O Estado de São Paulo (2020-04-11)

(Antfer) #1

%HermesFileInfo:A-10:20200411:
A10 SÁBADO, 11 DE ABRIL DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


Metrópole

Mortes por novo coronavírus passam


de mil no Brasil e de 100 mil no mundo


Ludimila Honorato


A pandemia do novo corona-
vírus alcançou ontem duas
marcas: no Brasil, o número
de mortos ultrapassou a casa
dos mil e no mundo, a dos 100
mil. Balanço divulgado pelo
Ministério da Saúde aponta
que já são quase 20 mil os bra-
sileiros diagnosticados com a
covid-19. No mundo, o total
de infectados é de 1,6 milhão.
Em 24 horas, o País registra-
das 115 novas mortes (acrésci-
mo de 12%) e 1.781 casos a mais
(aumento de 10%), elevando os
números totais para 1.056 óbi-
tos e 19.638 casos confirmados
da doença em todas os Estados.
São Paulo continua sendo o
mais afetado, com 8.216 casos e
540 mortes, seguido por Rio de
Janeiro (2.464 e 147) e Ceará
(1.478 e 58). Na quinta-feira, o
governador João Doria (PSDB)
prometeu mais rigor nas medi-
das de distanciamento social,
cogitando até prender quem
desrespeitar a recomendação.
O objetivo, segundo ele, é que
o isolamento englobe cerca de
70% da população em todo o Es-
tado, patamar considerado
ideal para desacelerar a doença.
Porém, o Sistema de Monitora-
mento Inteligente (SIMI-SP)
do Governo de São Paulo mos-
tra que o porcentual de isola-
mento social no Estado foi de
apenas 47% na quinta-feira.
Segundo o infectologista e epi-
demiologista Carlos Magno Cas-
telo Branco Fortaleza, do Comi-
tê de Contingenciamento do Es-
tado, estudos indicam desacele-
ração no crescimento da doença
depois que Doria decretou qua-
rentena a partir de 24 de março.
“Hoje, uma pessoa passa o vírus
para um pouco mais de uma. Is-
so ainda é um crescimento, mas
mais lento. A questão é como fi-
cará daqui duas semanas se não
decretar prorrogação. Podemos
ter crescimento exponencial.”
Para o infectologista Jean Go-
rinchteyn, do Hospital Emilio
Ribas, as ações de isolamento to-
madas em vários Estados po-
dem ter feito com o que o pico
da doença no País fosse um pou-
co adiado. O Ministério da Saú-
de estima que isso deve ocorrer
entre o fim de abril e o começo
de maio. A primeira em decor-
rência da covid-19 foi em 17 de
março, em São Paulo, de um ho-
mem de 62 anos que tinha diabe-
te e hipertensão, sem histórico
de viagem ao exterior. Em me-
nos de dez dias, em 25 de março,


já eram 57 mortes. Passou para
mais de 200 em 1.º de abril e ul-
trapassou os mil óbitos ontem.
“As curvas foram desacelera-
das pelas quarentenas e, em pa-
ralelo, pela otimização dos hos-
pitais de campanha, com leitos
de UTI e aparelhos”, diz Gorin-
chteyn. “Mas se o número de ca-
sos crescer de forma acentua-

da, medidas terão de ser estabe-
lecidas para garantir que pes-
soas não tenham risco de vida,
não só para não sobrecarregar o
sistema de saúde”, avalia.
Ele alerta, porém, para o au-
mento da circulação de pessoas
observado nos últimos dias. Na
quinta-feira, o Estado mostrou
que a quarentena afrouxou em

todas as capitais entre a última
semana de março e os primei-
ros dias de abril. Entre as dez
maiores capitais, a que apresen-
tou maior proporção de pes-
soas circulando nas últimas se-
manas foi Manaus. O Amazo-
nas registrava ontem 981 casos
e 50 mortes por covid-19. “Isso
pode fazer com que haja mais
circulação do vírus e contamina-
ção dos mais vulneráveis e a
mais mortes”, diz Gorinchteyn.
No início da semana, o Minis-
tério da Saúde propôs que algu-
mas regiões afrouxem o isola-
mento, desde que estejam provi-
das de leitos, respiradores, tes-
tes, equipamentos de proteção
e equipes de saúde suficientes.

