Linhas e Tramas

(Casulo21 Produções) #1

Mesmo sem posse de personagem, em todo caso, na performance se faz
presente um arquétipo. O contador assume uma postura, uma voz, um gestual que
não são fielmente os seus cotidianos. Podem ser muito parecidos, mas ao estar
frente a uma plateia, especialmente se esta for grande, sobre um palco, com
microfone, enfim, cercado de elementos não ordinários, o contador- performer
reproduz um tipo preparado e ensaiado para este fim.
Inegável que o avanço de tantas tecnologias de informação surgidas nos
últimos 15 anos e que convivem com uma geração nascida neste período
estabeleçam novas formas de acesso ao conhecimento da palavra. A leitura está
marcada pelo suporte também das mídias digitais, que atuam formando novos
leitores. O contador de histórias também tem espaço nessa virtualidade, valendo-se
de técnicas próprias e reconfiguradas para este meio. E, na outra extremidade, está
a necessidade de suprir a distância física e da voz ao vivo, fazendo com que a
performance do contador garanta seu lugar. Os ouvintes não querem apenas saber,
mas precisam também ser cúmplices da história e de quem a conta.
De forma geral, em qualquer suporte ou espaço físico, o contador tem uma
metodologia para criar. Ele parte do conto, do entendimento de sua estrutura, seu
estudo, sua incorporação, prática, inserção de elementos e competências, ajustes e
contato com o público.
Todo este processo criativo tem a mesma finalidade da narração de histórias
tradicional, que é a de atingir o ouvinte. Configura-se a trinca básica de qualquer
forma de comunicação: o emissor (contador), a mensagem (história) e o receptor
(espectador). No entanto, no ato performático do contador de histórias, este ouvinte
participa ativamente. Mesmo sem proferir palavra, gesticular, rir ou emitir qualquer
reação de troca, quem ouve uma história contada em tempo presente por meio da
voz e corpo acaba por tornar-se aliado da fabulação. Por mais surreal que possa
soar, acredita na história contada e, assim, desperta o espírito de coletividade
adormecido.
No fim, era o verbo.

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