O Estado de São Paulo (2020-04-13)

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O ESTADO DE S. PAULO SEGUNDA-FEIRA, 13 DE ABRIL DE 2020 Política A


Pedro Venceslau
Paula Reverbel


O PSDB do governador João
Doria ampliou sua base políti-
ca em São Paulo e atraiu 50 no-
vos prefeitos do Estado até o
limite do prazo de transferên-
cia partidária, que se encer-
rou no último dia 4. A investi-
da tucana reforça o projeto
eleitoral de Doria, potencial
candidato do partido à Presi-
dência em 2022. Em 2016, o
PSDB, que comandava o Palá-
cio dos Bandeirantes com Ge-
raldo Alckmin, contabilizou a
filiação de 20 novos prefeitos.

Há praticamente 26 anos no
poder em São Paulo, a sigla che-
fia hoje 220 das 645 prefeituras
do Estado. Deste montante de
prefeitos tucanos, 115 tentarão
a reeleição no Executivo muni-
cipal, segundo levantamento
feito pela legenda e ao qual o
Estado teve acesso. O presiden-
te estadual do PSDB, Marco Vi-
nholi, é também secretário de
Desenvolvimento Regional e
despacha com prefeitos no Palá-
cio dos Bandeirantes.
Entre os chefes do Executivo
municipal que entraram no
PSDB estão prefeitos de gran-
des colégios eleitorais, como o
ambientalista Clodoaldo Gaze-
ta, (ex-PSD) de Bauru (com
374.272 habitantes), o promo-
tor Nelson Bugalho (ex-PTB)
de Presidente Prudente
(227.072 habitantes) e Marcos


Neves (ex-PV) de Carapicuíba
(369.908 habitantes). Segundo
Vinholi, o PSDB vai lançar 500
candidatos a prefeito no Estado
e 1.300 a vereador.
O PSDB também buscou qua-
dros no movimento de renova-
ção política RenovaBR e vai lan-
çar 20 candidatos ligados ao gru-
po. Em cidades governadas por
outros partidos a estratégia é in-
vestir em nomes considerados
de fora da política. Esse cresci-
mento do PSDB paulista – fora
do período eleitoral, por meio de
novas filiações de prefeitos efe-
tuadas depois que Doria assu-
miu o governo – irritou vários di-
rigentes regionais de partidos. O
que mais deixou clara sua insatis-
fação com o assunto foi o deputa-
do estadual Campos Machado,
secretário-geral da Executiva
Nacional do PTB.
Ele entrou em fevereiro com
uma representação no Ministé-
rio Público em São Paulo con-
tra Doria e contra o presidente
estadual do PSDB e secretário
de Desenvolvimento Regional
do Estado de São Paulo, Marco
Vinholi, acusando-os de pres-
sionar prefeitos a migrarem à
sua sigla em troca de liberação
de verba.
Campos Machado incluiu na
representação uma gravação do
prefeito de Chavantes (SP),
Márcio de Jesus Rego, à época
filiado ao MDB, em que ele su-
postamente admite à sua secre-
tária que a filiação ao PSDB vale-

ria R$ 2 milhões em obras de
recapeamento de vias e duplica-
ção da rodovia na região.
Ao Estado , o tucano negou
que a máquina tenha sido usada
para formar esse exército no
prefeitos. “O PSDB, que já era o
partido mais estruturado, se re-
novou e sob a liderança de João
Doria atingiu um patamar his-
tórico. Esses prefeitos estão se-
guindo o Doria, que é um líder
nacional, e não a máquina”, dis-

se Vinholi. O Palácio dos Ban-
deirantes também rebateu a
acusação do parlamentar.
“O Palácio dos Bandeirantes
lamenta a manifestação do de-
putado Campos Machado. E in-
forma que o governo está preo-
cupado e focado com a crise do
Coronavírus e não com eleição.
O Palácio recomenda que o de-
putado Campos Machado tam-
bém priorize o seu tempo e man-
dato para ajudar nesta crise. E
deixar eleição para depois.”

