O Estado de São Paulo (2020-04-13)

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B6 Economia SEGUNDA-FEIRA, 13 DE ABRIL DE 2020 O ESTADO DE S. PAULO


S


er investidor no Brasil nunca foi fácil.
Na verdade, investir não é trivial. Re-
quer conhecimento e dedicação. Ins-
trumentos financeiros, mercados e tecnolo-
gia tornaram-se sofisticados e acompanhar
a evolução disso exige tempo. No entanto, o
momento que vivemos, com incertezas, o
sobe e desce da Bolsa e a taxa de juro, faz

com que investir seja mais difícil ainda. Nos
últimos dias, estamos encontrando quase
como um mantra que o melhor lugar para
manter o dinheiro é no bolso ou no banco.
Essa posição tem fundamento quando com-
paramos os retornos dos ativos com a infla-
ção. Mais forte ainda fica essa posição se
comparamos com investimentos de mais
risco, como renda variável.
A Bolsa brasileira está com perdas acima
de 35% no ano e, conforme o dia, é fácil per-
der mais de 10% do valor investido. Isso in-
dica que quem está fora da Bolsa assim de-
ve permanecer. Mas, quem está dentro, só
deve sair se precisar muito do dinheiro por-

que irá realizar grandes perdas. Da mesma
maneira, devemos pensar nos investimen-
tos em fundos.
Mas essa posição não prevalece quando
analisamos os números de algumas aplica-
ções em renda fixa ou mesmo de alguns fun-
dos, mesmo quando calculamos o ganho
real, que é quando tiramos a inflação previs-
ta do retorno líquido calculado para o ativo.
Por exemplo, o CDB que oferece 100% do
CDI proporciona um pequeno ganho, mes-
mo caso das LCI/LCA com pelo menos 80%
do CDI. Obviamente, a grande maioria dos
investimentos estão oferecendo retorno
real negativo. Em outros termos, quando

descontamos do ganho as taxas e imposto
de renda, o ganho líquido será menor que a
inflação prevista para este ano, de 2,72%.
No entanto, se não aplicarmos os recur-
sos, haverá perda igual à inflação. Esses cál-
culos não trazem grande conforto, mas pre-
cisam ser considerados. Mas devemos consi-
derar, também, alguns comportamentos.
Por mais que tentemos ser racionais nos
investimentos, de maneira geral, sentimos
muito mais a dor da perda do que a alegria
do ganho e isso pode nos levar a decisões de
investimentos de maior risco e comporta-
mentos irracionais, que nessa hora é tudo
que não precisamos.

]
FÁBIO GALLO

Márcio Kroehn


A frase “Winter is coming!” (O
inverno está chegando) é mar-
cante para os fãs de Game of
Thrones (A Guerra dos Tronos,
HBO, 2011-2019). Ela é o tema
do primeiro episódio da série e
serviu para resumir as batalhas
e os dias difíceis que viriam a
seguir para todos os reinos.
Não é difícil fazer um paralelo
com a Bolsa de Valores desde
que o novo coronavírus se tor-
nou uma pandemia. O efeito no
mercado acionário foi imedia-
to. O Ibovespa, que chegou aos
119.527 pontos no início de
2020, despencou 46,81% para
63.569 pontos. Nas duas últi-
mas semanas, o principal índice
da B3 mostrou força ao recupe-
rar uma pequena parte dessa
perda - valorização de 22,2% pa-
ra 77.681 pontos até a quinta-fei-
ra (9). Esse é um dos motivos
que torna mais difícil conven-
cer os investidores a deixar o oti-
mismo de lado e tratar este mo-
mento como uma batalha vito-
riosa na longa guerra que está
em curso. “Não acredito que a
Bolsa esteja cara nos 78 mil”,
diz Luiz Fernando Figueiredo,
sócio da Mauá Capital e ex-dire-
tor do Banco Central (BC).
“Mas os parâmetros que tínha-
mos antes vão demorar a acon-
tecer. O problema pode ser o
desarranjo econômico, mesmo
com pacotes Fiscal e Monetário
para ajudar as empresas.”
Nas últimas semanas, os eco-
nomistas começaram a revisar
a expectativa de crescimento
do PIB brasileiro. O boletim Fo-
cus, divulgado pelo BC na se-
gunda (6) com a mediana de
100 especialistas, trouxe uma
queda de 1,18% para a economia
este ano - em 3 de janeiro, a pro-
jeção era de uma expansão de
2,3%. O perigo está justamente


no tempo necessário de isola-
mento para evitar um risco de
contágio em massa que sobre-
carregue o sistema de saúde.
Por isso, o ministro da Econo-
mia, Paulo Guedes, disse em te-
leconferência com Senadores
na quinta (9) que o recuo pode
ser ainda maior, de até 4%, se-
gundo apuração feita pelo

