O Estado de São Paulo (2020-03-26)

(Antfer) #1

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O ESTADO DE S. PAULO QUINTA-FEIRA, 26 DE MARÇO DE 2020 Especial H3


Maria Fernanda Rodrigues


Vamos voltar um pouco no tem-


po, até o dia 16 de janeiro de



  1. Naquele sábado, os peque-


nos leitores do Estado rece-


biam em casa, junto com o jor-


nal, a edição semanal do suple-


mento infantil Estadinho com


uma matéria


sobre o que as


crianças po-


diam fazer pa-


ra arrumar o


quarto e dei-


xá-lo com a ca-


ra delas.


Publicada


há 21 anos, a reportagem conti-


nua atual nesse momento em


que milhares de famílias estão


confinadas em casa, ao redor do


mundo, para evitar a dissemina-


ção do coronavírus. Vale tudo


para mudar a monotonia das pa-


redes, dizia o texto. Vale tudo,


hoje, para mudar a monotonia


da quarentena. Até customizar


as paredes?


Uma dica descrita ali pode ter


deixado os pais de 1999 de cabe-


lo em pé e talvez tenha o mesmo


efeito hoje. Ou não.


Bruna, que tinha 13 anos na


época em que a reportagem visi-


tou sua casa, contou que a ideia


surgiu num bate-papo com ami-


gos depois que seu quarto foi


todo pintado de branco. Ali, ha-


via móveis bem-comportados e


estrelinhas fluorescentes – um


clássico nos anos 1980 e 1990. A


mãe concordou que aquela pare-


de branquinha passasse por


uma transformação e os amigos


começaram a escrever recados


e frases de amor nela.


Assim que ela viu os primei-


ros rabiscos, não soube dizer se


tinha gostado ou não. Mas logo


se decidiu. “Os grafismos trou-


xeram outra


utilidade às pa-


redes: lá são


anotados to-


dos os com-


promissos im-


portantes”,


ela disse à re-


portagem.


Um pouco mais velha do que


Bruna, Camila, de 14 anos, fez


tudo escondido da mãe. Seu


quarto, que era cheio de bichi-


nhos de pelúcia, se transfor-


mou em atração para a turma


quando ela resolveu colar todos


os pôsteres e recortes de Leo-


nardo DiCaprio. Era o auge do


ator de Titanic. A mãe brigou,


mas ficou tudo bem.


Não foi só Camila que deco-


rou o quarto com fotos de DiCa-


prio ou de seu personagem


Jack Dawson, tão na moda na-


queles anos. Stephanie, que ti-


nha 12, juntou o que ela tinha


guardado com o que as amigas


tinham lhe dado e fez uma pare-


de todinha dedicada ao ator.


“Esta é a maneira de vê-lo to-


dos os dias”, comentou. A re-


portagem encerra com a his-


tória de uma outra garota,


Débora, que adorava pintu-


ra e aproveitou a parede do


quarto para praticar. E mos-


tra ainda famosos contan-


do mudanças que fizeram


em seus quartos. Eliana,


por exemplo, disse que pin-


tou nuvens no teto.


É para deixar a criança


desenhar a parede? Vale


mais refazer a pintura


quando a vida voltar ao


normal e garantir horas de


distração e de exercício de


imaginação para as crianças


neste momento ou manter


a ordem? A decisão cabe aos


pais.


Há outras opções, menos


drásticas, para quem não


quer fazer mudanças tão es-


truturais. Mude a cama de lu-


gar, trocando-a com a escriva-


ninha. Guarde os brinquedos


que estão mais à vista e abra


aquelas caixas guardadas no


armário com coisas das quais


as crianças já nem se lembram.


O reencontro com objetos anti-


gos pode render horas e horas


de novas brincadeiras.


Faça uma cabana com almo-


fadas e lençol. Crie uma cidade


no chão com fita crepe, ou en-


tão uma pista de carrinhos. De-


senhe uma amarelinha (tam-


bém com fita crepe ou giz) – se


os pulos não forem atrapalhar


os vizinhos de baixo.


Que tal montar uma exposi-


ção com os desenhos que as


crianças têm feito por esses


dias? Ou com poemas e letras


de músicas, no caso dos mais ve-


lhos? E que tal abrir aquela caixa


com papéis guardados de via-


gem? Agora pode ser finalmen-


te a hora de transformar aque-


les postais e cartões comprados


em museus em quadrinhos.


REORGANIZE OS MÓVEIS,


RESGATE BRINQUEDOS,


USE A PAREDE COMO


ESPAÇO EXPOSITIVO


‘LIVES’ GANHAM ESPAÇO NA QUARENTENA


Profissionais de áreas


diversas criam agendas


nas redes sociais para


compartilhar experiências


de forma gratuita


Priscila Mengue


“Sem tempo, irmão. Estou com


a agenda cheia de lives”, brinca


uma postagem na internet, que


resume a mudança de hábitos


de parte da população neste mo-


mento de necessário isolamen-


to social diante do avanço do


novo coronavírus.