‘Namoro’. Recém filiado ao
PSDB, o prefeito de Bauru, Clo-
doaldo Gazetta, está entre os tu-
canos que disputarão a reelei-
ção em outubro (se o pleito não
for adiado). “Meu namoro com
o PSDB vem de longa data”, afir-
mou. Seu partido até a março
era o PSD, liderado pelo ex-pre-
feito Gilberto Kassab, que é alia-

do de Doria.
“Não vejo nada de imoral nes-
se contexto (de ir para o PSDB).
O prefeito vislumbra o apoio do
governador para disputar a reelei-
ção. Não é porque o governo man-
da recursos que o prefeito muda
de legenda”, disse Gazetta.
Em seu mandato, Bauru rece-
beu R$ 7 milhões do governo es-
tadual para recapear avenidas.
O projeto custou R$ 14 milhões
e a prefeitura pagou metade da
obra. Segundo o prefeito, outra
obra, do Mercado Municipal, re-
cebeu R$ 2 milhões do governo.
Para o deputado estadual Emí-
dio Souza (PT), que faz oposição
a Doria na Assembleia Legislati-
va, o “uso da máquina” é uma he-
rança que o PSDB recebeu do
MDB em São Paulo. “O instru-
mento são pequenas obras e mui-
to asfalto.”
Líder do PSDB na Assem-

bleia, a deputada Carla Moran-
do responde que os novos pre-
feitos vieram para o partido por
meio de parlamentares e líderes
locais da sigla. “Os partidos re-
clamam porque perderam espa-
ço. Não tem fundamento falar
em uso da máquina. Doria faz
um governo municipalista. Ele
investe nas cidades e conhece
as deputada tucana”.
Mário Covas foi o primeiro
tucano a governar São Paulo e
comandou o Palácio dos Ban-
deirantes de 1995 a 2001 – quan-
do morreu vítima de um cân-
cer e seu vice Geraldo Alckmin
assumiu o posto. Ele foi reelei-
to. Em 2006 foi José Serra
quem venceu a elei-
ção no Estado,
dando lugar no-
vamente a Alck-
min em 2010 e
2014.

PSDB.ORG

‘O prefeito vislumbra o apoio do governador para disputar a reeleição’


Vinícius Valfré / BRASÍLIA


Na ausência de uma legislação es-
pecífica que defina como crime a
produção e o compartilhamento
de fake news no cenário de pan-
demia do novo coronavírus e de
ameaças à saúde coletiva, autori-
dades passaram a enquadrar ca-
sos à Lei de Contravenções Pe-
nais, de 1941, numa tentativa de
coibir a disseminação de notí-
cias falsas relacionadas à covid-



  1. O dispositivo já foi utilizado
    em ao menos três capitais.
    O texto estabelece pena de pri-
    são de até seis meses para quem
    “provocar alarma, anunciando
    desastre ou perigo inexistente,
    ou praticar qualquer ato capaz
    de produzir pânico ou tumulto”.
    Mas, na prática, a punição, se apli-
    cada, é restrita à prestação de ser-
    viços comunitários ou multa.
    Em Belo Horizonte, a polícia
    recorreu ao dispositivo ao inves-
    tigar o homem que fez um vídeo
    na Ceasa denunciando um falso
    desabastecimento, em março. O
    conteúdo foi compartilhado pe-
    lo presidente Jair Bolsonaro, e
    depois apagado.
    No Recife, em fevereiro, quan-


do o município registrava ape-
nas cinco casos suspeitos de co-
vid-19 um cidadão apresentou-
se nas redes como profissional
da saúde e disse que a capital per-
nambucana tinha 61 infectados.
A alegação inverídica preocu-
pou a população, que passou a
desconfiar da transparência dos
gestores locais. Com base na lei
de contravenções, o município
pediu uma investigação poli-
cial, que comprovou a mentira.
Em Vitória, a polícia indiciou
um homem que publicou vídeo
no qual dizia estar infectado e
que, prevendo um cenário de
caos com a disseminação da
doença, usaria sua arma para se
defender. Mais tarde, quando a
gravação já estava amplamente
disseminada, ele descobriu que o
resultado do exame era negativo.
O Ministério da Saúde tem
manifestado, em coletivas,
preocupação com o fenômeno
de postagens que confundem a
população. A Polícia Federal in-
formou, no entanto, que até ago-
ra não foi acionada por órgãos
federais da área da saúde a res-
peito de “possíveis práticas cri-

