O Estado de São Paulo (2020-03-24)

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O ESTADO DE S. PAULO TERÇA-FEIRA, 24 DE MARÇO DE 2020 Especial H7


CHEFS ABREM SUAS
COZINHAS E CRIAM
PROGRAMAÇÃO PRÓPRIA

Danielle Nagase e NAS REDES SOCIAIS
Renata Mesquita


Com restaurantes fechados e, tal-
vez, tão entediados quanto boa
parte de seus seguidores, chefs
resolveram colocar a mão na
massa para ensinar aquilo que sa-
bem fazer bem: cozinhar.
Utilizando recursos da plata-
forma Instagram (post, story ou
IGTV), eles têm compartilhado
receitas e, melhor ainda, filmado
os modos de preparo.
Ficou animado em fazer parte
dessa rede de cozinha virtual?


Confira, a seguir, dez perfis que
valem a pena apertar o botão “se-
guir”. Ah, e não se esqueça de
acompanhar o @paladar.

@carolecrema. Não são ape-
nas doces que a confeiteira e
apresentadora do programa Que
Seja Doce ensina em seu perfil do
Instagram com a #receitasemfa-
miliacarolecrema. Dá para confe-
rir nos destaques como preparar
coxinha caseira do início ao fim.
Carole vai ensinar uma receita
por dia – ontem, por exemplo, foi
brownie de chocolate.

@lano_alto. Já que o Lab, em
São Paulo, fechou as portas por
tempo indeterminado, Peèle Le-

mos e Yentl Delanhesi abriram o
caderno de receitas da Lano Alto
para compartilhar com seus se-
guidores. Nos posts, já dá para
aprender a fazer doce de leite e
“ovinhas” de mostarda fermenta-
das em soro de leite. Destaque
para o vídeo Vamos Saudar a Man-
dioca, que, com participação da
pequena Pilar, filha do casal, ensi-
na a fazer puba, tucupi e tapioca.

@ligiaka. Além de receitas, a
chef Ligia Karazawa dá dicas
práticas de cozinha para colocar
em prática na quarentena, entre
elas, “como montar um menu se-
manal para três pessoas” e “co-
mo organizar a sua geladeira”.
Nos destaques, Ligia salvou o

passo a passo do yakissoba de
frango e camarão, com direito a
macarrão tostadinho, e do bolo
de banana com granola. Ela pro-
mete ainda uma série com comi-
das para bebês, inspirada em seu
filho Akira, de nove meses.

@massimobottura. Que tal co-
zinhar com o chef do restaurante
eleito duas vezes o melhor do
mundo? Claro, não são as mes-
mas receitas que o italiano serve
em seu Osteria Francescana,
mas já tem vídeo no IGTV do
chef ensinando como preparar
molho bechamel. Bottura prepa-
ra os pratos na cozinha de sua ca-
sa, em Modena, com ajuda dos
filhos e da mulher. As transmis-
sões ao vivo ocorrem diariamen-
te às 16h (horário de Brasília),
em inglês. O projeto se chama
Kitchen Quarantine (Quarentena
na Cozinha, em tradução livre).

@nacozinhadahelo. Por meio
de seu Instagram, a chef Heloisa
Bacellar, do Lá da Venda, estreou
a série Sobrevivendo na Cozinha,
onde publica diariamente recei-
tas “fáceis para ajudar nesses
tempos difíceis”. Já constam por
lá arroz e feijão de todo dia, farofi-
nha de cinco minutos e legumes
caramelizados ao forno. Vêm
por aí: polenta cremosa, molho
de tomate, frango assado, entre
outros. Em breve, a chef prome-
te lançar aulas online de culiná-
ria, como a de cortes de carne
mais baratos.

@nelipereira. O instigante bar
do Espaço Zebra é o pano de fun-

do dos vídeos que a jornalista e
bartender Neli Pereira tem publi-
cado em seu perfil. Além de ensi-
nar a fazer diferentes drinques,
ela fala sobre infusões com raí-
zes e ervas brasileiras, como ca-
tuaba e cataia, foco do seu traba-
lho de pesquisa. Às sextas-feiras,
a bartender entra ao vivo, às
19h30, e mostra como fazer co-
quetéis com poucos ingredien-
tes. Ela também propõe receitas
de drinques sem álcool.

