O Estado de São Paulo (2020-03-25)

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B10 Economia QUARTA-FEIRA, 25 DE MARÇO DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Negócios enumeram


questões e soluções


para conquistar mercado


externo; entidades como


Apex-Brasil dão apoio


Nathalia Molina
ESPECIAL PARA O ESTADO


Lidar com regras diferentes
de um país para outro, tratar
com um especialista em ex-
portação ou diretamente
com o importador, vender a
granel ou os produtos emba-
lados. Muitos são os detalhes
para cuidar quando o assunto
é exportação em pequenas e
médias empresas.

Mesmo com tantas variáveis,
PMEs viram uma chance de di-
versificar sua operação e equili-
brar perdas no mercado nacio-
nal, decorrentes da crise econô-
mica. O ganho pode ser maior
em tempos de taxa de câmbio
favorável, como agora, em que o
dólar gira em torno de R$ 5.
“Como nosso trabalho de ex-
portação começou faz tempo, o
dólar não nos favorecia e o mer-
cado interno estava aquecido (e-
ra 2010, com o câmbio a R$
1,60). Mas não desistimos da in-
ternacionalização e nos prepara-
mos”, conta Valéria Cristina Na-
tal, diretora executiva da Distil-
lerie Stock do Brasil, com fatura-
mento de R$ 100 milhões.
Planejamento é essencial, de
acordo com a Agência Brasilei-
ra de Promoção de Exportações
e Investimentos (Apex-Brasil).
“Começa com o estudo de mer-
cado. Aí a empresa vai fazer in-
vestimento na produção, em
marketing. Não basta querer.
Tem de ter financiamento ade-
quado”, afirma Deborah Rosso-
ni, coordenadora de Qualifica-
ção e Competitividade da Apex-
Brasil. Sobre o novo coronaví-
rus, Deborah é cautelosa. “É ce-
do para saber a extensão disso
tudo e o impacto dessa situação
no comércio internacional.”
Estados Unidos, Paraguai,
Hong Kong, Reino Unido e Ale-
manha são os principais desti-
nos para os quais exportaram as
PMEs apoiadas pela Apex-Brasil
em 2019 – do volume de exporta-
ção, esses países responderam
por US$ 690 milhões. Os dois
primeiros da lista também estão
entre os cinco que concentra-
ram mais exportadoras de pe-
queno e médio portes. Com o
apoio da Apex-Brasil, 1.088 em-
presas venderam para eles, além
de Argentina, Chile e Uruguai.
“Já tem a questão econômica,
a tributação, o custo logístico. É
muito difícil para uma empresa
brasileira competir no mercado
internacional”, diz a coordena-
dora da Apex. “Quando ela põe
um item de brasilidade, tem
mais chance de vender lá fora.”
Isso ocorre tanto com a Stock



  • nos extratos de frutas Kaly
    (guaraná, açaí e manga, entre
    elas), enviados para Chile, Ingla-
    terra e França – quanto com a
    Nugali Chocolates, na série Ca-
    cau em Flor, com cupuaçu, pi-
    menta e açaí. “É um produto de
    apelo no mercado externo. Es-
    tou com outros três sabores em
    desenvolvimento”, revela Mai-
    tê Lang, proprietária da marca.
    Na Nugali, ela conta que pro-
    videnciou certificações, mas o
    que deu um empurrão na expor-
    tação foram os resultados no In-
    ternational Chocolate Awards.


“A premiação é uma chancela
de qualidade. Por dois anos, ten-
tei vender para um francês. Ele
tinha provado nosso chocolate,
sabia que era bom. Ganhamos o
prêmio em 2016. Dias depois,
ele ligou para importar.”
O produto que a Nugali mais
exporta ainda são tabletes, co-
mo na sua primeira remessa pa-
ra fora: 13 mil unidades para Du-
bai, em 2014. A maior parte da

venda externa – 5% do volume
da empresa em 2019 – é realiza-
da para Estados Unidos, além
de Peru, França e Japão.