Avanço no mundo. Ainda sem
nomear o vírus, em 31 de dezem-
bro, o governo da cidade chinesa
de Wuhan confirmou para auto-
ridades de saúde a existência de
dezenas de casos de uma pneu-
monia desconhecida na região.
Em 11 de janeiro, foi informada a
primeira morte. Desde então, a
covid-19 se espalhou por todos
os continentes e deixou mais de
100 mil mortos até ontem, se-
gundo levantamento da universi-
dade norte-americana Johns
Hopkins. Os dados da Organiza-
ção Mundial de Saúde (OMS)
apontam 92.798 mortos. São
mais de 1,6 milhão de infectados.
Da China, o novo epicentro
da doença passou a ser a Europa
em março, com Itália e Espanha
destacando-se pelo crescente
número de casos e mortes. De-
pois, os Estados Unidos passa-
ram a chamar a atenção, supe-
rando registros europeus.
Para Carlos Magno, três fato-
res colaboraram com a propaga-
ção do vírus pelo mundo: o pa-
drão de deslocamento das pes-
soas, a velocidade de resposta
dos países e o negacionismo
dos líderes políticos. Ele avalia
que a Itália reconheceu tarde
que se tratava de uma emergên-
cia de saúde e que os norte-ame-
ricanos “são vítimas do negacio-
nismo do presidente”, que che-
gou a minimizar a doença.
Em comparação com esses
países, Gorinchteyn diz que o
Brasil está conseguindo fazer
com que as pessoas entendam a
importância de ficar em casa e,
ao mesmo tempo, tem prepara-
do as unidades de saúde. “Ape-
sar do número de casos, esta-
mos fazendo história diferente
de China, Itália e EUA. Por isso,
nesse momento, não é adequa-
do afrouxar o isolamento.”

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


lRisco

Bolsonaro


erra em suas


previsões


Total de infectados no planeta é de 1,6 milhão. No País, São Paulo é o Estado mais afetado, e estudos indicam desaceleração no


crescimento da doença após governo decretar isolamento, em 24 de março. Confinamento, porém, caiu ontem para 47% – ideal é 70%


A cidade de Nova York, onde se
concentra o maior número de
mortos dos EUA, passou ontem
a sepultar cadáveres em valas
comuns abertas às pressas em
Hart Island, uma ilha na região
do Bronx, onde normalmente
são enterrados indigentes e mo-
radores de rua. A maior cidade


do país sozinha responde por
80 mil casos e 5 mil óbitos.
Em imagens capturadas on-
tem pela Reuters, detentos com
equipamento de proteção indi-
vidual usavam uma escada para
descer dezenas de caixões em
enormes trincheiras cavadas
no local. Em Hart Island, estão
sendo enterradas as vítimas de
covid-19 cujas famílias não fo-
ram identificadas ou não pude-
ram pagar um enterro.
Segundo a prefeitura de Nova
York, são realizados no local 25
enterros por semana. Agora, au-
toridades informam que fazem

mais de 20 sepultamentos por
dia. Nos EUA, a doença avança a
um ritmo assustador: mais de
30 mil novos casos e quase 2 mil
mortos todos os dias. Nessa ve-
locidade, os americanos devem
ultrapassar brevemente a Itá-
lia, que lidera o ranking mun-
dial com quase 19 mil mortes.
Um porta voz do departamen-
to responsável pela administra-
ção do sistema prisional, res-
ponsável pelos funerais na ilha,
disse que precisou abrir novas
covas para acomodar os corpos,
que são enterrados em bolsas
especiais e em um caixão de ma-
deira. Ele também comentou
que o local está preparado para
receber corpos de todo tipo de
vítima, caso o sistema de necro-
térios da cidade de NY atinja a
capacidade máxima.