minosas” ligadas à divulgação
de fake news relacionadas à pan-
demia. À reportagem, o Supre-
mo Tribunal Federal destacou,
em nota, que integra o Painel de
Checagem de Fake News.
Nas eleições de 2018, o Tribu-
nal Superior Eleitoral (TSE),
que tem na sua composição mi-
nistros do STF, chegou a insta-
lar um grupo para monitorar cri-
mes nas redes, mas não apresen-
tou resultados convincentes.
Em março de 2019, o presidente
do Supremo, Dias Toffoli, abriu
inquérito para apurar crimes
nas redes contra ele e outros
membros da instituição. No úl-
timo dia 6, o ministro limitou-
se a dizer que quem propaga no-
tícia falsa sobre a covid-19 co-
mete dolo.
Reprimir fake news com o
aparato estatal, no entanto, não
é recomendável, avaliam espe-
cialistas, por causa de riscos à
liberdade de expressão. As prin-
cipais medidas nesta crise têm
sido tomadas por órgãos de im-
prensa e pelas gigantes de tec-
nologia. O procurador-geral do
Recife, Rafael Figueiredo, reco-
nhece que o efeito inibidor é bai-
xo. “Embora seja uma punição
de menor potencial, elas po-
dem perder a primariedade pe-
nal, além de ter que gastar ho-
ras indo se explicar à Justiça”,
comentou, ao mencionar a lei
de contravenções.
Se a punição para quem usa a

tecnologia para oferecer riscos
à saúde pública é branda, basta-
ria endurecê-la? Esse é um cami-
nho problemático, afirmam es-
pecialistas. Caberia a deputa-
dos e senadores criar as leis,
além de definir o que deveria ser
considerado fake news ou não.

Subjetividade. A conceituação
é mais complexa do que parece,
uma vez que a desinformação
possui várias nuances. O depu-
tado Eduardo Bolsonaro (PSL-
SP), por exemplo, publicou um
vídeo verdadeiro do médico
Dráuzio Varella dando orienta-
ções sobre como encarar o novo
coronavírus. Contudo, as expli-
cações eram de janeiro, num ce-
nário de alastramento comple-
tamente diferente, e foram pu-
blicadas como sendo atuais. O
Twitter removeu a publicação.

“Não adianta colocar uma proi-
bição na lei e esperar que o Judi-
ciário julgue todos os casos. O
volume de posts torna inviável.
Mesmo que fosse viável, não é
boa ideia, dada a subjetividade,
concentrar esse tipo de decisão
nas mãos de poucas pessoas”,
afirmou o professor Ivar Hart-
mann, coordenador do Centro
de Tecnologia e Sociedade
(CTS) da FGV Direito Rio.
É o que também defende Sér-
gio Lütdke, coordenador do Pro-
jeto Comprova, iniciativa que
reúne jornais brasileiros para
combater a desinformação – e da
qual o Estado também faz parte.
“Qualquer atitude ou legislação
que se imponha sobre a livre ma-
nifestação das pessoas pode ter
consequências nefastas. Deve
haver regulação de outras manei-
ras. Atitudes mais reativas ten-

dem a ser melhores do que as
que podem levar à censura.”
Caso alguém se proponha a
recomendar tratamentos fal-
sos que prejudiquem a saúde
dos que receberem a informa-
ção, há quem entenda haver
margem para processos por le-
são corporal ou mesmo tentati-
va de homicídio. “Temos al-
guns crimes que poderiam ser
interpretados para englobar es-
sas situações. Mas quando você
precisa pegar a legislação penal
e fazer interpretação grande em
cima dela para punir, os tribu-
nais não aceitam”, avaliou o ad-
vogado Gustavo Arthur Coelho
Lobo de Carvalho, especialista
em Direito Constitucional e Ad-
ministrativo. “A hipótese crimi-
nal tem que estar muito clara.
Penalmente falando, a gente
não está protegido.”

PANDEMIA DO CORONAVÍRUS


PSDB de


Doria filia 50


prefeitos em


São Paulo


Norma que trata da


contravenção prevê prisão


de autores de notícias


falsas; para analistas,


solução é controversa


l Tamanho

Base. Vinholi, presidente estadual do PSDB, segura fichas de novos filiados; tucano ressalta ‘estrutura’ do partido em São Paulo

Sigla do governador tem hoje 220 prefeituras;


prazo de transferência se encerrou no dia 4


Clodoaldo Gazetta , prefeito de Bauru, que trocou o PSD pelo PSDB

Minas. Vídeo citava um falso desabastecimento no Ceasa; Polícia Civil abriu investigação

CEASA MG

Lei Penal é usada contra


fake news sobre covid-


FELIPE RAU/ESTADÃO

645
prefeituras tem o Estado –
o PSDB comanda hoje 220
cidades; 115 prefeitos da sigla
pretendem disputar a reeleição,
de acordo com levantamento
do próprio partido

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de checagem de
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