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O ESTADO DE S. PAULO SÁBADO, 28 DE MARÇO DE 2020 Internacional A
MALMO, SUÉCIA
Apenas os 8 quilômetros de
uma ponte separam as vizinhas
Suécia e Dinamarca, mas en-
quanto as ruas da capital dina-
marquesa, Copenhague, estão
desertas, a vida em Estocolmo
continua normal, em um mo-
mento em que os dois países
adotam abordagens diferentes
no combate à pandemia do coro-
navírus.
A Dinamarca restringiu aglo-
merações públicas a no máxi-
mo dez pessoas. Determinou o
fechamento de escolas, univer-
sidades, creches, restaurantes,
cafés, bibliotecas, academias e
salões de beleza. A Suécia, não.
“Não acho que é tão perceptível
aqui”, disse Michaela Johnsson
sobre as medidas para comba-
ter o vírus. Seu salão de beleza
em Malmo, terceira maior cida-
de da Suécia, com 317 mil habi-
tantes, permanece cheio. “A
maioria dos meus clientes se
não trabalha em seus escritó-
rios, trabalha em casa. Espera-
mos que eles não façam o mes-
mo que a Dinamarca e fechem
os salões.”
Ontem, a Suécia proibiu reu-
niões de mais de 50 pessoas –
até então, vetava apenas aglo-
merações de mais de 500 pes-
soas – e determinou que restau-
rantes podem servir apenas
clientes sentados. Além disso, o
governo pediu às pessoas que
usassem o bom senso e ficas-
sem em casa se estivessem
doentes.
A 35 minutos de carro, do ou-
tro lado do Estreito de Ore-
sund, em Copenhague, Jorgen
Skjodt, dono da cadeia de
salões de beleza Dinamarca,
olha para seus estúdios vazios.
“Foi um pouco chocante desco-
brir que você tinha de fechar
seus negócios”, disse. “Desde a
semana passada, está vazio,
sem funcionários, sem clientes,
sem cabeleireiro, sem nada.”
Skjodt disse acreditar que
sua empresa sobreviverá, pois
ainda vende produtos e oferece
conselhos de moda por telefo-
ne. “É como um pesadelo, onde,
na verdade, não há ninguém em
nenhum lugar”, comparou,
acrescentando que confia no go-
verno e apoia as medidas toma-
das até agora. A Dinamarca fe-
chou suas fronteiras e só permi-
te a entrada de pessoas que en-
tregam mercadorias, de quem
trabalha e vive em outro territó-
rio ou quem retorna de viagem.
Já a Suécia adotou uma abor-
dagem mais suave do que a
maioria dos países do continen-
te. O governo argumentou que
fechar escolas seria ineficaz e
restrições serão impostas no
momento certo e pelo menor
tempo possível. Com quase o
dobro da população da Dina-
marca, a Suécia tem 3 mil casos
confirmados e 92 mortes. O
país vizinho registra 2 mi infec-
tados e 52 mortes.
A Agência Pública de Saúde
da Suécia admitiu, no entanto,
que pode tomar mais medidas,
caso o vírus se espalhe. “Mas de-
vem ser medidas sustentáveis,
não podemos apenas dizer que
tudo precisa ser fechado por vá-
rios meses”, disse o epidemiolo-
gista Anders Tegnell. Com uma
pressão cada vez maior dos
pais, a primeira grande restri-
ção talvez seja o fechamento
das escolas – o governo, porém,
ainda resiste. / REUTERS
WASHINGTON
O Departamento de Estado
dos EUA publicou em seu site
e no Twitter uma oferta enco-
rajando a contratação de
médicos e enfermeiros “que
buscam trabalho no EUA ou
querem trocar o visto de visi-
tante, principalmente os que
estão lidando com a pande-
mia de coronavírus”.
O anúncio indica que os pro-
fissionais que já estão nos EUA
com esse tipo de visto podem fa-
lar com as autoridades sobre a
possibilidade de estendê-los. A
notícia provocou o temor de
que os EUA estejam tentando ti-
rar médicos de países que já es-
tão sofrendo com a pandemia
do coronavírus e poderiam ficar
sem mão de obra qualificada em
um momento de extrema neces-
sidade.
O serviço de vistos nas embai-
xadas americanas no mundo to-
do foi suspenso no dia 20 e a
maioria das sedes diplomáticas
dispensou seus funcionários.
Em outra mensagem, divulgada
na quinta-feira, o Departamen-
to de Estado anunciou a realiza-
ção de entrevistas pessoais para
vistos H-2 (que incluem médi-
cos).
O Departamento de Estado es-
clareceu ontem que o pedido se
aplica somente aos indivíduos
que já têm “certificado de elegi-
bilidade” para seus vistos – e não
era um meio para convidar ou-
tras pessoas a solicitar o visto.
Não ficou claro, no entanto, se
governo americano estava pas-
sando na frente na fila de vistos
as pessoas com capacidade para
atender pacientes contamina-
dos com o coronavírus.
