Valor Econômico (2020-04-07)

(Antfer) #1

JornalValor--- Página 8 da edição"07/04/20201a CADA" ---- Impressa por VDSilva às 06/04/2020@21:24:


A8|Valor| Te rça-feira, 7 deabrilde 2020

PolíticaPolítica


IMPACTOSDO


CORONAVÍRUS


Doria relataameaças


contra famíliae cita


‘gabinetedo ódio’


AndréGuilhermeVieira
DeSãoPaulo

O governador João Doria
(PSDB)enviouum recadoclaro
ao presidente eàmilitânciadi-
gitaldo presidenteJairBolsona-
ro fazendomençãoexpressa ao
chamado‘gabinetedo ódio’, du-
ranteentrevistacoletivaconce-
dida ontem para anunciar a
prorrogação da quarentena em
São Paulo até odia 22 de abril.A
medidatem o propósitodecon-
ter aexplosãode casosde coro-
navírusno Estado.
“No Brasil, defendem isola-
mentooministrodaSaúde,Luiz
HenriqueMandetta,o ministro
da Justiça, SergioMoro,ominis-
trodaEconomia,PauloGuedes,o
vice-presidente HamiltonMou-
rão,ocentro de Estudosdo Exér-
cito eamaioria absoluta de mé-
dicose cientistas. Será que todos
eles estãoerrados? Seráque a
ciênciamundialestá errada?Se-
rá que um únicopresidenteda
Repúblicano mundo éocerto? É
quemdetémopoder,aciência,o
conhecimentopara discordar do
mundo?”,indagouDoria.
Odistanciamentosocialconver-
teu-se em tema de disputa política
com o presidente Bolsonaro. O go-
vernador, principal expoente do
isolamento emais fortecontra-
ponto políticoao Planalto, tam-
bémse referiu, indiretamente, ao
processode fritura do ministro
Mandettapelopresidente.
“Saberouviré tão importante
quantosaberfalar, mas é preciso
ter humildadeparasaberouvir,
sobretudoem temposem que
alguns gostam de impor suas
vontades eameaçam aqueles
que têm posição contrária”, dis-
se Doria.Bolsonarotem vivido
embatesfrequentescom Man-
dettapor discordardo entendi-
mento sanitário seguido pelo

ministro, afinadocom os proto-
colosda OrganizaçãoMundial
da Saúde(OMS)eacompanhado
pelogovernador de São Paulo e
também por outrosEstados.O
presidentese incomoda ainda
com oprotagonismode Man-
dettana conduçãoda criseda
pandemiaecom aelevaçãoda
popularidadedo ministro e de
governadores, conformeapon-
tarampesquisasde opiniãodi-
vulgadasna sexta-feira.
Doriarevelouter colocadoos
filhose esposaem esquemaes-
pecialde segurançadepoisde
receberameaçasem um de seus
celulares, inclusive por meiode
mensagensde áudio, afirmou,e
associou os autoresdas intimi-
daçõesao gabinetedo ódio—
nomedadopor integrantesdo
governo federal a um grupode
três servidoresligadosao verea-
dor do Rio de Janeiro,Carlos
Bolsonaro (PSC),que produzem
relatórios diárioscominterpre-
taçõessobrefatosnacionaise in-
ternacionaise respondempelas
redessociaisdo presidente.
“É um tematristeem meioa
tantascircunstânciasondenós
precisamossalvarvidas,eu ter
que defendera vida dos meusfi-
lhos de ameaçade pessoasque
queremseguiraorientaçãodo
gabinete de ódio, ou de pessoas
que odeiam”, afirmouo gover-
nadorpaulista.
Doria disse sentir “tri stez a”
por estarvivendo“emum país
ondedeveríamos estarsendoli-
derados por uma causade salvar
vidase isto não acontece, ao con-
trário, manifestaçõesde ódio são
estimuladaspelasredessociais,
manifestaçõesinadequadas,ino-
portunase irresponsáveis são co-
locadas, aindaque pontualmen-
te,porpessoasquequeremodes-
respeitoàs medidasque estamos
tomandoparadefenderavida”.

