Adega - Edição 174 (2020-04)

(Antfer) #1

Edição 174 >> ADEGA 83


A história do Château Ausone,
que leva o nome de um célebre
escritor romano

Bordeaux


do poeta


O

s versos acima seriam para um
epitáfio na “tumba de um ho-
mem feliz”, escritos por Deci-
mius Magnus Ausonius, ou Ausô-
nio, um poeta e político romano
que viveu no século IV. Nascido por volta do ano
310 na região de Bordeaux, Ausônio teve educa-
ção requintada para a época e acabou se tornan-
do tutor do futuro imperador Graciano, de quem
receberia o título de cônsul de Roma, a mais alta
honraria da época.
Diz-se que Ausônio era um exímio orador e
retórico e foi assim que passou do cargo de pro-
fessor para a política, tornando-se uma das figuras
mais influentes na Gália naquele momento da
história. Em sua poesia, ele celebrou a região de
Bordeaux e seus vinhos, como no trecho abaixo:
“Ó, minha pátria ilustre pelos teus vinhos, teus
rios e teus homens, pelos costumes e espírito de
teus habitantes, pela nobreza de teu senado; eu não
a nomeei dentre as maiores, como se, cidadão cons-
ciente de uma cidade humilde, hesitava por fazê-
-la gozar de louvores imerecidos [...] Bordeaux é
a minha terra natal, ali o céu é doce e clemente,
o solo, graça às chuvas, bom e fértil, a primavera
longa, o inverno resfriado até o retorno do sol; os
rios têm uma corrente borbulhante que, ao longo
das colinas plantadas de videiras, imita os fluxos do
mar [...] Meu amor à Bordeaux; a Roma, o meu


respeito”. Burdigala, Ausone. Em: “Classificação
das cidades célebres” [tradução de Lucas Bertolo].

O Château
Ausônio também era proprietário de terras, sen-
do que uma de suas propriedades, a Lucania-
cum, produzia vinho, que foi citado por ele em
suas obras. “Que a vista das videiras apareça a nós
como um outro espetáculo, e que os presentes de
Baco convidem nossos olhares errantes, ali onde
um cume elevado, acima da cadeia de penhascos,
de rochedos, de cantos ensolarados de montanhas,
ondulações e depressões, a proteger as videiras e
a formar um teatro natural”. Acredita-se que esse
local, hoje, é onde fica o Château Ausone.
A história de um dos mais famosos vinhos de
Bordeaux é longa e tortuosa como alguns dos
poemas de Ausônio. O nome da propriedade
acredita-se que evoluiu de Casteau Dauzone,
para Château Dosone, até chegar a Château
Ausone. Restos de peças agrícolas, mosaicos de
videiras, fragmentos de estátua dão a entender
que Lucaniacum era mesmo no platô onde está
a propriedade atual, uma encosta chamada “Roc
Blancan” (rocha branca, ou seja calcário).
Na Idade Média, o espesso banco de pedra
calcária com vista para a propriedade abrigava um
ossuário e depois uma pequena capela românica.
O edifício ainda hoje surge no meio das parcelas

“Polvilhe minhas cinzas com vinho puro e perfumado
óleo de nardo; traga bálsamo também... Ó estrangeiro, com
rosas carmesim. Primavera sem fim permeia minha urna sem lágrimas:
Eu mudei de estado e não morri.
Não perdi uma única alegria da vida antiga, embora
Você ache que eu me lembre de tudo ou nada.”
Free download pdf