LIVRO DIGITAL ENCONTRO SHAKESPEARE 2.1 - 2023

(Shakespeare 2.1EU1AMn) #1

II – A tempestade latino-americana


Embora outros escritores latino-americanos, como o nicareguense Rubén Darío e o
franco-argentino Paul Groussac, já tivessem escrito textos nos quais A tempestade
servisse como metáfora, foi o livro Ariel , de José Enrique Rodó, publicado na virada do
século XIX para o século XX (1900), que teve maior repercussão na região.


Diferente das obras anteriormente abordadas neste artigo, o texto de Rodó não se
tratava de uma peça de teatro, mas sim de um ensaio no qual buscava orientar as
juventudes latino-americanas para a importância dos valores das culturas hispânica e
greco-latina (representando Ariel) em oposição ao utilitarismo e materialismo dos
Estados Unidos (Caliban). Nesse espectro, Próspero poderia ser pensado como uma
metáfora para o intelectual, que aconselhava a juventude.


A obra Ariel foi bastante lida no início do século XX e tornou-se um elemento importante
para a construção de uma identificação latino-americana entre os intelectuais da época,
mas deve-se levar em consideração não apenas o contexto de sua publicação, como
também seus fundamentos e as expectativas de intervenção da obra.


Politicamente, Rodó poderia ser considerado um liberal-conservador. Na virada do
século XIX para o XX esse posicionamento estava ligado a uma concepção aristocrática
da democracia, isto é, considerar que a democracia era boa pois permitia, através da
disputa, que os indivíduos mais aptos se destacassem.


Em relação a Renan, Rodó o cita em diversos momentos, sendo que em uma passagem
específica ele menciona Caliban, embora discordasse do autor francês a respeito da
equivalência entre o personagem e a democracia. Se para Renan esta levaria ao
materialismo – como vimos, ao menos em Caliban , sendo que em L’eau de jouvence isso
se altera −, para Rodó ela preserva a base da aristocracia.^3


3
Ver RODÓ, José Enrique. Ariel. Buenos Aires: Editorial Cervantes, 1920, pos.646.

Free download pdf