@papoula_ribeiro. Pão, pão,
pão. Há uma semana, a padeira
Papoula Ribeiro tem ensinado,
dia após dia, o passo a passo do
preparo do levain – o processo,
batizado de jornada do fermento
natural, vem sendo salvo nos des-
taques e, quando estiver pronto,
vai virar pão.
Para quem bus-
ca uma versão
mais rápida,
entre os posts
há uma receita
de pão de for-
ma integral,
com fermento
biológico, mel, azeite e um tanti-
nho de castanhas.

@quitandarte. A cozinheira mi-
neira Iara Rodrigues, do empó-
rio Quitandarte, começou a pos-
tar vídeos direto da cozinha de
sua casa – vestindo shorts e chi-
nelo –, mostrando o passo a pas-
so de receitas bem caseiras, que
ela chamou de Cozinha de Quaren-
tena. Os pratos, como um omele-
te de forno e uma berinjela no
shoyu, são para ela mesma co-

mer. Iara também passou a ensi-
nar as receitas das quitandas que
vende na casa, como o biscoito
frito. Afinal, “mineiros não di-
zem eu te amo, fazem café e as-
sam pão de queijo”.

@rdespirite. “O que tem na
sua geladeira? Como posso aju-
dar?”, postou Raphael Despirite,
do francês Marcel, em suas redes
sociais. O chef já vinha postando
receitas nos stories de seu Insta-
gram e intensificou as postagens
logo no início da quarentena. O
acervo (salvo nos destaques)
tem receitas francesas – bouef
bourguignon, gigot de cordeiro
–, mas não só. Por ali, dá para
aprender a fazer também estro-
gonofe, espaguete à carbonara,
ceviche, pão de queijo, arroz do-
ce. “Que lin-
do!”, como diz
o chef.

@renatocario-
ni. #fiqueem-
casa e #useosa-
limentoscom-
sabedoria são
as hashtags usadas pelo chef Re-
nato Carioni, do Così, para in-
centivar seguidores a reprodu-
zir suas receitas em tempos de
isolamento social. Direto da co-
zinha de sua casa, ele ensina a
fazer cavatelli al tonno com mo-
lho de tomate, abobrinha e atum
enlatado, bolinho de arroz, piz-
za e requeijão caseiros e cookie
de aveia e chocolate. Por vezes,
algumas receitas levam para o ca-
nal do chef no YouTube, que
também tem bom acervo.

Danielle Nagase
Renata Mesquita


“Se o governo não ajudar, que-
bramos em um mês.” A reporta-
gem escutou essa afirmação re-
petidas vezes, em conversas
com chefs sobre a atual crise
causada pelo novo coronavírus.
Antes mesmo de o governo es-
tadual ter proibido por decreto
o “consumo local em bares, res-
taurantes, padarias e supermer-
cados”, grande parte dos restau-
rateurs adiantaram-se à medida
e fecharam para contribuir com
o isolamento.
Na tentativa de diminuir os
danos ao faturamento, o chef
Luiz Filipe Souza, do italiano
Evvai, que fechou as portas por
tempo indeterminado na sema-
na passada, estreou um sistema
de delivery e take away (pegue e
leve) temporário. “Hoje o deli-
very é uma questão de sobrevi-
vência”, diz Luiz Filipe.
A mesma saída foi usada por
outras dezenas de restauran-
tes, que correram para se cadas-
trar nos aplicativos de delivery.
A medida, porém, não é suficien-
te para cobrir nem os custos fi-


xos de um estabelecimento,
que incluem aluguel, folha de
pagamento, tributos e contas
de consumo, como água.
Além do delivery, outra medi-
da paliativa usada pelos bares e
restaurantes é a venda de vou-
chers, no qual o cliente compra
hoje para usar depois da crise,
assim como dar férias coletivas.
Renata Vanzetto, chef e sócia
dos cinco restaurantes do gru-
po Eme, afirma que o delivery
“está saindo bastante, mas na-
da se compara ao faturamento
anterior à quarentena”. Houve
uma queda de 80%, segundo
ela. O que entra “não paga nem
o salário de quem ficou”.
A chef demitiu 25 funcioná-
rios dos 120 que tinha na empre-
sa antes da crise. “Se a gente
continuasse como estava, a gen-
te ia quebrar e todo mundo per-
deria o emprego.” Como o salá-
rio da equipe é uma das princi-
pais preocupações do setor, a
Associação Brasileira de Bares e
Restaurantes (Abrasel) reivin-
dicou, em conversa com o presi-
dente Jair Bolsonaro e o Minis-
tro da Economia, Paulo Gue-
des, que o governo arque com a
folha de pagamento dos funcio-
nários de restaurantes do Sim-
ples Nacional.
“Se isso não acontecer, em 30
ou 40 dias, serão mais de 3 mi-
lhões de pessoas na rua, o que
vai agravar ainda mais o proble-
ma”, afirma Percival Maricato,

presidente da Abrasel em São
Paulo. Em contrapartida, os res-
taurantes se comprometeriam
a manter o quadro de funcioná-
rios e demais obrigações.
O Ministério da Economia já
concedeu prazo maior para o pa-
gamento dos tributos federais
do Simples Nacional.

