tos dos efeitos das medidas
que baixam disputarem poder
uns com os outros na base do
“quem fecha mais” é tão segu-
ro, num país com o retrospec-
to político do Brasil, quanto
acender uma tocha para procu-
rar uma agulha num paiol de
dinamite.
Não é só no Brasil, aliás. Em
todos os países onde a autori-
dade está desmoralizada pela
conflagração ideológica o com-
bate à peste é duplamente pro-
blemático. O comportamento
das áreas técnicas dos gover-
nos e do povo é razoável, mas
na ida e na volta as informa-
ções têm de passar pelos políti-

cos e pelos seus respectivos
“batedores de caixa” na inter-
net e nas redações engajadas.
E aí todo cuidado é pouco.
Quanto desse empenho todo é
luta pelo poder? Quanto é vai-
dade? Quanto do que dizem e
fazem os governadores candi-
datos e o presidente candida-
to é fruto de decisões cons-
cienciosas e equilibradas e
quanto é precipitação para acu-
sar, direta ou indiretamente, o
adversário de omissão?
As dúvidas são pagas em vi-
das...
É, de qualquer maneira, uma
controvérsia que se desfará
por si mesma. Todo o esforço
de equilíbrio fiscal de um ano
inteiro do ministro Paulo Gue-
des virou pó na primeira hora
da paralisação total da econo-
mia mundial. Isso arrebenta
com a arrecadação, num qua-
dro que já era de falência geral
dos governos estaduais e muni-
cipais. Vai faltar dinheiro para
pagar polícia e hospital em
dois, no máximo, três meses.
O Brasil é o “velhinho” des-
ta epidemia. A economia de
pior desempenho numa qua-
dra de prosperidade global.
Roído pela privilegiatura, não
tem um pingo de gordura de
proteção social. No mínimo a
metade da população já vinha
vivendo da mão para a boca.
Uma economia de guerra será
agora, e por muito tempo, a
realidade de todos.
Não haverá alternativa se-
não partir para a reforma das
reformas. Para Bolsonaro será
a última chance de redimir-se
de tudo o que não fez e não
deixou fazer, embora estives-
se autorizado a tanto pela vo-
tação maciça que teve. Para
seus adversários, a definitiva
de provar quanto, de fato, se
preocupam com a saúde dos
nossos avozinhos. Para o Bra-
sil, como um todo, a de entrar,
finalmente, para o rol das de-
mocracias, acabando com a
privilegiatura medieval, ou
mergulhar definitivamente no
caos. Não vai ter outra.

]
JORNALISTA, ESCREVE
EM WWW.VESPEIRO.COM

PUBLICADO DESDE 1875

LUIZ CARLOS MESQUITA (1952-1970)
JOSÉ VIEIRA DE CARVALHO MESQUITA (1947-1988)
JULIO DE MESQUITA NETO (1948-1996)
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Segundo curado do
HIV revela identidade

Leoa adota filhote de
leopardo na Índia

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]
Fernão Lara Mesquita


Tema do dia


Jornalista critica obsessão
com o esporte e diz que para-
lisação levanta reflexões.

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A peste e a


reforma das reformas


Esta é a última chance
de o Brasil acabar com a
privilegiatura medieval.
Ou mergulhará no caos

O impacto geopolítico


do coronavírus


O mundo pós-pandemia
deve emergir com
novas prioridades, num
novo cenário global

AMÉRICO DE CAMPOS (1875-1884)
FRANCISCO RANGEL PESTANA (1875-1890)
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Marco Aurélio


suspende cortes no


Bolsa Família


Decisão vale até o fim do estado de
calamidade pública; ministro atende ao
pedido de seis Estados do Nordeste

]
Rubens Barbosa

TALIA HERMAN/THE NEW YORK TIMES NATUREZA

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Coronavírus pode
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