Assim como famílias e ami-


gos têm adotado métodos para


conversar por vídeo à distância,


professores e profissionais de


áreas diversas utilizam a tecno-


logia para transmitir ensina-


mentos ao vivo e de forma gra-


tuita, geralmente pelo Insta-


gram – em que dura por apenas


24 horas, antes de ser automati-


camente apagado.


Os tipos de conteúdo variam:


vão de artesanato, a música,


idiomas, exercícios, culinária e


atividades para crianças, entre


outros. Até famosos têm aderi-


do à ideia, como a cantora Anit-


ta, que está fazendo lives em


que ela participa de aulas de in-


trodução ao francês, ginástica e


outros temas.


A professora de dança Isado-


ra Zendron, de 31 anos, de São


Paulo, começou na semana pas-


sada a realizar três aulas sema-


nais de “Boate Class”, com co-


reografias para dançar em fes-


tas. Assim como costumava


ocorrer nas presenciais, as au-


las pela live são com luzes colo-


ridas, semelhantes a de uma ba-


lada, e as roupas vestidas pela


instrutora são inspiradas na mo-


da dos anos 80 e 90.


“A ideia é criar esse ambiente


de que estamos em uma boate.


E, na boate, nunca se erra, sem-


pre se dança do nosso jeito”,


compara. Isadora conta que alu-


nos habituais têm participado


das transmissões junto de cole-


gas de apartamento, amigos e


familiares. Em uma das lives,


chegou a reunir mil pessoas.


“Estou conseguindo atingir gen-


te que nunca atingiria se não fos-


se a internet, de outros países.


Minha aula tem muito mais es-


sa questão de movimentação,


de se divertir, dar risada, do que


de perder peso”, conta.


Já Vanessa Joda, de 40 anos,


uma das idealizadoras do Yoga


Para Todos, de São Paulo, jun-


tou-se com outras instrutoras


para criar um cronograma de


transmissão de aulas de yoga e


meditação diárias. “No primei-


ro dia, tivemos quase 700 pes-


soas, foi uma loucura.”


“Começo trocando um pou-


co de ideia, aí vem a aula, faço o


relaxamento e tem uma mini ro-


da de conversa (com os especta-


dores que comentam na trans-


missão)”, explica. “É tudo novo


para mim também, fico super


preocupada porque não estou


vendo as pessoas.”


Ela conta que a yoga também


tem a vantagem de não exigir


grandes espaços e acessórios.


“Precisa só dela (da pessoa).


Um tapetinho também é me-


lhor. Como a maioria não tem,


pode ser um tapetão mesmo,


daí coloca uma canga ou uma


toalha em cima (diretamente


no chão não é recomendado,


porque pode escorregar).”


Crianças. A experiência tam-


bém é nova para confeiteira Ka-


rina Palmquist, de 42 anos, de


Curitiba, que fez uma transmis-


são ao vivo pela primeira vez no


fim de semana. “Estava super


nervosa, ainda mais com os


meus filhos em casa”, diz. “Mas


isso também mostra um pouca


a realidade de muitas mães.”


As receitas são versáteis e


com ingredientes que grande


parte das pessoas têm em casa.


As três primeiras foram de bis-


coito, bolo e pão. “São massas


que podem criar vários sabores,


com vários formatos”, explica.


“Ajuda as mães que devem estar


pensando: ‘o que faço com as


crianças trancadas dentro de ca-


sa?’ Além de diversificar o cardá-


pio.”


A contadora de histórias Ma-


riane Bigio, de 32 anos, do Reci-


fe, começou a fazer lives diárias


há uma semana. Ela criou uma


cronograma para permitir que


os pais tenham programação


durante várias faixas de horário


ao longo do dia, organizadas pe-


las hashtags #viralizahistoria e


#quarentenacriativa. “Vai da


manhã até à noite, com histó-


rias nos mais diversos sota-


ques, com livros, sem livros, au-


torais.”


Mariane conta que as trans-


missões chegam a reunir até 2


mil pessoas, número que chega


a cerca de 3,4 mil com as pes-


soas que assistem ao vídeo já


gravado, postado no YouTube.


“Estamos isolados por um bem


maior, mas isso não quer dizer


que a gente está sozinho, esta-


mos conectados.”


Resgatamos no ‘Estadinho’ histórias de crianças que,


com criatividade, deram nova cara ao seu cantinho


lFilhos


Cenas de lives. Professores e profissionais de áreas diversas utilizam a tecnologia para transmitir ensinamentos ao vivo e de forma gratuita


Dicas*


Caderno 2


ACERVO ESTADÃO - 16/1/199
9

CRIAR


QUARTO NOVO


PARA COMBATER


A MONOTONIA


Suplemento.


Edição de


janeiro de


1999 dava


dicas sobre


como mudar


os quartos


das crianças


REPRODUCAO/ARQUIVOS PESSOAIS

“Ajuda as mães que devem


estar pensando: ‘o que faço


com as crianças trancadas


dentro de casa?’ Além de


diversificar o cardápio”


Karina Palmquist,


CONFEITEIRA

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