JornalValor--- Página 11 da edição"26/03/2020 1a CAD A" ---- Impressapor vdsilvaàs 25/03/2020@21:27:
Quinta-feira, 26demarçode (^2020) |Valor |A
IMPACTOSDO
CORONAVÍRUS
Brasil
Estratégia deisolamento verticaldivideempresários
StellaFontes,AnaPaulaMachado,
Chiara Quintãoe Cibelle Bouças
DeSãoPaulo
Embora os impactos da covid-
sobre a economiapreocupem o em-
presariadobrasileiro,nãopareceha-
verconsensosobreoscaminhosque
devem ser adotadospelogoverno
para contera pandemia. Enquanto
há aqueles que avaliam que éme-
lhor que umamaiorparcela da po-
pulação pare nestemomento, para
queo sistemadesaúdetenhacondi-
ções de atender a todosos doentes,
outrosacreditam que o isolamento
vertical, defendido por Jair Bolsona-
ro, é a melhorsaída para evitar uma
criseeconômicamaisforte.
Para o empresário José Ricardo
Roriz Coelho, presidenteda Asso-
ciação Brasileirada Indústria Plás-
tica(Abiplast),oBrasildeveriacon-
tinuarseguindoasrecomendações
da Organização Mundial da Saúde
(OMS)no enfrentamento àcovid-
- Em sua avaliação, o isolamento
de apenasum grupo da população
não parece asolução adequada,
tendoem vista oque fizeram os
países que conseguiram contera
pandemia,comoaCoreiadoSul.
Por outro lado, o agravamento
da criseeconômicano Brasil pós -
pandemiado novocoronavíruséo
argumentousadopelo presidente
da farmacêutica brasileira Biolab,
Cleiton de Castro Marques,para
defenderoisolamentovertical.
Segundoo empresário,acr ise
socialem cursopodepiorarcaso
as medidasde isolamento total
da população persistam por
muitotempo. “Parar opaís e os
Estados Unidosvai ser nefasto
para oBrasil.Por isso,sou favorá-
velaoisolamentovertical”,diz.
“Estou muito preocupadopor-
que é preciso haver convergência
do que deveser feitono Brasil. A
populaçãonãopodeficaremdúvi-
da sobre o que deve ser feito”, diz
Roriz.Segundo ele, há também
uma preocupação realcom os im-
pactos da pandemiana economia
ecom anecessidade de manuten-
ção da renda do brasileiro, oque
deveria ser atacadode frente pelo
governo. “O que fizeramos países
que deram certo e as recomenda-
ções da OMSéoque agentedeve-
riaestaraplicandoaqui”,afirma.
Marques,daBiolab,dizquecabe
aos empresáriosseremresponsá-
veis ao usar amedidapara não pa-
rar a produção.Nafarmacêutica,
cujaoperaçãonão podeparar,foi
adotadoo revezamentodo traba-
lho remototanto na área adminis-
trativaquantonaprodução.“Aque-
les funcionáriosque estãono gru-
poderisco,foramafastados.Todaa
área de propaganda médica tam-
bém está trabalhando remoto.
Mas,hoje,oquevejoéqueestamos
no meiode uma disputa política e
issoéumdesserviçoparaoBrasil.”
Marques afirma ainda que,na
Biolab,oh orário de trabalho foi
reduzidoparadiminuir aexposi-
ção dos funcionáriosque usamo
transporte público. Na fábrica, a
prioridade agora é produzir medi-
camentosessenciais e, por ora, foi
interrompida afabricação de
amostras grátis. “Colocamosen-
fermeiros na entrada de cada uni-
dadeparamedir atemperaturade
cada empregado.Caso se constate
que essa pessoa está com sintomas
ela é, imediatamente, levada ao se-
tor médico e afastada. Não esta-
mos pedindo atestado médico pa-
ra esseafastamento, temos que
confiarnas pessoas.Omomento
exigeresponsabilidade”,afirma.
Oempresário Rubens Menin,
fundador da MRV, defende que
ainda não está na hora de o Brasil
passar por um isolamento vertical
—situação em que somentemaio-
res de 60 anos e pessoas de outros
gruposderisco são afastadas do
convívio com as demais. Para ele, é
preciso manter oisolamento so-
cial até que seja possível entender
a curva de contaminação do coro-
navírus,nopaís,ean ecessidadede
leitos. “Quandoentendermosessa
curva, será a horade começar a
pensarna reativação da economia.