Prefeito deVarginha fracassaemreabrircomércio e renuncia


MarcosdeMoura e Souza
DeBeloHorizonte

Após umasériede críticas e
questionamentos por ter determi-
nadoa reabertura do comércio na
cidade mineira de Varginha, o pre-
feito Antônio Silva (PTB) decidiu
renunciar ontem ao cargo.Silva
havia assinadoum decretona se-
manapassada que determinava
que a, partir desta segunda, o co-
mércioem Varginha poderia vol-
tarafuncionar.
Assimcomotodosos municí-
pios de MinasGerais,Varginha,
nosuldoEstado,tinhadecretado
ofechamentodetodososestabe-
lecimentos comerciaisconside-
radosnão essenciaiscomoforma

de reduziro riscode dissemina-
çãodocoronavírus.Adecisãope-
lo fechamento tinhasido assina-
da em 20 de marçopelo vice-pre-
feitoVérdi LucioMelo(Avante).
Meloestava, naquelemomento,
comoprefeitoemexercício.
Segundoa imprensalocal Antô-
nio Silva estava em férias quando a
decisão foi tomada. Na semana
passada,jádevoltaaocomandoda
prefeitura, Antônio Silva decidiu
atender à demanda de comercian-
tes de Varginha e assinou um novo
decreto que permitiaque as lojas
voltassemafuncionar.
Aposição de Silvacoincide
com a que vem sendo defendida
pelo presidenteJair Bolsonaro,
paraquemgovernadoresepre-

feitos devem começar a autorizar
a reabertura dos estabelecimen-
tos comerciais. Bolsonarotam-
bémquestiona a necessidadede
que escolas públicas eprivadas
sejam mantidas fechadas pelo
paísporcausadapandemia.
Mas em Varginha, a decisão de
Silvaprovocouuma gritaentre au-
toridades públicas e em parteda
população da cidade. E fez com
queoentãoprefeitovoltasseatrás.
Numnovodecreto assinado
no sábado,Silva listouas posi-
çõesmanifestaspelo Ministério
Públicode Minas,pela Secretaria
Estadualde Saúde,peloConse-
lho Municipalde Saúde,pela As-
sociaçãoMédicadeVarginha,pe-
lo Sindicatodos Médicosde Mi-

nas Gerais,pela Comissãode Pre-
venção,ControleeEnfrentamen-
to do Coronavírusdo Estado.To-
das essasentidades foramcon-
tráriasà reaberturado comércio
em Varginha.No decretode sá-
bado,oentãoprefeitomanteveo
comércio fechadopor pelome-
nosmais15dias.
De acordo com oboletim di vul-
gadona manhã de ontem pela Se-
cretaria de Saúde de Minas Gerais,
em Varginha há 4 casos confirma-
dos e nenhumamorte por corona-
vírus. Acidade tem 135,5 mil habi-
tantes. No Estado são 525 casose 9
mortes. Vendo-se contestado pu-
blicamente etendode recuar, An-
tônio Silva —que havia sido eleito
em2016—renunciou.

Análise do Exército sai doar e será revista


MariaCristinaFernandes
DeSãoPaulo

OExércitoresolveutirardoara
análise, de autoria do Centro de
Estudos Estratégicos da institui-
ção, sobre a crise da covid-19.O
estudo, intitulado “Estratégias de
transição para anormalidade”,
estava no site do Exércitodesde o
dia 2. Foidivulgado pelo colunis-
tadoUOL,RubensValente.
SegundooC entro de Comuni-
cação do Exército, o texto voltará
ao ar depoisde passar por um
ajuste.Teria havidouma leitura
“inadequada” de que se tratava
de uma postura do Exército con-
trária ao Comandante Supremo
das Forças Armadas, o presidente
da República.“Nossainstituição
não se presta a interesses que não
sejamodasociedade”, informou.
O Centrode EstudosEstraté-
gicosestá diretamente subordi-
nadoao chefe do Estado Maior
do Exército, segundocargona
hierarquia da instituição, depois
do comandante.Oestudofoi di-
vulgadoum dia antesde ocargo
ser oficialmente transmitido pe-
lo seu ex-ocupante,oministro-
chefeda CasaCivilda Presidên-

cia da República,Walter Braga
Netto, ao general Marco Antônio
Amaro dos Santos.
Por conta da pandemia,a
transmissão foi feita em cerimô-
nia restrita. Alémde BragaNetto,
que hoje lidera o comitêda crise
da covid-19no governo,ede
Amaro,queassumiuafunçãode-
pois de chefiaro ComandoMili-
tar do Sudeste, em São Paulo,
compareceramo ministro da De-
fesa, FernandoAzevedoeSilva, e
o comandantedo Exército, gene-
ralEdsonLealPujol.
Oestudode 25 páginaspreco-
nizamedidasem linha comas
orientações da Organização
Mundial da Saúdeecom acon-
duta recomendadapelo Ministé-
rio da Saúde.“A adoçãoprecoce
de estratégias de isolamentoho-
rizontaltem apresentado resul-
tados parciais maisefetivos, no
achatamentodacurva”.
Consideraoisolamentoverti-
cal, defendidopelopresidente
Jair Bolsonaro, comoumame-
dida a ser adotada apenas
quandose comprovarumacur-
va descendente de contágio.
Ponderaaindaque a medidafoi
bemsucedidaem paísescuja

