JornalValor--- Página 12 da edição"26/03/2020 1a CAD B" ---- Impressapor CGBarbosaàs 25/03/2020@20:22: 07
B12|Quinta-feira, 26 de marçode 2020
Agronegócios
830
850
870
890
910
Fonte:DowJonesNewswirese ValorPRO.Elaboração:ValorData.* Mercadofuturo,segundaposição
Sojaem Chicago
Em US$cents/bushel
Dia a dia Mêsa mês
Variações- em %
Dia
No mês
No ano
12 meses
-0,31
-0,90
-7,40
-3,83
840
870
900
930
960
jan/19 mar/20**
12/fev
2020
25/mar
2020
884,75
884,75
929,25
903,50
Produtoresbrasileirospedemprorrogaçãodedívidas
Rafael Walendorff
De Brasília
As dificuldadesque a pande-
mia do novocoronavíruspodem
geraraos produtores ruraisbra-
sileiros estãotirando osono de
representantesdo setor. A prin-
cipaldelas éopossívelagrava-
mentodas dívidase a falta de ca-
pacidade de pagamentode par-
celas de financiamentos da atual
safra.Parte do segmentonão se
vê contemplada nas medidas
anunciadaspor bancoseminis-
térios recentementeepedem
ações específicas para o campo.
Ofícios enviados aos ministé-
rios da Agricultura e da Economia
pedemdesdeasuspensão da co-
brançado passivodo Fundo de
Assistênciaao Trabalhador Rural
(Funrural) até desoneraçõesem
algumas cadeias. Opresidente da
Associação Brasileira dos Produ-
tores de Leite (Abraleite), Geraldo
Borges, divulgou carta em que rei-
vindica “umatréguaem impostos
e suspensão temporária de encar-
gos como FGTSeINSS”como for-
ma de garantir a produção.
Ontem, aConfederação da
Agricultura e Pecuária do Brasil
(CNA) apresentouumalista de
propostas à ministra Tereza Cris-
tina na área de crédito, incluindo
prorrogação automática de ven-
cimentosde financiamentosde
custeio e investimentoparape-
quenos emédios agricultores
(com contratos de até R$ 1,5 mi-
lhão) e redução do impacto da
tributaçãonosetor,comaposter-
gaçãodorecolhimentodeimpos-
to de renda etributosfederais
(PIS/Cofins/IPI)portrêsmeses.
A entidadepresididapor João
Martinsquerdar fôlegoe“estan-
car a sangria”sobretudoem seg-
mentosque já estãoperdendo
dinheirocomproblemasde co-
mercializaçãoatualmente,como
produtores de frutas,flores,hor-
taliçaseleite. Opreço de produ-
tos perecíveis, como folhosas,
despencou30%emumasemana.
A CNA quer, ainda, a criação de
uma linha de capitalde giro para
todos os agricultores, comjuros
acessíveis, e jápensaem outras
medidas amédio elongo prazo. “A
prioridade era garantir aprodu-
ção,agora ésalvar quem estámor-
rendoedepois vamos pensar no
futuro, temosciência que a crise
econômica apóso coronavírus vai
ser muito grande evai impactar o
ato de consumodo brasileiro”,
afirmouosuperintendente técni-
codaentidade,BrunoLucchi
O deputadofederal Jerônimo
Goergen (PP/RS)sugeriuao mi-
nistroda Economia Paulo Gue-
des a suspensãopor tempoinde-
terminadoda cobrançado passi-
vo do Funrural,estimado em
maisde R$ 12 bilhõespela Recei-
ta Federal.A respostafoi negati-
va. Demandaantigado setor,o
perdãoda dívidaéuma promes-
sa de campanhado presidente
Jair Bolsonaroque aindanão foi
cumpridae enfrentaresistências
noexecutivoenoCongresso.
Goergentambém cobrou me-
didas emergenciais voltadas a
produtores atingidos pelaestia-
gemno Sul e a participaçãodo
governo paraavalizar linhasde
composição de dívidas já em ope-
ração, mas sem resultados.“Uma
securitização com recurso do BN-
DES,mas precisater redução do
juro egarantiado governo para
repassar aos produtores atingidos
por efeitos de seca e de mercado”.
AFederaçãoBrasileirade Ban-
cos (Febraban) informou que
produtoresruraisde pequenoe
médioportesestãoincluídos na
decisãodas principaisinstitui-
çõesfinanceiras(Bancodo Bra-
sil, Bradesco, CaixaEconômica
Federal,Itaú UnibancoeSantan-
der) de prorrogar opagamento
de parcelasde empréstimospor
60 dias,anunciada na semana
passada.A prorrogação, no en-
tanto, não é automática. Cabeao
produtor entrarem contato e in-
formara iniciativa. A medidasó
vale paracontratoscompaga-
mentoem dia. Se estivercom dé-
bito em atraso,oagricultornão
é elegível para esta ação.