Barreira. Dependendo da mer-
cadoria, pode ser complicado ex-
portar. Marina Cabral, proprie-
tária da Combu, enfrenta dificul-
dades com produtos da Amazô-
nia. “Os exportadores normal-
mente não compreendem as es-

pecificidades, a cultura em tor-
no desses alimentos.” Ela man-
da, então, por conta própria tu-
cupi e jambu para Miami, por
empresas de transporte. “Já apa-
receram interessados de vários
países. Porém, os valores de en-
vio são tão altos que desistem.”
Problemas para vender ao Ja-
pão potes de mel e própolis fize-
ram Humberto Pinto Júnior, da
Nectar Floral, investir na expor-

tação do produto bruto. “O mel
vai em tambores para os Esta-
dos Unidos. Lá eles fazem um
blend com o de outros países.”
Adaptações como essa são ne-
cessárias, defende Luis Ramos,
diretor de Desenvolvimento de
Negócios e de Pesquisa de Mer-
cado da Dacolor. “A empresa de-
ve ter flexibilidade para se ajus-
tar aos mercados”, diz. “Estabe-
lecida há 30 anos no Brasil, pres-

tando consultoria para PMEs, a
Dacolor há sete anos passou
também a assessorar essas em-
presas na internacionalização.”
A QueenNut Macadâmia já
nasceu exportadora, em 1994.
“Vimos uma oportunidade de
negócio com valor agregado”,
conta Maria Teresa Camargo,
CEO da empresa. “Nosso pri-
meiro contêiner foi para os Esta-
dos Unidos. Hoje mandamos
para Japão, Alemanha, Holan-
da, China e América Latina. Em
2019, 80% do nosso volume foi
exportação.” Ela processa ma-
cadâmia de outros produtores
para atender a demanda.

Força. Às vezes vender lá fora
exige se unir. “As pequenas em-
presas precisam estar associa-
das em cooperativas, já que um
fator para a competitividade é a
escala de produção”, afirma Jor-
ge Souza, gerente de Projetos
da Associação Brasileira dos
Produtores Exportadores de
Frutas e Derivados (Abrafru-
tas). A Europa é o principal des-
tino de mangas, uvas e mamões.
Conectar agricultores ao ex-
terior é o negócio da Fresh Qua-
lity. “O produtor quer alternati-
vas mais rentáveis do que tem,
que é basicamente o Ceasa/Cea-
gesp”, afirma Gideão Guilher-
me Marques Soares, CEO Sales
Manager da empresa, cuja pri-
meira remessa, em 2018, foi pa-
ra o Canadá. Hoje os produtos
chegam também a Estados Uni-
dos, França, Espanha, Alema-
nha, Áustria, Hungria e Rússia.
“O Brasil é o terceiro maior pro-
dutor de frutas do mundo e ex-
porta apenas 2%. A oportunida-
de de expansão é enorme.”
A Fresh Quality teve o supor-
te da Câmara de Comércio Bra-
sil-Canadá (CCBC), que há dois
anos tem um trabalho de apoio
a PMEs. “É inspirado na cultura
canadense. Mais da metade dos
que exportam lá são pequenas e
médias”, diz Paulo de Castro
Reis, diretor de Relações Insti-
tucionais da CCBC, que faz mis-
sões ao Canadá com produtos
brasileiros. Já teve de cachaça e
café, mas a exportação come-
çou com um produtor de figos.
“Saímos de um pallet para 400
toneladas de frutas em geral.”

