LIVRO DIGITAL ENCONTRO SHAKESPEARE 2.1 - 2023

(Shakespeare 2.1EU1AMn) #1

criação rígida e patriarcal e os percebo em mim, mesmo sem aderir, pois fui
atravessado por estes fortes sinais em minha educação social, o que identifiquei
prontamente como um caminho que não seguiria. Não tive aderência.
Observo o impacto causado na personagem Ofélia (em Hamlet ), lanço mão das
técnicas de espelhamento para encontrar as evidências desses traços machistas em
sua estrutura textual.


A escritora Betty Friedan em seu livro Mística Feminina (pag. 20), mostra
bem a realidade vivida pelas mulheres americanas nos anos posteriores a
Segunda Guerra Mundial: Durante mais de quinze anos as palavras escritas
para as mulheres e por elas usadas ao conversarem entre si, enquanto os
maridos se reuniam a um canto da sala, falando de negócios, política ou
novidades tecnológicas, referiam-se a problemas com os filhos, a manter
feliz o marido, ajudar as crianças nos estudos, preparar pratos deliciosos,
ou costurar capas de poltronas. Ninguém queria saber se as mulheres eram
superiores ou inferiores: eram simplesmente “diferentes”. Vocábulos como
«emancipação» ou “carreira” pareciam estranhos e embaraçosos. Ninguém
os usara há tanto tempo! (NUNES, 2022, p 62).

Olho para a personagem Ofélia, identifico e faço um link direto com as
mulheres americanas, é como se nada tivesse mudado, mesmo com o passar do
tempo. Numa cena onde nos deparamos com o confronto entre um homem e uma
mulher, a sociedade continua defendendo a postura masculina. As Ofélias são
sempre loucas. Mas os Hamlets apenas fingem a loucura. Nesse ponto foco no
machismo estrutural, cultural e inerente a diversos aspectos de uma sociedade,
normalizado por muitas décadas.
Eduardo Chaves Nunes em Os Pontos de Interseção entre o Feminismo e o
Machismo Tóxico: Uma Análise à luz da teoria feminista,
2022, fala da realidade
brasileira. Traço o cruzamento de suas análises com as personagens de Shakespeare
para supor uma possível atuação desses pensamentos, pois há sinais de machismo
desde a Inglaterra no período elisabetano que continuam reverberando até os dias
atuais, alcançando a contemporaneidade.
Durante o movimento de libertação feminina das décadas de 1960 e 1970, o
termo machismo começou a ser usado por feministas latino-americanas para
descrever a agressão masculina e a violência. A origem do pensamento machista não
foi evidente e tão pouco percebida, por essa razão hoje é lida como estrutural. Por

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