REFLEXÕES SÔBRE A VAIDADE DOS HOMENS
nestes o favor sempre é puro, e generoso, em lugar que
nos mais homens sempre é inficcionado de algum gênero
de interesse: nos príncipes os benefícios nascem de
liberdade, nos mais homens procedem de premeditação, e
esta fundada comumente na satisfação do que já devem,
ou esperam dever; de sorte que nos príncipes os
benefícios é grandeza, nos mais homens é comércio. O
maior favor é aquêle que se faz sem condição: quando os
soberanos favorecem, é sem a expectativa de retribuição
alguma, porque esta não pode ter lugar de nós para êles;
dão, e não esperam; por isso as mercês de um rei
mostram a sua inclinação, e não a sua intenção: as graças
dos reis, e as de Deus, só se pagam com amor. Como os
príncipes são os melhores avaliadores dos homens, por
isso supomos, que o favor, que fazem, sempre se dirige
ao nosso merecimento. Estimamos viver na lembrança
dos reis, ainda que seja por meio da desgraça: o mesmo
decreto, que põe a pena, suaviza o efeito dela, porque há