O cenário de crisetambém
podeaumentara inadimplência
e os pedidosde recuperação ju-
dicial,segundoAntonioCarlos
de OliveiraFreitas,sóciodo Lu-
chesi Advogados, especialista
em recuperaçãode crédito no
agronegócio. “Apesardo câmbio
favorável e da demandainterna-
cionalpelosprodutosdo agro-
negócio brasileiro,muitospro-
dutores já vinhamacumulando
prejuízosnas últimassafras,tan-
to por motivos econômicos
quantoclimáticos”, afirmaVa-
milsonJosé Costa,sóciodo Cos-
ta TavaresPaes Advogados.
MARCELO CAMARGO/A GÊNCIABRASIL
Martins,presidente da CNA:tréguaem impostos e suspensãode encargos
China começa a ampliar suas importações de grãos
Assis Moreira e Fernanda Pressinott
De Genebra e São Paulo
A Chinavoltou ao mercado e es-
táimportandograndesvolumesde
soja, milhoe trigona esteira da re-
duçãodasrestriçõesquehaviaapli-
cadoporcausadocoronavírus.
SegundoMichelPortier,diretor-
geral da Agritel, consultoria com
foco no setor agrícola sediada em
Paris e com escritórios na China e
na Ucrânia, as atividadesportuá-
rias foram retomadas no país asiá-
tico. Havia um número enorme de
navios carregados, em pleno mar,
esperando para desembarcar
commodities, o que,de acordo
comele,enfimestáacontecendo.
Mas Portier observou que o au-
mentodas importaçõestambémé
motivadopelo temorde Pequimde
que portosem Brasil e Argentina se-
jamfechadoscomoavançodovírus.
Oespecialista confirmou que os
chineses voltarama comprar mais
soja dos EUA,em parte por causa
do acordocomopresidente Do-
naldTrumppeloqualPequimse
comprometeu a comprar adicio-
nalmente US$ 12,5 bilhões de pro-
dutos agrícolas americanos no pri-
meiro ano e US$ 19,5 bilhões a mais
no segundo ano,em comparação
com os níveis de 2017.E que isso
tem ajudado a sustentar as cotações
na bolsade Chicago,apesar da leve
queda de ontem (ve r infográfico).
Segundo o Departamento de
Agriculturados EUA (USDA), a Chi-
na vai importar88 milhões de to-
neladas de soja em grãonesta safra
2019/20 —de setembro de 2019ao
próximomês de agosto —, 5,5 mi-
lhões a maisque em 2018/19. A
Agritel credita parte desse aumento
à tendência de avançoda demanda
por rações na Chinaem virtude da
recomposição do plantel de porcos
do país, que sofreu duras baixas por
causada peste suína africana.
JáosEUA,tambémsegundooUS-
DA, deverão exportarquase50 mi-
lhões de toneladas de soja, ao passo
que os embarques do Brasilestão
projetados peloórgão em 77 mi-
lhõesdetoneladas.Oschinesestam-
bémestãocomprando milhodos
EUA, enquantoas compras de trigo
continuam concentradas na França
—os produtoresfranceses esperam
exportar1,5milhãodetoneladas.
“A Chinafoioprimeiropaísafeta-
do pelo surto,eoprimeiro asair”,
afirmouPortier. “Agora éver o que
vaiacontecernosEUAenoBrasil”.
No primeiro bimestre, as impor-
tações chinesasde soja somaram
13,5 milhõesde toneladas,segundo
dadosdaalfândegadopaís.Emrela-
ção ao mesmoperíodo de 2019,
houveincrementode 14,2%.Dentre
os derivadosda oleaginosa,a China
comprou110 mil toneladas de óleo
no período, com queda de 13,4% na
comparação anual.As importações
de milhochegarama 930 mil tone-
ladas,alta de 64,7%,e no caso do tri-
go houveretração de 8,9% na com-
paração,para 680 mil toneladas. A
alfândegatambéminformou que a
Chinaimportou 410 mil toneladas
de algodão, queda de 19%.(Colabo-
rouNaiaraAlbuquerque)
CenáriosAgênciadaONUprojeta
problemasapartirdeabriloumaio
FAO vê riscos
de tensões na
cadeia global
de alimentos
DIVULGAÇÃO
Assis Moreira “Se os países ficarem nervosos, isso poderálevar os exportadores a impor restriçõesaos embarques”, disse o economista-chefe da FAO, Maximo ToreroCullen
De Genebra
AFAO apontariscode tensões
no sistema alimentar mundial no
rastro do covid-19. Segundoa
agênciadas Nações Unidaspara
agriculturaealimentação, pertur-
baçõespodemaparecernacadeiaa
partirdeabriloumaio.E,porcausa
da recessão, a FAO tambémprevê
menorconsumoglobaldecarnes
Para a agência, impactos do coro-
navírus na produçãode alimentos e
na agricultura vão ocorrerna medi-
daemqueoscasosdapandemiaau-
mentamnomundoeoconfinamen-
to eoutrasrestrições são adotadas
parafrearapropagaçãodadoença.