geografia—edisciplina—são
distintasdasdoBrasil.
Otextoavançana análisede
uma“estratégiade sequencia-
mentoou mista”, com 14 dias de
isolamentohorizontaleoutras
duas semanas de isolamento
vertical,condicionadosao perfil
epidemiológico de evoluçãodo
contágio em cadaregião,àreali-
zaçãode testesrápidosparase-
pararapopulação contaminada
daquela sem sintomas,alémde
medidascomoo revezamento
do horáriode funcionamento
das atividadescomerciais,limi-
taçãode transporteurbanoe li-
mitação da quantidade de pes-
soasemcirculação.
O estudoponderaque qual-
quermedidadevelevarem con-
sideraçãoas dimensõesdo país,
a precariedadedas condiçõesde
vidade comunidades periféri-
cas, as deficiênciasdo sistema
hospitalareodesemprego.Aler-
ta aindaque umadas maiores
dificuldadespara aadoçãodas
medidaséaobtençãode con-
sensosna Federação. “Essecon-
sensodeveserconstruídodefor-
maurgente.Nãoparecerazoável
uma quebrade governabilidade

nummomentotãocrítico”.
Alémde apoiar,em linhasge-
rais,aconduta do Ministérioda
Saúde,o estudo especulasobre
umapossível retomadada cen-
tralidadede mecanismoseconô-
micosmultilaterais, comoa Or-
ganizaçãoMundialdo Comércio
(OMC), a Organização Mundial
do Trabalho(OIT)eoFundoMo-
netário Internacional (FMI). A
crítica ao multilateralismo tem
marcadoaatuaçãodo chanceler
ErnestoAraújo.
A repercussãodo estudoso-
mou-se à tempestade perfeita
paraopresidenteda República
ao longodo fim de semana. Pes-
quisa Datafolhaindicou que a
popularidade do ministro da
Saúde,HenriqueMandetta,su-
pera a do seu chefe, levando-o a
intensificaras gestões parasua
substituição.Aprecipitaçãode
Bolsonaro rumoa um isolamen-
to aindamaiorfoi coroadacom a
atuaçãode suamilíciadigital
que decretou guerracomperfis
falsos do presidenteda Câmara,
Rodrigo Maia ede Mandetta,
alémda radicalizaçãodas provo-
caçõescontrao governochinês,
#bloqueiocomercialchinesja.

ExecutivoMinistroconvocaentrevista,redobraapostaemisolamentoesurpreendeequipequeesperavapordemissão


Alvo de fritura, Mandetta diz que fica

Mandetta,aodizer quefica, depoisdesereunircomBolsonaro noPlanalto: “Omédiconãoabandonao paciente, masprecisadeumbomambientepara trabalhar”

PABLO JACOB / AGENCIA O GLOBO

Fa bioMurakawa, RenanTr uffi,
Rafael Bitencourte Andrea Jubé
DeBrasília

Oprocessode fritura do minis-
tro da Saúde, Luiz Henrique Man-
detta, esquentou ontem e ele ficou
por um fio de perderocargo. Po-
rém, no fim do dia,após participar
de uma reunião ministerial no Pa-
láciodoPlanalto,Mandettaconvo-
cou uma entrevista coletiva na se-
de da pastaparadizer que fica.
“Nósvamoscontinuar, porquenós
temosum inimigo.Nosso inimigo
tem nome e sobrenome:covid-19.
Um médico nãoabandona opa-
ciente”,afirmou.
Alvo de críticas públicas do
presidente Jair Bolsonaro nos últi-
mos dias, por contade divergên-
cias emtorno da conduçãoda cri-
se provocada pelacovid-19, Man-
detta reforçouseu antagonismo
como chefe na defesa do isola-
mento social. Epediu “umbom
ambiente para trabalhar”.
“Nãotemos nenhumreceio da
crítica. Gostamos da crítica cons-
trutiva. O quenós temosdificulda-
de équando em determinadas im-
pressõesas críticas nãovêm no
sentidodeconstruir,masvêmpara
trazerdificuldade no ambientedo
trabalho”, disse Mandetta. “O mé-
diconão abandonaopaciente.
Mas o médico precisade um bom
ambientepara trabalhar. Tudo o
que eu estou pedindoéum bom
ambienteparatrabalhar.”
Mandetta reiterouque atua
com base na ciência eunido àaca-
demia para definir protocolos, es-
colher as drogaseestratégiaspara
combater a pandemia. E destacou
que vem trabalhando com trans-
parência nos números,nas discus-
sõesetomadasdedecisões.
A entrevista coletivaaconteceu
momentos depois de Mandetta
deixar o Planalto.Ele foi recebido
no ministériopor funcionários,
que aguardavampara homena-

