National Geographic - Portugal - Edição 229 (2020-04)

(Antfer) #1

Cada vez mais cidades costeiras localizadas ao nível do mar estão a viver
um fenómeno conhecido como “cheias dos dias de sol”: basta apenas uma
maré alta para fazer a água jorrar pelas ruas. Segundo projeções da Agência
Nacional para os Oceanos e a Atmosfera, este tipo de cheias irá, dentro de al-
gumas décadas, ser a norma em cidades como Miami e Charleston. Até 2050,
espera-se que Norfolk, no estado da Virgínia, sofra cheias causadas por ma-
rés em cerca de metade dos dias do ano.
E o tipo de subida do nível dos mares que dificultará a vida em locais
como Norfolk poderá impossibilitá-la em locais como as ilhas Marshall e as
Maldivas. Um estudo recente realizado por investigadores norte-america-
nos e holandeses previu que, até meados deste século, a maioria dos atóis
tornar-se-ão inabitáveis.
No entanto, as cheias são apenas uma das consequências infelizes de brin-
carmos com o termóstato do planeta. Um mundo mais quente também será
assolado por secas mais graves, tempestades mais violentas e monções mais
erráticas. Nesse mundo, a época dos incêndios durará mais tempo e as cha-
mas serão maiores e mais intensas.
Antes de 1970, os incêndios que consomem, pelo menos, 40 mil hectares
eram raros nos EUA. Na última década, registaram-se dezenas. No Verão de
2019, os incêndios florestais queimaram mais de sete milhões de hectares na
Sibéria, uma área quase do tamanho da Irlanda. O fumo cobriu a região com
uma bruma doentia e levou os profissionais da saúde pública a aconselha-
rem os residentes de cidades como Krasnoyarsk a só saírem à rua caso fosse
estritamente necessário. Entre o fim de 2019 e o início de 2020, os incêndios
ocorridos na Austrália devoraram mais de 9,5 milhões de hectares.
E não é tudo. A degradação dos solos, o branqueamento de corais, as vagas
de calor cada vez mais mortíferas, a expansão das zonas mortas dos oceanos
estão a acontecer em tempo real. Já estamos a presenciar danos enormes e
estão a aumentar de ano para ano.
Em 2070, quando o Dia da Terra completar 100 anos, como será a Terra?
Isso depende claramente de quanto carbono viermos a emitir a partir deste
momento e até lá. Nos cerca de dez minutos que demora a ler este artigo, cer-
ca de meio milhão de toneladas serão acrescentadas à atmosfera. E, em certa
medida, assustadoramente, o futuro já foi escrito.


O PRIMEIRO DIA DA TERRA foi um movimento popular tão explosivo que pra-
ticamente todos os órgãos de comunicação social quiseram juntar-se a ele.
O programa Today emitiu informação especial durante uma semana subor-
dinada ao tema “New World or No World” [Novo Mundo ou Nenhum Mundo].
O apresentador do programa, Hugh Downs, abriu a semana com a seguinte
declaração: “A nossa Mãe Natureza está a apodrecer com os resíduos da nossa
boa vida. Os nossos oceanos estão a morrer, o nosso ar está envenenado.”
“Teremos força de vontade para mudar completamente o nosso estilo
de vida? Porque é isso que vai ser preciso”, acrescentou Downs. “Ou vamos
continuar a reproduzir-nos, exigindo cada vez mais energia, mais de tudo,
até sufocarmos ou morrermos de fome ou com uma epidemia? Provavel-
mente no próximo século, possivelmente nas próximas décadas?”
Em 1970, habitavam o planeta 3.700 milhões de seres humanos. Havia
cerca de duzentos milhões de automóveis e camiões na estrada. O consu-
mo de petróleo era de cerca de 45 milhões de barris por dia. Nesse ano, os
humanos criaram cerca de trinta milhões de toneladas de porco e cerca de
13 milhões de toneladas de aves e recolheram cerca de 65 milhões de tone-
ladas de alimentos marinhos.


Degelo da
Gronelândia
À medida que o Verão aquece,
os lagos com água do degelo
multiplicam-se no manto de
gelo da Gronelândia. Estas
imagens captadas por drones
mostram como um lago com
125 hectares foi quase drenado
em 2018 quando se abriu uma
fenda no gelo. Em determinada
altura, estava a perder um
volume de água equivalente a
uma piscina olímpica a cada
três segundos. A água destes
lagos flui até ao fundo do
manto de gelo, onde lubrifica o
leito rochoso e acelera o fluxo
do gelo para o oceano,
contribuindo para a subida do
nível dos mares.
COMPOSIÇÃO: TOM CHUDLEY,
UNIVERSIDADE DE CAMBRIDGE
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