Britânicos. Mas não são ape-
nas os americanos que empur-
ram as estatísticas da pandemia

para cima. Se as contaminações
têm dado sinais de desacelera-
ção na Itália e na Espanha, a co-
vid-19 está se espalhando por
Reino Unido e França assusta-
doramente. Os britânicos regis-

traram ontem 980 mortes – um
recorde para o país. Os france-
ses, 987. Os números relatados
pelos dois países se parecem ca-
da vez mais com os de italianos
e espanhóis, quando eles estive-

ram no auge da pandemia. Tan-
to Reino Unido quanto França
demoraram para apostar no iso-
lamento como melhor forma de
coibir a proliferação da doença.
Um dia antes, os ingleses já
tinham registrado o óbito de
881 pessoas vítimas da covid-
19, totalizando 8.114. Tanto na
Inglaterra quanto em Londres
os números foram os maiores
até agora em um único dia. Há a
expectativa de que o pico da
doença no país esteja próximo,
podendo ocorrer no domingo
de Páscoa, e o Sistema Nacional
de Saúde (NHS, na sigla em in-
glês) se prepara para um “tsuna-
mi” de casos no fim de semana.
O jornal The Guardian publi-
cou material exclusivo apontan-
do que o total de vítimas fatais
ligadas ao coronavírus possa es-
tar subestimado em até 1 mil
pessoas no país por causa de
mortes ocorridas em casas de
repouso não contabilizadas.

São Paulo registra 8.216 casos e 540 óbitos. Pág. 11 }


lCerca de 64% dos mortos e
74% dos hospitalizados por co-
vid-19 no Brasil são brancos, se-
gundo informações do balanço
do Ministério da Saúde divulgado
na tarde de ontem.
A pasta já vinha apresentando
o perfil dos mortos pela doença
por faixa etária e sexo, mas pas-
sou a incluir ontem também os
dados por raça/cor.
Ainda de acordo com o levanta-
mento do Ministério da Saúde,
indivíduos pardos são os segun-

do grupo mais acometido: repre-
sentam 28,5% dos óbitos e 18,9%
das internações. Outros 4,3% dos
mortos eram negros, 2,5% classi-
ficados como raça/cor amarela e
outros 0,2%, indígenas.
No grupo de hospitalizados, os
índices são parecidos: 4,2% ne-
gros, 2,8% amarelos e 0,2% indí-
genas.
Os números indicam que embo-
ra, o porcentual de mortes seja
maior entre os brancos, a doença
pode ser mais letal entre pardos
e negros, pois, embora eles re-
presentem uma em cada quatro
internações (23.1% ), correspon-
dem a uma em cada três mortes
(32,8%).
A distribuição de hospitaliza-

ções e mortes pode sofrer gran-
des alterações, já que 1.942 dos
casos de internação e 341 óbitos
foram excluídos do levantamento
pelo fato de a variável raça/cor
ser desconhecida.
Os números mostram ainda
que, dos mortos, 58,2% eram ho-
mens e 41,8%, mulheres. Quanto
à faixa etária, os idosos represen-
tam 77% das vítimas fatais. São
633 maiores de 60 anos, 104 en-
tre 50 e 59 anos, 59 entre 40 e
49 anos e 53 mortos menores de
40 anos. Os dados mostram ain-
da que 74% dos mortos apresen-
tavam pelo menos um fator de
risco complicador. Os mais preva-
lentes foram cardiopatia, diabe-
tes e problemas nos pulmões.

Quer fi car bem
informado de forma
rápida e direta?

Acesse o PODCAST
pelo QR CODE e
confi ra as principais
notícias do Brasil
e do mundo.