A demanda do brasileiro que
mora no exterior por produtos
nacionais serve de oportunida-
de para empresários exporta-
rem. Chamado “mercado da
saudade”, ele ocupa prateleiras
em cidades lá fora. Fundada em
1991 na mineira Luz, a Maricota
começou assim. “Fomos procu-
rados por importadores de paí-
ses onde há muitos brasileiros”,
diz Ronaldo Evelande de Olivei-
ra, sócio diretor da empresa.
A primeira remessa para os
Estados Unidos, em 2009, le-
vou pães de queijo. Hoje a Mari-
cota vende ainda broa, chipa e
biscoitos, para cerca de 15 paí-
ses, incluindo China, Coreia,
Angola, Espanha e Alemanha.
“A empresa alterou receitas


para adequar os produtos a ór-
gãos reguladores de Estados
Unidos, Canadá, Portugal e paí-
ses do Oriente Médio, onde é
preciso ter a certificação halal,
que garante que o processo pro-
dutivo e a matéria-prima estão

de acordo com os preceitos mu-
çulmanos.” A exportação res-
ponde por 6,5% do faturamento
médio anual de R$ 144 milhões
da Maricota. Contribuiu para o
sucesso, diz Oliveira, o fato de
serem produtos sem glúten.

Naturais. Como mora no Cana-
dá desde 2014, Bruno Corrêa
percebeu que havia uma deman-
da grande no país para produ-
tos orgânicos, veganos e sem no-
zes. Em setembro de 2019, le-
vou, então, a primeira remessa

dos produtos da Juçaí, sorbets e
polpa da fruta da palmeira juça-
ra, nativa da Mata Atlântica.
Para desenvolver uma emba-
lagem para canadenses, contra-
tou uma empresa de Québec,
que sugeriu que a comparação
nutricional do juçaí com o açaí,
usada no Brasil, fosse trocada
para o mirtilo. “A referência de-
les de antioxidante é outra fru-
ta. Adaptar a linguagem é muito
importante”, diz o diretor de
Marketing e Exportação da mar-
ca, que também está no Chile.
A preocupação com a relevân-
cia da embalagem tem sentido
para a estratégia que Corrêa
adotou. “O mercado da sauda-
de é importante porque o brasi-
leiro conhece o produto, mas o
grande potencial de vendas é o
consumidor local. Só que ele
não conhece e precisa de um cer-
to grau de confiabilidade.” / N.M.

Típicos.
Demanda
por produtos
como juçaí
(da palmeira
juçara) e pão
de queijo
estimula
exportação

PME


O desafio da


exportação para


os pequenos


Fora da mesa,


de calçados a


combustíveis


PARA EXPORTAR

lAs vendas ao exterior não se
limitam a alimentos e bebidas.
Metais e pedras preciosas, calça-
dos, têxteis, plásticos e madeiras
estão entre os principais setores
que movimentaram as exporta-
ções das PMEs apoiadas pela
Apex-Brasil nos últimos cinco
anos. Já em São Paulo, em 2018,
máquinas e equipamentos mecâ-
nicos (21,2%) foram os itens
mais vendidos lá fora pelas pe-
quenas, e combustíveis e óleos
minerais (21,6%) predominaram
entre as médias, segundo dados
da Fiesp. No mesmo ano, o Mer-
cosul foi o principal destino das
exportações das PMEs paulistas.

Dificuldades. Chocolates Nugali e tucupi vendido pela Combu: demanda e logística são determinantes

Mercado da saudade ou consumidor local?


l Pesquise mercados
e estude países e nichos que pos-
sam interessar à sua empresa

l Tenha site em inglês
pelo menos da descrição institu-
cional e dos principais produtos

l Garanta investimento
suficiente para ser capaz de fi-
nanciar todo o processo

l Capriche na embalagem
em língua estrangeira, respeitan-
do aspectos culturais do país

l Considere vender a granel
para importadores que embalam
localmente blends de produtos

l Veja logística e produção
atentamente para fazer ajustes e
escalar com qualidade

l Invista em marketing
para ações com compradores ou
consumidores no país de destino

Nacionais.
Produtos vão de
frutas a xaropes
para drinque

FOTOS: FELIPE RAU/ESTADÃO

ESTADÃO

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