Em âmbito municipal e esta-
dual, a Abrasel reivindica o adia-
mento no pagamento de impos-
tos e taxas, além da criação de
linhas de financiamento viáveis
para os estabelecimentos.
Ainda segundo Maricato,
“99% das empresas do setor não
possuem reservas técnicas”. “O
grande problema no caso dos res-
taurantes é que a gente vende ho-
je para pagar amanhã. É uma
questão de fluxo de caixa”, afir-
ma Guilherme Giraldi, do Cais.
O restaurante, inaugurado há
pouco mais de quatro meses, fe-
chou as portas por tempo inde-
terminado na última terça-feira.
“Além do pouco tempo de opera-

ção, viemos de um mês ruim, de-
vido ao carnaval. Agora com essa
crise, tive de renegociar o valor
do aluguel e ir atrás de emprésti-
mos para pagar o salário dos fun-
cionários”, conta Giraldi.
“O que precisamos é de mais
abonos (de impostos e taxas). O
negócio é exonerar, não empur-
rar para frente. Se tivermos que
pagar tudo integralmente, que-
bramos, e logo. O governo está
sendo muito lento”, comple-
menta Giraldi.
Janaína Rueda, sócia d’A Ca-
sa do Porco, do Bar da Dona On-
ça, entre outros, manteve os res-
taurantes do grupo abertos por
mais tempo – seguindo todas as

orientações de prevenção à co-
vid-19 da Organização Mundial
da Saúde, segundo explica – co-
mo forma de pressionar o gover-
no a adotar medidas de salva-
guarda aos estabelecimentos.
“Quando o governo decreta o
fechamento devido à pande-
mia, há contrapartidas. A ideia é
ter poder de barganha, facilitan-
do a negociação”, afirma a chef.
Ontem, porém, o grupo fe-
chou as portas de suas quatro
casas e encerrou o serviço de de-
livery para “atender ao apelo do
Ministro da Saúde e contribuir
com a não proliferação do ví-
rus”, disse Janaína. “Precisa-
mos agora, mais do que nunca,
de um pacote de emendas para o
setor.” Com 243 funcionários,
Janaina reivindica a liberação de
dois meses do seguro desempre-
go. “Nós pagaríamos um mês de
férias coletivas e o governo arca-
ria com mais dois. Assim, daria
para manter os funcionários
por, pelo menos, três meses em
casa”, explica.

Mobilização. Chefs e restaura-
teurs também se organizam
em grupos de WhatsApp para
alinhar seus reivindicações
com o poder público. Na sexta-
feira (20), um dos grupos, for-
mado por 250 participantes –
entre eles, os restaurantes Ruel-
la, Fitó, Firin Salonu e Tasca da
Esquina –, fez um apelo pelas
redes sociais, que já tinha mais
de mil compartilhamentos. A
ideia é tornar as reivindicações
públicas para pressionar o go-
verno.

RESTAURANTES BUSCAM MEIOS DE SOBREVIVER


lProposta

Proximidade. Da esq. para dir., Massimo Botura, Ligia Karazawa, Carola Crema, Raphael Depirite, Neli Pereira e Heloisa Bacellar: isolamento com receitas possíveis


Chefs usam Instagram para filmar o passo a passo de receitas


e compartilhar com seus seguidores durante a quarentena


S.O.S. Chefs, como Luiz Filipe Souza, pedem ajuda ao governo para tentar sobreviver à crise

Com estabelecimentos


fechados, chefs afirmam


não ter caixa para arcar


com os custos fixos


da operação


PREPARE EM CASA


Comer*


FOTOS REPRODUÇÃO INSTAGRAM

“Nós pagaríamos
um mês de férias
coletivas e o governo
arcaria com mais dois”
Janaína Rueda
SÓCIA D’A CASA DO PORCO

Paladar


ASSISTA,


CURTA,


AMANDA PEROBELLI/ESTADÃO

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