BECO

(Leonam Victor) #1

pinta quem tem conheci-
mento dos editais e não é
todo mundo que tem acesso.
Às vezes, exigem currículo e
tal, mas como vou ter currí-
culo sem oportunidades?
Até agora, a gente só ganhou
grana com editais porque a
gente se organizou para isso.
A gente conseguiu fazer o
mutirão em comemoração
aos 8 anos porque passamos
em um edital da ‘Juntas’, co-
letivo das deputadas, senão
não teria grana.


MILA: A burocracia dificul-
ta muito. A gente tá falando
de um movimento urbano
que emerge na rua, na peri-
feria. Quando faz um edital
com tantas burocracias, você
tá ditando quem você quer
que passe.


O ‘Colorindo Recife’, do qual
vocês participaram recent-
emente, foi um edital tam-
bém ou foi convite?
LALESCA: Foi edital tam-
bém. Todas tiveram que se
inscrever, mandar portfólio.
A gente fez até um mutirão
pra essas inscrições do Co-
lorindo, porque tinha mana
que nem portfólio tinha, não
sabia mexer no Canva. A
gente tem que ensinar como
fazer.


O que vocês consideram
como uma conquista na
cena?
LALESCA: Para a cena,


recentemente, tá acontecendo um edital de empenas - pra
pintar prédios - e eu achei incrível, magnífico! E... a gente
conseguiu cursos de NA85 [curso para trabalhar com alturas]
de graça, priorizando mulheres. Não vejo a hora de pintar um
prédio! Super empolgada!

Recife ainda tem uma parte muito conservadora quando o
assunto é arte de rua. Mas o que vem de fora é valorizado e
ganha até espaço nobre, voltado para a elite, como a expo-
sição de OSGÊMEOS, no Instituto Brennand. Qual a opinião de
vocês sobre isso?
LALESCA: Primeiro, pra a gente conseguir acesso a essa
exposição a gente teve que pressionar muito a prefeitura para
liberar entrada gratuita, pelo menos pra quem participou do
Colorindo. O Brennand é um espaço totalmente elitizado. De
cara, achei estranho ter uma exposição de grafite lá. Se não
fosse OSGÊMEOS, que tem visibilidade internacional, simp-
lesmente ela não estaria lá, de jeito nenhum. [...] O talento de-
les é inegável, mas tiveram acessos que quem vem da periferia
não teve e, se continuar assim, nem vai ter.

MILA: Acho muito importante ter tido exposição deles aqui,
mesmo com várias ressalvas, [...] como o valor cobrado, que
não era acessível e que delimitou quem poderia participar.
[...] Acho importante para aprendizado nosso, apreciar a arte,
sacar as técnicas e a história. Mas, também, tem o questiona-
mento de “por que esse espaço de referência e notoriedade tá
sendo ocupado por dois boys brancos de classe média?”. Por
que sempre esses mesmos corpos nesses lugares de referência,
de conseguir viver e ganhar o mundo com arte?

Sabendo que arte de rua muitas vezes é menosprezada e
vista como vandalismo, qual a visão de vocês do que seria a
linha entre o vandalismo e a expressão artística?
LALESCA: Como o grafite começou como um movimen-
to periférico, a galera encara muito como um movimento
marginal, e é marginal, sim. São pessoas periféricas que vivem
realmente à margem da sociedade. Leminski fala que o grafite
está para a arte como o grito está para a voz. É como a gen-
te estar gritando que a gente existe. Se você passa por uma
avenida e não gosta das pichações que vê, esse é o intuito, de
incomodar. Você tá passando por uma avenida toda boni-
tinha, mas por trás tem uma favela com pessoas subsistindo
nela, sendo principalmente esquecida por poderes públicos.
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