Broadcast. “Vai demorar um
bom tempo para imunizar a po-
pulação. Por isso, há riscos de
ondas de relaxamento e restri-
ção sanitária até a descoberta
de uma vacina”, afirma a econo-
mista Monica de Bolle, pesqui-
sadora sênior do Peterson Insti-
tute for International Econo-
mics e professora da Universi-

dade John Hopkins. “A incerte-
za é total sobre quantas ondas
vão acontecer. Os 120 mil pon-
tos da Bolsa não voltam nesse
cenário de acelera e para. O efei-
to no mercado vai ser de extre-
ma volatilidade.”
Um levantamento feito pela
Frente Corretora ajuda o inves-
tidor a se orientar sobre o tem-

po que a Bolsa demorou para re-
cuperar a pontuação anterior a
um evento de queda. Em 2008,
por exemplo, o Ibovespa levou
42 dias para atingir a pontuação
mais baixa após a quebra do ban-
co de investimentos Lehman
Brothers. Mas foram 254 dias pa-
ra retornar ao mesmo ponto.
Desta vez, em 13 dias o Ibovespa
foi para a casa dos 60 mil pon-
tos. “A saída de capital estran-
geiro da Bolsa no coronavírus é
porcentualmente maior do que
em outras crises. O pequeno in-
vestidor local, que não tem mui-
to know how e está passando
pela primeira queda, não enten-
de o ajuste de valores que está
acontecendo”, diz Fabrizio Vel-
loni, chefe da mesa de câmbio
da Frente. “O tempo de recupe-
ração da economia nessa crise
vai ser mais alongada do que as
outras, entre 24 a 36 meses.”
As empresas, naturalmente,
refletem a velocidade da econo-
mia para gerar resultado para o
investidor. Nos Estados Uni-
dos, a comparação que os espe-
cialistas estão fazendo é com o
período da Grande Depressão,
que é considerada a mais grave
crise econômica mundial do Sé-
culo passado. Para se ter uma

ideia, os dividendos (parcela do
lucro que as empresas dividem
com os acionistas) distribuído
pelas companhias americanas
será a metade do projetado no
fim de 2019 pelos próximos 21
meses. No pós-1929, o recuo foi
de apenas 26,7% em 47 meses.
“Esta crise é diferente das ante-
riores. Há necessidade de sobre-
vivência do ser humano, o que
afeta todos os mercados”, afir-
ma Fábio Astrauskas, CEO da
consultoria Siegen. “A Bolsa é
um reflexo disso. A recupera-
ção não virá em semanas. É
mais parecida a uma guerra, de
longa duração. Por isso, pode
ter havido uma acomodação
nos 80 mil pontos.”

l Pequeno investidor

Comportamento


irracional é tudo que


não precisamos


Investidor sonha com a
volta do Ibovespa aos


120 mil pontos, mas


recuperação não é tão


simples como parece


agorainvestimentos.com.br

Recomendações de acordo com o seu


perfil, objetivo e momento de vida.


Mesmo em tempos de incertezas.


Invista com a gente.


● A pontuação do principal índice da B3 no dia anterior a um grande evento, sua queda máxima e o tempo que foi necessário para se recuperar

A REAÇÃO DO IBOVESPA ÀS CRISES

EM PONTOS TEMPO DE RECUPERAÇÃO DO ÍNDICE QUEDA MÁXIMA APÓS A CRISE

Ataque às torres Gêmeas Crise 2008 – falência do
banco Lehman Brothers

Joesley Day Greve dos
Caminhoneiros

Coronavírus

(14 DIAS)

(55 DIAS)

11.
25/SET/

12.
5/NOV/

11/SET
2001

10/SET
2001

11.922 10.

(42 DIAS)

(254 DIAS)

29.
27/OUT/

57.
27/MAI/

15/SET
2008

12/SET
2008

52.

(50 DIAS)

(32 DIAS)

62.
7/JUL/

62.
19/JUN/

18/MAI
2017

17/MAI
2017

61.
48.

67.

(58 DIAS)

(135 DIAS)

77.
18/JUL/

83.
3/OUT/

21/MAI
2018

18/MAI
2018

83.082 81.

(13 DIAS)

(29 DIAS)

63.
23/MAR/

77.
9/ABR/

10/MAR
2020

4/MAR
2020

92.

107.

FONTE: FRENTE CORRETORA INFOGRÁFICO/ESTADÃO

“A saída de capital
estrangeiro da Bolsa no
coronavírus é maior do que
em outras crises. O
pequeno investidor local,
que está passando pela
primeira queda, não
entende o ajuste de valores
que está acontecendo.”
Fabrizio Velloni
CHEFE DA MESA DE CÂMBIO DA FRENTE.

Quanto tempo vai demorar o inverno?


DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO

Acelera e para. Para especialistas, Bolsa não volta aos 120 mil pontos neste cenário volátil
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