OFERECIMENTO
APOIO

“É irresponsabilidade
deixar adoecer desde que
tenha leito. Não vejo
nenhuma possibilidade
segura de abertura antes de
meados ou fim de maio.”
Carlos Magno, EPIDEMIOLOGISTA

Em 22 de março, o presidente
Jair Bolsonaro disse em entre-
vista para a TV que a quantida-
de de mortes causadas pelo no-
vo coronavírus não seria maior
do que as provocadas pela H1N
no ano passado. Em 2019, 796
brasileiros morreram de H1N1,
segundo o Ministério da Saúde.
Quatro dias depois de sua de-
claração, em 26 de março, Bolso-
naro comentou que o contágio
pela covid-19 no País não seria
como nos Estados Unidos por-
que, segundo ele, não acontece
nada com o brasileiro. Queria
dizer que seu povo era mais re-
sistente. No mesmo dia, o presi-
dente comentou que o brasilei-
ro deveria ser estudado (por
cientistas e médicos) porque
mergulha no esgoto e não pega
nenhuma doença.
Bolsonaro tem minimizado a
pandemia do coronavírus em
suas falas e ações, como a de iso-
lamento que não cumpre, e cha-
mou a doença de “gripezinha”.
Ontem, ele caminhou pelo co-
mércio de Brasília, reunindo
apoiadores em torno de si, em
meio ao isolamento social em
vigência no Distrito Federal de-
vido à pandemia. Seu ministro
da saúde, Luiz Henrique Man-
detta, já comentou que o DF é
um dos Estados que mais o preo-
cupam. “Eu tenho direito cons-
titucional de ir e vir. Ninguém
vai tolher minha liberdade de ir
e vir”, afirmou o presidente aos
jornalistas presentes na saída
de ontem com seus pares.
Já o ex-ministro e deputado
federal Osmar Terra (MDB-
RS), que tem sido uma das prin-
cipais vozes contrárias às medi-
das restritivas no combate ao
coronavírus, disse em rádio que
o Brasil terá menos mortes pela
doença do que o Rio Grande de
Sul terá por gripe no inverno.
“Vai morrer mais gente de gri-
pe sazonal no Rio Grande do
Sul. Morrem, em média, 950
pessoas de gripe sazonal, princi-
palmente os idosos”, disse,
acrescentando que errar o que
chamou de “vaticínio” seria des-
moralizante para ele. “Vai mor-
rer menos gente de coronavírus
no Brasil do que gente no inver-
no gaúcho de gripe sazonal.”

● O Brasil registrou o primeiro caso da Covid-19 em 26 de
fevereiro e hoje tem 19.638 casos confirmados da doença

EVOLUÇÃO

FONTES: MINISTÉRIO DA SAÚDE INFOGRÁFICO/ESTA D ÃO

26/FEV 4/MAR 11 18 25 1º/ABR 8

DIA 10

1
CASO^352428

2.

6.

15.

19.
TOTAL DE
CASOS

Em 45 dias

15.

1
TO
C

1.
TOTAL DE
MORTOS

4
MORTOS

57

241

800

1.
CASOS

115
MORTOS

EM 24 HORAS

2

AC

3

AL

2

AP

50

AM

19

BA

58

CE

14

DF

TO
0

7

ES

8

GO

16

MA

2

MT

2

MS^17

MG

25

PR

PB 11

9

PA

7 PE^65

PI

11

RN

14

RS

147

RJ

2

RO

3

RR

18

SC

4

SE

540

SP

Total de
mortos por
Estado
Dados até 10 de
abril de 2020

JOHN MINCHILLO/AP

Procedimento ocorre em


Hart Island, ilha na


região do Bronx,


onde são enterrados


moradores de rua


Nova York começa a


sepultar cadáveres


em valas comuns


Estados Unidos. Valas no bairro do Bronx, em Nova York

64% das vítimas no


País são brancas,


diz ministério

Free download pdf