Teremos de fazerissoum dia”, afir-
ma o empresário,ressaltando que
não estáclaro qual será o momen-
toparaamudançadepostura.
SegundoMenin,aseletividadea
ser adotada, mais para frente, deve
sereferiràsindústriasenãoàspes-
soas.“EmpresasdogrupoA,deuti-
lidade pública, como padarias,
não podem parar. As indústrias do
grupo B, importantes para a recu-
peraçãoda economia, comoside-
rúrgicaseac onstrução civil, deve-
rão ser retomadasquando for a
hora de reativação. Outrasempre-
sas, as do grupo C, comoturismoe
cinema,terãodeesperarmais.”
Já Associação Brasileira da Indús-
tria Têxtil e de Confecção(Abit) de-
fende um modelo maissofisticado
de quarentenapara conter apande-
mia de covid-19 sem paralisar aeco-
nomia. “Temosque cuidar das pes-
soas e cuidar da economia.Temos
que encontrar um equilíbrio, coma
adoção de açõescoordenadas”, afir-
mou FernandoPimentel, presidente
da Abit. O executivoconsidera im-
portantequeopaísobserveosresul-
tadosdaquarentenanestasemanae
na semana que vem para, apartir
daí,definirumnovoplanodeação.
“Os resultadosda quarentenavão
indicar a velocidadede contamina-
çãoeondeas ituaçãoémaiscrítica.
O ideal seria já começar a avaliar as
informaçõese começar a ter uma
volta das atividadeseconômicas de
forma controlada”, diz Pimentel. O
executivo sugere manterem isola-
mento os grupos de risco—como
pessoas com diabetes, hipertensão,
doenças pulmonares, eidosos—
com a liberação gradual de outros
gruposparavoltaraotrabalho.“
Encomendasdosegmentode
calçadoscaem49%emmarço
CibelleBouças
DeSãoPaulo
Um levantamento da Associação
BrasileiradasIndústriasdeCalçados
(Abicalçados)com as empresas as-
sociadas aponta uma quedade 49%
nasencomendasfeitaspelovarejoàs
indústrias neste mês, em compara-
ção com omesmoperíodo do ano
passado. Acausaé acrise causada
pela pandemiade covid-19.A Abi-
calçados tem cercade 200 associa-
dos, que representam maisde 70%
daproduçãonacionaldecalçados.
Comlojasde rua edeshopping
centers fechadas, as varejistas de
calçadoscancelaram pedidosjá
feitos paraaindústriaou reduzi-
ram as encomendas paraabrile
maio, levando aessa queda, disse
Haroldo Ferreira, presidente-exe-
cutivodaAbicalçados.
Desdeasemanapassada,cercade
60%das indústriasde calçadosdo
país estãoparadas, com funcioná-
riosemfériascoletivasouemlicença
remunerada. “Algumas empresas
voltam em 13 de abril, outrasem 20
de abril. Vamos nos aproximando
do Dia das Mãesenão sabemosse o
país aindaestará em quarentena,e
se aas indústriasterão condições de
atendera demandado varejo de
imediato”, afirmou Ferreira. Ele
acrescentouqueamaioriadosfabri-
cantesdecalçadosnopaíssãodepe-
quenoe médioporteseessasindús-
triasnãotêmcapitaldegiroparapa-
garosfuncionáriosapartirdeabril.
“Asindústriaspagaramossalários
de março para os empregadosfica-
rem em casa. Mas não têm recursos
para pagar os salários de abril”, afir-
mouFerreira. A Abicalçadospediu
ao Ministério da Economia, por
meioda Confederação Nacionalda
Indústria(CNI),acriaçãodelinhade
crédito para capital de giro para fo-
lha de pagamento, com garantia do
governo.“Ogovernoanuncioulinha
de crédito para capitalde giro,mas
sem garantia.Só que com tantos pe-
didos cancelados,a indústrianão
consegue oferecer garantia aosban-
cos. Com isso, os bancos oferecema
linha com spreadmuito alto,invia-
bilizandoaoperação.”
Marcone Tavares, presidente da
AssociaçãoBrasileiradeLojistasde
Artefatos e Calçados (Ablac), disse
que o varejo calçadista também
enfrentadificuldadesparaseman-
ter em meio à crise de coronavírus.
Atualmente, 96% das lojasmono-
marcas e95% das lojas multimar-
cas estão fechadas. Tavares tam-
bém disseque a maioria dos lojis-
tas de calçados são de pequeno e
médio porteseestão sem caixapa-
ra manteras operações a partir de
abril. “É muitodifícil o varejo se
manterde portas fechadas. Muitas
lojasnãovãosobreviveratéabril.”