geá-lo,jácertosdademissão.Omi-
nistro falou rodeado por todosos
seus secretários e com integrantes
da bancada da saúdena plateia,
em umademonstraçãode força
peranteopresidente.
“Espero que a equipe do Minis-
tério da Saúde que já ficou muito
temposemtrabalharhoje,volteao
trabalho.Vamosacabaressacoleti-
va evamosretomar otrabalhoque
temosqueretomar”, disse.
BolsonarocogitoudemitirMan-
dettaontem mesmo, segundo re-
latos. Mas anotícia de que odesti-
no do auxiliarestava seladogerou
uma forte repercussãonegativa
nas redes sociais e provocoupane-

laçoscontraopresidenteàtarde.
Ministros militares advertiram
Bolsonaro de que opresidente do
Congresso Nacional,senador Davi
Alcolumbre (DEM-AP), também
estavacontra amedida. Alcolum-
bre telefonou, maiscedo, paraos
ministros da Casa Civil, Walter
SouzaBragaNetto,edaCidadania,
OnyxLorenzoni (DEM-RS), com
quemdiscutiuoassunto.
Ele também falou pessoalmen-
tecomolíderdogovernonoCon-
gresso, senador Eduardo Gomes
(MDB-TO), na Residência Oficial
daPresidênciadoSenado.
Bolsonaro,por suavez, esteve
ontem com doisdos principais co-

tados parasubstituir Mandetta. O
deputado federal Osmar Terra
(MDB-RS), ex-ministro da Cidada-
nia, participoude uma reunião
com o presidente, BragaNetto eos
outrostrês ministros palacianos:
LuizEduardoRamos(Secretariade
Governo), Augusto Heleno (Gabi-
nete de Segurança Institucional)e
Jorge Oliveira (Secretaria-Geral).
Terra vem adotandoum posicio-
namentoalinhadoaodopresiden-
tecontraoisolamentosocial.
Depois, almoçou comaonco-
logista Nise Yamagushi, diretora
doInstitutodeAvançosemMedi-
cina, que tem defendido ouso de
cloroquinano tratamento inicial

de pacientes com covid-19 —po-
siçãoantagônicaàdeMandetta.
Bolsonarotem se irritado com
o protagonismodo ministrona
crise eacreditaque ele está agin-
do politicamenteparase cacifar
paraaseleiçõesde2022.
Mandettatem pretensões de
concorrer ao governo de Mato
Grosso do Sul. Porém,opresidente
temeaté mesmoque ele represen-
te uma ameaça à sua reeleição, da-
da apopularidade que o ministro
adquiriupor suacondução da cri-
seprovocadapelocoronavírus.
Bolsonaro também está contra-
riadocom oalinhamento do mi-
nistrocomAlcolumbreecomo

presidente da Câmara, Rodrigo
Maia(DEM-RJ). Embora também
defendam a linhamais científica
do ministro da Saúde, ministros
militares comoBraga Netto eRa-
mos avaliam que Mandetta extra-
polou ao expor publicamente suas
divergências com opresidenteem
relaçãoàpandemia.
Aparticipação de Mandetta no
sábadoemuma “live”da dupla
sertanejaJorge& Matheus tam-
bém incomodou opresidente. “É
importante que a música chegue,
maséimportantenãoaglomerar.
O shownão pode parar, mas a
aglomeração tem queparar”, dis-
seoministroemsuaaparição.
Na entrevista de ontem,ele
agradeceunovamenteaduplae
reiterouaadvertênciaquefezaos
músicoscontraasaglomerações.
Parlamentares da basedo go-
verno acreditavam ontemque as
chances de demissão de Mandetta
eram“muito altas”, mas também
afirmavam que omartelo “ainda”
nãohaviasidobatido.
No domingo, o presidente disse
que alguns em seu governoestão
“se achando”, “viraram estrela” e
que “a horadeles vai chegar”, em
referênciaindiretaaMandetta.
Na semana passada, opresiden-
te afirmouque faltava “humilda-
de” ao ministro,que, em sua ava-
liação, deveria escutá-lo mais.Dias
antes,Bolsonarohavia passeado
por Brasília, desrespeitando as re-
comendações da pasta eda Orga-
nizaçãoMundialdaSaúde(OMS).
Aliados do ministro creem que a
atitude presidente tem como objeti-
vo principal “desgastar”aimagem
do auxiliar para minimizar o ônus
de umaeventual demissão.Ciente
da aprovação do titulardo Ministé-
rio da Saúde frente àopiniãopúbli-
ca, Bolsonaroteria adotado, na ava-
liação aestratégia de “queimá-lopa-
ra que ademissãonão custetão ca-
ro”. Segundopesquisas, aavaliação
da atuação de Mandettamelhorou
em relaçãoaos primeiros dias da
pandemia.Por outrolado, arejeição
à performance de Bolsonaro au-
mentou.(ColaboraramMarceloRi-
beiro e MatheusSchuch)

CANAL UNICO PDF - ACESSE: T.ME/JORNAISEREVISTAS
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