O trabalho feito na Escola Charlo e é lento, diário, árduo, exige grandes
doses de paciência. Os resultados vêm com o tempo. Alguns casos são resolvidos
em poucos meses, como a reabilitação dos gêmeos. Outros levam anos.
Aquele local inundado de quadros nas paredes, desenhos e luz me fez
lembrar, já na primeira visita, de disciplina, esforço e repe ção. Antes de ser
ocupada para ser a escola, a casa de dois andares abrigava uma academia de
dança. Na sala maior, onde acontecem as aulas de yoga, capoeira, teatro e o
circuito neurológico (rastejar, rolar, braqueador, caminhar), ainda estão as barras
de ferro u lizadas nos exercícios de balé.
As lembranças me levam a um tempo distante. Mais de dez anos
passaram-se desde que frequentei aquela sala. Ainda consigo ouvir ni damente a
voz da professora dizendo: "Mais uma vez. Es ca o braço, levanta a perna, coluna
reta, de novo. Suporta a dor. Sorria!" Essas palavras ainda ecoam por entre as
paredes, agora coloridas por nta salmão, impulsionando as crianças, fazendo
com que acreditem que um dia poderão ter a desenvoltura de uma bailarina, de
um dançarino.
Mas, assim como no balé, os exercícios executados na escola são dolorosos,
cansa vos, exaus vos. Para quem olha não passam de dança. Para quem faz são
um sacri cio, feito todo dia da mesma maneira. A recompensa chega, mais cedo
ou mais tarde, em forma de olhares, de palavras ou de sorrisos.
Todas as vezes em que es ve por lá observei Luciana. Menina bonita, de
claros olhos azuis. Tem dezesseis anos. Fala muito pouco. Nunca sorri.
Luciana é o único caso de au smo tratado na escola. Esse fenômeno é
caracterizado pelo desligamento da realidade exterior e da criação mental de um
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(Casulo21 Produções)
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