Setorinicia pressãopara suspender
cobrança depedágio duranteepidemia
LuAikoOtta
DeBrasília
Nummovimento ainda discre-
to, caminhoneirospressionamo
governo parasuspenderacobran-
ça de pedágio duranteacrise do
coronavírus.Amedida, porém,
tem encontrado forteresistência
do ministro da Infraestrutura,Tar-
císioGomes de Freitas, que não
pretendecedernesseponto.
Ogovernotem atendido apedi-
dos da categoria, comoo forneci-
mentodemáscaraeálcoolemgele
a inclusão dos motoristas entre os
que receberão vacina contra a gri-
pe.AprioridadedeFreitaségaran-
tir oabastecimento ealogística
para adistribuição de insumos pa-
ra as ações de saúde, comoos 10
milhõesdetestesdecoronavírus.
“Seriamuitobom”, disseo pre-
sidente da Associação Brasileira
dos Condutoresde VeículosAu-
tomotores (Abrava), Wallace
Landim, oChorão. Ele disseter
tratadodo temana segunda-fei-
ra com Freitas,que lhe deu uma
respostanegativa.
As concessionáriasdeveriam,
ao menos,reduziropreço do pe-
dágioporqueaquedano tráfego
levaráaum menordesgastedo
pavimento, disseo presidente do
Sindicato de Transportadores
Autônomosde Carga(Sinditac)
de Ijuí (RS),CarlosAlbertoLitti
Dahmer. “E por que não abrir,
agoraque todomundodevedar
suaparceladecolaboração?”
Ocaminhoneiro WanderleiAl-
ves, oDedeco, que atuano Para-
ná, defendeu a suspensãodo pa-
gamento de pedágiospor causa
do risco de contágio por meio de
cédulas e moedas.Ele disse que,
emseuscaminhões,utilizatags.
Emborasemantenhainflexível
emrelaçãoaospedágios,ogover-
no tem atendido a outros pedi-
dos. Chorão disseque a resposta
foipositivaaumpedidodedistri-
buição,nos postos de serviço de
atendimento ao usuário das ro-
doviasconcedidas, de kits con-
tendo máscaraeálcool em gel. E
os caminhoneiros foram incluí-
dosno grupoprioritário para re-
cebervacinascontraagripe.
Agrande preocupação,disseo
caminhoneiro, écom a falta de ali-
mentaçãoe oficinas mecânicas. O
Ministério da Infraestrutura infor-
mouque os casospontuaisdefe-
chamento de serviços de apoio es-
tão sendo equacionados. Estados
estãorevendoseusdecretos que
suspenderam atividades, de forma
queaquelasessenciaisaossetorro-
doviário, comoborracharias eofi-
cinas,possamoperar.
Oentendimento entre governo
federaleEstadostem garantido o
trânsitodemercadoriasportodoo
país,informa a pasta. Ontem,Frei-
tas e aministra da Agricultura, Te-
rezaCristina,sereuniramcompre-
feitos paragarantir que normas
municipais sejam obstáculo ao
transportedemercadorias.
ConjunturaCategoria reclama do fechamentode restaurantes, borrachariase oficinasnas estradas
Com falta de serviços, caminhoneiros pedem apoio
WanderleiAlves,o Dedeco,umdoslíderesdoscaminhoneiros,precisaviajardeSantaCatarinaaoMaranhão,e temenãoencontrarlugarespara comer
JORGEWILLIAM/AGÊNCIA O GLOBO
FernandaPressinott e
Luiz HenriqueMendes
DeSãoPaulo
Diversos relatosde caminhonei-
rosnasredessociaiseemgruposde
WhatsApp apontam que não há
em diversas regiõesdo interiordo
paíscondiçõesmínimasparaman-
ter o transporte de mercadorias,
sobretudo por causade açõesres-
tritivas ao tráfego de pessoaseveí-
culos.Borracharias,lojasdepeçase
serviçosde mecânicos, por exem-
plo, não foramenquadrados como
essenciais e, portanto, não podem
abrirdiantedo Decreto 10.282pu-
blicadoem 20 de março.Ofecha-
mento de restaurantesé outroen-
travaapontadopelosmotoristas.