O anúncio inicial provocou re-
volta nas mídias sociais, entre
pessoas do mundo todo, que acu-
saram o governo dos EUA de pro-
mover uma potencial debanda-
da de médicos e enfermeiros de
países com sistemas de saúde
mais fracos. Outros analistas
destacaram o quão difícil é obter
esse tipo de permissão. Isso às
vezes pode levar anos para ser
aprovado, pois as regras podem
ser mudadas drasticamente em
momentos de crise.
Equipamento. Ontem, a pande-
mia avançou mais nos EUA, que
romperam a barreira dos 100
mil infectados. O presidente
Donald Trump pediu às monta-
doras Ford e General Motors
que comecem “imediatamen-
te” a produzir respiradores pa-
ra responder à disparada da de-
manda. As primeiras unidades
estarão disponíveis a partir de
abril, disseram a General Mo-
tors e a Ventec Life Systems, em
comunicado. / W. POST e AFP
LONDRES
O primeiro-ministro britânico,
Boris Johnson, e seu ministro
da Saúde, Matt Hancock, estão
infectados com o novo corona-
vírus, informou ontem o gover-
no britânico. Ambos afirmaram
ter “sintomas leves” da doença.
Johnson chegou a ironizar a
pandemia ao aconselhar os bri-
tânicos a lavar as mãos durante
o tempo que durasse a canção
Parabéns para Você. Ele foi um
dos últimos líderes europeus a
tomar medidas de restrição,
mesmo quando a pandemia já
atingia quase todo o continen-
te.
“Agora, estou em quarente-
na, mas continuarei liderando a
resposta do governo no comba-
te a esse vírus por videoconfe-
rências. Juntos o venceremos”,
afirmou Johnson, de 55 anos, pe-
lo Twitter, em um vídeo em que
aparece com aspecto de quem
está gripado.
“Felizmente, meus sintomas
são leves, trabalho de casa e me
mantenho confinado”, afirmou
Hancock, que participaria on-
tem de uma entrevista coletiva
com jornalistas para falar sobre
a crise do coronavírus. No dia
10, uma de suas colaboradoras
mais próximas, a secretária de
Estado de Saúde Pública, Nadi-
ne Dorries, foi diagnosticada
com a covid-19 – ela foi a primei-
ra figura política pública a ser
contaminada.
O premiê apresentou sinto-
mas leves na quinta-feira e fez
o teste seguindo o conselho do
consultor médico do Executi-
vo, Chris Whitty, informou um
porta-voz de Downing Street.
O exame foi feito na residência
oficial. A noiva de Johnson, Car-
rie Symonds, de 32 anos, está
grávida.
No entanto, de acordo com o
jornalista político Steven Swin-
ford, do Times, Symonds não es-
tá atualmente em Downing
Street, onde o primeiro-minis-
tro permanecerá isolado por se-
te dias, durante os quais serão
deixadas refeições e documen-
tos na porta de seu apartamento.
Em sua mensagem, Johnson
agradeceu aos trabalhadores
do serviço público de saúde bri-
tânico, o NHS, por seus esfor-
ços na luta contra a propagação
da doença. Mais de 14 mil casos
foram confirmados até agora
no Reino Unido, que registrava
ontem 759 mortes.
Príncipe. No início da semana,
o príncipe Charles, de 71 anos,
herdeiro do trono britânico, tam-
bém divulgou que está com o ví-
rus. Ele está confinado em seu
castelo de Balmoral, na Escócia.
Na quinta-feira, o príncipe foi vis-
to aplaudindo, de sua porta, a
equipe de saúde do Reino Unido,
uma homenagem que tem se re-
petido pelo mundo. / AP e AFP
Enquanto dinamarqueses
adotam isolamento mais
radical, suecos mantêm
escolas, bares e
restaurantes abertos
EUA oferecem visto a
médicos e enfermeiros
PANDEMIA DO CORONAVÍRUS
lVida normal
Suécia e Dinamarca
adotam políticas
opostas contra vírus
lOs EUA romperam ontem a
barreira de 100 mil infectados
pelo coronavírus. A pandemia
matou ainda um recorde de 345
pessoas em 24 horas, segundo
contagem da Universidade Johns
Hopkins. Ao todo, 1,5 mil pes-
soas morreram no país vítimas
da doença. Os EUA vêm registran-
do uma média crescente de 18
mil novos casos por dia. A maio-
ria das mortes vem ocorrendo no
Estado de Nova York, que se tor-
nou o centro da epidemia ameri-
cana. No Estados como Michigan
e Illinois, as contaminações tam-
bém ameaçam disparar. / AP
Após subestimar pandemia, Boris Johnson é infectado
“Devem ser medidas
sustentáveis. Não
podemos apenas dizer
que tudo precisa ser
fechado por vários
meses”
Anders Tegnell
EPIDEMIOLOGISTA CHEFE DA
AGÊNCIA DE SAÚDE DA SUÉCIA
DAVID KEYTON/AP-25/3/
Rotina. Moradores de Estocolmo jantam em restaurante
País tem mais de
100 mil infectados
ANGELA WEISS / AFP
Departamento de Estado é criticado por atrair profissionais
de saúde, privando outros países de mão de obra qualificada
Alerta. Centro de testes para a covid-19 no Brooklin; Nova York tem maior número de mortos