LIVRO DIGITAL ENCONTRO SHAKESPEARE 2.1 - 2023

(Shakespeare 2.1EU1AMn) #1

Identifico mais traços do machismo estrutural pelas “frases-evidências”, que
ocuparam o mesmo “lugar de fala” machista, validadas pela memória sensorial e
emotiva detectada através do processo de transferência e espelhamento. Parte das
frases, terminologias, ideias, conceitos que estavam presentes nos textos e que,
desde então, foram detectadas durante os processos de construção das duas
personagens interpretadas por mim. Estavam revestidas pelos personagens
históricos, mas eram semelhantes.


Destaco em Hamlet:
Fragilidade, teu nome é mulher! (FERNANDES, 1988, p. 12).

Em Enéas, destaco:
De noite, Hermes, anunciou-me em um sonho
Que devo procurar a frutuosa Itália.
Jove assim quer, a minha mãe também o quer.
Que a minha feniciana permita, e eu vou.
Permitindo ou não, Enéas deve ir. (IV, 3)
(TIBIRIÇA, 2023).

Ou o diálogo entre Dido e Enéas:
EN. Amor, gasta em vão o esvaído respirar.
Se falar adiantasse já teria vencido.
DI. Não vão adiantar as palavras de Dido?
(TIBIRIÇÁ, 2023, p. 118).
Aqui há a evidência de que a mulher não possui lugar de fala privilegiado,
mesmo sendo uma Rainha. Suas palavras não valem nada diante da decisão de seu
amado.


Do tradutor destaco:
Marlowe se encontrava justamente entre duas épocas, no
momento de passagem entre uma visão do fetichismo religioso e
o fetichismo do valor. Não seria nada surpreendente que estivesse
captando justamente esse momento. Mas o efeito dessa cisão em
Dido seria bem pior. Como Enéas já tinha sido definido como a
parte racional, do cumprimento das obrigações, do dever e da
responsabilidade, Dido passa a ser apresentada como a parte
emotiva, feminina, ‘irracional’ e improdutiva.
(TIBIRIÇÁ, 2023, p. 46).
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