“Nãotemosonde comer.Acaixa
de cozinha dos caminhões quebra
um galho, mas não dá para estocar
comida.Nãotemosondetomarba-
nho. Não dá paracontinuar via-
gem”,diz um caminhoneiro não
identificado,que choraem vídeo
que circulaem vários grupos. No
depoimento, ele afirmaque um
restauranteconhecidode beira de
estradaemCasimiro de Abreu, no
Rio de Janeiro, estava abertoe on-
tem ele conseguiualmoçar. Mas
apósàs 16 horasaVigilânciaSani-
táriado Estado mandou fechar o
estabelecimento. “Eu estava me
programandoparajantar lá e se-
guirviagem.Masdisseramqueeles
têmqueficardeportasfechadas.”
O mesmo relato éfeito por diver-
sos motoristas, em estradas diferen-
tes. “Nãotem ondetomar banho”,
diz um áudioque circula em redes
socias.“Nãosoubichoparaficarsem
banho”.Outra preocupaçãode to-
dosécomopedágio,porqueamaio-
ria pagaos operadorescom dinhei-
roemespécieeenxergamaiumfoco
dedisseminaçãodecoronavírus.
WanderleiAlves, conhecidoco-
mo Dedeco, afirmou aoValorque
está sendocobradoparaentregar
materiaishospitalarescomurgência
para aSecretaria da Saúde do Mara-
nhão, masestá com medode seguir
viagem.“Estoucarregadode másca-
ras, luvas e outrosmateriais essen-
ciais para estemomento. Mas não
posso ir até oMaranhãoe passar fo-
me.Seépara morrer de fome, fico
comminha família emorroabraça-
do”, diz ele, que é de Curitiba (PR).
Dedecosaiu de Araquari,em Santa
Catarina,no sábadoe, se tudoder
certo, pretendechegar aSão Luís
amanhã. “Estamos vendojustasho-
menagens para médicos, enfermei-
ros e até profissionais de limpeza.
Mas se nós pararmos,nenhum deles
come. E tambémnão há combustí-
vel parao transporte de doentes”,
completa. Dedecodiz ter passado
vários áudios para oMinistro da In-
fraestrutura,TarcísioFreitas.
O presidente da AssociaçãoBrasi-
leira da Indústria de LácteosLonga
Vida (ABLV), Laércio Barbosa, afir-
mou que alguns caminhoneiroses-
tão inclusive recusandoos fretes por
causada paradeira dos serviços. Na
Laticínios Jussara, controladapela
família de Barbosa eque conta com
unidadesem PatrocínioPaulista
(SP)eAraxá(MG), amédiadiária de
caminhõesquetransportamositens
produzidos nas fábricasfica entre
120 e 130,mas houveuma “quebra”
de 15 caminhões por dia por causa
dosproblemas.
Em uma videoconferência com o
ConsórciodeIntegraçãoSuleSudes-
te (Consud)da qualparticiparam
governadores de Rio Grandedo Sul,
Santa Catarina,Paraná,São Paulo,
Rio de Janeiro,EspíritoSanto eMi-
nas na segunda-feira, oministro
Freitaspediuaaberturadasestradas
eapoio aos caminhoneiros.Noen-
contro virtual, Freitas recomendou
que os governadores dialoguem
comprefeitos para garantir alivre
circulação de produtos e o abasteci-
mento das cidades. Segundoele,
borracharias, oficinas epontos de
alimentação devem ser entendidos
comoserviçosessenciais.
Oministro admitiu, também,es-
tarrecebendomuitosrelatosdemo-
toristasque não conseguemprosse-
guirviagem.“Estouem70gruposde
WhatsApp, com uma média de 200
motoristas por grupo,etodosrela-
tandodificuldades. Se otransporte
de cargas parar, teremosoef eito da
greve de 2018somado ao coronaví-
rus”,afirmouoministro.
Na semana passada,oMinistério
da Infraestrutura instituiu o Conse-
lho Nacional dos Secretários de
Transporte. Entreoutras delibera-
ções, esse conselhodefiniu que "de-
cretos estaduais que suspendem
atividadeseconômicas estãosendo
ajustados para garantir serviçoses-
senciaisao setorrodoviário,como
borracharias, oficinas epontos de
alimentação nas rodovias. O minis-
tério informouque Estados como
EspíritoSanto, Maranhão,Santa Ca-
tarina, Minas Gerais,Mato Grosso,
Paraná, Alagoas eBahia já editaram
novos decretospara evitararestri-
ção ao transporte de carga.
Ta rcísioGomesdeFreitas:ministro daInfraestrutura indicaquenãopretendecedera novopedidodecaminhoneiros
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