No momento,oórgãoavalia que
as interrupçõessão mínimas,por-
que os abastecimentos de alimen-
tostêmsidoadequadoseosmerca-
dos continuaramrelativamentees-
táveis.Os estoquesmundiaisde
grãossão aindaelevadose as previ-
sões sobrea colheitadas principais
culturassãopositivasparaesteano.
DeacordocomaFAO,éprovável
umamenor produçãode alimen-
tos básicos de valor maiselevado,
comofrutas elegumes, mas ainda
não há turbulências nesse seg-
mento. No entanto, aagência vê
desdejá desafios crescentes na cir-
culaçãodeprodutosalimentícios.
Em entrevista aoValor, o econo-
mista-chefedaFAO,MaximoTorero-
Cullen disseque oproblemafunda-
mental será na área logística, mas
queasituaçãoédiferentenosdistin-
tosmercadosdecommodities.
“Para os cereais, intensivos em
capital,asreservassãosuficientese
ascolheitasatuaissãomuitoboas”,
afirmou. Ele considera que não há
problemasde disponibilidade de
alimentos, mas disse que dificul-
dades logísticas vão ocorrer se ca-
deiasdedistribuiçãodefatoforem
prejudicadaspelolockdown.
“Se os países ficarem nervosos, is-
so poderálevaros exportadores a
impor restrições aos embarques, e é
algoquedeveserevitado.Noladode
commoditiesdealtovalor,produtos
perecíveis,demandammuitotraba-
lho e, portanto,parte da produção
podeser afetada pela reduçãona
oferta de mão-de-obra devido aas-
pectos de doençasou pelolock-
downque está afetandoofluxode
trabalhadores temporários (mi-
grantes). Nessecaso, também os
problemasna cadeia logística são
muitomaispreocupantesporserem
produtosperecíveis”,disseele.
Porisso, afirmou,a FAO reitera
que éimportante que os países
tentemevitar esses problemase
permitam que “a cadeia alimentar
possasermantidavivaeeficiente”.
Para ToreroCullen, as tensões
tendem acrescer apartirdeabril
porque os efeitos do confinamen-
toeareduçãodaofertademão-de-
obraserãoclaros nospróximos
mesesnosetoragrícola.Nessecon-
texto, ele prevê quecolheitas de
muitos produtos de países expor-
tadorespoderãoserafetadas.
Sobreoimpactodacrisedocovid-
19 para paísesexportadores como o
Brasil, Maximo ToreroCullenapon-
tou que os efeitos negativosna ofer-
ta acontecerão principalmente por
problemaslogísticos e trabalhistas,
devido a doenças ou incapacidade
demovimentaçãoparaotrabalho.
Oeconomista-chefedaFAOlem-
brouque, no Brasil,já há proble-
masdelogística—emMatoGrosso
porexemplo.Elemencionouocaso
do município de Canarana, ondeo
prefeito emitiudecreto restritivo
parafrearapropagaçãodocorona-
virus eamedidapoderiainterrom-
per a logística de exportaçãode
grãos e as operaçõesdas principais
tradingagrícolasnaquelaregião.
Quanto àdemanda, ToreroCul-
len disse que acrise atual vai ge-
rar uma recessão,“eisso vai se re-
fletir na demanda, podendo afe-
tar os preços, levando-os àbaixas
no futuro próximo”. Ele observou,
também,que a estrutura de cus-
tos do setor agrícolabrasileiro vai
ser afetada peladesvalorização do
real em relação ao dólar.
Sobre a expectativa de queda
na produção eno consumoagrí-
cola, já que as pessoasestãocom-
prando menos emuitos não estão
produzindo, o economista-chefe
da FAO disse:“Se acadeiade valor
não estiver protegida, é possível
que ocorram problemasde preço
e escassez de alimentos, especial-
mentede produtos de alto valor
(frutas e vegetais), porque são
maistrabalhosos eserão maisafe-
tados por problemas logísticos”.
Para ToreroCullen, émuito ce-
doparasepreverrecuonaprodu-
ção de grãos. No entanto, aredu-
ção do crescimento econômico
mundial comoresultadodo co-
ronavírus afetará negativamente
ademandae,portanto,ospreços.
AFAO considera possíveluma
quedamaior, desproporcional,do
consumo de carne. Do lado da ofer-
ta,avaliaaagência,problemaslogís-
ticosjáestãoafetandoosegmento,e
épreciso que sejam adotadas medi-
dasdesaúdenecessáriasparaosem-
pregados de frigoríficos.Há,tam-
bém,o problema de informação.
“Tem havido muita especulaçãode
que o coronavirus tenha se origina-
do de animais para humanos. Isso
não tem evidência científica, mas a
especulaçãolevouconsumidores a
temeremcomercarnes”. E, em ter-
ceirolugar, a recessão vai reduzira
demanda,oqueafetaráospreços.
IMPACTOSDO
CORONAVÍRUS